Capítulo 20

1K 47 4
                                    

Estou começando a me preocupar. Ele não tira os olhos de mim e a moça com quem esbarrei está com os olhos avermelhados, como se estivesse segurando o choro. Seguro meu colar involuntariamente. Renan senta perto de Rafael e tenta entender o que está acontecendo.

— Desculpe a pergunta, mas qual é o interesse que vocês têm nesse colar? Lembro que o senhor teve a mesma reação quando fez o discurso na formatura.

— Sei que parece estranho, mas se importa de tirá-lo? — O senhor Rafael fala, olhando entre Renan e eu. Estreito os olhos desconfiada, mas concordo.

— Se prometer me devolver! Não sei por quê, mas acredito que esse colar é a única coisa que tenho da minha mãe.

— Você não conhece sua mãe?

Tiro o colar e o entrego, fico em silêncio sem responder sua pergunta, pois acho estranho falar coisas tão pessoais para alguém que estou conhecendo só agora. Ele olha atrás do pingente, apertando-o em suas mãos e o leva para o peito. Lágrimas escorrem dos seus olhos sem parar. Me abaixo, tocando em sua mão preocupada.

— O senhor está bem?

— Acho que sim. Quem são seus pais? — Novamente ele faz mais perguntas pessoais, mas dessa vez decido responder.

— Meu pai se chama Julio Thompson...– Ele passa as mãos na cabeça, colocando os dedos no meio do cabelo. Parece que ele ficou muito mais nervoso.

— Pai, se acalma, por favor... nós a encontramos, pai, suas buscas acabaram. — Enrugo minha testa sem entender do que ela está falando.

— Quem é sua mãe... filha, me diz, por favor. — Há um certo desespero em sua voz. Eu não entendo essa preocupação que tenho com ele. Meu coração está batendo em descompasso, minha respiração está um pouco falha. Algo dentro de mim, grita, me sento ao lado daquele homem, ele passa a mão gelada e trêmula no meu rosto.

Renan fica em silêncio, observando o que está acontecendo. Ele apenas apoia suas mãos no meu ombro, como se estivesse dando um sinal para que eu saiba que ele está ali e que posso contar com ele.

— Bem, meu pai me disse que minha mãe me abandonou. Desde que eu era pequena, fui criada pela minha madrasta.

— Quem é ela? Eu preciso saber... quem é ela?

Me levanto nervosa, não sei o que está acontecendo comigo, mas não estou bem.

— Desculpe, senhor, não sei qual é o seu interesse em mim, mas não te conheço. Peço desculpas, moça, por ter esbarrado em você. — Viro para o Renan com os olhos suplicantes. — Amor, por favor, me leva para casa.

— Sim, amor.

Viro as costas e dou alguns passos para sair, ignorando os chamados dos dois, até que lembro que não peguei o meu colar.

— O colar... — Volto em passos largos para pegá-lo, mal conseguindo me manter em pé. Minhas pernas ainda estão tremendo. — Se o senhor não se importar... eu preciso do meu colar de volta. — Falo com um pouco de receio.

— Por favor, fique, vamos conversar. Temos tanto para conversar. — Ele fala se pondo de pé, parando na minha frente.

— Senhor, não me leve a mal, mas eu não te conheço. No dia da formatura foi a primeira vez que te vi. Acho que não faz sentido ficar falando da minha vida para um desconhecido. — Ele me entrega o colar e abaixa a cabeça como se estivesse derrotado. Um aperto no peito me consome, mas ignoro. — Obrigada.

Meus olhos se encontram com os dele pela última vez. Respiro fundo e me viro para ir ao encontro do Renan, que está alguns passos à frente.

— Pai! Fala para ela... — Paro ouvindo a Evelyn falando, sua voz está um pouco falha. — Não vá, por favor. — Dou mais uns passos, mas paro no mesmo instante com ela falando. — Você pode ser minha irmã. — Ao ouvir isso, fico imóvel, como se estivesse petrificada no local.

— Como assim, irmã? — Renan pergunta.

— Minha filha foi sequestrada na maternidade que se localiza em Veneza, Itália. Seu nome era para ser Gabriele, mas pode estar usando outro nome. — Ele leva a mão no peito, como se estivesse com dor. Evelyn ajuda ele a se sentar. Caminho poucos passos perto deles e os encaro.

— Ive? Você está bem, amor?

— Acho que não... — Me sento de frente ao senhor Rafael. — Por que vocês acham isso?

— Quando Gabriele nasceu, Adriana, minha ex-esposa, pediu para que eu colocasse esse colar nela.

— Como sabe que é esse colar? Existem milhões de bijuterias iguais a essa.

— Esse é um colar que está na família há décadas. Era da tataravó da Adriana. Foi passando de geração em geração, até que a avó dela, antes de falecer, deu esse colar para a Adriana. É só olhar atrás do pingente. Tem uma inicial, B, de Bronson.

— Não pode ser, eu... eu encontrei faz uns meses dentro de uma caixinha de madeira, que carrego comigo desde que eu era pequena.

— Gente, desculpa interromper. Vamos conversar em um lugar privado, pode ser no meu apartamento. Sei que há muitas dúvidas. Ive passou por muita coisa na sua vida, e não dê falsas esperanças a ela. Ela não merece passar por isso. — Renan fala e eles concordam em ir para o apartamento. Em seguida, se levantam. Vejo o senhor Rafael ligar para alguém e passar o endereço do Renan. Cada um foi no seu carro na viagem para o apartamento. Encosto a cabeça no vidro do carro e fico tentando entender por que esse colar está comigo. Será que eu sou essa Gabriele? Eu fui sequestrada? São tantas dúvidas.
— Minha princesa? — Olho para ele com os olhos cheios de lágrimas.

— Oi amor?

— Você está bem?

— Estou sim...

— Não minta para mim, Ive. Eu te conheço e sei que tem algo te incomodando.

— Será que tudo que eu vivi foi uma mentira? Todas aquelas humilhações, minha vontade de receber um carinho do meu pai, um beijo de boa noite... Será possível eu estar sendo tão egoísta em querer ser essa bebê sequestrada?

— Não, amor. Você é humana, e sei que para tudo isso tem uma explicação. Só quero que me prometa que, se tiver alguma incerteza sobre tudo isso, você vai me falar. O senhor Kenedy é um homem bom, não acredito que estaria mentindo, mas não quero que sofra caso não seja você essa criança.

— Prometo... Você viu o amor com que ele trata sua filha. Eu... Eu só queria ter sido amada, entende?

Renan para o carro e me puxa para um abraço apertado, sem dizer nada. Era tudo que eu precisava naquele momento: sentir um abraço de quem gosta de mim de verdade.

— Sinto muito por tudo que você teve que passar. Prometo que sempre que puder vou te mimar, te amar o tempo todo, como você realmente merece.

— Eu sei. Obrigada por estar comigo nesse momento. Sozinha, não saberia agir. — Dou um beijo calmo e ele retribui da mesma forma, mas consigo sentir que, por mais simples que seja, ele é cheio de amor.

Desde pequena, tenho essa necessidade de ser amada, de ter carinho, de me humilhar por poucas migalhas. Isso afetou minha adolescência, a minha infância, pois quando recebia atenção e a mínima demonstração amor de alguém, eu não sabia como agir. Eu achava que aquele tratamento que eu tinha dos meus pais era normal, pois nunca tive aquele afeto que um pai e uma mãe têm com o filho.

O resultado de tantos anos de rejeição foi eu ficar mendigando atenção, amor e carinho quando estava com Taylor. Eu não aprendi a me impor, a me fazer de forte. Eu me sentia mal quando não queria fazer alguma coisa que me pediam; eu fazia só para ver aquela pessoa feliz, mesmo que aquilo muitas vezes me ferisse.

Separamos o nosso beijo com alguns selinhos. Renan passa o polegar em meus lábios e me olha com tanto afeto que tenho medo de não saber retribuir para ele como ele merece.

— Eu te amo, Ive. Nunca se esqueça de que você é especial demais na minha vida.

Ainda olhando nos seus olhos, eu digo pela primeira vez o que sinto por ele.

— Também te amo, Renan. Desde o primeiro beijo, já sabia que te amava.

— Repete, só para ter certeza de que não ouvi errado.

— Te amo, senhor Renan Lyons.

INFIEL Where stories live. Discover now