Vergonha em dobro

5.8K 751 319
                                    

— Lia! Lia, a gente tá te procurando há um tempão, por que não me esperou no banheiro? – Rebeca pergunta.

— Becuxa! Eu tava aqui falando com o seu irmão! – Falo e me jogo nos braços da menina a minha frente.

— Você tava O QUÊ? Ai, meu deus! Me deixa ver isso aqui. – Ela diz e pega meu celular, não entendo pra que tanto desespero...

— Meu deus, Lia, meu deus! Você disse que ainda gosta dele! Não era assim que você devia falar! – Ela fala quase gritando e de repente eu me sinto triste, triste porque Pietro tem uma namorada, triste porque Beca tá brava comigo, triste... E então começo a chorar.

— Rebeca! Não se fala com uma bêbada assim! – Analu diz.

— Lia! – Uma voz grita. Será Pietro? Ele chegou pra me buscar? Ele também gosta de mim! —Lia! Não acredito que te encontrei aqui, podemos conversar?

— Gustavo? Nãooooo! Eu quero o Pietro!

— Lia, olha... Pode me dar licença por favor? – Ele pergunta para Analu, que assente. — Lia, eu sinto muito por ter agido como um babaca, fica comigo de novo, por favor!

— Ela não vai ficar com você.

— Pietro...? – Eu sorrio ao ver o garoto parar ao meu lado.

— Quem você acha que é pra decidir o que ela faz ou não, cara? – Gustavo pergunta, peitando Pietro.

— Eu não tô decidindo nada, só tô dizendo que ela tá bêbada demais pra tomar qualquer decisão. Amanhã vocês conversam. – Ele diz e me puxa pela mão.

— Ei, ei, ei! Peraí! Você não vai sair arrastando minha garota por aí! – Gustavo grita.

— Que eu saiba, ela não é sua garota. – Pietro responde e eu acho que ele está um pouco irritado.

— Nem sua, babaca! – O outro diz e empurra Pietro, que solta minha mão e retribui, empurrando de volta.

— Cara, amanhã vocês conversam!

E é então que Gustavo voa em Pietro, derrubando-o no chão, eu tento fazer ele parar, mas o garoto me empurra e eu caio.

— Ai, meu deus, Lia! Você tá bem? – Analu me ajuda a levantar.

— O Gustavo luta boxe, isso vai dar merda! – Grito.

E então começam os socos, Pietro está por baixo, apenas apanhando e eu começo a chorar com a cena, mas de alguma forma ele consegue ficar por cima e também soca Gustavo, os dois começam a rolar pelo chão, mais rápido do que meu raciocínio lento de bebida me permite entender, tudo que eu sei é que eles estão se atracando e ninguém aparece pra ajudar, em vez disso, as pessoas se amontam ao nosso redor e começam a gritar "briga", como se ainda tivesse no fundamental. Aí eu sinto uma coisa queimar meu estômago e quando me dou conta, estou vomitando no chão do lugar e um bando de expressões de nojo soam, os dois garotos olham pra mim e Pietro diz:

— Cara, me deixa levar ela pra casa.

— Sabia que você era um perdedor. – Nesse momento Beca cutuca Gustavo e quando ele a encara, Analu dá um chute em suas partes, o que me provoca uma crise de riso. Pietro termina de se levantar, me arrasta com ele para fora e as meninas vêm junto, o vômito me fez recuperar parte da consciência sobre meus atos e eu já não estou mais rindo.

— Lia, você tá bem? – Pietro me pergunta quando nós já estamos todos dentro do carro, eu apenas assinto.

— Acho melhor ela dormir lá em casa hoje. – Rebeca diz e Pietro a encara com uma expressão que eu não consigo ler — Lia, me empresta seu celular, vou mandar mensagem pra sua mãe.

***

— Aqui, uma roupa confortável pra você colocar depois do banho. – A irmã de Pietro me entrega uma espécie de pijama.

— Precisa de ajuda? – O garoto me pergunta.

— Você quer me ajudar a tomar banho? – Falo brincando, mas ele faz de novo aquela expressão indecifrável e o clima fica estranho, então eu só entro no banheiro e fecho a porta.

O banho me faz sentir consideravelmente melhor, o que me deixa desesperada ao lembrar do áudio que mandei para Pietro. Meu deus. Eu nunca mais vou beber, nunca mais. Como é que eu vou sair daqui agora e encarar o garoto? Meu deus. Acho que eu vou dormir por aqui mesmo, é, acho que vou fazer isso. Merda, alguém tá batendo na porta.

— Lia, a Analu vai dormir no meu quarto e você no do Pietro, ok? – Beca fala com uma expressão natural no rosto.

— O quê? Não! Beca, você tem ideia do que eu fiz?

— Tenho, eu surtei com você quando ouvi aquele áudio, mas, por outro lado, talvez tenha sido bom...

— Bom? Como dizer que ainda gosto dele pode ser bom?

— Porque, Lia, talvez fosse não tivesse coragem de falar com ele, a sua "eu bêbada" te fez um favor.

— E por que você acha que agora eu vou ter coragem de falar com ele? Eu tô com o dobro de vergonha!

— Bem... Agora você meio que não vai ter escolha. – Ela diz e eu fico petrificada, encarando-a. — Boa noite, Lia. E boa sorte.

Eu fico mais alguns minutos no banheiro, mergulhada em profundo desespero, até que Pietro bate na porta, dizendo:

— Ei, tá tudo bem?

— Tá sim. – Digo ao abrir a porta e dar um sorriso fraco.

Ele anda até seu quarto e eu apenas o sigo, estralando todos os ossos possíveis do meu corpo em nervosismo. Ele abre a porta e eu analiso todos os pequenos detalhes do quarto, que continua basicamente o mesmo, os pôsteres do Pink Floyd e do Coldplay espalhados pelas paredes, uma foto dele com o avô em cima da cômoda e o violão em cima de um puff. A única diferença que eu consigo notar é a bandeira azul marinho da Nova Zelândia no teto, nela estão diversos nomes assinados.

— São os nomes de todas as pessoas que eu conheci lá. – Ele me diz.

— Ah.

— Lia...

— Eu sei, a gente precisa conversar.

— Acho que podemos deixar isso pra amanhã, agora você precisa descansar. – Ele fala e eu assinto, olhando pra sua cama de casal. — Eu vou dormir no sofá.

— O quê? Pra quê?

— Uai, Lia...

— Pietro, nós já dividimos uma cama antes, não tem nada demais. – Digo e ele me encara por um tempo, até suspirar e dar de ombros, deitando na cama, onde eu me deito também.

— Boa noite, Lia. – É a última coisa que eu ouço antes de apagar completamente.

As Duas VersõesOnde as histórias ganham vida. Descobre agora