Eu consigo ver, ao longe, o tão famoso Gateway Arch. Pelo menos, eu acho que é ele. Um monumento que parece uma linha de metal curvada em um arco. Bem, eu nunca vi um arco, mas imagino que aquilo seja o formato de um.

Daqui, parece ser extremamente pequeno. Mas eu sei que ele é maior que a altura da minha casa. Minha mãe falara isso para mim quando fomos visitá-lo. É difícil de acreditar que aquilo podia ser mais alto que uma casa.

O rio Mississipi está com alguns pontinhos — que eu imagino que sejam barcos — e se movimentando conforme as correntezas. O azul dele não é tão parecido com o azul do céu, mas eu já sei que existem muitos tons de todas as cores.

Eu nunca me senti tão feliz. Nunca me senti... tão viva. Suicídio? Um dia eu pensei nisso?

E, de repente, acontece novamente. Mas dessa vez, eu percebo que isso não é um defeito do aparelho. Sou eu. Minhas pálpebras estão fazendo um movimento involuntário sem que eu percebesse. Eu estou piscando.

Acabo soltando uma risada baixa ao perceber o quão idiota eu sou por não ter percebido isso antes.

— Incrível, não? — Ouço Mitchell às minhas costas. Olho por cima do ombro e o vejo se aproximar.

— Si-sim... — Acabo gaguejando um pouco. Não consigo conter a emoção em minha voz.

Nada disso parece real ainda. Mas também não pode ser um sonho. Mesmo nos sonhos, eu nunca vejo nada, apenas ouço, toco ou sinto.

— Você consegue ver? — fala Steve. Eu me viro pra ele. Está com a boca aberta e as sobrancelhas bem perto uma da outra. — De verdade? Tipo, isso funciona? Quantos dedos eu estou pondo aqui?

Ele coloca a mão na minha frente com dois dedos erguidos.

— Dois — digo, rindo.

— Caralho, você tá enxergando! — Ele quase grita, entusiasmado.

Solto um enorme sorriso. Olho para Mitchell, que parece satisfeito com o resultado do seu trabalho.

— Ainda não acabamos — diz ele. — Este aparelho só lhe permite ver como nós vemos. Até agora. Atualizações serão feitas. Já vou avisando, quando as atualizações acontecerem, você parará de enxergar até que ela se complete. Não se preocupe, não será constante. Aqui, pegue isso.

Ele coloca sua mão no bolso e retira um pequeno aparelho de metal quadrado. Estende sua mão para mim e eu pego o objeto.

— Quando precisarmos de você, este aparelho brilhará e apitará. Então, você vem até aqui.

Eu analiso o objeto por alguns instantes, usando mais o tato do que os olhos. Ainda não me acostumei com o fato de ter visão.

Guardo o aparelho no meu bolso, piscando diversas vezes para ver qual a sensação de piscar voluntariamente quando se enxerga. Bem, não é algo tão legal quanto eu pensei que seria.

Levanto a cabeça e olho para os olhos de Mitchell. Aqueles círculos são suas íris. Elas têm uma coloração, apesar de eu não saber qual é. Sua pupila é essa bola pequena. A cor me traz uma sensação estranha. O resto do seu olho é de uma cor só com alguns riscos finos e quase invisíveis com outra cor.

Os olhos só têm cor dentro da íris. O resto é branco. Foi o que minha professora de Biologia me falou na sétima série. Então, eu finalmente conheço o branco. A junção de todas as cores está presente em todos os nossos olhos. E tem aquela aparência.

Era aquela cor que eu tinha visto ao acordar da cadeira. Tudo estava branco nos instantes antes de começar a ver aquela parede.

— Você terá que praticar ficar olhando para pontos incomuns na sala quando estiver falando com alguém — diz ele. — As pessoas vão desconfiar se olhar maravilhada diretamente para os olhos delas.

Invisível (DEGUSTAÇÃO)Where stories live. Discover now