Floresta de sangue

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Elza ponderou e depois disse:

"Aceito a oferta da tutoria, meu rei, se o magista em questão for o próprio Magnus, o seu mago real".

"Mas isto está fora de questão. Magnus está velho, 120 anos pelo menos, e já está aposentado de suas atividades", disse o rei repousando a mão sobre o cabo de sua espada mágica.

"Ora, melhor ainda, então. Um mago poderoso e experiente sempre quebrará o moral de qualquer exército invasor e além do mais, se ele está aposentado, não vejo que falta ele lhe fará na corte".

Vencido pelos argumentos da cunhada, o rei cedeu. Magnus chegou ao ducado um mês depois, mas ao invés de ver Willian empossado, era a duquesa quem ainda governava.

"Não entendo", disse o velho. "Achei que viria aconselhar o duque".

"Disse ao rei que aceitaria a tutoria", disse Elza na sala senhorial ao mago, "mas não disse nada a respeito de ceder o poder de minhas terras. Não ainda".

"O que deseja, Elza?", disse o mago cansado.

"Que me ensine o que eu deveria ter sido há muito tempo".

"Você se tornou o que deveria ser. Suas escolhas lhe trouxeram até aqui".

"Errado, Magnus. Não foram minhas escolhas, foram as escolhas que me deram. Agora trilharei o meu caminho. Quero ser uma magista como você".

"Uma bruxa, quer dizer".

"Não me importo com nomes".

"Mas deveria. A magia sacerdotal é mais apropriada às mulheres. A ligação materna as aproxima das benesses das divindades. No entanto, a magia da lei, ou do caos, exercida por uma mulher leva à bruxaria, simplesmente, aos sortilégios e às maldições. Até mesmo os homens têm dificuldade em suportar a hubris e as energias com que lidam. Veja o exemplo do marido de sua sobrinha Caritas, que se aliou aos lordes do Caos".

"Talvez eu seja diferente".

"Talvez não queira ser e isso me preocupa. É muito tarde para ensiná-la paciência, ou comiseração".

"Veja por este lado, Magnus. Quando meu marido faleceu, decidi-me por aprender magia. E nada mudará essa minha determinação. Se você não aceitar ser meu tutor, encontrarei outro que o seja e ele pode não ter as mesmas preocupações éticas que você. A escolha é sua".

"Onde está aquele menina que foi me procurar em minha torre, atormentada com o que uma cigana tinha visto em seu futuro?"

"Você não sabe? Ela se casou há sessenta anos atrás e teve uma vida bem feliz".


Os sonhos voltaram no terceiro ano de seus estudos místicos, na noite anterior em que Elza se preparava para enfrentar a sua primeira batalha de defesa de suas terras. No sonho via uma terra cinzenta, sem luz, ou esperança. Havia pessoas lá, mas nenhuma parecia possuir rosto. Elas aguardavam alguém que não vinha. Esperavam o momento de descansar do outro lado do rio da morte. Em meio àquelas pessoas ouviu uma voz chamar-lhe, uma voz conhecida, mas distante. "Encontre-me, estou perdida", dizia a voz, "meu pai corre perigo". Como antigamente, Elza acordou suada e nervosa. Lavou-se na tina de água para espantar os fantasmas e depois vestiu sua roupa de guerra e saiu da tenda.

Seu exército estava a postos. Seus generais gritavam instruções e seus filhos estavam ao seu lado. Do outro lado do campo o outro exército erguia suas bandeiras. Suas fileiras eram largas e talvez profundas, a primeira delas era formada por cavaleiros armados com lanças. Atrás deles haveria arqueiros com flechas incendiárias, sempre havia. Ao primeiro sinal de batalha, eles iriam cobrir os céus com suas setas e então a morte cairia sobre o seu exército. Olhou para as sua próprias fileiras. Elas não possuíam uma cavalaria, apenas seus oficiais estavam montados. Seus homens não eram guerreiros em sua maioria, eram aldeões e fazendeiros retirados de suas casas para defenderem sua suserana que havia cometido o erro de não se dobrar à vontade de seu rei.

Rua Dornelas, 45Where stories live. Discover now