we need to talk about lucy

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A família de Luke nunca o entendeu.

"Ela é lésbica" dizia o irmão.

"É uma fase" falava a mãe.

"Você não é minha filha" gritava o pai.

Ele não ligava. Estava só esperando a maior idade para sair de casa. Não aguentava mais ser chamado de ela, ou Lucy.

Ele não era Lucy.

Ela morreu quando Luke cortou seus cabelos longos naquela noite fria.

Ela morreu quando ele tivera oito anos.

Luke colocou seu top preto, extremamente apertado e espremeu os seios com as mãos. Doía. Ele procurou a faixa que usava e a achou debaixo da cama. Escondida. Correu de volta para frente do espelho e deu cinco voltas nos seios, agora completamente batido.

Negou-se olhar para seu próprio rosto, que ainda tivera feições femininas e catou o moletom cinza que estava sobre a cama.

Luke bagunçou o cabelo curto, jogando o capuz no moletom sobre os fios e colocou a mochila nas costas. Aquela maldita mochila.

Logo no começo do ano letivo, seu pai lhe comprara aquela mochila. Ele odiava o filho, ou como ele costumava dizer, a filha. Andrew comprou a mochila mais bonita da loja.

A mochila rosa.

Luke chorou, gritou, esperneou dentro daquele banheiro minúscula. Até negou não usar a mochila, mas seus livros eram muito pesados.

O rapaz não conseguia entender como alguém não conseguia entendê-lo. Era só ter comprado a porra de uma mochila azul. Qual a merda do problema?

Luke, que tinha quatorze anos naquela época, desceu as escadas correndo. Sua mochila rosa brilhava e o skate sujo debaixo do braço fez seu pai contorcer o nariz.

Ele saia sem falar com ninguém. Na verdade, ele se recusava a falar com alguém daquela casa.

Estúpidos.

"Viu? Isso é culpa sua. Deveria ter abordado" falava Andrew depois que Luke batera a porta.

"Você é um babaca" dizia Liz levando os pratos sujos até a pia. Seus olhos marejados a fazia se sentir fraca.

Liz tentava apoiar o filho, mas sempre ficava ao lado do marido por medo.

Ela sempre tivera medo da dor.

"Ela vai ter que tirar essas roupas de lésbica e vestir um vestido" falou Andrew voltando a atenção para o jornal. "Meu chefe não pode vê-la assim. O que vai pensar de mim? Que eu crio uma aberração dentro de casa"

O colégio era a melhor parte do dia do garoto. Ninguém o julgava, ou tentava entendê-lo. Apenas o ignoravam ou o tratavam com respeito.

Lucy era Luke, um garoto homossexual no corpo de uma garota.

Luke tinha traços femininos e uma voz calma, mas sua aparência era masculina. Pelo menos seu jeito de se vestir e andar. Sempre com o skate e roupas surradas, ele não dispensava seu moletom e calça jeans. Luke tivera os olhos mais bonitos, mas só iria descobrir quando conhecesse Michael. Porém, isso é para outro capítulo.

Vamos continuar.

Quando chegou em casa, depois de um longo dia no colégio e viu a casa estupidamente arrumada e Liz no melhor vestido que tivera.

Luke correu para o quarto e bateu a porta, como sempre fazia.

"Parece um bicho do mato" murmurava Jack, rindo.

A mulher entrou sorrateiramente no quarto do garoto e o viu sentado na janela, abraçado aos joelhos. Ela ignorou o quarto bagunçado.

"Lu?" Falou hesitante.

Luke virou a cabeça e franziu o cenho, observando o vestido rosa nas mãos da mãe.

"Não" disse o rapaz levantando. Aquilo era um absurdo, não iria vestir vestido nenhum para agradar ninguém.

"Lucy, seu pai vai ficar extremamente bravo se você descer assim" disse a mulher ignorando os gritos do filho.

"Não, não, não e não" gritava ele por cima da fala de sua mãe, enxugando as estúpidas lágrimas que escorriam.

Luke estava enjoada e sentia fortes dores na barriga. Liz estava fazendo isso com ele, o deixando doente. A mulher olhou para baixo e arregalou os olhos, tampando a boca.

Luke olhou para baixo, vendo sua calça ficar vermelha bem na sua parte genital. Na parte que ele mais odiava naquele corpo. Ele passou pela mãe correndo e trancou-se no banheiro.

Lucy menstruou pela primeira vez e Luke chorou como se não houvesse amanhã. Ela era ele. Aquilo não estava certo. Meninos não menstruam. Porra. Aquele estúpido corpo. Estúpido seios. Estúpidos pais. Estúpida vida.

Foi no dia do jantar especial do seu pai que Luke tentou cometer suicídio pela primeira vez.

n/a: oi


luke ♢ muke [c]Where stories live. Discover now