Cap 2

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Clarisse

Tudo que posso sentir é o silêncio sufocando a minha alma. Olho ao redor e vejo um enorme vazio em todos os cômodos da mansão dos meus pais. Os nossos sorrisos ecoam em meus ouvidos como lembrança do que foi e não vai voltar. Seco as lágrimas que escorrem no meu rosto, nem sei mais como elas existem ainda. Pensei que já estivessem se esgotado.

As últimas palavras que troquei com a minha mãe por telefone estão vivas ainda mesmo depois de dois meses...." Estamos indo te buscar boneca, seu pai está cansado, teve um dia exaustivo, mais confessou que não pode ir dormir sem te abraçar filha". Fiquei esperando no aeroporto por horas, eles não chegavam nunca. Era para eu ter viajado no outro dia, mas como sempre,minha impulsividade e minha ansiedade falaram mais alto e adiantei o voo.

Cheguei de madrugada. Como eles não apareciam e o celular só dava caixa postal, fiquei irritada. Sempre odiei esperar. Depois do ódio veio a preocupação e quando por fim vi a Julie se aproximando com lágrimas nos olhos, descobri que algo estava errado.

"- sinto muito, mais eles se acidentaram. Seu pai dormiu e bateu atrás de um caminhão, eles...." Ela não precisou terminar a frase. Meu mundo ruiu, desabou e terminou ali. Estava sozinha no mundo, e como uma criança de cinco anos chorei abraçada as minhas próprias pernas no chão do aeroporto.

Os primeiros dias foram cruéis. A culpa me consumindo a todo instante. Se eu não tivesse sido a estupida mimada de sempre, teria esperando meu voo, chegado pela manhã e eles ainda estariam aqui.

Me fechei em um mundo de tristezas. Mal comia, me entupi de calmantes e todas as tentativas da minha melhor amiga Julie para me resgatar desse inferno foram em vão.

Não tem nada que subsistitue um pai e uma mãe. Nada preenche esse vazio e quando você quer consolo e vai atrás deles, estão mortos e você está sozinha. Nem todo o dinheiro do mundo preenche isso, nem um milhão de bolsas trazem um sorriso de volta aos meus lábios e talvez tardiamente eu tenha descobrindo o que realmente têm valor.

Além da perda o mundo desaba nas minhas costas. Sinto todo o peso sobre mim. Não tem mais ninguém para cuidar dos bens e da empresa de exportação da família. Quase cem por cento das ações estavam nas mãos deles e agora estão nas minhas. Não sei por onde começar, não sei a quem recorrer. Só sei que algo precisa ser feito, já que meu tio Greg apareceu aqui ontem com um papel, pedindo que lhe passasse todo o controle dos bens e da empresa.

Ele só se esqueceu de um detalhe. Meu pai o tolerava porque era da família e tinha algumas ações em mãos, mas sempre soube das suas falcatruas, dos desvios de dinheiro, suas artimanhas sujas para passar meu pai para trás. Talvez ele não saiba, mas meu pai sempre me alertou " cuidado boneca, seu tio sabe ser astuto quando quer e só tem uma prioridade na vida: dinheiro".

Então hoje resolvi sair desse estado vegetativo e lutar pelo que é meu. Lutar pelo que meus pais construíram e para isso preciso ir até a empresa e assumir o controle de tudo. O único problema é que não entendo nada de negócios. Meus conhecimentos de resumem à moda e bolsas. Tenho a intuição de que não vai ser suficiente.

Tomo um longo banho. Visto um vestido tomara que caia um pouco curto na cor dourada, coloco minhas joias, meu salto trinta e me olho no espelho. Parece que exagerei um pouquinho para o ambiente, mas preciso causar impacto. Também não dá para trocar. Estou atrasada. Madruguei hoje. Acordei às nove e já são dez horas. Não posso demorar!

Quando chego no oponente prédio da matriz da Romero imports, sinto um calafrio percorrer a espinha. Como vou comandar tudo isso? É o que vou descobrir.

Na recepção já sou reconhecida, claro. A secretaria me conduz até uma sala enorme que era dos meus pais. Quando ela se retira respiro fundo e vejo que tudo ainda está mantido e uma foto de nós três se sobressai sobre a mesa. As lágrimas vem, mas empurro tudo de volta para dentro. Hoje preciso ser forte, agora preciso ser uma Romero de verdade.

O doce sabor da justiça (degustação)Where stories live. Discover now