Capítulo 8 - Cores Reluzentes

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Ela cuspiu a espuma esverdeada na pia. Arg, aquilo ardia! Passou água na boca e lavou as cerdas da escova de dentes antes de guardá-la.

Sentiu algo gelado na sola dos pés. Olhando para baixo, viu os pezinhos brancos se envolvendo numa poça que se formava no chão do banheiro. Agachou-se defronte à pia e viu as gotas caindo do encanamento. Apoiou-se numa parte do cano para enxergar melhor e sentiu o ferro se deslocar um pouco. Apertou mais a válvula e se apoiou novamente. Nenhum movimento. É, aquilo devia bastar.

Enxugou o chão com o tapete azul e secou os pés com sua toalha cinza.

Após arrumar o cabelo escuro no coque de sempre, saiu do banheiro. A porta bateu e sentiu-se a vagar num mundo que se alterara demais desde sua última visita a ele.

Os pés descalços deslizaram pelo piso de madeira falsa sem fazer barulho algum. Desceu as escadas com a delicadeza de uma raposa. Ouvia o burburinho vindo de uma sala de jantar não muito distante.

Através da janelinha embaçada da porta fechada, a luz fantasmagórica da tarde nublada iluminava o hall, filtrada pelas gotas de chuva que escorriam lá fora.

Uma planta tristonha num vaso decorava o lugar juntamente à cômoda que dava lugar a uma bandeja com três copos de vidro e uma jarra d'água. As folhas compridas e secas suplicavam por um único gole de água.

Alley foi até a cômoda e encheu um dos copos até a borda. Ajoelhou-se defronte ao vaso.

Não.

Se levantou e devolveu a água à jarra.

Não. Aquilo não pertencia ao seu mundo. Não deveria interferir em nada por ali.

Entrou no corredor da direita. Era frio. Mas não; ela não possuía a regalia de julgá-lo desagradável, então apenas passou. Quieta. Olhando para baixo.

- Adolescentes bêbadas aparecem em estradas todos os dias. Não precisa ligar para a delegacia - ouviu a Sra. Chermont.

- Ela não me parece uma adolescente bêbada. Pode ter passado por coisas ruins, ou pode ter feito coisas ruins. Pessoas normais não aparecem em beiras de estrada - escutou uma segunda voz que parecia pertencer ao Sr. Chermont.

Alley terminou de percorrer o corredor e chegou à sala de jantar.

Era um ambiente incrivelmente agradável, ainda mais comparado ao corredor frio que havia acabado de percorrer.

A mesa de jantar de bordas arredondadas ocupava o centro do cômodo. Oito cadeiras a rodeavam. A cristaleira exibia lindas taças e copos de vidro. As travessas dispostas à mesa eram bem servidas com grande variedade. A sala em si parecia emanar um calor próprio.

A conversa cessou.

A passos largos, Alley andou até um dos assentos desocupados e se sentou.

O silêncio pesou sobre a sala.

Ela não pertencia àquele lugar e, pela primeira vez, todos pareceram saber disso.

O baque metálico soou pelo aposento e pareceu ecoar em cada cantinho da sala quando a menina de sete anos deixou a faca com a qual brincava cair no prato.

- Posso lhe servir, Alleyke? - a Sra. Chermont perguntou.

Alley demorou um pouco para responder, atordoada por todas as cores que reluziam dos pratos já servidos.

- Ah, sim. Sim, por favor.

A Sra. Chermont levantou-se e perguntou o que ela iria querer. Soltou o nome de todas as coisas servidas ali. Mas Alley já se sentia meio zonza ao nome do terceiro prato e pediu o único do qual se lembrava: sopa de beterraba.

- Está tudo bem? - perguntou após pôr o prato à frente dela.

Alley levantou a cabeça com os olhos meio confusos até perceber que passava as mãos na nuca e na testa com frequência. Estava suando. As crianças lançavam olhares curiosos e preocupados a ela.

- Sim, estou. Obrigada.

- Posso cuidar disso depois do almoço - apontou para o braço de Alley, voltando ao seu assento.

Controlou-se para não olhar o braço até todos se distraírem com os próprios pratos.

Ah, um belo rasgo de algum galho ranzinza. Como não havia visto aquilo? Suas costas também doíam; sem dúvidas tinha ganhado uns hematomas ao bater as costas nas pedras no fundo do lago.

Deu um suspiro baixinho.

Mergulhou a colher na sopa e a tomou.

Ela odiava sopa de beterraba.


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O Lago de AlleykeWhere stories live. Discover now