Emily não respondeu, apenas se manteve calada enquanto via o pai se afastar e ir para a cozinha preparar o café da manhã, resmungando algo sobre levá-la ao psicólogo um dia desses.

Chateada e magoada, a garota voltou para o seu quarto e tratou de se arrumar, fazendo isso da forma mais lenta e malfeita que já fizera. Não se dando ao trabalho de pentear o cabelo e apenas o manteve em um coque desajeitado enquanto vestia uma calça jeans e um moletom simples. Pensou melancolicamente no que diria se visse Victor na escola e sentiu um calafrio descer por sua espinha. Ele iria acabar com ela, não na escola onde todos podiam ver, mas quando ela estivesse sozinha e não pudesse se defender. Quando menos esperasse ele se vingaria.

Escutou o pai gritar que o café da manhã estava pronto, mas não fez menção de sair do quarto. Se encarou no espelho e franziu o cenho com o que viu, havia sombras escuras debaixo de seus olhos e estava pálida, mais do que o normal, o que a deixava com uma aparência adoentada. Sentiu uma dor no pescoço onde ele a beijara na noite da festa e notou com horror uma mancha escura no local. Não parecia uma mancha roxa, na verdade era preta e parecia um símbolo estranho, como uma tatuagem. Aquela parte do seu pescoço parecia morta, estava gelada e não conseguia sentir nada no local ao tocá-lo. Com medo do que aquilo significaria e pensando no que Victor fizera com ela, decidiu desfazer o coque e ir com os cabelos despenteados soltos mesmo.

_Quer que te deixe na escola, amor? _perguntou seu pai da porta do quarto um tempo mais tarde, a vendo sentada em sua cama de cabeça baixa enquanto encarava uma flor amarela estranha, que parecia estranhamente brilhar. _De onde veio essa flor?

_E essa flor eu achei no caminho da escola, achei ela diferente e a trouxe comigo. _mentiu ela baixinho._Se importa se eu for sozinha? Eu não quero chegar muito cedo. _quis saber ela sem encará-lo.

_Tem certeza de que não quer que a leve? _insistiu ele cruzando os braços na frente do peito de forma séria. _Eu não acho bom você ficar andando sozinha por aí.

_Eu vou ficar bem. _respondeu Emily se levantando e indo se sentar em uma cadeira na frente do seu computador antigo que ganhara quando tinha doze anos. _Eu ainda tenho que pesquisar algo para a escola, algo que eu tinha esquecido, você pode ir.

_Tudo bem. _disse ele suspirando pesadamente e se aproximando dela, deixando um beijo em sua testa e se afastando, a deixando sozinha com seus pensamentos conflitantes.

A verdade é que não havia trabalho nenhum, simplesmente não queria que ele a levasse a escola porque não pretendia ir. Tinha pesquisado a pouco sobre uma biblioteca que ficava a alguns quilômetros de Greendale que tinha um acervo de livros de uma escritora local que falava sobre lendas sobre os sombrios, seres sobre os quais Arthur lhe falará.

Pretendia adquirir algum dos livros ou até mesmo falar com a escritora se tivesse a chance, e para isso iria pegar o primeiro ônibus até Catarine Hill e lá descobrir de uma vez por todas o que Victor Hale era. Nem que para isso tivesse que gastar suas últimas economias e se arriscar em uma cidadezinha desconhecida e distante. Nada seria pior do que enfrentar Victor depois que ele descobrisse que ela não iria embora da cidade como ele havia ordenado.

Arrumou a mochila com comida e o dinheiro que precisaria para comprar sua passagem para a cidade vizinha e os livros, pegando mais cem dólares da gaveta do quarto do seu pai prometendo para si mesma pagar cada centavo depois, antes que ele percebesse sua falta. Conferiu se não esquecia nada e partiu rumo a rodoviária, rumo a verdade sobre Victor e sua família.

***

Apesar de Catarine Hill ser á cidade mais próxima de Greendale, ficava a mais de 80 Km/h de distância, e com a chuva forte que caia lá fora o ônibus demorou mais de duas horas de viagem, o que fez Emily ter bastante tempo para pensar sobre tudo. Principalmente em como sua vida havia mudado completamente desde a separação dos pais, tudo o que era perfeito agora já não era. Por isso haviam se mudado para tão longe, para que sua mãe não os encontrasse, mas apesar de tudo ainda sentia saudades dela. Seus pais eram casados há muito tempo, e é claro que na época sabia que a relação deles não era perfeita, já os havia visto discutir diversas vezes, mas nunca achará que a crise no relacionamento dos dois estava tão grave ao ponto de separarem. Mas seu aniversário de 17 anos chegou e tudo desmoronou de vez quando eles tiveram a discussão final. Na frente de toda família foram gritados todos os tipos de xingamentos já existentes e sua mãe pedirá o divórcio, assim Emily nunca mais a viu o ouvirá falar dela. Não soubera muito além do que sua vó paterna lhe contará, mas sabia que sua mãe tinha outra pessoa e a escolherá ao invés dela e Erik. Depois disso sem sequer uma despedida da família seu pai a apanhara no seu antigo colégio um dia e numa espécie de fuga haviam se mudado as pressas pra Greendale. O mais longe possível do resto da família, e apesar de no início sentir raiva do pai por aquilo, agora o entendia. Ficar longe de todos para esquecer e levá-la junto porque ela era tudo o que lhe restara.
Porém apesar de fingir ser forte e cuidar dela como ninguém mais faria, sabia que seu pai ainda sofria com a traição, e podia ouvir seus choros durante algumas noites quando ele achava que ela já estava dormindo. Aquilo doía em seu coração e a fazia ter certeza de que ele ainda não a havia superado. Na verdade, nem ela esquecerá a mãe, ela nunca fora muito presente e as vezes parecia não gostar muito da filha, mas a amava e sentia muita raiva pelo que ela fizera com seu pai. Não importava as milhares de ligações que ela lhe fazia por dia ou das mensagens de perdão e arrependimento que mandava, enquanto seu pai a amasse a odiaria, e enquanto ela o fizesse sofrer a esqueceria.

Mistério Dos Sombrios Vol 1Where stories live. Discover now