Capítulo 31

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Sem saber direito o que fazer, Malu mal desligou a chamada de Hiram e já se viu discando o número de Kátia.

A animação na voz da amiga do outro lado ao ouvir a história que uma Malu afoita despejava sobre ela, atropelando as palavras, deu a ela a confirmação que precisava ouvir.

A possibilidade de deixar de lado a lanchonete tediosa do Sr. Olavo e aplicar seus conhecimentos sobre marketing no circo, fazia cada célula do seu corpo vibrar.

Parte dela tentava se convencer de que aquilo tinha cunho meramente profissional, que seria uma ótima oportunidade para ela, que além de ser muito mais dinâmico seria totalmente diferente de tudo que qualquer pessoa já fizera e certamente iria impressionar o carrancudo – ou não tão carrancudo assim – Sr. Aguiar.

Parte dela, no entanto, já havia desistido de ser hipócrita e se entregava de corpo e alma à deliciosa certeza de que aquilo lhe garantiria um pouco mais de tempo com Hiram.

Enfiou-se rapidamente num jeans claro e numa camiseta cor de rosa.

Sem ter tempo de passar maquiagem, Malu pegou sua bolsa e saiu correndo, calçando o tênis espalhafatosamente no corredor.

- Mãe, to saindo – anunciou ela, piscando repetidamente ao jogar colírio nos olhos.

O ônibus nunca demorara tanto para passar e depois do que pareceu uma verdadeira eternidade, Malu finalmente se viu diante da tenda colorida.

Não tinha fila na bilheteria e quando ela apresentou o documento dizendo que tinha cortesia para entrar, uma mulher gorda e mal encarada com volumosos cabelos loiros deu um resmungo e entregou com má vontade um ingresso.

O circo estava vazio, não havia fila em nenhuma das barraquinhas de comida e na arquibancada grande parte das cadeiras estavam desocupadas.

Malu não se importou de chegar um pouco atrasada. É bem verdade que o espetáculo inteiro a havia fascinado, mas de repente ela se sentia como se nada mais importasse a não ser o show do Dragão.

Sentada na primeira fileira,ela se distraia com os mínimos detalhes. Era como se em cada vez que assistisse ao show, reparasse em alguma coisa que não tinha visto na vez anterior, o que a encantava ainda mais.

O rufar dos tambores a trouxe de volta à realidade e seu estômago se comprimiu de forma estranha: ela sabia muito bem o que aquilo significava.

Logo, ele apareceu, e com um suspiro, Malu concluiu que nunca se cansaria de ver aquilo.

Era uma verdadeira transformação.

Assim que Hiram pisou no picadeiro, ele a viu.

Ela sabia que ele a tinha visto, embora ele não tivesse acenado, ou dado qualquer tipo de sinal.

Seus olhos negros cintilavam de forma indescritível, muito diferente do brilho jovial que ele apresentava fora do picadeiro.

Havia um terceiro sorriso em seu rosto, que nada tinha em comum com o sorriso aberto e relaxado que ela vira na Casa das Tortas, ou com o meio sorriso de lado que a fazia derreter.

Era um sorriso sedutor, misterioso. Um sorriso que transparecia seu ar selvagem de Dragão. Um sorriso que dizia Eu SEI que eu sou demais,e ADORO isso. Um sorriso de tirar o fôlego.

As chamas das tochas projetavam sombras irregulares em toda a tenda, dando a impressão de terem sido transportados para um mundo mágico, sombrio, iluminado apenas pelo brilho dos olhos negros que faiscavam diante dela.

Seu corpo escultural se movia com precisão, com graça e leveza. Nenhum passo dele parecia em vão. Nenhum movimento com a mão parecia ser espontâneo...tudo parecia ser precisamente calculado e ensaiado. Ele parecia um deus. O sedutor Deus do fogo bailando diante dos olhos incrédulos da platéia.

SpettacoloWhere stories live. Discover now