A Detetive

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Aquela era para ser a manhã mais bela de sua vida, seu véu caiu perfeitamente bem, mesmo que sua tia a dissesse que em casamento na praia não se usava véu, mas era a realização de um sonho, pouco se importava.

A música começou e lentamente caminhava até seu noivo, o qual sorria de uma forma impressionante, foi um grande momento, seus colegas de trabalho sentados, alguns acenavam, tudo perfeito do começo até o aceito.

Queria seus pais com ela naquele momento, nunca os conhecera e acabou sendo criada pela tia, mas tinha a esperança que um dia os encontraria. Isso não impediu que o momento fosse memorável.

Após a lua de mel sua vida voltou ao normal, porém com uma aliança no dedo. Seu marido voltou ao trabalho que exigia muito dele, era um grande executivo, quase não parava em casa, não o culpava porque o trabalho dela também a fazia passar dias focada, as vezes não voltava para casa, e ela odiava isso.

Era detetive, não era uma das melhores, não gostava do que escolheu, quando criança tomou como meta encontrar seus pais, então decidiu entrar nesta carreira. Infelizmente, não era algo que fazia com amor, ou com vontade, fazia por obrigação. As noites que passava no trabalho para fazer investigações eram as piores, estava infeliz naquele ramo.

O que a confortava era encontrar o marido depois de um longo período trabalhando.

Em um dia comum de trabalho, uma cliente qualquer veio pedir sua ajuda dizendo que achava que o marido estava traindo-a e queria que seguissem para descobrir, coisa típica. O que a detetive não esperava é que quando a mulher mostrou a foto do marido era exatamente a mesma pessoa que havia se casado há duas semanas.

Não falando nada para a mulher, aceitou o caso e acabou descobrindo toda verdade, era casado com as duas, seu mundo caiu, o coração partiu e o casamento acabou.

Transtornada e com os olhos borrados de maquiagem foi para casa de sua tia chorar e desabafar. Contou o que aconteceu, xingou o homem, se enraiveceu, mas depois acalmou-se e culpou-se.

"A culpa é toda minha!" Disse.

"Você não tem nada com isso, ele que foi cafajeste" disse a tia.

"Por que eu fui escolher essa profissão? Se não fosse esse maldito desejo de encontrar meus pais que ainda não achei, eu nunca teria descoberto a traição, tudo poderia estar bem ainda".

"Querida..." começou a tia "Não sabia que havia escolhido pelo seus pais" com um longo suspiro sentou-se do lado da mulher "Seus pais não te deixaram comigo, eles estão mortos, nunca vai achá-los, achei que já tivesse descoberto".

Sentiu suas bochechas corarem, seu nariz arder e os olhos começaram a lacrimejar. Eram muitas revelações, sua cabeça martelava enquanto tentava manter o controle da situação.

Tudo era uma mentira, em quem confiar? pensou.

Não queria falar mais, pegou sua bolsa e saiu de sua casa. Entrou em seu carro e viu que estava sem gasolina.

"Isso não é possível!" gritava em seu carro.

Bateu a porta do carro e decidiu pegar o primeiro ônibus que passasse aquela hora da noite e descer no primeiro bar aberto.

Foi o que fez, sentou-se do lado da janela e tentava chorar, mas seus olhos ardiam e nenhuma lágrima escorria. Observava a rua, pouco movimento para uma quinta-feira. Dois homens entraram no ônibus, logo atraiu a atenção da detetive.

Então ambos anunciaram o assalto, o motorista aparentava estar nervoso e abriu as portas do ônibus para que a mulher pudesse correr. Ao levantar olhou para situação, era uma detetive particular, não possuía porte de arma, não tinha um treinamento para assaltos, não havia nada a fazer a não ser ligar para polícia que sabia que demoraria para chegar, os assaltantes dispararam o primeiro tiro no motorista o qual morreu instantaneamente, o segundo tiro foi em sua direção, mas falharam na mira.

A detetive correu para longe, seu coração palpitava rapidamente.

Não conseguia parar de pensar na onda de azar que a cercava. Parecia que sempre estava no lugar errado na hora errada, voltou a se culpar por tudo e entrou em um bar para beber.

"Parece que temos um panda aqui" disse um rapaz sentando-se ao seu lado.

Passando a mão nos olhos percebeu que o rímel já estava espalhado pelo seu rosto.

"Eu quero ficar sozinha!".

"Nossa, não precisa gritar, moça, o que houve?".

Se fosse um dia qualquer em seu trabalho não confiaria em um rapaz no bar para contar sobre os casos, mas a situação pedia um desabafo para um desconhecido que provavelmente nunca veria novamente.

"As coisas de repente começaram a dar errado todas de uma vez, minha vida está errada, eu estou errada, não devia ter pego aquele ônibus" disse mesmo sendo um pouco difícil de decifrar por estar chorando.

"Pode me contar o que aconteceu?".

Respirando fundo contou tudo ao rapaz, todos os detalhes e o mesmo pediu mais uma garrafa de bebida para os dois, aquela seria uma noite que não dormiriam.

"Em que momento eu deixei isso acontecer?" ela se perguntou.

"Não deixou isso acontecer, sabe, coisas ruins acontecem e são elas que nos fazem crescer, nos ensinam lições valiosas e até mesmo mostram verdades que eram necessárias aceitar na vida".

"Mas é difícil de aceitar".

"Nada é fácil de aceitar, mas quem sabe agora você finalmente saia de seu emprego e vai fazer algo que realmente gosta, se encontre! Tenho certeza que deve ter algo que você goste de fazer e isso possa tornar uma profissão, ou um hobbie, algo que te fará não pensar nessas coisas ruins, pois não é necessário esquecer essas coisas, são elas que fazem você ser quem é, sendo boas ou ruins, fazem parte de sua história, não é porque a caneta falhou que você vai jogá-la fora, você vai fazer uns rabiscos no canto da folha até que ela volte a funcionar para continuar a escrever".

"Mas e se a caneta não funcionar?".

"A caneta ainda tem muita carga, ela vai funcionar, as vezes você está escrevendo no tipo errado de papel".

"Só há papéis errados".

"Mas você sabe que são errados, não vai insistir em usá-los, e sabe que pode ir atrás de um certo ao invés de achar que a caneta não funciona".

"Obrigada" tenta dar um sorriso, mas logo torna os pensamentos ao seus pais "Eu queria muito ter meus pais, mas agora sei que eles estão mortos, não iria adiantar procurá-los".

"Você pode achar seus pais, eles podem estar enterrados em algum lugar, será bem mais fácil de achá-los agora, não como gostaria, mas não desanime, assim que amanhecer sairemos daqui e iremos achá-los, eu prometo".

E essa promessa foi cumprida. Encontravam-se ambos em frente aos túmulos, onde depositaram uma flor. A detetive finalmente os encontrou.

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