cápitulo 15. jardim de lavanda

327 30 8
                                    

11h47 Hora da Costa Leste - 16h47 Hora de Greenwich 

Mesmo que o pai ainda morasse com ela em Connecticut, mesmo que ela ainda se sentasse com ele para tomar café, vestindo pijama, e desse boa-noite no corredor antes de ir dormir, mesmo assim esta cena devia acontecer com a participação da mãe. Sendo pai ausente ou não, consolar a filha que está aos prantos por causa de um garoto é território materno absoluto e irrefutável.

No entanto, está com o pai, a melhor e única opção no momento, contando toda a história como se fosse um segredo antigo. Ele está sentado numa cadeira virada ao contrário, e apoia os braços no encosto. Maya agradece por ele não fazer aquela cara de professor — cabeça para o lado e olhos vazios, com uma expressão que denota um suposto interesse.

Não, a maneira como olha para ela agora é mais profunda; é a maneira como olhou quando era criança e machucou o joelho, quando caiu de bicicleta no asfalto, quando deixou cair um vidro de cerejas no chão da cozinha e cortou o pé. Alguma coisa naquele olhar a faz se sentir melhor.

Abraçada com uma das almofadas decorativas da cama sofisticada, conta tudo sobre o encontro com Thomas no aeroporto e a mudança de assento no avião. Conta que Thomas a ajudou a não se sentir claustrofóbica, distraindo-a com perguntas bobas, salvando-a como o pai já havia feito.

— Lembra como você me disse para pensar no céu? — pergunta ela para o pai, que faz que sim com a cabeça.

— Ajuda?

— Ajuda — diz. — É a única coisa que ajuda.

Ele abaixa a cabeça, mas antes ela consegue ver que está sorrindo.

Tem uma festa de casamento acontecendo lá fora, uma noiva e garrafas de champanhe, horários a cumprir, coisas importantes. Mas ele está ali ouvindo a filha, como se não tivesse mais nada para fazer. Como se nada fosse mais importante do que isso. Do que ela. Maya continua contando.

Fala sobre a conversa com Thomas, sobre as longas horas em que não podiam fazer nada a não ser conversar enquanto sobrevoavam um oceano sem fim. Conta sobre os projetos de pesquisa ridículos de Thomas, sobre o filme com os patos e sobre ter achado erroneamente que ele também ia para um casamento. Fala até sobre o uísque.

Não conta nada sobre o beijo no aeroporto. 

Quando chega à parte em que se perdem no aeroporto, está tão afobada que mal consegue falar direito. É como se uma espécie de válvula tivesse sido aberta dentro dela e não tem como parar a torrente. Quando conta sobre o funeral em Paddington, sobre a concretização de suas piores suspeitas, ele pega a mão da filha.

— Eu devia ter contado — diz ela e limpa o nariz com as costas da mão. — Na verdade, nem devia ter ido lá.

O pai não diz nada, para alívio de Maya. Ela não sabe ao certo como contar o resto da história — a expressão de Thomas tão obscura e solene como uma tempestade começando ao longe. Do outro lado da porta, pessoas riem e batem palmas. Ela respira fundo.

— Eu estava tentando ajudar — explica com calma, mesmo sabendo que essa não é toda a verdade. — Queria vê-lo de novo.

— Que fofa — diz o pai, e ela balança a cabeça.

— Não sou, não. Tipo, só conversei com ele durante algumas horas. É ridículo. Não faz sentido.

O pai sorri e depois ajeita a gravata-borboleta torta.

— É assim que essas coisas acontecem, filha — diz ele. — O amor é a coisa mais estranha e sem lógica do mundo.

Maya levanta a cabeça.

Amor à primeira vista [Thomas Sangster]Where stories live. Discover now