A Empresária

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Tic-tac. O tempo não para de passar, e a vontade de levantar de sua cama é quase nula. Com as mãos ao rosto escuta seu telefone tocar, mais uma tarefa, mais um cliente pedindo ajuda, mais um dia que ficar na cama não seria uma opção.

Todos os dias a mesma coisa, sua vida de empresária já era rotineira, dez anos fazendo o que faz, já não havia novidade, sem filhos, sem marido, tudo fora destinado à sua vida profissional. Ganha seu dinheiro, tem muitos clientes que dependem dela. Tem muito, mas ao mesmo tempo não tem nada, experiência profissional, mas nada de experiência pessoal.

Os pensamentos rondam sua mente, seu celular enfim para de tocar e o tic-tac do relógio fica evidente, a lembrando do tempo perdido.

Dedicou sua vida inteira a isso, para agora sentir que não é completa, seu sonho sim, era ser bem sucedida, mas depois da realização de seu sonho, o que vêm a seguir?

Não importa o quanto se lamente, sabe que deve levantar. Ainda deitada pega seu celular, mensagens e mais mensagens, tudo o que quer é apagar tudo e sumir, ir para bem longe, para lugares que não imaginou conhecer, havia tanto ainda para viver, porém grande parte de seu tempo já fora, percebe que aos quarenta só conhecera sua própria casa, sua cidade, só conhecera seus clientes, colegas e seus pais, mesmo que não os veja com tanta frequência, na verdade, faz anos que não vê os rostos familiares.

A saudade aperta seu coração, seus olhos cerram buscando lembranças de todos os momentos, era uma época boa, mas o tempo passa, a vida continua e ela se sente incompleta.

Seu despertador tocou, sete horas da manhã, sabe que se não se levantar no momento para se higienizar, iria chegar atrasada para uma reunião. Aquela reunião com o cliente que insistia em fazer coisa errada e ela tem sempre de iluminar seu caminho para o fazer mudar de ideia.

"Minha presença é realmente necessária?" Se perguntou e enfim levantou, pois sabe que não deve olhar somente para si.

Essa é sua realidade, não há tempo para pensar, não há tempo para ver seus pais, construir sua família, e muito menos tempo para fugir de tudo. Já é tarde, seu tempo passou, sua decisão foi feita e tem de arcar com isso.

Após seu banho e colocar sua devida roupa, pegou sua bolsa, celular e a chave de seu carro, o qual não é nada menos que um Porsche e foi a sua exausta reunião.

Com expressão totalmente fechada, dirige, liga na rádio, mas nada consegue agradar seus ouvidos. Tudo o que gostaria de ouvir é que no final tudo ficaria bem, que a solução de construir uma família aparecesse rápido.

Na reunião as coisas chatas foram discutidas e procuraram uma solução, mas ela não deu ouvidos. Não queria mais discutir, ou dar opinião, deixou o cliente seguir o caminho que quisesse. Seu colega percebendo isso veio mais tarde perguntar como estava.

"Eu simplesmente cansei disso, não tenho mais para onde ir, quero a minha família, quero alguém que me ame, e não esse mundo".

"Achei que gostasse do que faz".

"E gosto muito, isso era meu sonho, mas agora que a meta foi cumprida, o que fazer?".

"Acho que deveria tirar férias, realmente férias".

Após esta fala decidiu o que realmente iria fazer. Mal se dava férias, seu trabalho ocupava o primeiro lugar em sua vida, e o segundo, e os próximos dez lugares.

Nos dias que se passaram ainda estava preocupada com seu trabalho, toda hora seus clientes a ligavam, aquilo não era férias. Foi então, em um piscar de olhos, que decidiu se desligar de tudo, deixou seu celular, seus pertences e pegou sua mochila com poucas trocas de roupa e pegou o primeiro voo para onde seu dedo apontasse no mapa, Machu Picchu.

Conheceu a cidade perdida dos Incas, admirou aquela paisagem, sem ter um celular para ao menos tirar foto, curtiu o momento. Pensou em seus pais, iria visitá-los assim que voltasse, mas o problema era que não queria voltar. O lugar era libertador, o ar parecia mais limpo, até o céu parecia mais bonito, era como se tivesse se encontrado lá.

O guia turístico contava a história do lugar e tudo o que pensava era se conseguiria morar lá, ou ao menos ter uma casa próxima para quando quisesse fugir de sua realidade. Após um longo dia fechou seus olhos na cama do hotel e imaginou morando em uma bela casa, com uma filha dando bom dia, até sentiu o cheiro de pão quentinho.

A viagem ainda seguiu por mais uns dias, vez passeios de trem, trilhas que jamais imaginou que faria, aquelas de sentir um arrepio e ficar ofegante. Definitivamente uma experiência que nunca esqueceria, quando sua vida se despertou.

Ao voltar, a primeira coisa que fez questão de fazer foi visitar seus pais. Com um abraço envolvente encheram a mulher de perguntas, do tipo como estava sua vida, contou sobre o trabalho e eles ficaram felizes em saber que ela tinha conseguido realizar seu sonho. Perguntaram também se tinha lhes dado netos, com a cabeça baixa disse que não.

"Mas tudo bem filha" começou seu pai "Era seu sonho, não teve tempo para família".

"É que eu realmente queria uma pequena, passou a ser meu novo sonho".

"E com a sua idade como pretende fazer isso?" Perguntou sua mãe.

"Adoção, talvez".

Foi um longo ano para a empresária, adotar uma criança era de uma grande dificuldade, maior que todas que já tinha enfrentado em seu meio, nenhuma reunião com um cliente importante se comparava a isso.

Mas lá se encontrava ela, com uma pequena de 6 anos deitada no outro lado de sua cama, dormindo, com uma respiração leve.

Não sabia que era possível criar mais sonhos, o seu próximo era fazer com que a menina tivesse uma vida tão boa para realizar todos os seus sonhos.

A realização de um sonho é como despertar do mesmo, é o momento que você sente que sua alma transborda e a vida tem muito mais a lhe oferecer.

Fitava a pequena com seus olhos e conseguia sentir, o amor que a envolvia, isso era melhor do que qualquer realização de sua vida. Abraçou então aquele pequeno ser e prometeu que a amaria até o fim de seus dias.

DesolaçãoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora