OITO

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Estava dançando enquanto fritava meus ovos mexidos pro café da manhã na minha cozinha. Não, meu humor não tinha nada a ver com o quase beijo que Lorenzo me deu ontem, nem com o fato da música que estava tocando ser "Accidentally in love", sabe, aquela do Shrek?

Apenas estava animada, não sei, acordei mais empolgada. Finalmente estou empregada outra vez e posso pensar no meu futuro, sem medo.

Pretendo, em breve, dar entrada na minha casa própria. Já consegui juntar um pouco de dinheiro na poupança — e está lá, intocável. Meu foco é a casa e em breve, quem sabe, dar aulas de balé particulares. Sempre quis ser professora particular.

Eu me alimentei bem naquela manhã e depois decidi correr. Eram 9 horas já, mas queria sentir o sol mais quentinho naquele dia.

Corri pelos quarteirões durante uma hora. Passei na lanchonete dos Mirandas e bati um papo leve com os donos, meus amigos de longa data: Natália e Felipe.

Nat é uma loira branquinha linda de estatura mediana, seu rosto é fofo e dá vontade de levá-la para casa. Felipe é alto, moreno e forte. Lembra-me o ator Theo James, com os traços do rosto muito semelhantes.

— Mas e aí, como vão os negócios? — perguntei.

— Ah, você sabe, não é, Lorena? Os pães de queijo vendem como água pela manhã e à tarde os milk shakes. Estamos indo bem, graças aos céus — Nat comentou.

— E o casamento? — perguntei discretamente.

Felipe parou de passar pano no balcão e me olhou de soslaio, como quem diz "assunto proibido".

Natália colocou as mãos no rosto, apoiando os cotovelos no balcão, cansada.

— Meu Deus, Lorena! Que loucura essa coisa de casar! Não sei por que Felipe fez o pedido, eu já falei pra ele que não precisava de papel pra mostrar que o amo, mas ele insiste nessa loucura e, depois, quem tem de surtar com os preparativos sou eu!

Olhei discretamente para Felipe e percebi seu rolar de olhos devido ao que acabara de ouvir. Ele largou o pano em cima do balcão, limpou as mãos no avental e andou a passos duros em direção à cozinha.

— Desculpa te dizer isso, Nat, mas acho que você está exagerando. Felipe é um amor de pessoa e vocês já estão há sete anos juntos. Passou da hora de oficializar. Dá pra ver pelo rosto dele que ele te ama demais. Sei que nunca ligou pra essas coisas de festa, vestido, buquê... Mas pensa pelo lado bom, quem ama tem de ceder às vezes, você cede no casamento e ele vai ceder o resto da vida — dei uma gargalhada.

Ela riu comigo, mas logo ficou séria.

— A verdade é que eu estou com medo — disse baixinho para que apenas eu a ouvisse.

— Medo do quê, doida?

— Ah, Lore... A gente se dá tão bem, sabe? Medo desse título de marido e mulher pesar muito pra gente, não sei... Medo de dar errado. — Fez biquinho.

— Ah, relaxa, Nat. A vida está aí pra ser vivida apenas uma vez. Medos nos fazem retroceder e não viver o novo. Vai dar certo, confia! Vocês se amam — confortei-a.

Ela sorriu e agradeceu. Comi meu misto quente saboroso e cheio de queijo, porque quis variar, e tomei o suco de umbu natural mais delicioso da face da Terra.

Após me despedir deles, saí da lanchonete e voltei caminhando para casa.

Sentei no sofá, em silêncio. Minha casa estava limpa e silenciosa. Às vezes eu gosto do silêncio, transmite paz e me faz pensar.

Relaxei meus músculos e deitei a cabeça no encosto do sofá, pensando nas palavras que disse para Natália.

Medo de viver o novo.

Grande piada.

Por que a gente consegue dar o melhor conselho para os outros, mas quando se trata de nós, não conseguimos segui-lo?

Morro de medo da minha nova vida dos últimos dias? Sim.

Morro de medo de estar começando a criar expectativas com o beijo de ontem? Sim.

Se eu vou arriscar e viver a vida?

HA! HA! HA!

Sabe por que eu nunca fui azarada? Porque eu vivo em cautela. Alerta 24h por dia.

Nunca pisei fora da faixa.

Nunca avancei o sinal vermelho.

Nunca colei.

Nunca trapaceei.

Nunca fugi da rotina.

Nunca cheguei atrasada.

Sempre certa, metódica, rotineira.

Chata, eu sei.

Mas daí minha vida dá um triplo twist desde que fiz 25 anos, me obrigando a lidar com essa nova realidade. Essa coisa de experimentar o novo.

Já sei!

Liguei para minhas batgirls.

Em instantes as seis amigas estavam interligadas numa só ligação. Como faço isso? Não sei, apenas faço hahaha.

— Fala, doida! — Raquel começou.

— Conta as últimas do babado — Anna disse.

Bora, Lore, não tenho tua vida, amiga! — Duda me apressava.

— Calma, vacas! Queria pedir opinião sobre o que devo fazer. Ontem Lorenzo me beijou.

Pausa dramática.

Seis gritos histéricos ao mesmo tempo.

— Tá, mas e depois? — Maysa foi a primeira a perguntar.

— Gente, fala que eu tô ouvindo, só não posso ficar falando, pois estou no trabalho. — Emily falou.

— Depois, nada. Ele foi embora e eu não peguei seu telefone nem endereço.

— Que droga, amiga — Alice lamentou.

— O que eu faço?

Começou o burburinho de ideias simultâneas, sem que eu conseguisse ouvir ninguém claramente.

— Uma de cada vez, por favor!

— Pede o celular dele pro seu irmão — Anna sugeriu.

— Eu andaria mais arrumada a partir de hoje. Vai que ele aparece de surpresa e te vê com essas roupas de ginástica cafonas? — Maysa comentou.

— Eu esperaria. O que tem de ser, será — Duda sugeriu.

— Tem de ser será uma ova! Vaaaaai atrás do boy, sim. Ele ainda está na casa da sua mãe? Passa lá, ué! — Raquel afirmou.

— Não, foi só aquele dia. Ele mora perto de mim, mas não sei onde.

— Anda desfilando pelo quarteirão! — Alice disse, empolgada.

— Vocês são muito foguentas. , suponhamos que eu faça isso tudo. Se ele não me der bola ou me ignorar?

— Posso responder essa? — Duda falou primeiro.

Todas disseram "pode", inclusive eu.

— Eu focaria na minha vida pessoal e profissional, Lore. Se você está afim dele, espera o momento certo pra demonstrar. Ele parece bem sério, pelo que vimos naquele dia, e não quero te ver magoada. Mesmo querendo quebrar seu jejum de homens. Nem lembro a última vez que nos disse que beijou na boca — riu.

Ahh, sai pra lá — ri. — Obrigada, meninas, amo vocês.

— Também te amo! — Todas disseram juntas e desligaram.

Eu me sentia melhor depois de conversar com elas.

Peguei minha sapatilha e decidi treinar um pouco essa coisa de voltar no tempo. Será que conseguiria fazer algo impactante?

AMOSTRA - Minha sapatilha mágica.حيث تعيش القصص. اكتشف الآن