Matando saudades

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Todos começaram a arrumar desculpas para sair. Balmac já indo em direção a porta começou a falar.

— Vou caçar o que conseguir essa noite para ser preparado para a partida.

Jiron e Caluto saíram dizendo ir fazer o mesmo e Caluto falou já empoleirada na janela. — Por sorte esse lugar esquisito abriga tanto a vida no céu como na terra.

Jahil saiu dizendo que iria buscar raízes medicinais e Luthiron foi com ele, Ádino foi preparar as coisas e colher as ervas para infusão.

Lúcia sorriu ao ver que não mudaram, saíam sempre que viam a cara de Linade. Não resistiu em espetar os que ainda podiam ouvir. — Vejo vocês amanhã.

Linade levantou o baú. — Vamos experimentar essas roupas Lúcia.

O único quarto da pequena casa era muito simples, completamente desprovido de móveis tinha apenas uma cama feita de madeira rustica e um colchão de palha.

Linade foi direto ao ponto. — Então você acha estranha essas minhas mudanças Lúcia?

— Não comentei por mal, estou preocupada com você, já te vi bem velhinha, depois bem jovem e agora está envelhecendo novamente.

Não entendo o que está havendo e nem queria te perguntar. Achei que comentaria comigo, mas nunca falou do assunto.

— Não precisa se preocupar, logo volto ao normal e aqui também tem a influencia do oráculo por todo lado, mas espero que não pergunte nada sobre isso no santuário.

Lúcia assentiu entendendo que ali não era lugar para falarem disso, então olhou para Linade e deu uma risadinha.

— E esse normal Linade, é velhinha ou jovem? — Levantou uma única sobrancelha na direção dela. — Para mim, tem que ser velhinha, pois estou acostumada com a vó Linade, mas ao mesmo tempo acho que você ficou linda quando rejuvenesceu.

Linade olhou Lúcia com doçura, coisa que não fazia desde a época em que tinham paz na cabana.

— Pode ter mudado fisicamente moça, mas continua sendo a minha pequenina Lúcia.

Linade se aproximou dela e a abraçou forte, depois que tinham saído da cabana, ela nunca mais lhe havia dado um abraço e lhe tratado como sua neta como antes. Sempre distante e fria perdida em seus pensamentos, agora ali tão perto dela, queria que esse momento não acabasse.

Não conseguiu se conter e a apertou mais forte, sentindo o cheiro agradável de lírio. — Você pode ficar tão jovem que eu precise te carregar no colo Linade, ainda vai ser minha avó.

Linade riu. — Não se preocupe, não vou ficar tão jovem assim, volto sempre à idade em que recebi a missão e que foi onde meu povo ficou aprisionado. Não sei a forma que ficaram, mas vou lembrar da aparência sempre.
— Não? Por quê?

— Porque sai antes de meu povo ser escravizado, não fui atingida, pois tinha o oráculo a me proteger, porém não vi o que aconteceu com eles.

Posso estar até a lutar com eles, talvez tenham até virado seguidores do espectro. — Os olhos de Linade de repente mudaram de cor e ela falou de modo estranho. — Mataria um por um se fosse preciso, mesmo que minha raça acabasse, não teria nenhuma piedade, seriam inimigos e tratados como tal.

A frieza de Linade assustou Lúcia — Você fala como se soubesse que teria que fazer isso.

— Fazer o que? Lutar com eles? — Linade a fitou friamente. — Não faria diferença se soubesse ou não, mas te digo uma coisa, não deixaria que nenhuma criatura atrapalhasse nossos planos, mesmo que fossem meu povo. Não perdoaria uma traição dessas. Imaginar que poderiam matar um do nosso grupo só me faz pensar que não deixaria um vivo.

Realmente Linade tinha razão, não seria justo poupar um povo que se bandeasse para o lado do espectro, de certa forma ela estava dizendo que faria o mesmo que Balmac já fazia, proteger os amigos lutando até mesmo contra seu próprio povo.

Linade ainda estranha colocou o baú na cama. — Chega de conversas, vamos experimentar as roupas.

Lúcia tirou do pequeno baú roupas conhecidas, basicamente tudo o que já vestia, só que maiores.

Ficou um pouco apreensiva quando vestiu, estavam muito justas e dizia claramente que ela era uma moça, não poderia esconder as curvas tão acentuadas.

— Tem certeza que vou parecer um menino com essas roupas?
Linade assentiu. — Na verdade essas roupas são necessárias, vai entrar em batalhas e precisará de proteção e roupas adequadas para isso.

E vai usar uma camisa por cima, esse espartilho te protegerá, mas não ficará a mostra por enquanto, ainda terá que parecer um homem.

Lúcia sentiu um estranho alivio, gostou da parte de poder esconder o corpo com a camisa, se sentia estranha ao ver como ele estava justo.

— Mesmo que o espectro ache que foram apenas palavras sem sentido sobre sua vinda. —Continuou Linade. — Não podemos arriscar, até que ao menos tenhamos mais aliados conosco.

— Mas você não usa roupas assim e guerreia muito bem.

— Não usava Lúcia, agora vou usar também, confesso que sentia falta de roupas adequadas, como saímos daquele jeito sai com roupas improvisadas que peguei de Chilsto.

Linade vestiu as roupas que levaria na viagem e Lúcia não deixou de reparar que apesar da aparência abatida de seu rosto, seu corpo era firme e forte, mostrando uma força que seu rosto frágil não demonstrava existir.

Fez uma careta olhando para ela. — Ficou estranha vestida com essas roupas, nem parece minha avó.

As duas riram e Linade rebateu. — Melhor assim, se eles estiverem procurando uma menina fracote e uma velhinha desamparada vão ter uma surpresa.

Continuaram a rir e deitaram ainda em clima alegre lado a lado na cama pequena, isso não incomodou nenhuma das duas, na verdade era agradável essa aproximação, lembrava a Lúcia os velhos tempos em que dormia com ela em sua cama, pois Chilsto nunca dormiu no quarto, apesar de ela crescer escutando Linade falar que o quarto era dos dois.

Lúcia adormeceu rapidamente, ainda sentia o cansaço dos treinos, e estava contente por estar com seus companheiros novamente.


Crônicas Helenísticas- Niedra Livro 1Onde as histórias ganham vida. Descobre agora