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O leprechaun não era tão ruim assim, no final, e enquanto todos as amontoavam ruidosamente ao redor da mesa, o senhor demônio do pântano viu-se obrigado a admitir que aquela criatura tinha uma língua tão afiada que o próprio satã poderia sentir-se envergonhado de compartilhar uma refeição com ele. No entanto e em contrapartida, a maneira com que aqueles olhos azuis vivos e cheios de ansiedade encaravam Louis não tinha nada além de fraternal. Harry saberia dizer se fosse o contrário, especialmente depois de permanecer em sua cadeira completamente em silêncio durante grande parte do jantar, concentrado em devorar cada pequeno movimento do leprechaun e avaliar todas as intenções subentendidas que emanavam dele. A única coisa que acabou por descobrir foi que: a) a criatura era realmente do tipo que poderia roubar até o lustre sobre sua cabeça se lhe dessem oportunidade e b) ele se importava com Louis, genuinamente. Verdadeiramente. E para um coração demoníaco que poderia dar à fada todo um céu, então... bem, isso lhe era o bastante para poder puxar uma taça de vinho entre os lábios e relaxar um pouco ainda que mantendo-se alheio à toda a conversa na qual ele não parecia realmente se encaixar. Era um jantar para Louis. Havia carne de javali assada e bolinhos de mel, cidra à vontade e ensopado de batata do pântano com caranguejos selvagens. Não era o tipo de coisa que o demônio permitiria em sua mesa diariamente, porém ele sabia que aquilo não se tratava dele. Não mais. Não quando até mesmo Zayn se sentia confortável em compartilhar do jantar ao lado direito da fada e Ken se aninhava com intimidade ao lado de demônio da encruzilhada. Eram todos como uma grande e desordeira família, bacana de se observar, caso Harry fosse honesto o bastante para admitir que não estava com ciúmes pela maneira como Louis sorria como se aquele estivesse sendo o melhor momento de sua vida até então. Quer dizer, e quanto a todos os outros? E quanto àqueles em que eles passaram juntos dentro e fora de um quarto? Sentindo-se no limite da compreensão de seus próprios sentimentos, o demônio apenas engoliu seu vinho de uma só vez, esforçando-se para manter os cascos escondidos sob magia e não assustar nenhum dos convidados que não eram seus. Ele jamais convidaria nenhum deles se Louis não tivesse surgido em sua vida.

Às vezes, o demônio não sabia se tinha maneiras de realmente agradecer adequadamente o dia em que o destino colocou a criatura debilitada no meio de seu salão. Louis tinha tanto medo naqueles olhos azuis, na ocasião. Suas asas inacabadas, ossos expostos sob a pele malicenta e tantas marcas cruas em sua alma de uma vida miserável que Harry sentia-se ferver com aquela coisa herdada de seu pai girando na base do estômago. Ódio. Ele gostaria de mostrar ao povo estúpido de Calia quem era o demônio do pântano de verdade. Ele gostaria de torcer o pescoço da banshee e torturá-la em suas masmorras por anos, centenas deles. Mantendo-a viva somente para prolongar o sofrimento. "Você é o melhor dos dois mundos" sua mãe havia dito. O problema em questão era que, diabos, em momentos como aquele ele apenas não queria ser. "Papai teria amaldiçoado toda uma vila se alguém fosse estúpido o suficiente para maldizer minha mãe, o que ele faria com aqueles porcos imundos por tudo o que Louis passou?" o demônio perguntou-se conforme mais uma taça de vinho lhe descia suave pela garganta. Ele sabia a resposta, claro. Morte. Sangue. Tortura. Maldições terríveis. Fome. Tanto terror que somente a própria Gaia poderia fazê-lo parar. No final, Harry não sabia o quão justo poderia soar todo o horror desde que fosse para proteger alguém. Especialmente alguém como Louis.

— Imagine o quão grande o mundo pode ser para você agora — a voz ligeiramente aguda do leprechaun lhe chegou aos ouvidos mesmo sob a névoa de pensamentos nada cristãos corroendo dentro de seu cérebro, deixando-o em um estado de semi alerta ainda que suas feições estivessem tão entediadas quanto minutos antes. Uma máscara, claro. Um demônio têm que ser primariamente bom em fingir. — Com essas asas enormes, não há lugar onde você não possa ir. É incrível, Lou.

Do outro lado da mesa, Harry sentiu a leve agitação na aura sentimental da fada. Ele parecia quase envergonhado ainda que algo mais sombrio nebulasse entre uma onda clara e outra. Quando os olhos azuis de Louis chocaram com os verdes gelados do senhor demônio do pântano, ele sorriu quase aliviado.

DEVIL TRIBUTE // larry stylinsonWhere stories live. Discover now