Ela chegou sob a tutela de um café da manhã tardio.
Chegou como chuva de verão, passageira, trazendo o seu toque suíço em franca evidência nos vocábulos e nas conjugações verbais de sua fala cavernosa.
Num instante, nossos corpos tramaram sedução.
De um lado, o trópico da fome, da violência desmesurada, da vida que crê sempre no vir a ser, dos orixás em contas intocáveis.
Do outro, Zurique, o país da não-nunca-miséria, da não-nunca-violência, da quietude desesperante da existência, dos beijos mal-instruídos.
Agora, estávamos ali: unidos pelo prazer, pela saudade, pela carência de um afago, pela falta de beijos picantes – abstinência mútua de línguas e mãos que a tudo querem lamber, tocar.
Naquela noite, nós nos beijamos num sofá vadio ao som do refrão da canção de Moby, no sexto andar daquele hostel.
In my dreams...
Nadine, Nadine.
I'm dying all the time...
Teu beijo salvou um náufrago.
As I wake its kaleidoscopic mind...
Nadine, Nadine.
So this is goodbye...
Tua boca afastou a sombra.
This is...
Rasgou as vestes de fantasmas trajadas em mim pelos deuses invernais da Noruega.
Goodbye...
E mostrou que nada nessa viagem fora em vão.
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Carne de Trópico
Non-FictionNão, não escrevo isso para vocês. Faço isso em uma exclusiva e patética homenagem aos inúmeros diálogos que tive comigo mesmo no silêncio dos quartos de hostéis emporcalhados, nos vôos turbulentos de um hemisfério ao outro, nas praias escondidas, na...