A INFELICIDADE É ALGO QUE VOCÊ ESCOLHE PARA SI

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Jovem: De jeito nenhum. Isso é um absurdo.

Filósofo: Por quê?

Jovem: Porque algumas pessoas nascem em berço de ouro, têm bons pais, e outras nascem pobres e têm pais ruins. O mundo é assim. Não estou com a menor vontade de tocar neste tipo de assunto, mas não existe igualdade no mundo, e as diferenças entre cor de pele, sexo e nacionalidade têm mais importância do que nunca. É natural se concentrar naquilo com que você nasceu, e toda essa sua conversa é apenas teoria acadêmica. Você está ignorando o mundo real!

Filósofo: É você quem está ignorando a realidade. Por acaso consegue mudar a realidade quando se fixa naquilo com que nasceu? Não somos máquinas substituíveis. Não precisamos de substituição, mas de renovação.

Jovem: Para mim, substituição e renovação são a mesma coisa. Você está evitando o ponto principal. Existe uma infelicidade que vem de nascença. Antes de tudo, você precisa reconhecer isso.

Filósofo: Não vou reconhecer isso.

Jovem: Por quê?

Filósofo: Em primeiro lugar, neste momento você é incapaz de se sentir verdadeiramente feliz. Você acha a vida difícil e até gostaria de poder renascer como uma pessoa diferente. Mas está infeliz agora porque optou por “ser infeliz”, não por ter nascido com azar.

Jovem: Eu optei por ser infeliz? Como posso aceitar isso?

Filósofo: Não há nada de extraordinário nesse conceito. Ele vem sendo repetido desde a Antiguidade clássica. Você já ouviu a frase “Ninguém faz o mal voluntariamente”? Essa é uma afirmação conhecida como paradoxo socrático.

Jovem: Mas não faltam pessoas que fazem o mal de propósito, não é? Existe um monte de ladrões e assassinos, isso sem contar todos os políticos e as autoridades com suas negociatas. Talvez seja mais difícil encontrar uma pessoa realmente boa que não deseje o mal.

Filósofo: Sem dúvida, não faltam comportamentos maus. Mas ninguém, nem mesmo o pior bandido, se envolve no crime apenas pelo desejo de se envolver em atos cruéis. Todo malfeitor tem uma justificativa interna para se envolver no crime. Uma briga por dinheiro leva alguém a cometer um assassinato, por exemplo. Para o criminoso, existe uma justificativa que pode ser enunciada como a realização do “bem”. Claro que, nesse caso, não se trata do bem no sentido moral, mas do bem no sentido de ser “benéfico para a própria pessoa”.

Jovem: “Benéfico para a própria pessoa”?

Filósofo: A palavra grega que designa “bem” (agathon) não tem significado moral. Significa apenas “benéfico”. A palavra que designa “mal” (kakon) significa “não benéfico”. Nosso mundo está cheio de todo tipo de injustiças e maldades, mas não existe ninguém que deseje o mal no sentido mais puro da palavra, que é “não benéfico” para ninguém.

Jovem: O que isso tem a ver comigo?

Filósofo: Em algum estágio da sua vida, você optou por “ser infeliz”. Não foi porque nasceu em circunstâncias infelizes ou foi parar numa situação infeliz. Isso aconteceu porque você achou “ser infeliz” uma coisa boa.

Jovem: Por quê? Para quê?

Filósofo: Por que optou por ser infeliz? Não tenho como saber a resposta. Talvez isso fique mais claro à medida que debatermos.

Jovem: Você está se esforçando para me fazer de bobo, não é? Isso não tem nada a ver com filosofia! Não aceito isso de jeito nenhum.

Em um movimento involuntário, o jovem se levantou e encarou o filósofo com um olhar furioso.

Optei por uma vida infeliz porque foi bom para mim? Que ideia absurda! Por que ele está querendo me ridicularizar? O que eu fiz de errado? Vou acabar com esse argumento, custe o que custar.

Vou fazê-lo se ajoelhar diante de mim. O rosto do jovem corou de raiva.

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A Coragem De Não Agradar Where stories live. Discover now