Prólogo

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Estou aqui. Estou mesmo aqui.

As pétalas desabrochadas das cerejeiras emolduravam o que parecia ser um formigueiro.

Eles saíam de todos os lugares. Riam e acenavam uns com os outros, gargalhavam de felicidade, reencontravam amigos, verificavam suas salas no quadro de chão perto da porta e depois refugiavam-se dentro do prédio institucional.

Roí a unha do polegar, o estômago gelado, observando o fluxo de alunos.

Chegar não foi difícil. Me despedi de Gio, minha madrasta-quase-perfeita, peguei o metrô na estação, lidei com uma preconceituosa e subi duas quadras até a Academia Chiyoko. Fácil como pegar doce de criança. O pior vinha agora.

Soltei o coque para não verem minha tatuagem de tartaruga na nuca. Meu cabelo rosa caiu com elegância ao redor dos meus ombros. Fiz leves cachos com os dedos e chequei o uniforme branco com listras marrons nas extremidades. O blazer estava devidamente passado e o nó da gravata não estava torto. Espanei uma poeira imaginária pela oitava vez e bati a ponta dos sapatos no concreto da calçada.

Ergui a cabeça, engolindo em seco.

Eu consigo.

Encarei o formigueiro.

Alunos. Muitos alunos. Dezenas deles. Centenas...

Meu estômago afundou, sugando com ele metade dos meus órgãos.

Dei meia volta, quase sem ar.

Eu não consigo não.

Expirei.

Eu posso vir amanhã. Quer dizer não faz mal faltar só no primeiro dia de aula, né?

Encarado o esmalte descascado das unhas, o coração a mil, esbarrei em alguém.

— É cego por acaso? — Emudeci, mas não a tempo de ver quem era.

— Acho que é meio óbvio, não?! — Ele rosnou, agitando a bengala de aço.

— Nero? — Perguntei, a ansiedade misturada com surpresa.

— Espera... Eu conheço essa voz... — Suas sobrancelhas franzem acima dos óculos escuros. — Batista?

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