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Não havia nada de mais agradável naquele lugar do que os amanheceres quando o sol ainda dorminhoco começava sua escalada pelo céu ainda cinzento, as neblinas espessas do pântano iam sendo sopradas par alone e a vida alagada efervescia em um ritmo quase caótico que, para o demônio cruel que era Harry, soava como a mais bela canção que seus ouvidos poderiam captar. E, naquela manhã em específico, ele deixou-se aproveitar os coachar dos sapos por mais tempo, assim como silvo agudo das cobras e o ruído quase imperceptível da água lamacenta sendo cortada por grandes crocodilos indo em busca do café da manhã. Há muito tempo atrás, mais tempo do que qualquer outra criatura poderia conseguir contar em seus anos de existência, Harry havia escolhido aquele lugar para erguer seu grande castelo demoníaco. Na época, ele encontrava-se desolado depois de passado um curto período de algumas centenas de anos com os de sua raça, parentes de pactos distantes de seu pai morto. Seres cruéis e horrendos, alimentando-se do desalatento, medo e sonhos vis, vivendo em grandes casas repletas de feitiços para deixá-las genuinamente belas para os olhos curiosos daqueles corajosos o bastante para se aproximarem e então terem suas entranhas devoradas e a alma engolida por bocanhas cheias de dentes, olhos muito negros e cascos velhos. Uma experiência terrível, de fato, e nada compatível com sua própria essência meio humano. Foi quando partiu para o lugar mais longe que conseguiu encontrar. O pântano em questão ficava no centro de quatro vilas mágicas circunda por espessos bosques, longe o bastante da vida humana para que algum dos mortais fossem capazes de alcançá-los em busca de pactos, vendas de alma, forca e invocações. Ele próprio – e Kendall, sua familiar – lançaram os feitiços nas muitas pedras, obrigando-as se moldarem. O trabalho também foi feito com as madeiras, os minerais, a seda conseguida de grandes produtoras simpáticas ao norte, a lã comercializada por ovelhas selvagens. A construção demorou sete meses sem nenhum tipo de pausa, noite e dia e madrugada tendo sua magia exaurida até o fim. Harry dormiu por quase dezoito anos depois do término de um trabalho tão cansativo. Mas, no fim, o concluiu com grande conforto. Um lugar seguro de toda a excentricidade de criaturas medonhas para onde um demônio como ele poderia viver por toda a sua eternidade com um pouco de paz. Isso, obviamente, não foi o que aconteceu.

Em todo caso, Harry realmente sentia-se inspirado pela vista de seu quarto, todas as manhãs, todos os dias há tanto tempo que poderia ter perdido o sabor a algumas boas centenas de ano. Mas não. Harry era um demônio calmo, tranquilo e sem vícios, ambições e desejo de sangue sob seus cascos. Ele era uma aberração, uma vergonha para seus iguais, de fato.

Afastando os pensamentos cheios de lembranças tortuosas de sua cabeça, jogou-se para fora da cama e se colocou dentro de uma calça escura. Sem camisa. Sem calçados. O frio do castelo lhe aquecia a alma estragada de demônio e os sapatos lhe dava uma sensação angustiante apesar dos pés com dedos humanos. Com uma longa olhada no espelho do banheiro de seus aposentos, o demônio encarou as marcas do tempo em seu rosto jovem. Não havia nada. Tão jovem quanto qualquer outra criatura de três décadas ou menos, olhos verdes muito expressivos no mesmo tom que as chamas borbulhando nas pontas de seus dedos. Harry gostava do fogo já que essa era uma especialização elemental. Todos os demônios costumavam ter aproximação a um em específico de acordo com suas árvores genealógicas. Harry era um demônio do fogo por ordem de Belzebu, o primeiro demônio no topo da árvore de seu pai. Ele poderia ter bisneto do próprio, possivelmente. Ouvia boatos de que ele ainda estava vivo e devorando existências humanas inteiras em algum lugar perto da costa europeia. Não que Harry se importasse, obviamente. Quanto mais longe de outros demônios ele estivesse, melhor seria para si próprio e toda a coisa do vegetarianismo, mãe humana, e exclusão de si mesmo.

Suspirou pesado, pegando uma quantidade de água significativa de água e jogando no rosto com força, esfregando todos os resquícios do cochilo anterior e lavando de suas feições o desgosto por ter cedido à Ken, novamente. Não era um mentiroso obsceno a ponto de negar sua própria curiosidade em relação a fada, não quando sentia seu estômago retorcer em êxtase com a ideia de desdrobá-lo e experimentar o despertar de uma magia tão suave quanto a híbrida que pulsava sob a pele da criatura. Entretanto... bem, ele ainda sentia-se receoso por todo o resto. O garoto claramente desconhecia suas origens verdadeiras e, de acordo com a familiar, havia sido renegado pelo povo de Calia e das outras três vilas com tamanha urgência que nunca soube pertencer apenas a um tipo de diferente de normalidade. "Coisinha deformada, quanto mal gosto para uma ofensa" pensou meio ranzinza em imaginar quão terrivelmente criativo o mundo fora do castelo tinha se tornado. Ainda encarando o espelho, Harry sentiu-se diante de um grande impasse. Ele poderia voltar atrás naquela mesma manhã e então mandar o garoto para o mais longe possível de Calia, trazendo a si próprio um pouco mais de paz ainda que perturbada pela consciência de que a fada acabaria destroçada tão rápido quanto um piscar de cílios quando as outras criaturas percebessem o que ele era. Ou... "pelo inferno em chamas, Ken, vou arrancar suas unhas e comê-las na sopa".

DEVIL TRIBUTE // larry stylinsonKde žijí příběhy. Začni objevovat