06| Bad Night

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Amy Smith

Brooklyn, Nova York.
Sete e quarenta da noite.

Sábado desanimado igual a minha vida atualmente. Pensei que ao menos com chegada do final de semana as coisas iriam parecer melhores, ou talvez mais aceitáveis de lidar. Mas me enganei. Tudo continua terrível. A sensação que eu tenho é de que estou em um pesadelo que não acaba. Literalmente um poço sem fundo. Uma rua sem saída.

— Papai, papai! Me levanta no ar igual aquele dia 'pra eu fingir que eu sou um super-herói com superpoder de voo! — ouço Peter falar com meu pai, enquanto desço as escadas de casa. Chega ser engraçado o quanto o meu irmão está super feliz em estar morando com o papai, enquanto eu estou repensando se fiz a escolha certa enquanto continuo sem saber o paradeiro de minha própria mãe, que até agora não atende a nenhuma das minhas ligações.

— Opa, meu garoto. Assim? — disse pegando Peter no colo e o levantando no alto, como se de fato Peter pudesse voar de verdade. Meu irmão dava risadas gostosas e divertidas sem preocupações por trás, apenas sendo uma criança normal de sete anos de idade. Sem problemas, sem estresses, sem possíveis traumas... apenas diversão.

A cena vista ao meus olhos era de pai e filho se divertindo e aproveitando do amor um do outro, da união de amor e carinho que obtinham. Era linda a cena deles se divertindo juntos, tenho que admitir. Só é uma pena que isso nunca aconteceu e nem vai acontecer comigo, porque diferente de Peter agora eu sou uma adolescente de 16 anos e também a filha menos preferida do papai. A que nunca teve e nem terá o amor de seu próprio pai.

— Amy! — exclamou Peter de repente me notando ali parada ao lado da escada vendo eles, me tirando do meu pequeno transe depressivo e melodramático. — Quer brincar com a gente também? O papai tá me ajudando a voar igual a um super herói. — sorriu feliz, me arrancando um sorriso singelo para meu irmão mais novo. Ainda que por trás desse sorriso há muito dor.

— Olha, temos um novo super herói agora. — dou uma risada divertida. – A irmã aceita brincar sim. — respondo a sua pergunta vendo meu pai o colocar no chão, e o mesmo comemorar. — O quê acha de ir buscar uns brinquedos 'pra gente brincar juntos? — sugiro vendo o mais novo assentir e correr para as escadas, para ir para seu quarto buscar os brinquedos.

O silêncio se fez presente na sala. Estávamos eu e o meu pai. E pela a primeira vez um olhando nos olhos um do outro. Era esquisito demais.

— Acho bonito a forma como cuida de Peter. — digo de repente, andando para perto do sofá, vendo ele cruzar os braços e manter o olhar em mim. — Só é uma pena eu nunca ter sido cuidada assim pelo o senhor, né papai? — olho para baixo rindo de nervoso, enquanto a minha garganta começava a se fechar. A vontade de chorar está começando a aparecer. E isso não é bom. Não agora. — Eu fiz alguma coisa de errado 'pra você quando criança, papai? Eu fui uma criança travessa ou uma criança insuportável? — pergunto voltando a olhar para ele, que suspirou.

— Não, Amy. Você nunca me fez nada e tão pouco foi uma criança difícil de lidar. — disse olhando para chão.

— Então por que o senhor nunca ligou 'pra mim? Por que sempre preferiu estar longe de mim e perto de Peter? Por que o senhor não consegue me chamar de filha ou me tratar como uma? Por quê? — pergunto já podendo sentir as lágrimas escorrerem pelo o meu rosto. Lentamente. Assim como a dor que está se formando no meu peito, pouco a pouco crescendo.

— Por que... — suspirou pesado e me olhou.

— Por que o que, papai? FALE DE UMA VEZ, DIGA LOGO! — grito já quase que desesperada por uma resposta. Eu preciso que ele diga. Eu tenho que ouvir da boca dele pra aprender a aceitar isso.

— PORQUÊ EU NÃO TE AMO, AMY! — gritou vendo eu olhar para chão chorando tudo o que tinha 'pra chorar. — EU NUNCA TE AMEI. EU NÃO DESEJEI VOCÊ! EU DESEJAVA SER PAI DE UM MENINO, DE UM HOMEM, AMY! UM HOMEM QUE EU PUDESSE ENSINAR TUDO O QUE EU SEI E SER O TIPO DE HOMEM QUE EU SOU. — continuou a explicar com um tom de voz alterado. Ele parecia querer me atingir, me machucar com aquelas palavras. E se for isso ele conseguiu muito bem. — Eu nunca quis você, sua mãe que insistiu em continuar tendo você na nossa vida. Ela sim te ama. Eu não. — disse por fim como se não fosse nada, como se o que disse não fosse nada demais. Ele é cruel comigo, cruel demais.

— Ser um tipo de homem igual a você... — levanto a cabeça ainda chorando, e dou uma risada debochada. — Um homem covarde? — digo com a voz calma. Mas logo aumento o tom de voz. — UM HOMEM QUE TRAIU A PRÓPRIA ESPOSA POR DOIS ANOS? UM HOMEM QUE REJEITOU SUA PRÓPRIA FILHA SÓ POR QUERER SER PAI DE UM GAROTO? UM HOMEM QUE TEVE CORAGEM DE PEDIR A GUARDA DO FILHO NA JUSTIÇA MESMO SENDO UM PÉSSIMO PAI, E AFASTOU OS FILHOS DE SUA PRÓPRIA MÃE? — digo em um tom alto e bem auditivo pra que ele pudesse ouvir bem e com clareza tudo o que eu queria dizer. Eu preciso descarregar essa raiva toda e falar tudo que está entalado aqui dentro, ou então vou explodir. — VOCÊ É UM PÉSSIMO HOMEM! E UM PIOR EXEMPLO DE PAI TAMBÉM! — digo então vendo ele me dar um tapa. Um tapa. Ele me bateu. Ele realmente me bateu. Ele está realmente louco se acha que pode me bater, ele não tem autoridade para fazer isso. Não depois do que me disse a pouco.

— VOCÊ É EXATAMENTE IGUAL A SUA MÃE! É UMA-

— É UMA O QUE, SENHOR ADAM SMITH? — grito com a mão no meu rosto, exatamente onde me desferiu um tapa. — A MINHA MÃE É UMA MULHER INCRÍVEL, UMA GRANDE MULHER! UMA MÃE EXEMPLAR E UMA EX ESPOSA MAIS EXEMPLAR AINDA! ELA AGUENTOU MUITA COISA NESSE CASAMENTO DE MERDA DE VOCÊS, ELA É A PESSOA MAIS MARAVILHOSA QUE EU CONHEÇO! — grito olhando para o mesmo como se eu fosse a mãe da minha mãe que precisava proteger ela, e não ao contrário, como foi durante todos esses anos. — Mas e quanto a você... — dou uma risada debochada. — Sabe o que você é, Adam? — digo em tom mais baixo, me aproximando dele. — Você é um ser humano desprezível! — o olho nos olhos sentindo uma dor física e emocional gigantesca. Mas ele não precisa saber disso, não quero que se sinta vitorioso em me machucar e saber que me feriu. — E escuta bem o que eu vou te falar agora... — chego perto de seu rosto. — Você nunca mais vai encostar um dedo sequer em mim! E quanto ao Peter... eu irei fazer de tudo 'pra mamãe voltar a ter a guarda dele. Antes já era importante 'pra mim fazer a mamãe te derrubar no tribunal, e agora virou questão de honra! — digo caminhando para o lado da porta de casa, onde eu abri a porta e parei por alguns segundos e me virei para trás para vê-lo novamente. — E fique tranquilo, senhor Adam, a partir de hoje você é um só homem desprezível para mim. Vou dar jus a sua decisão e fingir que não sou sua filha. Tenha uma péssima noite, seu babaca! — digo então saindo de casa e pegando a minha bicicleta, onde eu pedalei para o mais longe possível de casa e parei em um beco escuro, onde eu só me sentei no chão e me permiti a chorar. A chorar muito.

Acho que a dor que eu estou sentindo nessa noite, seja a maior dor que eu já senti. Confrontar o meu pai foi a coisa mais inesperada que eu poderia fazer em pleno sábado, ainda mais que está tão recente a minha chegada aqui no Brooklyn. Mas não me arrependo de nada do que disse, foi tudo verdade. E sinceramente, acho que isso vai até me fazer bem daqui em diante. Talvez agora seja hora de começar a pensar em um plano de fuga de volta para a mamãe. Isso se ela resolver me atender.

Meu Primeiro AmorWhere stories live. Discover now