8. Magiocatex: tempos de incertezas

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Magiocatex atravessou o maior cômodo da casa lentamente, atento aos diferentes sons, vindos de fora e que lhe chegavam aos ouvidos. Distinguiu dentre outros, flautas, tambores, chocalhos e o barulho ritmado de pés em uma dança no pátio maior da aldeia. Uma música era cantada, puxada por um líder e acompanhada pelos outros jovens.

Pios estridentes, parecidos com vozes humanas agudas, lhe tiraram de seus pensamentos. Os pássaros da família, no canto da sala, chamavam por ele, exigindo sua atenção. O rapaz aproximou-se do casal de araras vermelhas e acariciou suas penas. As aves abaixaram as cabeças e arrepiaram a penugem junto ao pescoço, dengosas, demonstrando satisfação para com o carinho recebido. Ele passou a mãos por todo o dorso das araras e depois saiu pela porta principal. As aves seguiram-no e voaram pousando em uma árvore próxima.

O rapaz parou por instantes para observar o intenso movimento no pátio à frente. Os últimos raios do sol sumiam no horizonte, formando um caleidoscópio de sombras e luzes que se revezavam, mostrando ou ocultando rostos e corpos, bem como a poeira levantada pelos pés. O ritmo da música, a intensidade das rodas de danças e o burburinho de conversas, lhe prendeu a atenção. Fogueiras com distâncias definidas estavam preparadas por todo o espaço.

A praça central, agora repleta de pessoas que dançavam e cantavam, era circundada pelas características placas de pedras entalhadas com imagens que incluíam plantas, animais e criaturas mitológicas. Grande parte da multidão de pessoas provindas de todos os cacicados de Quisqueya, encontrava-se ali em uma grande roda de dança, principalmente os jovens, mas também muitos casais adultos. Um outro círculo era formado de crianças, que em uma reunião à parte, tentavam imitar os movimentos dos integrantes da grande roda. Havia ainda um outro grupo de pessoas que, sentadas, cuidavam em tocar os tambores e troncos, que davam ritmo e sonoridade à uniforme movimentação. A agitação e alegria era regada a muita comida, com carne de caça e pesca preparados com antecedência, além de bebida.

Uma fumaça densa subia dos fundos da casa do cacique e o cheiro de carne assada impregnava o ar, chegando-lhe às narinas em um forte convite para que se dirigisse ao local onde se encontrava seu pai, tios e primos, cuidando da caça previamente preparada com excelentes temperos.

Seguiu entre o amontoado de pessoas direto ao local onde grandes vasilhas de cerâmica transbordavam de bebida fermentada, feita a partir de caldo de mandioca brava. Pegou um copo e se serviu. Geralmente não bebia muito esse tipo de bebida fermentada, mas aquele era um dia especial para todos e, de mais a mais, havia passado há muito pelo processo de iniciação e já era deste então um adulto para a etnia, estando liberadas todos alucinógenos e bebidas usados em ocasiões especiais, principalmente nas cerimônias religiosas.

Magiocatex levou o copo à boca e sentiu o cheiro forte da bebida. Tomou um grande gole e a sentiu-a descer queimando-o por dentro e, no entanto, não houve nenhuma mudança em seu rosto que demonstrasse isso. Passou a mão livre pela cicatriz da arara no rosto que indicava sua etnia e cacicado ao qual pertencia e que lhe parecia um peso que ele sempre teria que carregar. Acariciou-a levemente, seguindo o traço de seu contorno. Sempre que tocava a cicatriz, lembrava que era um nitaíno e futuro cacique, e isso lhe trazia um aperto no coração com a imagem de Manaya que se formava na sua mente.

Levou o copo à boca novamente e tomou o resto de uma vez, enchendo de novo o recipiente. Muitos homens e rapazes também se serviam ali. Alguns, já se percebia, começavam a ficar bêbados. Um forte cheiro emanava das vasilhas e corpos suados dos que aproveitavam festas como aquela, para beberem até se prostrarem.

Correu a visão ao redor. A noite se instaurava. Algumas estrelas não demorariam a surgir. Do recanto onde se encontrava, observava vários servos nabória acendendo as fogueiras em diversos lugares do grande e agitado pátio, onde o emaranhado de pessoas que se fazia presente se tornava cada vez mais confuso. Também acendiam tochas que colocavam em hastes previamente erguidas circundando todo o espaço da festa.

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⏰ Última atualização: Mar 22 ⏰

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