Capítulo 16

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Antes mesmo que o bruxo pusesse as mãos nas anáguas, o homem pálido de cabelos negros e vividos olhos azuis entrou no campo de visão de Elisie, ele corria rápido em sua direção, o rosto contorcido pelo esforço, e assim que ele chutou o bruxo que voou para o outro lado e rugiu como um monstro, Elisie desmaiou. Ao reabrir os olhos, um lindo par de olhos verdes a encarava, estava sentado no chão com ela em seu colo, uma lágrima escorreu pelo rosto dele, Elisie atordoada ergueu a mão e a enxugou como fazia ultimamente. ― Elisie? Diga alguma coisa. Por favor... ― pediu ele aflito sacudindo-a em desespero, um fio de sangue escorreu de seu nariz, e uma veia escura e grossa pulsava em seu pescoço. ― Nunca te vi tão desesperado... ― brincou ela, lutando para manter os olhos abertos, ele abriu um sorriso enorme e lindo, tão lindo que trouxe um pouco mais de lucidez a ela que se sentou zonza. Olhou seu marido, depois olhou em volta, o bruxo queimava distante deles. ― Como dizem, se um bruxo perde o coração eles queimam. ― disse o príncipe tentando fazer uma piada, e se levantou erguendo Elisie que se aconchegou ao peito frio de seu marido que a apertou ainda mais. ― Vamos voltar. ♦♦♦ Alex lançou um olhar raivoso para Elisie, que se encolheu, já era a quinta vez em menos de dois minutos. Estavam seguindo para o Vale do desespero, após implorar para ir junto, Dixon permitiu que ela os acompanhasse, Alex tinha sido contra, e lhe lançava esses olhares para mostrar o quanto estava insatisfeito. ― Acho que estamos andando em círculos. ― disse Dixon analisando as árvores ao redor. Eram exatamente as mesmas, até a pequena pedra no meio do caminho com o formato de uma mão com quatro dedos. ― Alex, preste atenção ao caminho e esqueça seu ódio por mim. ― alertou a princesa deixando o caçador para trás. ― Você me distraiu, por essa razão eu não queria que vossa alteza viesse. Depois de muito brigar entraram em uma cidade de muros de pedras coberto por musgo. O caminho se apagava pela vegetação crescida e as casinhas pareciam desabitadas. Algumas plantas toscas saiam das janelas e portas. ― Não entendo, que vila era essa? ― disse Elisie olhando para dentro de uma casa invadida pelo mato. ― Isso é uma ilusão, não há vila nenhuma aqui. Vamos apenas continuar. Um choro de criança ultrapassou o silêncio espasmódico, fazendo os três erguerem a cabeça. ― Eu disse, vamos acelerar, são os Mermyos. ― Mermyos? ― Não faça perguntas, apenas acelere os passos. ― Mas e se for uma criança?― insistiu Elisie ― Impossível! Ninguém passa por essas bandas. ― explicou Dixon afastando o cavalo de uma poça de lama esverdeada. Ela o seguiu atordoada pelo choro insistente, virou o rosto para olhar uma última vez de onde o choro vinha e viu uma criança, uma pequenina criança. ―É uma criança!― exclamou saltando e correndo até o pequeno de enormes olhos castanhos e cabelos vermelhos. Dixon e Alex gritaram em desespero, correram atrás dela puxando as espadas. Ela pegou o pequeno que estava com as pernas escondidas dentro de uma árvore seca e oca, o puxou revelando pernas de tentáculos negros que pingavam uma gosma negra pobre. Ela o jogou para longe, no entanto ele retornou gargalhando enroscando um de seus tentáculos ao redor do pescoço dela apertando-o. Alex pulou para cima com a espada cortando os tentáculos que se erguiam para matá-la. Ele cortou o que a sufocava e Dixon a puxou para trás, arrastando a princesa em choque para longe daquele monstro assombroso que gargalhava endiabrado. Ela o abraçou, trêmula, e ele assustado a apertou contra si, estava com a respiração entrecortada e o peito palpitando de dor e algo mais. Alex matou a criatura tosca e se virou para ver se Elisie estava bem, todavia a pergunta ficou presa na garganta ao encarar a cena afetuosa entre eles. Fechou os punhos, ele seria a pessoa a abraçá-la, a confortá-la, seria ele se não tivesse acreditado em ter ela por amor e não a força. É isso o que acontece quando somos os mocinhos... Engolindo sua magoa e uma dor no braço, Alex se aproximou limpando o sangue gosmento da espada, depois puxou o queixo de Elisie para analisar seu pescoço que se encontrava vermelho e cheio de bolhas que ardiam como queimaduras. ― Isso é mal, precisamos chegar até a vila dos rebeldes, eles devem saber o que fazer contra esse veneno. No entanto, você ficará com manchas vermelhas para sempre. As mulheres vão olhá-la com maus olhos. ― Não importa, deixe que me julguem, eu não posso ser perfeita, ninguém pode. Vamos. ― pediu ela se soltando de Dixon, no entanto a fraqueza a fez cair para os braços de Alex que a abraçou quase que automaticamente. Queria beijar seu rosto, queria abraçá-la mais apertado. Mas ele só queria, e querer não é poder. Ela foi junto com Dixon que lhe apertava a cintura para impedi-la de cair, seu corpo estava molenga e seus olhos se fechavam sonolentos. Chegaram até as ruínas do antigo castelo, várias colunas de pedra ao redor da estrada, outras ainda formavam torres partidas ao meio. Elisie começou a tremer e se contorcer de frio por causa da febre, Dixon tentou não sentir dor, mas estava apavorado, e por estar com as emoções agitadas as garras oscilavam juntamente com os três olhos estranhos que surgiam a cada piscar insistente. Parou o cavalo, já sem conseguir se controlar. ― Leican, o que está fazendo? ― Preciso parar, parar... ― a urgência em sua voz arrastada fez com que Alex parasse o cavalo e corresse até eles, pegou Elisie nos braços e se afastou do Cordial. ― O que está acontecendo? ― Mi-minhas emoções... descontroladas. ― explicou se apoiando em um enorme bloco de pedra e vomitando sangue. ― Incomum... muito incomum... ― gorjeou uma voz rouca, eles olharam para cima, em um galho grosso viram uma velha murcha de rosto macilento e cabelos brancos, como as nuvens do começo da tarde, olhando-os com curiosidade. Ela tinha nos cantos da testa quatro tranças douradas penduradas brilhando como ouro, ela saltou, os ossos rangeram, tinha o corpo pequeno, desnutrido e murcho, ela se aproximou bambeando com a ajuda de seu cajado maior que ela. ― Incomum. ― repetiu encarando com curiosidade os dois parados olhando-a com desconfiança. Dixon tinha a mão atrás das costas apertando a adaga para o caso dela ser perigosa. ― O que é incomum? ― perguntou Alex pousando Elisie adormecida na grama, a velha não respondeu, seguiu até Dixon e o cutucou o peito com o cajado. ― Passado e futuro, bem e mal. Você os carrega no peito. Magia das bravas. Das bravas, loirinho... ― disse ela murmurando para si mesma. ― Como você sabe? Você é a bruxa? ― Nunca! Eu sou eu e ela é ela. E sorte a minha não ser ela. ― a velha revelou horrorizada e se virou. ― Então como sabe da magia que eu tenho no peito? ― Eu sinto, e sinto que você está prestes a ser liberto. Muito perto. Pertinho. ― Encontrarei a bruxa? ― Isso também, mas... quer dizer seu corpo encontrará a bruxa. ― a confusão nublou as feições do Cordial que cuspindo mais sangue correu até a velha que andava ágil para longe. ― Como? Ajude-me. A velha se virou para Elisie adormecida no chão e Alex próximo a ela, abrindo um sorriso amarelo apontou com o cajado para ele. ― Eu não posso ajudá-lo. Mas ele pode, venha cá olhos azuis. ― sem hesitação Alex caminhou até ela, que o cutucou com o cajado para que ele se abaixasse e assim sussurrou algo no ouvido do príncipe que empalideceu e resmungou um: Tem certeza que é isso? Para a velha que balançou a cabeça melancolicamente antes de dar um pulo alto e entrar na floresta gritando como um corvo ao sumir entre as folhas escuras. Alex ficou em pé, o sangue parecia ter sumido de seu rosto, e atordoado ele seguiu até Elisie. Durante todo o longo caminho até a vila dos rebeldes por mais que Dixon perguntasse o que a velha tinha dito, Alex fazia uma careta ainda mais feia e virava o rosto sem se dar ao trabalho de inventar uma desculpa, apenas se mantinha quieto e concentrado em levar Elisie até o curandeiro da vila. Ao chegar deram quinze dakios de prata para o curandeiro que os guiou até um quarto amplo com quatro camas, onde os três poderiam ficar enquanto Elisie se recuperava. Ao anoitecer, ela abriu os olhos, ainda se sentindo confusa, olhou em volta, estava sozinha no quarto. Levantou-se e seguiu até a varanda, a vila dos rebeldes era um lugar bonito, mágico e com marcas de um povo que tentou mudar aquele lugar, tentou reerguer o reino que a muito tinha se desfeito por guerras sem fim; apertou as têmporas sentindo dor de cabeça e quando fechou os olhos alguém lhe tapou a boca e a levou. Ela se debateu e mordeu os dedos que lhe tapavam a boca, e se virou aterrorizada assim que ele a soltou. ― Alex! O que você está fazendo? Você tem noção do quanto eu fiquei assustada?― Alex olhou em volta, para se certificar de que ninguém estaria ouvindo, ou se Dixon estava por perto. ― Desculpe por isso, mas tenho uma coisa para lhe contar. Não posso mais adiar, se eu continuar adiando acho que esse segredo ira me sufocar até a morte. Você precisa saber, Elisie.

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