Spettacolo

Capítulo 11

Malu não sabia exatamente o que esperar daquele domingo preguiçoso e chuvoso que se revelava através da janela embaçada do seu quarto.

Assim que acordou, a dor de cabeça e o peso nos olhos vermelhos e inchados a lembraram da terrível noite anterior.

O turbilhão de sentimentos que a haviam assombrado, assolaram-na de uma vez enquanto espreguiçava-se tristemente.

Ainda sonolenta, Malu assustou-se quando o celular sobre a mesa vibrou insistentemente, anunciando o recebimento de uma mensagem de texto.

Seu coração disparou.

Seria Pedro?

Talvez ele finalmente tivesse percebido o seu erro, talvez ele pudesse voltar a ser o namorado carinhoso e apaixonado por quem Malu havia nutrido um sentimento tão puro.

Todos merecem uma segunda chance, quem seria ela para negá-la a Pedro?

Fechou os olhos por um instante e recostou a cabeça novamente no travesseiro, criando coragem para enfrentar a tela acesa do celular.

Lembrou da textura macia da pele de Pedro, e da maneira morna e densa que ele o olhava antes de beijá-la, lembrou-se do sabor mentolado do seu beijo e na simpatia estampada em seu sorriso.

Imaginou que ambos estavam caminhando em um parque, repleto de ipês coloridos que ladeavam o caminho por onde passavam.

De mãos dadas,Malu e Pedro riam e conversavam animadamente, enquanto um vento suave arrancava algumas flores do topo das árvores, derrubando-as no chão e formando um tapete aveludado para que ela passasse.

Encantada com a visão, Malu virou-se para Pedro.

Queria abraçá-lo, beijá-lo com força, dizer que o perdoava e que tudo iria ficar bem.

Queria que ele a fizesse sentir novamente aquele amor que ela sentira antes, que parecia tão certo e constante.

Porém conforme o rosto de Pedro foi se virando para ela, não havia nada dele lá.

Um rosto selvagem ocupava o corpo do seu namorado.

Os olhos escuros e brilhantes combinavam com o cabelo preto despenteado que dançava ao sabor do vento.

Um sorriso que ela não se lembrava de ter visto abriu-se em seu rosto, exibindo uma fileira de dentes brancos e perfeitos.

Ela não conseguia achar as palavras certas para dizer, parecia tudo tão errado e ao mesmo tempo parecia tão certo beijá-lo.

Sacudiu a cabeça na esperança de que as coisas voltassem ao normal, mas o rapaz desconhecido ao seu lado só riu, como se não estivesse entendendo o comportamento dela.

Uma mão forte e dura pousou em sua cintura, trazendo-a mais para perto.

Ela podia sentir sua respiração, e estava ficando cada vez mais quente...quente demais.

Assustada, Malu não pode reprimir um grito quando notou que a barra de seu vestido estava pegando fogo.

Olhou para trás na esperança de pedir ajuda, mas não havia mais nada lá, nem Pedro, nem parque, nem mesmo o rapaz desconhecido.

Somente o fogo.

Em um sobressalto, Malu descobriu que havia cochilado e correu até a pia do banheiro para lavar o rosto, ainda podia sentir o calor das chamas escalando lentamente seu corpo.

Sem dúvidas, havia sido um pesadelo estranho.

Pegando o celular de cima da mesa, Malu desapontou-se ao ler a mensagem:

“Espero que esteja melhor amiga, fiquei preocupada com você ontem. De toda forma, adorei sair só com você, espero que possamos repetir isso em breve! Com amor, K.”

Envergonhando-se da frustração que apertava seu estômago, Malu respondeu rapidamente que estava bem e que gostaria de sair novamente com a amiga.

Kátia era sempre uma ótima companhia e acima de tudo, era uma ótima amiga.

Conseguia entendê-la e influenciá-la de uma forma que ninguém mais conseguia, nem mesmo sua mãe...muito menos sua mãe.

Normalmente Malu ouvia e seguia todos os seus conselhos, pois tinha certeza que no final das contas eles a guiariam para o melhor caminho.

Por que então parecia tão difícil seguir a intuição da amiga em relação a Pedro?

Cansada de tantas perguntas para as quais ela não tinha resposta, Malu tomou um café  rápido e saiu para uma caminhada, na esperança de que as gotas frias da garoa que caía, lavassem sua alma e trouxessem um pouco de paz.