A Bailarina

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Um sonho. Era tudo o que movia a vida de uma jovem de 23 anos a qual dedicava todo o tempo para sua paixão, o ballet.

Sentia que a cada Rond de Jambe sua vaga na escola de ballet mais renomada na Austrália estava se aproximando. Foram anos tentando, ensaiando, já até ensinara garotas mais novas que ela, fazia de tudo para sempre ser a melhor, para se destacar, concentrou seus maiores esforços, tempo e dinheiro para ficar mais próxima de seu sonho. A vaga era o que mais importava.

Seus pais sentiam um grande orgulho, queriam que a filha fosse para Austrália, não pelo dinheiro que ganharia se isso acontecesse, mas por ter uma filha fazendo o que ama e seguindo o grande sonho, por mais que ficassem longe nos próximos anos.

A relação entre eles era de se fazer inveja em muitos, o apoio que depositavam em cada decisão de sua filha era de se impressionar, compreensivos e verdadeiros amigos fieis. Demonstravam um amor puro, o que era lindo de se ver.

Suas apresentações eram de emocionar qualquer um. Os amigos iam em todas para lhe dar o suporte necessário, cercada de carinhos. Sua namorada a trazia rosas no fim de cada uma delas, era evidente seu orgulho pela garota.

Realmente era uma garota cercada de energias e pessoas boas, seu caminho estava mais que certo, alcançar seu sonho ficou mais fácil com todo o apoio que recebia.

Dois meses para a grande competição que definiria seu futuro, uma única vaga, gerou horas de ensaio, e seu cansaço era evidente. Ao fim do dia suas articulações doíam, seu rosto ficava rosado, talvez pelo esforço - imaginava. Mas não era uma dor que a faria parar, já passou por isso muitas vezes. A dor fazia parte no fim de alguns ensaios, era de seu costume.

Sentia que precisava descansar depois de muito ensaio aquele dia, seus amigos sempre saiam quando possível, diziam que queria aproveitar os últimos meses da amiga antes de ir para Austrália, pois todos tinham certeza de que passaria.

Decidiram ir à praia. Sentada no sol a garota quieta, refletia. Dedicou tanto tempo a isso, mas e se não passasse? Já tentou quatro anos seguidos, talvez o destino não quisesse que ela fosse. Com este pensamento começou a gritar com seus amigos, sua namorada ficou espantada, e ainda assim, os mesmos pediam para esquecer a ideia de que não iria para Austrália. Mas a garota insistiu, em sua mente pensava que não ia conseguir se virar em outro país.

A ansiedade e nervosismo tomou conta de seu corpo, estava tão perto, mesmo que tenha passado grande parte de sua vida se preparando para isso, o pensamento lhe invadiu e não conseguia parar de pensar na ideia do fracasso, ou de ficar longe.

Os amigos insistiam que era apenas o medo falando, era justificável já que não faltava muito para o grande dia. Ainda assim sentia um embrulho no estômago, um nó na garganta, gritava mudo suas angústias, os sentimentos falavam mais alto.

Depois de alguns minutos de muita gritaria no meio da praia a garota retornou a si. Era seu sonho, não desistiria assim tão fácil.

Sua namorada a abraçou, confortou e a levou em segurança para casa. Como sempre, uma cuidando da outra, em perfeita sintonia, assim como o ballet.

Ao chegar em casa foi tirar a areia de seu corpo dolorido, parece que o sol a piorou das dores. Mas nada de que um banho gelado não resolvesse. Com o corpo molhado notou que sua pele estava cheia de lesões, pensou ter abusado da praia, ou talvez marcas de nervosismo e ansiedade, sabia que essas coisas poderiam afetar seu corpo fisicamente também. Logo veio a preocupação com a aparência para aparecer no ballet no dia seguinte.

"Nada que uma maquiagem não cubra" pensou. "E para a dor, os remédios sempre estão na bolsa".

Suas colegas do ballet estavam em total sincronia para uma coreografia que haviam treinado, era algo bonito de se ver. No entanto após minutos de ensaio sua visão começou a tontear, um mal-estar a percorreu junto com uma dor intensa no peito. Era algo atípico, não entendia o que estava acontecendo.

As colegas perceberam. Disseram para ela ir ao hospital, mas apenas ignorou e foi para sua casa. O dia passou e a dor mais forte ficou. Até que os pais perceberam que havia uma dificuldade de respirar e que as lesões em sua pele não eram normais, não reconheciam como lesões de ensaio ou algo de seu psicológico se externalizando. Logo a preocupação bateu, sempre cuidaram da jovem, naquele momento não seria diferente.

Ao médico foi levada, exames atrás de exames e tudo o que conseguia pensar é que estava perdendo mais um dia de ensaio.

O médico não conseguia definir o que era, apenas pediu para a garota passar mais um dia no hospital, pensava que seria um dos piores momentos de sua vida, pois não estaria ensaiando para que pudesse realizar seu sonho. Eram dias perdidos, tempo que lhe aproximaria da Austrália, ensaios preciosos e decisivos para sua carreira.

Sua mãe resolveu passar a noite com a garota, no entanto dormiu e deixara a garota plena para pensar em paranoias.

No meio da noite, quando estava quase pegando no sono o médico chamou a mãe, e a garota esperta fingiu que estava dormindo para poder entender o que estava acontecendo.

Sem escutar muito, mas o suficiente para ouvir o choro de sua mãe, a preocupação veio no mesmo momento, com um salto que doeu intensamente levantou de sua cama.

Correndo para abraçar, mesmo com seu corpo inteiro possuído por uma dor intensa, a mãe percebendo, foi em seu encontro.

"O que eu tenho?".

O médico se apoiou na cama e disse que a garota estava com Lúpus, uma doença autoimune, que não havia cura, e o tratamento não seria suficiente para fazê-la voltar tão cedo ao ballet, talvez nunca.

Com o choque e um sonho destruído a garota caiuem prantos. Essa era a última notícia que esperava receber em toda sua vida.Sentia seu mundo desabar. Sabia que sua família e amigos estariam com ela paraajudar a superar a doença, mas sabia que era muito pior, poderia morrer, e nãohavia realizado seu sonho.

DesolaçãoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora