- O que você tá fazendo?!

- O que você acha que eu estou fazendo?

Ele parece cansado, examinando os seus pés. O jeito que os dedos dele tocam seus tornozelos te arrepiam.

- Não machucou muito - Ele diz. - Ainda bem. Você...

- Vai dizer de novo que eu não devia ter feito aquilo? - Você pergunta, irritada.

- Ia perguntar se você não está com dor.

Você morde a língua.

- Não.

Célia, a dona da pensão, volta com uma bandeja e os curativos. Começa a arrumar tudo na mesa de centro.

- Acho que isso vai ser o suficiente, mas se precisarem de qualquer coisa, é só pedir. O jantar vai sair em dez minutos. Queria poder convidá-los para passar a noite, mas já estamos cheios. Verão, sabe como é que. Mas fiquem a vontade o tempo que for necessário.

Vocês agradecem e ela volta para a cozinha, os deixando sozinhos na sala. Você se mexe de maneira desconfortável, sentindo a mão de Pryce cobrir seu pé. O rapaz se inclina para a mesa e começa a mexer nos curativos: primeiro ele limpa seus pés, depois passa um remédio para não ter infecções e então coloca as pequenas ataduras. Você observa a forma como ele faz isso, com atenção e certo carinho, se lembrando das vezes em que Rob cuidara dos joelhos ralados das irmãs mais novas. A calma que ele sempre teve nesses momentos é o mais surreal.

Fora que você gosta de como os dedos mornos dele deslizam pelos seus pés.

O inglês volta a colocar seus pés no chão com cuidado. Cuidado até demais.

- Eu não sou uma bonequinha de porcelana, Pryce.

- Eu sei.

- Às vezes não parece.

Ele não responde. Está se aproximando de você e segurando seu queixo com delicadeza para colocar seu rosto para o lado e deixar seu pescoço à mostra. Você sente uma leve ardência quando ele passa o remédio no corte superficial em seu pescoço, logo cobrindo com um band-aid. A ponta dos dedos dele descem levemente da sua orelha até sua garganta antes que ele recolha a mão.

- Pronto.

E então Pryce volta a se afastar.

Quando vão jantar, você pensa que não está com fome. Mas é oferecerem um lugar para você na mesa calorosa e você descobre ter mais apetite do que já imaginara um dia. Seu mau humor vai embora, assim como o tremor em suas mãos, enquanto você ouve as conversas altas e tem o prato cheio. As pessoas são todas tão simpáticas e divertidas. Uma moça até te oferece um par extra de sapato que ela trouxe para a viagem mas não gosta muito. Ela não te deixa recusar.

Você come o suficiente para conseguir ficar em pé de novo e bebe vinho um pouco até demais. Está meio zonza e risonha quando se coloca de pé, assim que os hóspedes e moradores também começam a se recolher. Robert está conversando com Célia, ou pelo menos ouvindo o que ela diz, com um sorriso leve no rosto que não esconde a consternação em seus olhos. Ele olha para você e suspira com pesar. Você desvia os olhos.

- Vocês devem estar cansados, não é? - Célia se levanta. Parece pensativa. - Olha, nunca fiz isso, mas se vocês quiserem podem passar a noite no quartinho dos fundos. Vai ser péssimo porque é o lugar que meu filho usa para pintar, então deve estar uma bagunça. Tem uma cama só, bem pequena e dura, mas garanto que não tem um dedo de poeira ou coisa assim. Eu recusaria se fosse vocês, mas não tendo melhor opção...

O rosto de Pryce fica aceso de alívio.

- Nossa, seria ótimo, Célia. Obrigado.

- Podem vir. Vou pegar uma roupa de cama pra vocês - Ela começa a andar na frente, meio cambaleante. - Me sinto mal de deixá-los num lugar neste estado, mas é o melhor que posso fazer por hoje.

✧ e se você voltasse ✧Where stories live. Discover now