C A P Í T U L O 28

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          Era doloroso, mas eu sabia bem que existiam dores piores.

          Fechei meus olhos com força contando até dez, tentando regular a minha respiração. Inspirei fundo, uma, duas, três vezes, até que a dor cessou e as inscrições sumiram. Tudo parecia ter voltado ao normal, com exceção da ira que eu ainda sentia, e do calor insuportável.

          E que calor!

          O suor brotava em meu pescoço fazendo algumas gotinhas descerem pelos meus seios, e o mormaço proveniente da minha pele, exalava o perfume dele. Era uma imensa droga. Um simples contado fez o cheiro dele grudar em mim. Na verdade, estava espalhado por todo o carro, mas na minha pele era muito mais intenso.

          Anton entrou no carro, e imediatamente virei meu rosto para a janela, pois não queria nem olhar na cara dele. Minha bolsa fora colocada no meu colo, seguida da minha blusa e por fim, do meu sutiã. Neste último gesto minha face voltou a arder. Era humilhante uma peça tão íntima do meu vestuário, ter passado pelas mãos do motorista que acabara de conhecer e depois pelas mãos daquele babaca.

          Eu estava morta. Morta de vergonha, de raiva, e de calor.

          Ele não falou nada, e era melhor assim, eu não estava disposta a voltar a gritar. O único barulho que se fez foi o ressoar profundo do ronco do motor, antes que ele arrancasse com o carro. Pelo menos o ar-condicionado estava ligado, e em fração de segundos, o ambiente foi ficando fresco.

          Minutos tinham se passado, e ainda não havíamos trocado nenhuma palavra. Arrisquei uma olhada de relance para ele, que parecia distante, submerso em pensamentos ou apenas concentrado na direção. Reparei o quanto os traços do seu perfil eram perfeitos e harmoniosos. Observei suas mãos firmes ao volante, e os seus antebraços descobertos pela manga da camisa preta que estava dobrada até o início deles. Eu nunca os tinha visto descobertos. Eram grossos, seus pelos finos e discretos em uma pele clara, e que parecia ser tão macia.

          Balancei minha cabeça negativamente. Droga, eu não deveria ficar tão perturbada perto dele.

          Aproveitando que ele estava abstraído na direção, tentei movimentar meus braços para pegar meu sutiã, de modo que eu não mostrasse nada. Só vi sua cabeça se virando discretamente, e aqueles olhos claríssimos com seu ar superior sobre mim.

          ― Não me olha ― falei séria.

          ― Não adianta mais esconder, eu já os vi.

          ― Qual é o seu problema? ― indaguei alto. ― Por que você fez isso?

          ― Pensou mesmo que poderia me deixar esperando, fada?

          ― Não te deixei esperando. ― Me fiz de inocente. ― Eu disse que não iria, e se você ficou esperando foi por que quis!

          ― Sim, claro. Então você resolve usar o meu motorista para levá-la até o seu compromisso. Ou melhor, levá-la para deixar um remédio para a sua avó enferma. Que comovente.

          Eu não devia, mas não consegui evitar, soltei uma risada.

          Anton se concentrou em mim, varrendo com seu olhar frio cada traço do meu rosto. Senti vontade de rir mais, e tive de morder meu lábio inferior para conseguir me segurar. Toda sua atenção se voltou para a minha boca, e por lá permaneceu alguns segundos antes dele se virar de vez para frente.

          ― Só para esclarecer, eu não usei ninguém. Estava disposta a ir te encontrar depois.

          Ele freou o carro bruscamente. O meu corpo e todas as minhas coisas se projetaram para frente. Elas caíram no chão, enquanto eu, voltei para trás com tudo, batendo minha cabeça no encosto do banco.

Contrato de DestinoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora