XIV. Eu Não Vejo a Hora de Morrer

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Música indicada: I Don't Want to Miss a Thing

A energia dele vibra negativamente. Lorenzo se lembrou de grande parte de sua história original e todas as vezes que olha para ela, relembra mais uma vez. Nem sabe direito o porquê de tanto ressentimento. No início, achou que pelo fato dela ter sido a primeira a matar Teodora, mas depois repensou e talvez seja um ódio direcionado a si mesmo que, mesmo depois disso, continuou amando-a. Agora, nem sabe ao certo o que sente. É forte, impossível de evitar, mas ao mesmo tempo parece um outro buraco em sua memória. Como se pode ter um sentimento tão genuíno por alguém e ao mesmo tempo não se lembrar de como tudo começou? Lorenzo se lembra agora das coisas que aconteceram antes do ciclo. Ele se recorda de vê-la em seus pesadelos, de ter medo da garota, se lembra até mesmo da briga no bar com Tomas. Recorda-se do beijo deles, sente falta da sintonia que tinham, mas nada a respeito do princípio. Como tudo começou, como se apaixonaram pela primeira vez. Isso o enlouquece.

Está sentado na cadeira de estofado amarelo em um restaurante no meio da estrada. Ironicamente, está tocando I Don't Want to Miss a Thing, do Aerosmith no rádio. Ele não pode olhar para ela mais uma vez, sentada do outro lado do salão. Porque sabe, dentro do peito, que irá ceder. Bebe sua cerveja e encara Tatiana, com seus cabelos laranjas balançando com o ar fresco que entra pela janela, ela o encara em julgamento.

— Milhões de anos — brigou, balançando sua colher dentro da xícara branca à sua frente. — Ciclos e mais ciclos concluídos — olha para a mulher de pele marrom, olhos escuros e pouco puxados e um nariz longo à sua esquerda. — E eles ainda fazem a mesma coisa — suspira.

Isso o irrita mais. Não com ela em si, mas porque queria saber do que ela sabe. Queria, por si mesmo, tirar as conclusões de que estão repetindo hábitos antigos, mas tudo que tem são mais e mais perguntas à medida que as antigas são sanadas.

— Pelo menos Tim Maia não morreu ainda por aqui — disse em resposta a mulher ao lado de Tatiana, chamada Mônica, e ergue seu gin em direção à outra, que aceita o brinde.

No básico, Lorenzo ainda luta para entender como as pessoas podem existir em diferentes tempos de formas diferentes sem a visão de um tempo linear. Tim Maia morreu em 1998, o ano que estão em questão, mas como não estão na mesma terra, o cantor nem ao menos chegou a pegar uma infecção. Está bem e ainda teria alguns anos de sucesso. Ele está sério demais, não pode evitar, olha de relance a mulher loira sentada ao lado de Pitt, o jeito que ela coloca o cabelo para trás da orelha quando se concentra o desestabiliza. Quando volta a olhar para a mesa, Tatiana está fazendo fogo com as mãos para esquentar seu café e o homem quase dá um pulo de susto. Seus olhos amarelos, como os de Eloísa, estão à mostra e só voltam ao castanho quando ela o olha satisfeita.

— Co-como consegue fazer essas coisas? — Quer saber, incomodado e ao mesmo tempo impressionado.

— Como consegue fazer uma lança de diamante que pode me mandar de volta para o inferno com sua unha? — Irônica, sorri. Mônica também ri dele. — Algumas coisas não têm respostas, elas apenas são como são. O Supremo me fez assim — aperta os olhos e pressiona os lábios. — Ora, não me olhe com cara de cachorro sem dono, Caim, já pedi desculpas pelo que aconteceu em São Paulo.

— Lorenzo — corrige antes que ela continue.

— Certo, Lorenzo — debochada. — Eu estava tentando te levar para casa, como todos os outros, mas você continuava fugindo e fugindo eternamente. Sempre foi sua natureza, eu sei, mas tentar impedir o ciclo havia se tornado a minha — tagarela rápido e sem pausa para respirar. — Abri um buraco em sua testa, lembra? — Aponta o dedo com uma unha grande e pontiaguda pintada de preto, assim como todo o resto da vestimenta dela. — Estava procurando sua energia. Esses colares... Trocarem eles, foi tudo planejado.

FUGITIVOS DO INFERNO 02 -Triângulo Da Morte [EM ANDAMENTO] Where stories live. Discover now