Capítulo 2

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No dia seguinte Alice saiu sem dirigir uma palavra à mim. Eu havia acordado mais cedo para preparar o café da manhã dela, mas ela não comeu e me evitou como podia. Recebi uma ligação do meu pai, disse que Jack estava ansioso para me conhecer e pediu para que eu fosse até a sua casa no horário das 15h. Me arrumei, vesti uma camisa branca, calça cinza e sapato social, entrei no carro e dirigi em direção à sua casa.

A propriedade era afastada da cidade, demorei um pouco para chegar lá. Apesar de já ter visitado algumas vezes quando era mais jovem e ter ouvido meu pai falar muitas vezes de como era a moradia de seu chefe, não me contive e fiquei deslumbrado logo na entrada. Tive que mostrar meus documentos, escanear meu rosto, minha digital, responder formulários e outras burocracias antes de adentrar os portões. O local era realmente muito bem protegido, não entendia ao certo a necessidade de ter um segurança particular dentro dessa fortaleza. Segui com cautela as instruções do caminho até seu escritório para ter certeza de que não me perderia. Avistei um bosque, fontes, intermináveis jardins, uma estufa, piscinas, quadras, academia e até um enorme lago. Estacionei na frente da entrada da casa principal e fui encaminhado para dentro pelos funcionários até o cômodo combinado.

— Felipe, que prazer em vê-lo, lembro-me de quando ainda era um garoto. — Jack me cumprimentou com um aperto de mãos. Ele era um homem muito elegante, deveria ter um pouco mais de 60 anos, era alto e tinha músculos definidos, barba, cabelo grisalho e olhos escuros.

— O prazer é todo meu senhor. — retribuí o sorriso.

— Sente-se, por favor. Vamos tratar de negócios.

Me sentei e ele começou a falar sobre meu pai:

— Seu pai é uma das pessoas mais admiráveis que já conheci. Já tive centenas de pessoas trabalhando para mim, mas nunca uma tão leal quanto ele. Confio mais nele do que na minha própria família, por isso quando ele me falou que você estava disposto a ocupar o seu lugar fiquei muito interessado. Espero que essa lealdade esteja no sangue.

— Pode ter certeza que desconfiança não será um problema senhor, sou um homem honrado. — disse prontamente.

— Seu pai me garantiu que sim e isso é algo fundamental para mim, na verdade, a única coisa que importa, o restante pode ser trabalhado e desenvolvido. Afinal, estaria confiando minha mulher, meu bem mais precioso, a você.

— Estou ciente disso e darei o meu melhor para mantê-los em segurança.

— Posso ver que tem um bom físico, sabe manejar uma arma? — ele disse, analisando-me com os olhos atentos.

— Sim, senhor. Meu pai me ensinou desde jovem a julgar ser uma habilidade necessária para nossa própria proteção e também servi no exército por algum tempo.

— Muito bom. Ele tem toda a razão. — abre um sorriso enquanto abre a gaveta, pega um revólver e entrega para mim. Me espanto quando me deparo com a arma, eu já utilizei uma dessas muitas vezes e conhecia bem minhas habilidades, mas não esperava que fosse preciso demonstrá-las agora.

— Me mostre, atire naquele vaso. - ele me pede apontando para um vaso verde.

— Tem certeza? — olhei para ele completamente confuso, ele queria que eu atirasse em uma estante dentro de seu escritório?

— Sempre tenho certeza do que digo e não peço uma ordem duas vezes. — afirma em um tom assertivo, com um ar de seriedade.

Me levantei, segurando o revólver em minha mão que estava um pouco suada, já que não havia como não ficar nervoso, mas esperava que Jack não reparasse. Mirei em direção ao vaso e apertei o gatilho, acertei-o em cheio com um grande estouro o vaso se espatifou em muitos pedaços, ouvi alguém exclamar de susto do lado de fora. Meu coração batia acelerado, estava surpreso com seu pedido de imediato e toda aquela situação, mas fui me acalmando quando vi que ele estava com um semblante de satisfação.

— Bravo. — dizia entre palmas lentas — Pelo visto, não terei muito trabalho em te instruir daqui para a frente.

Três batidas na porta e uma voz doce diz do lado de fora em um tom preocupado:

— Jack, está tudo bem? — provavelmente foi a mesma pessoa que se assustou com o barulho que sem dúvidas ressoou em boa parte da casa.

— Ah, querida entre. Eu já ia te chamar.

A porta se abre e de repente meus olhos se deparam com uma das mulheres mais lindas que eu já vi, certamente não estava esperando por isso. Ela entra no cômodo de maneira graciosa e pela sua feição estava um pouco envergonhada. Ao perceber que eu estava a observando, olhou para baixo e colocou uma mecha de cabelo atrás da orelha com a mão. Levei alguns segundos para conseguir parar de encará-la. Seus traços eram finos, seu rosto angelical e seus longos cabelos brilhavam com os raios solares que ultrapassavam a janela. Até que a voz de Jack me desperta:

— Este barulho não foi nada, Felipe só estava demonstrando seu talento com armas. Ele é filho do Roberto, meu antigo braço direito. Deve-se lembrar dele.

Ah — um sorriso surge em seu rosto ao ouvir o nome de meu pai — Sim claro, eu me lembro. — ela profere com sua voz meiga.

— Ele será seu novo segurança. Irá garantir que você esteja sempre a salvo e longe de perigos. — ele desvia seu olhar dela para mim e espera que eu diga alguma coisa. Estava um pouco atordoado e contente por ele ter expressado que me contrataria e levei um tempo para conseguir formular a frase seguinte:

— É uma honra continuar o legado do meu pai e servir a uma família tão generosa quanto a sua. — Mesmo que eu tivesse muitas outras opções de trabalho em mente, isso não deixava de ser, em partes, verdade.

— É um prazer senhor Felipe, meu nome é Liza. — ela diz com uma voz baixa, ainda um pouco constrangida, mas dessa vez olhando nos meus olhos.

Eu sou do tipo que evita reparar excessivamente em outras mulheres, até porque sou casado e respeito minha esposa, mas não podia mentir, havia algo nela que me deixou sem fôlego. Estendi a mão para ela, completando:

— O prazer é todo meu.

Ela segura minha mão. Seu toque era macio e gesticulava de maneira delicada. Em seguida, olha para o que restou do vaso no chão no canto do escritório.

— Eu posso recolher. — diz para seu marido indo em direção aos cacos.

Quando ia me aproximar para ajudá-la, Jack diz:

— Deixe aí querida, eu vou chamar alguém para limpar.

— Não precisa se incomodar, eu posso limpar, não é nada. — ela segue caminhando

— Eu falei para deixar aí. — ele diz de maneira ríspida, apesar de manter o tom de voz calmo, depois disfarça com um sorriso.

Ela para imediatamente se vira para trás o encarando arrependida:

— Tudo bem, me desculpe.

Já estava claro qual dos dois era a autoridade dentro daquela relação, e não era de se espantar que fosse ele, mas à primeira vista, ela não era a garota que você imagina quando pensa em alguém que se casou por dinheiro. Ela era muito mais jovem que ele, acredito que fosse até mais nova do que eu e emanava um ar indefeso e inocente.

— Mostre a casa para ele. — ele retorna a falar — Podemos discutir horários e valores mais tarde, pois agora tenho uma reunião. — diz olhando para o relógio.

— Perfeito. — exclamo aliviado por ter um emprego.

— E o que acontecerá com Carter? — ela pergunta parecendo preocupada, presumo que seja seu atual segurança.

— Ele será despedido, isso não será um problema.

Ela assente com a cabeça e solta um suspiro discreto. Talvez eu esteja equivocado, mas antes dela se virar em direção a porta notei que seus olhos pareciam marejados, penso que deveria gostar dele. Espero que não me culpe por ter tomado seu lugar, não gostaria que houvesse ressentimentos entre nós, já que passaríamos tanto tempo juntos.

— Pode me acompanhar, por favor — ela tenta disfarçar o que estava sentindo, que eu não sei ao certo o que era, e abre um sorriso para mim.

Entre o Perigo e a PaixãoWhere stories live. Discover now