Capítulo 3

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  Talvez eu não goste tanto assim dessa calmaria.

  Foi difícil dormir ontem, sem o barulho dos carros, das festas do bar de frente para casa, dos latidos dos cachorros da rua, parece que eu estava tão acostumada a tudo aquilo que não percebi até me mudar.

  Quando acordei já estava claro, resolvi tomar um banho para acordar por completo. Desci as escadas, estava tudo quieto e calmo, olhei no relógio e ainda eram sete da manhã, minha avó ainda ia demorar uma hora para levantar, então decidi fazer um café. Foi difícil achar as coisas porque não sabia onde ficava nada, mas deu tudo certo e consegui fazer um ótimo café.
Fui me sentar na varanda vendo o sol clarear, parece que teria que acordar mais cedo se quisesse o ver nascendo.

– Bom dia?! – Uma menina que aparenta ter minha idade diz com um semblante e tom de voz confuso.

– Bom dia. – Digo esperando que ela continue, afinal ela que está na minha casa. Casa temporária. O que seja.

– Vim falar com a dona Aurora.

– Ela está dormindo ainda. – Digo com certeza pois ainda faltam dez minutos para as oito.

– Tem certeza? Sempre venho nesse horário e ela está acordada.

– Ela me disse que só acorda depois das oito e ainda faltam dez minutos, então acho que vai ter que esperar.

– E quem é você? – Ela pergunta não em um tom arrogante, mas tentando entender a situação.

– Sou Yasmin, a neta da Aurora, me mudei recentemente.

– Ah, verdade. Ela disse que você vinha. Sou Sofia, a propósito, moro aqui perto.

– Quer sentar? – Apontei para a outra cadeira, perto da minha e ela se sentou.

Ficamos em um silêncio desconfortável enquanto eu a observo. Ela tem a pele clara, o cabelo castanho na altura dos ombros, os olhos castanho claro e usava uma camisa branca com uma jardineira por cima.

– Está gostando daqui? – Ela pergunta tentando quebrar o gelo.

– Cheguei ontem, então ainda não fiz muita coisa, mas aqui parece tranquilo.

– É... pra quem veio da capital é mesmo, mas com o tempo você se acostuma, se quiser posso te mostrar alguns lugares legais daqui.

– Eu adoraria. – Nessa hora escutamos um barulho vindo de dentro da casa. – Acho que ela acordou, vou ir lá ver. – Levanto e vou até a cozinha, encontro minha avó de roupão colocando algumas coisas na mesa.

– Bom dia, dormiu bem?

– Dormi. Tem uma tal de Sofia aqui na porta dizendo ser sua vizinha e querendo falar com você. – Digo rápido para não entrarmos em assuntos paralelos.

– E você a deixou lá fora? – Ela diz inconformada e vai andando até a entrada.

– Eu não a conhecia, vai que ela era uma estranha mentirosa.

– Essas coisas não acontecem aqui, não precisa se preocupar. –Ela abre a porta da frente e a menina continua no mesmo lugar.

– Sofia querida, me desculpe. Me esqueci de avisar a Yasmin que você vinha, vamos entrar.

– Não tem problema, não fiquei ali por muito tempo.

– Vou fazer café, venha.

– Obrigada, mas eu já tomei café Aurora, só vim ver se precisava de alguma coisa mesmo, mas vejo que agora está bem acompanhada.

– Estou mesmo, Yasmin é uma ótima companhia, você podia levar ela para fazer alguma coisa com os outros. Prometo que ela é divertida, afinal, tem meu sangue, não tinha como ser chata. – Diz e sorri para mim. Me sinto grata e nervosa ao mesmo tempo, sei que ela está tentando me enturmar mas isso sempre me causa uma ansiedade, por mais que eu seja boa em conversar com pessoas.

– Disso eu não tenho dúvidas, já tinha chamado ela mesmo para conhecer a cidade, posso ver quando vamos nos reunir e se você quiser pode ir. – Ela diz e me olha.

– Claro, o que vocês fazem por aqui? – Pergunto por que com certeza os roles daqui são diferentes dos da capital.

– Ah, a gente se reúne na casa uns dos outros, ou na praça em festivais que a Ana organiza.

– Festivais? Que tipos de festivais? Shows ou coisas do tipo? –Pergunto, me interessando porque na minha antiga escola eu adorava fazer parte das produções dos eventos.

– Tipo isso, show de famosos, festas, ano passado o halloween foi incrível, no natal também teve um evento grande. Quando vocês se conhecerem pode perguntar para ela, ela adora falar sobre isso.

– Não vejo a hora então, adoro organização de eventos.

– Então vocês vão se dar bem, quem sabe ela não precisa de ajuda para o próximo. – Ela diz e parece ser sincera e legal, acho que poderíamos ser amigas.

– Que bom que já achou alguém que te interesse. – Minha avó diz e dá um sorriso para nós duas, o que me deixa nervosa pelo sentido que ela diz aquilo. Ela certamente sabe a respeito da menina que eu namorei por um tempo, espero que ela não pense que eu não posso ver uma menina e já me apaixono.

– Então, eu já vou indo. Tchau, Aurora. Tchau, Yasmin. – Ela diz com um sorriso e segue pela porta.

– Fica amiga dela, ela é uma ótima garota e conhece todo mundo, só toma cuidado com a ex namorada dela, essa aí não é flor que se cheire. – Certo, calma ex namorada??

– Ex namorada? – Pergunto e ela me encara.

– Acha que por aqui não tem essas coisas? É o que mais tem, esses jovens experimentam de tudo, não que isso seja um problema, obviamente, não é um problema para você, penso eu.

– Claro que não, só fiquei meio surpresa com sua naturalidade. – Digo a verdade, afinal se até meus pais demoraram um pouco para aceitar quem dirá ela.

– Acha que eu ligo para quem vocês namoram? Como se na minha época os jovens não fizessem isso. – Ela diz tediosa.

– Então quer dizer que você já beijou meninas? – Digo em um tom brincalhão.

– Isso é jeito de falar com a sua avó menina? – Ela finge estar brava, o que me faz rir. – Talvez um dia eu te conte sobre minha juventude, que por sinal foi bem vivida, se isso responde sua pergunta. – Então isso é genético. – O que você precisa é tomar cuidado com quem beija.

– Certo, vó, mas não precisa se preocupar, não estou pensando em me relacionar com ninguém por agora.

– A gente nunca quer se relacionar com ninguém, só acontece. Por isso tome cuidado. – O que isso deveria significar?

Longe da cidadeWhere stories live. Discover now