XXXIII. Eu sou uma usina nuclear

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Nem o mais rápido dentre os seres celestiais presentes conseguiram chegar até mim antes que toda a força vital de Paulo e Quione tenham sido sugadas por minhas garras. Quando a velocidade do tempo volta ao normal, Eloísa esta caída no chão, sentido apenas metade de sua alma. É como acontece. Eu também não sinto Isaac desde que ele foi preso e é como se estivesse andando no frio sem agasalho algum. Mônica não está diferente. Caída nos braços de Tatiana, com todo o vazio que agora rompe sua paz.

Meu olho esquerdo, antes cego, agora está preenchido pela metade de vermelho, de forma longitudinal. Precisava fazer isso, ter essa energia extra para salvar meu irmão e, consequentemente, os mundos.

— Sol — sussurra uma voz perto de mim, angustiada e distante.

Tudo parece longe agora, como se eu não ocupasse a mesma realidade que eles. Uma energia vermelha e elétrica rodeira meu rosto, ainda procurando uma forma de entrar no meu corpo, mas o estranhando por não ser a origem dela. Estou sentido Paulo e Quione, ainda, ambos dentro de mim agora.

— Sol — chama a voz mais uma vez, meu rosto vira robótico para a direita. Pitt está me encarando com seus olhos amarelos e bonitos.

Quando Eusébia e Héstia nasceram, Pitt e Tatiana, respectivamente, Seth me disse algo que nunca e esqueci. Ela falou que dos seus chifres nasceram os perpetuadores da paz e do caos, e que todas as mônodas, nascendo em pares, perpetuavam a ideia de certo e errado. Bem e mal. Nesse mesmo momento, questionei a Seth o porquê. Por que não deixar que só o bem existisse? E respondeu que tudo é equilíbrio. Se apenas coisas boas existissem, ninguém saberia o quão importante e valiosas eram, e então o mal nasceria de qualquer forma. Ela os batizava, assim que nasciam, davam a eles o soro do bem ou do mal, garantia que o controle estivesse sempre em nossas mãos.

Não nascem bebês, mas não nascem adultos. Mônodas surgem como se fosse adolescentes, entre seus quatorze e quinze anos, com asas brotando e chifres minúsculos. Surgiam sempre de um dos dois rios que traçam o inferno. O rio branco, com cheiro de mar, dos herdeiros de Caim. Ou do amarelo, com perfume de lavanda, dos seguidores de Lilith.

No inferno o tempo é muito diferente e as vidas são infinitas. Não existe noite e nem sol, apenas uma estrela vermelha que brilha o tempo inteiro e deixa todos os campos entre um vermelho e laranja, dependendo do humor de Lúcifer. Hoje, não sei como o inferno está com a ausência dele e não desejo tentar chegar lá.

Assim como nas terras, tudo que meus raios tocam é visível a mim e consigo caminha e agir onde quiser, o inferno era para meu irmão. Nada fugia de seus olhos, nada acontecia sem que ele soubesse. Ele sabia que Seth se partiria, mesmo que ela nunca tenha contado isso a alguém além de mim.

Nossa relação não era boa. Ele me achava quente, eu o achava salgado. Sim, nós conseguimos saber o gosto dos nossos irmãos, além de sua temperatura e cheiro; é algo exclusivo de gêmeos. Então, Eusébia nasceu do rio de Lilith.

Era totalmente amarelo e Tatiana também. Eles só escolhem seus corpos quando os chifres crescem o suficiente e as asas já os permitem voar. É assim que o tempo é contado no inferno. Pensando de forma a comparar as terras e o inferno, demora-se em média um centímetro por ano. Nos nascidos do rio de Lilith, são dez anos. Nos de Caim, trinta e cinco. A diferença existe porque, quando Lilith mandou Seth para o inferno, antes a caçou por dez anos e demorou trinta e cinco anos para rever Caim depois disso. É um tempo chulo se comparado aos milhões de anos que percorrem a história depois disso, mas foi crucial.

Quando Seth gerou a energia de ligação entre as almas gêmeas, seus chifres caíram. Deles, eu e Lúcifer nascemos.

Eusébia era doce. Até o seu nascimento, eu não tinha conhecido muitas mônodas. Isso porque, para mim e Isaac, foram cento e quatro anos até que nossos chifres crescessem. Até o dia do nascimento de Eusébia e Héstia, eu e Lúcifer vivíamos aos pés de Seth como passarinhos em um ninho. Foi assim que aprendemos todas as histórias de antes de nascermos. Seth era brilhante. Seus olhos eram de dores diferentes. Um totalmente branco com névoa e outro intensamente amarelo como um girassol. Meus olhos e os de Lúcifer sempre foram vermelhos, afinal, era a cor dos enormes e perdidos chifres de Seth.

Nesse em dia em questão, eu e meu irmão estávamos brigando por uma maça prateada perto do lago de Lilith. Foi bonito e assustador vê-lo borbulhar como se fervesse e de lá observar corpos sem cabelo, sem gênero e sem chifres se erguerem. Eles caminharam dentro do rio até que os chifres crescessem. Não saiam de lá, mas nós, de fora, conseguíamos observá-los crescer.

Até então, não existiam muitas mônodas. Paulo, ou YHWH, nasceu em corpo depois da união das almas gêmeas, antes de mim, e ele ficava sempre na terra. Eu sabia o que ele fazia, por era o sol, mas não gostava. Sempre achei entediantes, principalmente os que eu gerava.

Um dia depois de Eusébia e Héstia, do outro lado, paralelo ao rio de Lilith surgiram mais duas mônodas. Totalmente brancas, quase transparentes. Quione e Bragi são, respectivamente, Sofia e Mônica. Elas começam a andar também, andariam pelo menos três vezes mais por terem nascido do rio de Caim.

Nos anos seguintes, Lúcifer e eu não brigávamos mais. Estávamos estarrecidos pelo sentimento incomum que começou a nos perseguir. Sentimentos esses direcionados a seres de rios opostos. Nós nos apaixonamos, ao longo de anos, por seres que apenas andavam. Mas, digo com certeza, que meu irmão via o mesmo brilho sobre Quione que vejo sobre Eusébia.

Pode-se dizer, então, que nenhuma das mônodas presentes, inclusive eu, existiriam sem Lilith e Caim. Por isso, eles são cruciais para o triângulo da morte que libertará a todos.

Claro, Pitt e Tatiana saíram bem antes do rio do que Sofia e Mônica.

Eusébia era como cana de açúcar. Ficar perto de alguém tão oposto ao meu irmão era a coisa mais gratificante que já tinha sentido. Ele gostava do meu calor. Era o lado bom, eu soube no instante que me apaixonei. Mas eu sabia que existia algo errado porque Eusébia é amável e estável enquanto eu sempre fui um prédio em chamas prestes a explodir.

Então Seth nos deixou saber uma parte a mais da história. Seth chamava de energia do elo das almas gêmeas. Eu, entretanto, chamo de maldição. As pessoas daqueles rios já tinham um coração predestinado. Elas não tinham escolhas. Eu amava Eusébia, mas ele amaria algum filho de Caim.

As mônodas começaram a surgir aos montes. Nós não sabíamos o porquê começaram, mas apenas iam se erguendo dos rios e caminhando em procissão.

Mas, logo que as seguidoras de Caim assumiram seus belíssimos corpos, Mônica e Tatiana ficaram inseparáveis, eu esperei o momento no qual o meu coração e o do meu irmão seriam soterrados pela perda de nossos amores.

Isso estava prestes a acontecer, mas Seth se partiu antes.

Os seres em procissão, graças ao desequilíbrio, saíram dos rios antes do tempo e por esse motivo se perderam sem saber o que são. Estão confusos e as mônodas completas acabaram presas no ciclo da era. Eu e Lúcifer observávamos de fora, tentávamos impedir, mas nada dava certo porque, afinal, somos crias de Seth, como lutar contra uma vontade dela?

Por isso, olhar Eusébia dói em mim. Porque ele é lindo, doce e tem cheiro de café. 


Porque agora eu não sou mais um prédio em chamas. Eu sou uma usina nuclear.

FUGITIVOS DO INFERNO 02 -Triângulo Da Morte [EM ANDAMENTO] Where stories live. Discover now