— E ah, — ela disse da porta. — Fica tranquilo que ano que vem você vai ter que repetir essa história ainda, Scar já está com nove.

Eu assenti rindo e ela se foi. Apaguei a luz do quarto e desci pra ver se a Tina já tinha saído do banho. Pro meu nervosismo aguçar lá estava ela, sentadinha na mesa de jantar balançando as perninhas que mal alcançavam o chão comendo a comida que eu tinha deixado pra ela.

— Oi pai, senta aqui comigo! — ela pediu enquanto eu me aproximava. — Não precisa ficar com essa cara de assustado, conta logo e chega de enrolação.

Franzi as sobrancelhas com um sorriso no rosto, minha baixinha tava crescendo mesmo. — Ah, é assim?

— Sim, manda ver nessa história que eu esperei por anos! — disse colocando mais arroz, feijão e frango na colher e abrindo um bocão.

— Então vamo lá! — respirei fundo e abri o livro que já tava na minha mão. — Era uma vez...

— Ah pai, era uma vez? Que brega! — bufou.

— Quer me deixar contar? — arqueei a sobrancelha. Ela deu de ombros e me deixou prosseguir.


era uma vez, Ali.

Saí da faculdade estressado, minha moto tava soltando uma fumaça esquisita e o barulho era pior ainda, fora que na parte da manhã tinha tido o desprazer de dar de cara com a fuça do meu pai querendo saber do meu irmão. Ô, homem que me dava nojo só de ver.

Tive que parar na oficina mesmo só querendo partir pra casa e apagar na minha cama, porque sem condições nenhuma de deixar a porra da moto quebrar e eu ficar sem nada.

— Fala aí Leandro, dá uma moral aí nessa bagaça pra mim que tá toda fodida, pelo amor de Deus. — falei descansando a moto e me sentando numa cadeira que tava largada por perto.

— Qual foi o problema da vez? — ele riu limpando a mão de graxa.

— Ah sei lá qual foi, deve ter sido outro dia que eu dei um chute de ódio no cano de descarga. Fiquei pra morrer com a dor. — ri.

— Tá revoltadinho demais hein, tá descarregando a raiva lá na academia não!? — olhou pra mim por cima da moto.

— Hum, muita coisa. — dei de ombros.

Deixei ele trabalhando e fui na lanchonete ao lado pra comprar um salgado pra comer, a fome estava grande dentro de mim.

Pedi uma coxinha e fiquei observando os carros passando pela estrada pensando na vida, no sono que eu podia tá tirando, na aula de Muay Thai a noite, e no rolê que eu iria dar depois com a rapaziada.

— Caralho, como tu consegue ser tão inútil garota? Tu é escrota, uma piranha, não serve pra nada, não merece respeito. — gritou um cara saindo de um táxi acompanhado de uma mina que chorava.

Estranhei a cena, continuei comendo, mas prestando atenção. Os dois estavam com duas malas na mão e pareciam não conhecer bem o local.

— Como eu ia saber que eu tinha que pegar sua carteira? A carteira é sua, Rodrigo. — ela disse soluçando.

— E o foda-se que ela é minha? Tu serve pra quê se não consegue nem resolver as coisas pra mim? Ainda diz que quer terminar. — ele deu uma gargalhada alta. — Terminar. Como tu vai sobreviver sem mim, garota? Tu não é ninguém.

Era uma vez, AliWhere stories live. Discover now