Jaqueline 3 -Víctor

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Vozes... vozes sussurrando ao longe. Em meu sono negro e tranquilo eu as ouvia muito vagamente, como se estivessem em outra frequência. Aos poucos o sono foi sumindo, e com ele as lembranças retornaram num ímpeto. Abri os olhos assustada com o que acontecera e me encontrei em um quarto branco com janelas e venezianas; o cheiro de soro e limpeza ao meu redor.

Com um gemido percebi que estava em um hospital. Assim que resmunguei, dois rostos ansiosos apareceram diante de mim, que permanecia deitada.

-Filha? -meu pai perguntou. Seu rosto era preocupado. -Como está se sentindo?

Respirei fundo, procurando a resposta certa, e nesse movimento senti uma dor nas costelas e uma ardência na cabeça. Com uma careta respondi:

-Mais ou menos bem... -esfreguei devagar aonde estava dolorido.

Minha mãe suspirou aliviada e acariciou com cuidado meus cabelos.

-Você deu um susto e tanto na gente. -Elizabeth murmurou suavemente, mas em seus olhos havia aquela fúria escondida, que eu sabia que iria sair depois que estivéssemos em casa.

-O que aconteceu? Há quanto tempo estou aqui? -murmurei tentando me lembrar de qualquer coisa depois de eu ter caído no buraco.

- Ficamos desesperados... chegamos em casa e você não estava lá. Fomos te encontrar só na manhã seguinte, quando a acharam desmaiada e sangrando. Trouxemos você para cá, então faz mais ou menos umas...sete horas que está assim. -meu pai explicou enquanto eu tentava me sentar. -Por sorte são só alguns hematomas e cortes que não lhe prejudicaram em nada.

Acenei com a cabeça escutando, e me dando conta de que não foram eles que me acharam.

-Você disse que me acharam..., mas que não foram vocês... -cocei a cabeça fazendo uma careta com a dor. -Então quem foi?

-Foi o Víctor quem te achou. -minha mãe respondeu, o rosto me observando com cautela.

-Víctor? Que Víctor? -não havia ninguém com esse nome na fazenda.

-Esqueci de lhe avisar. -John respondeu. -Eu contratei dois funcionários para me ajudar. Pai e filho. Eles se mudaram ontem mesmo para a casa perto da entrada da fazenda, a que estava sem moradores. -ele me recordou e acenei compreendendo. -O filho, que é o Víctor, te achou depois de ir à floresta.

Fiquei em silêncio alguns segundos, fitando o vazio e reunindo todas as informações, para então fazer a seguinte pergunta:

-Se eles se mudaram há menos de um dia, como esse... Víctor, me achou naquela floresta?

-Bom, ele... quer dizer, foi por acaso. -meu pai sorriu. -Estava indo buscar lenha para a caldeira da ordenha e te achou.

-Hum... -minha cabeça martelava de dor e deixei o assunto de lado, cansada e ansiosa para ir para casa. -Quanto tempo mais vou ter que ficar aqui? -dei uma olhada na bolsa de soro ao meu lado.

O gotejar do líquido era irritante e faltava meio litro para a bolsa se esvaziar. Meu pai acompanhou meu olhar e então respondeu com uma careta de pena:

-Bem, poderá ir embora assim que terminar todo esse soro, e o médico fazer a avaliação final do seu raio-X por causa do ferimento em sua cabeça.

Resmunguei voltando para os travesseiros e cruzando os braços em teimosia. Meus pais soltaram uma risadinha e se sentaram no sofá de couro também branco. Fitando o teto nervosa, fiquei pensando no que havia acontecido. A pergunta que não queria se calar na minha cabeça, me fez perguntar sem rodeios:

-O que vocês estavam fazendo na floresta? -Forcei a me concentrar em seus olhos, lutando com o impulso de fechar meus olhos dormentes.

A boca de Elizabeth se franziu e seu rosto ficou bravo.

Guerreiros de Argon -Floresta dos AnjosOnde as histórias ganham vida. Descobre agora