PAIXÃO

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Sexta-feira, dia 6 de Novembro, 16:11, meu quarto.

Marjorie:

Era difícil acreditar no que havia acontecido. Quero dizer, eu imaginava que Thomas jogaria uma lata de Coca-Cola na minha cabeça e diria que eu era uma aberração da natureza. Mas nunca, nunquinha mesmo, eu pensei que ele fosse capaz de fazer o que fez.

Bom, as aparências enganavam, não é mesmo?

Assim que eu ouvi Thomas gritar o meu sobrenome, virei-me na cadeira com um solavanco. Então eu o avistei parado a alguns metros de mim, olhando-me com ódio nos profundos olhos castanhos. Eu levantei uma das sobrancelhas em desprezo e voltei-me para as minhas amigas, encarando a minha Coca-Cola. As meninas se cutucaram por debaixo da mesa, apontando com o queixo para onde Thomas estava parado. E então Laís sussurrou.

- Ele está vindo para cá, Mar!

- Deixa ele vir, o que eu posso fazer, prendê-lo no chão? - eu perguntei, dando de ombros.

- A cara dele não é das melhores, Mar, acho que ele vai te matar com a faquinha sem serra do pão! - Rafa sussurrou, arregalando os olhos.

- Se ele me matar ele vai ser preso - eu respondi, rindo do desespero delas, mas, por dentro, borboletas carnívoras atacavam o meu estômago.

Esperei durante uns bons cinco segundos, apertando o copo contra a palma da minha mão. Quando enfim ouvi a sua respiração ofegante nas minhas costas, virei-me lentamente, com medo de ser abordada por uma espingarda na cara.

Thomas estava parado, com as mãos nos bolsos e cara de mau.

- O quê? - eu disparei.

- Eu preciso falar com você - ele respondeu em um tom contido de voz.

- Pode falar.

- Sozinho - Thomas frisou a palavra com os lábios.

Eu olhei para as minhas amigas, que, discretamente, fizeram um sinal de "sim" com a cabeça.

- Bom, eu já volto - anunciei em voz alta, levantando-me. Coloquei a mochila nas costas e peguei o meu fichário na mesa.

Thomas foi na frente, andando a passos largos, e eu fui atrás, rezando dez pais-nossos e cinco ave-marias, pedindo para que ele não fosse um psicopata que me mataria com nada mais do que uma colher de sopa.

Ele caminhou determinado até a entrada do shopping, depois de descer os dois lances de escada rolante, e virou à direita, contornando a construção. Quanto mais ele se afastava, mas eu me arrependia de ter aceitado ajudá-lo desde o princípio. Se eu não tivesse cedido aos meus hormônios no começo de tudo, não teria metade dos problemas que estava tendo, como os estagiários da minha madrasta me ligando e perguntando coisas as quais eu não tinha a menor ideia como responder, os meus professores falando que eu estava distante, as minhas amigas me enchendo o saco pela minha aparente "paixonite" por ele, o meu pai brigado comigo e me colocando de castigo e, agora, a minha morte previsível atrás do shopping municipal.

Quando finalmente chegamos no estacionamento, Thomas parou de andar.

Adeus pai, adeus amigas, adeus vida!

- Pode falar - eu insisti, tentando parecer durona, mas a única coisa que eu queria era sair correndo dali.

- Eu queria... Bem... - ele tossiu, visivelmente constrangido. - Queria te pedir desculpas.

Pera aí... Ele... O quê?

- Desculpas? - eu perguntei, certificando-me que não estava ouvindo coisas.

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