O Tempo Nos Muda

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Ester narrando

Cartas e mais cartas se empilhavam em minha escrivaninha. Minha caixa de e-mails cheia.

Eu não queria mais nada dele. Não queria cartas, declarações e estava cansada de desculpas.

Será que pedir para dar certo uma única vez seria pedir demais?

Ele sabia que eu era insegura quanto a tudo isso. Ele sabia que eu me importava em fazer tudo dar certo. Ele sabia que eu nunca iria deixar de amá-lo.

Mas tudo acabou. Acabou como quando as ondas chegam até a areia, o sol toca o horizonte, um copo de vidro toca o chão. Acabou, e num passe de mágica, era como se um "nós" nunca tivesse existido.

Eu deveria saber que nada durava para sempre, mas o meu amor por ele me fez enxergar além do que eu achava que deveria ser.

É clichê tudo isso, eu sei. Batendo na mesma tecla mil vezes. Parece que nada nunca muda para mim e que minha vida segue um padrão de fazer com que tudo que me faz feliz acabe.

Dias sombrios se seguem, nessa solidão de final de semana. Trancada no quarto de uma escola interna, a única coisa com que eu realmente me importo é em tentar não molhar o travesseiro toda noite em que penso no que ele fez.

Sabe, eu tive uma chance de beijar outra pessoa, que eu gosto muito. Mas eu me lembrei dele no momento que iria fazer isso. Será que para ele naquele momento eu era um "nada"?

Será que ele não pensou em nós dois? No quanto isso iria prejudicar nossa confiança? No quanto isso me magoaria?

Não queria ter mais que olhar para ele. Pela primeira vez, estava tão feliz que estivéssemos separados. Não preciso aguentar a dor de perto, mas ela está aqui. É como se não estivesse, mas está.

De repente a porta do quarto se abre. Me levanto da cama correndo e limpo minhas lágrimas.

_Eu vim ver como você está. -o Bruno fica de frente para mim e me encara preocupado.

_Eu estou bem. -digo suspirando. -Não deveria estar na sua casa?

_Deveria, mas fiz um pequeno sacrifício e deixei meu compromisso com a família de lado um pouco para ver como você está. -ele disse sorrindo e eu sorri de volta.

_Obrigada. -eu disse e ele me abraçou.

_Vou estar aqui, sempre que você precisar. -eu sorri e me soltei dos braços dele. -Vamos dar uma volta?

_Onde? -perguntei entusiasmada.

_Ah, por aí.

_Não posso sair da escola, esqueceu? -eu disse e ele riu.

_Tranquilo. Eu tenho meus contatos. -ele piscou para mim e eu ri.

_Então vamos. -eu caminhei até o seu lado e ele pegou na minha mão. Se eu e o Lucas estivéssemos bem, teria soltado, mas se ele era livre para fazer o que quisesse, por que eu não poderia ser?

Saímos do quarto e andamos até a portaria do colégio.

_Vou sair aqui Bernardo. -ele disse ao porteiro, que só assentiu e abriu o portão.

Nós saímos e eu encarei o Bruno surpresa.

_Como você fez isso? -eu pergunto e ele ri.

_Fins de semana os alunos que ficam no colégio podem sair, mas tem que estar de volta até as 21:00. Ou então a polícia é acionada e ligam para os pais.

_Mas ele nem anotou meu nome, nem nada. -eu disse e ele me encarou.

_O sistema de segurança da escola é meio diferente. Reconhecimento facial. Tem uma câmera na saída. Mas o reconhecimento só é feito quando as gravações são reproduzidas a noite. Então os que não foram vistos voltando...

_Isso deve facilitar o trabalho do porteiro. -eu digo e ele assente.

_Quando a Helena me contou o que tinha acontecido vim para cá o mais rápido que consegui. Fiquei tão preocupado. -ele me encarou.

Estávamos andando sem rumo, somente conversando. Não tinha ideia do que eu deveria falar para ele. Desde que ele tentou me beijar não nos falamos direito, e agora parecia tudo tão simples.

_Se esse idiota aparecesse na minha frente eu juro que eu o matava e... -ele ia dizendo tudo aquilo e eu ia rindo, até que eu o interrompi.

_Por qual motivo você mataria ele?

_Ora... -ele parecia estar escolhendo as palavras certas para dizer. -Nunca se fica com a donzela sem lutar, concorda?

Eu sorrio sem graça e nós ficamos de frente um para o outro. Eu aproximei meu rosto do dele em um quase beijo.

_Você não precisará lutar, se conseguir conquistá-la. -eu sussurro e ele sorri.

_Isso deu certo para algum de nós?

_Provavelmente. -digo e ele ri.

Nossos olhares se cruzam e posso ver ele encarar minha boca. Ficamos algum tempo nos olhando, até que ele foi aproximando seu rosto ainda mais do meu.

_Não quero fazer isso se você não quiser. -ele diz e eu mordo o lábio inferior.

Eu estava louca para que ele me beijasse. Não estava mais aguentando olhar para ele e ter esse desejo. No começo achei errado, mas agora... Parece tão certo.

Eu não tinha mais nada com o Lucas, então qual era o problema? Por que ainda achava isso errado?

Percebi que ele ainda esperava uma resposta. Encarei o chão e suspirei. Olhei novamente para seus olhos e sorri.

_Você não tem ideia... Do quanto eu quero. -eu digo e a última coisa que vejo antes de fechar meus olhos é seu sorriso.

Doce, profundo, suave, relaxante... Tudo o que eu precisava naquele momento.

Aquele vazio inexplicável dentro de mim ainda não havia se preenchido. Não sei se vai se preencher algum dia... Mas um dia espero nem notar que ele está ali e me acostumar com a ideia de que eu devo reconstruir a minha vida.

As pessoas vem e se vão todos os dias. Nunca temos tempo para nada, e quando elas se vão, nunca ficamos sabendo antes.

O tempo voa e nós temos que voar com ele. Mas algumas pessoas precisam ficar para trás, no passado.

Pode parecer difícil esquecer alguém, e realmente é. Mas um dia, vemos que nem o próprio pedaço do nosso coração que foi arrancado por alguém, consegue se encaixar novamente.

O tempo nos muda, e uma hora ou outra temos que deixar o preto e branco para trás e nos jogarmos novamente nas cores.

O Amor AconteceWhere stories live. Discover now