Alianças De Sangue (Degustação)

Capítulo 7 - Nossas histórias

Capítulo 7

A pouca claridade dominava o ambiente, e com dificuldade para enxergar ela logo acendeu a luz,
Wanda lembrava de tudo que havia vivido ali. Seus olhos caçavam cada detalhe que tinha deixado para trás, trancados durante todos esses anos.

O quarto lhe trazia à tona um rio de histórias antigas. Entre a paz e o sossêgo de uma noite tranquila quando sua mãe a visitava sempre antes de dormir, e contava uma velha história de ninar, ou então, entre noites de solidão e desespero de quem nunca mais veria seus pais outra vez.

Tudo ainda permanecia ali.

— Lembra de como éramos próximos?

— O que aconteceu com a gente? — Ele perguntou com sua voz num tom emocionado.

— Todas as noites depois da morte deles, você me colocava para dormir.

— Você tinha medo que o escuro da noite nunca mais fosse embora. — Secou as lágrimas que escorriam teimosamente em seu rosto.

— E quando ficamos acordados aquela noite inteira... Lembra?

No silêncio que dominava tudo, os olhos deles se encheram de lágrimas ao se recordarem juntos.
Haviam ficado a se lembrar de seus pais. Um completava as memórias do outro, até que juntos, as lembranças se formassem sólidas em um álbum de tudo o que tinham vivido.

— Eu não acredito que você guardou isso.

Seus olhos tinha fisgado algo que outrora lhe foi importante.

Seu ursinho.

Empoeirado e jogado num canto do quarto, próximo ao guarda roupa, lá estava ele, ainda com seus olhos tão doces, como se tivesse guardado por todos esses anos os segredos e medos de uma criança.

— Essa casa, esse quarto. Tudo aqui é tão difícil ainda.

— Você era somente uma criança, mas vivemos tanta coisa aqui, não podemos deixar tudo isso no passado. Faz parte de quem somos.

Ela nem tentou ser forte, apenas deixou as lágrimas caírem. Um desabafo da sua alma, um grito silencioso que lhe afogou por dentro por tanto tempo, e agora, ali, estava pondo para fora.

Sentados na beira da cama, ela deitou sua cabeça no ombro que sempre esteve ali, nos melhores ou piores momentos​, e que por descuido de ambos, se afastaram por tanto tempo.

Um erro.

Deixar que a dor de uma perda seja tão grande que acabe afastando quem mais se importa com você e ainda está aqui, vivo.

— Vai me contar o que está acontecendo?

Como sempre fez, foi direto ao ponto, sem rodeios. Levantou a cabeça do ombro dele, olhando o mesmo fixamente, logo após secar as lágrimas, passando os dedos em seus olhos, borrando um pouco sua maquiagem.

— É complicado.

— Você tem ideia na onde se meteu? É Anne Pasquin, Adryan. Anne Pasq..

— Eu só tentei ajudar, não sabia quem era ela!

Levantou e deu meia volta no quarto, passando a mão na cabeça, fechando seus olhos brevemente, cerrando os lábios. Sabia que era complicado explicar tudo aquilo.

— Ajudar? Como assim?

— Eu a encontrei jogada num beco. Toda machucada. O que eu deveria ter feito? Deixado ela a própria sorte?

— Nada disso faz sentido, Adryan. Porque ela sendo quem é, estaria nessa situação? É loucura.

— Acredite. Ainda nem chegamos na parte que realmente você diz essa frase. Talvez você devesse sentar outra vez na cama.

Sabia que era um risco que estava correndo, mas ele tinha que falar tudo para ela, talvez assim Wanda entendesse do porque uma das mulheres mais ricas do mundo ainda estava alojada naquela casa, se refugiando com seu irmão.

Após voltarem a se sentar na beira da cama, Adryan enfim começou a contar aquela louca e surreal história.

— Tudo começou a algumas noites atrás...

•••

— Um chip que é capaz de mudar suas memórias? Você não deve está falando sério comigo.

— Você não acredita, não é mesmo?

A descrença nos olhos dela era nítida. Também pudera. Era algo insano, isso para dizer o mínimo.

— E você viu alguma prova disso?

— Ela me disse que existem provas.

— Quanto tempo faz que ela lhe disse isso? E cadê?

— Ela vai provar tudo isso. Tenho certeza.

Tentou se manter firme em suas convicções, sabia que era difícil acreditar, mas por algum motivo, ele parecia precisar crer nela. Talvez fosse seu interesse que estivesse lhe fazendo ficar cego e não ver que tudo não passava de alguma loucura da cabeça da própria Anne, mas, no fundo, ele sabia que existia verdades em tudo que ouviu a ruiva lhe contar.

— Presta atenção! — Disse. — Essa mulher só está te usando, pra ela, é como se você fosse apenas um brinquedo. Essas pessoas ricas quando não sabem mais o que fazer com tanto dinheiro inventam coisas. Isso é só um joguinho para ela, não consegue ver?

— Não, isso é real! Algo dentro de mim me diz. Eu sei que é real, Wanda.

— Está apaixonado por ela, não é?

Balançou negativamente com a cabeça, não crendo no que via.
Um irmão cego de desejos por alguém que ele sequer conhecia.

— Eu, eu... Eu sinto apenas uma atração, é isso.

Ela então não quis ouvir nem por mais um segundo o que Adryan tinha a dizer e assim saiu daquele quarto.

— Onde você vai? — Perguntou enquanto seguia seus passos apressados.

— Eu vou para longe de tudo isso, já vi que não vai adiantar tentar abrir seus olhos. Vocês homens são todos iguais mesmo. É só ver uma mulher bonita em perigo, que acham que tem a missão da vida de salva-la, e depois de se apaixonarem loucamente.

A dona dos olhos vítreos apenas observava todo aquele alvoroço que se formou, sabia que era o motivo de tal discussão, e então decidiu falar, logo após ambos chegarem na sala, onde ela se encontrava.

— Eu vou embora, não posso ser o motivo da briga entre vocês dois. Já causei problemas demais.

— Isso não será necessário. Minha irmã já está de saída. Talvez não seja você o problema.

— Se algum dia você descobrir que ela estava apenas te usando, por favor, não me procure.

Wanda chegou perto dele e sussurrou em seu ouvido aquelas palavras. Estava enfurecida por seu próprio irmão dar mais razão a uma desconhecida do que a ela própria, porém somente o advertiu pra situações futuras.

Com um sorriso irônico no rosto, ela então saiu.

Pela segunda vez em sua vida, abandonava seu lar, e dessa vez por escolha de alguém que ela amava.

Apesar de lutar contra seus pensamentos, sabia que sua irmã havia posto uma rusga de dúvidas em suas convicções, e mesmo sentindo dentro de si algo que nunca experimentou, sabia que Wanda poderia estar certa.

Fechou a porta e deixou ela ir embora, seus olhos não mais a acompanhavam, e agora dentro daquela casa era somente a misteriosa mulher, e ele, um desconhecido Adryan.