Capítulo 2 - A Rainha

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— Ainda quero saber o que ela tem com o diminutivo.

Rimos.

Vou até o espelho apenas para confirmar o que eu já sabia: estou lindo.

Novamente, percebo o exato momento em que o olhar de Tamara muda completamente.

— Eric, preciso falar com você...

E minha mãe entra.

E sua entrada, mesmo aqui, num ambiente em que só tem Tamara e eu, é magnífica. Ela está radiante, vestindo uma armadura com partes douradas, para combinar com o dourado que se destaca no meu terno, com uma capa preta. A maior parte de seu cabelo volumoso e castanho como o meu (mas muito mais bonito que o meu) está preso em um coque, mas parte dele cai sobre seus ombros. Ela definitivamente escolheu esse traje muito bem para mostrar que, apesar das aparências, ela e Aurora ainda são tão fortes como, ou mais que, qualquer um dos quatro territórios do reino; tão forte quanto Victor Sierra e suas Terras Altas.

— Senhora... — Tamara diz e percebe que, desconcentrada, errou a saudação à minha mãe — Desculpe-me... — e, como sempre, minha mãe diz que isso não tem importância (pelo menos não aqui, entre quatro paredes sem que ninguém mais veja):

— Não se preocupe, querida — a rainha oferece um sorriso para Tamara que também sorri.

Então minha mãe olha para mim e sorri e, nesse momento, percebo que sou completamente refém desse sorriso maléfico de minha mãe – foi com ele que ela conseguiu me convencer de que o casamento com Enrique fosse uma boa ideia.

Ela beija minha testa e o beijo dela me leva para momentos, nos quais eu poderia, sem dúvida nenhuma, morar para sempre.

Lembro-me de quando eu tinha por volta de seis anos, quando ela chegou, pela primeira vez que me lembro, do Front, lugar ao norte que o reino de Victoria, desde a guerra, ainda tenta "conquistar" e, com a armadura suja, os cabelos bagunçados e o rosto machucado por conta dos ataques, ela se aproximou de mim, apenas um garotinho encolhido e muito assustado rodeado por um palácio gigantesco e absolutamente frio, e me deu um beijo na testa. Sinto ainda a sensação que aquele gesto me fez sentir, uma sensação de alívio, de que ela estava ali e, estando ali, ninguém ousaria chegar perto de mim e me fazer mal; a sensação de que, apesar do meu medo naquele momento, sua presença faria com que todos os problemas e medos acabassem. A sensação de que tudo ia de uma forma ou de outra ficar bem.

Naquele dia, ela brincou comigo durante a noite toda e, hoje, sei que antes disso ela tinha acabado de defender, bravamente, na linha de frente, Aurora das tropas inimigas.

— Você está lindo, Eric.

— Culpa sua por fazer alguém tão perfeito — digo fazendo uma pose estranha que faz a calça preta e bonita apertar minhas coxas.

Minha mãe sorri e vejo que Tamara está se segurando para soltar uma piada que poderia me desmoralizar na frente da rainha.

— Obrigada, Tamara — diz minha mãe casualmente e Tamara entende o recado.

— Preciso me preparar também, nos vemos mais tarde, Eric. — E faz uma breve reverência a mim e à minha mãe.

Quando as portas se fecham atrás de Tamara, minha mãe diz:

— Falta só o toque final — Ela se aproxima de mim e fixa, ao lado das medalhas do meu paletó, o broxe da Casa Lluv. — Victor e Madalena Sierra já devem estar chegando.

Assinto e não dizemos mais nada por um tempo.

— Mãe, estou com medo — Digo, tão baixo e com a voz tão vacilante que acabo achando que minha mãe não deve ter ouvido. Mas seu olhar se encontra com o meu, e sei que ela está pensando no que dizer. Ela demora alguns segundos para falar alguma coisa.

A Canção do Rei [Concluída]Onde as histórias ganham vida. Descobre agora