Capítulo 1

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"Ela dançou como se nunca fosse morrer. Explodindo o chão como se fosse dinamite"

Meu pé encostou no asfalto adquirindo impulso para empurrar enquanto o outro se repousava no skate. Em um momento, coloquei o pé de trás na ponta do tail¹ e o pé da frente na diagonal, com o calcanhar para fora, e flexionei meus joelhos. Apliquei a força no meu pé de trás enquanto levantava o outro, isso fez com que o skate subisse e desse um giro de cento e oitenta graus no ar. Aterrissei meus pés sobre o skate assim que o giro foi finalizado, completando o pop shove-it.

Repeti a manobra mais uma vez e olhei para meu lado. Diego também estava com seu skate, fazendo algumas manobras mais complexas enquanto andava pelas ruas de Henrietta ao meu lado.

Ele estava com um moletom azul, o seu capuz indo por cima do querido boné preto que quase nunca tirava. Tinha uma tatuagem de um pequeno skate no lado direito do pescoço e um pequeno brinco preto na orelha esquerda.

Encarei então minhas vestimentas. Diego gostava de falar que eu tinha um estilo retrô, com minhas calças jeans claras, minha blusa branca larga e meus tênis de skatistas clássicos old school², que eram ótimos para dar uns rolês, mas não para fazer manobras radicais.

Paramos numa das belas e movimentadas praças de nossa cidade. Ignoramos o banco bem ao lado de nós e nos sentamos em nossos respectivos skates. Passei a mão em meus cabelos castanhos, sentindo-os levemente molhados de suor.

— Vai na festa? – Diego perguntou se referindo à festa anual dos irmãos Ferreira; Giovanni e Danilo. A festa acontecia todos os anos na, nada pequena e nada humilde, residência que eles tinham num dos melhores bairros de Henrietta.

Em resposta, concordei minimamente com a cabeça, e ele abriu o sorriso.

— Fiquei sabendo que esse ano vai ser inesquecível.

— Você diz isso todos os anos. – Comentei pegando minha garrafa d'água e tomando um gole.

— Mas dessa vez é sério.

— Você também diz isso todos os anos.

— Sempre odiei essa sua memória de elefante, Luca. – Ele contou e acabei rindo e quase me engasgando com a água que estava a tomar.

Levantei e peguei meu skate. Continuamos a conversar despreocupadamente enquanto andávamos pelas ruas movimentadas, o som das buzinas e de carros passando já faziam parte da minha rotina desde que me entendia por gente.

Paramos na casa de muro pichado, onde moleques idiotas haviam escrito rasuras indecifráveis. Diego havia ficado em um nível extremo de frustração quando viu a pichação em seu muro recém-pintado. A cara de desgosto percorreu seu rosto por longos dias.

— Nos vemos na festa! – Disse me despedindo.

Não demorei muito para chegar na minha quitinete. Apesar de ser minúscula, eu conseguia deixá-la bem confortável, com algumas decorações bonitas que se assemelhavam aos anos 80 e 90, por qual eu tinha tanto encanto.

Guardei meu skate e joguei meu tênis no canto, ficando descalço. Me atirei na cama e peguei meu celular, vendo várias mensagens de minha mãe perguntando se eu estava bem. Desde que me mudei para cá, alguns meses atrás, ela não parava de me mandar essas mensagens. Sabia que ela sentia minha falta por lá, mesmo que não admitisse, e, honestamente, eu também sentia.

Me levantei e abri o armário da cozinha, pegando um pacote de salgadinhos. No mesmo instante, ouvi a voz da minha mãe em minha cabeça: "Só come porcaria esse menino." Ri do meu pensamento e abri a embalagem, pegando um salgadinho e levando a boca.

***

Já eram oito horas quando saí de casa com meu skate. Vários carros estavam estacionados por todo o quarteirão quando cheguei. O portão branco estava aberto e, próximo a ele, haviam dois seguranças e uma mulher alta que recolhia os convites. Entreguei o meu a ela e entrei.

Como de costume, a casa estava lotada. Se Diego já estivesse lá, seria muito difícil encontrá-lo no meio de todas aquelas pessoas, por isso mandei uma mensagem a ele, que respondeu logo em seguida dizendo estar perto da mesa de bebidas. Caminhei até lá e logo o vi.

— Ei! – Ele me cumprimentou, já pegando uma latinha de cerveja e me oferecendo.

— Faz muito tempo que está aqui? – Perguntei aceitando a cerveja e tomando um gole.

— Não, cheguei faz apenas uns dez minutos.

— 'Tá um pouco quente isso, não? – Comentei me referindo à bebida, e ele apenas levantou os ombros. — Você está reconhecendo alguém daqui?

— Não. Não conheço ninguém, mas o Giovani disse que iria convidar gente da época do colégio.

— Ah, eu conhecia poucas pessoas da sala dele.

— Eu também. – Ele concordou.

— A Milena deveria ter vindo com a gente. – Afirmei encarando aquela multidão de pessoas que eu não conhecia.

— Ela não gosta dessas festas.

— É, eu sei.

— Bom, eu vou procurar pelo Giovani. Você... – Ele apontou para mim. – Vê se se diverte! Vai dançar, sei lá! – Acabei rindo do jeito animado com que ele falou e assenti, o vendo sumir pela multidão.

Resolvi seguir seu conselho e caminhar até a pista de dança. Várias pessoas dançavam dos mais variados jeitos enquanto a música tomava conta do local. De repente, ouvi gritos estridentes e empolgados por ali. Virei minha atenção para onde achei ter vindo o barulho e vi garotas vibrando e pulando por alguma coisa, focavam fixamente em algo ali no meio que não consegui enxergar de primeiro instante.

Minha curiosidade me fez aproximar e quando a vi, entendi por que elas gritavam. Ali no meio existia uma garota que dançava. Dançava como se toda aquela pista fosse dela, como se sua vida dependesse daquela dança. Ela se movia no ritmo da música com passos complexos e arquitetados, parecia sentir aquela melodia em suas veias e transmitia aquilo para qualquer um que a visse. Não pude deixar de observá-la.

E ela percebeu.

Senti um arrepio percorrer meu corpo quando seus olhos focaram nos meus. Eles eram de um castanho esverdeado hipnotizante e pareciam ter um brilho que eu nunca havia visto antes. Seus cabelos ondulados e castanhos caíam em seus ombros como uma cascata. Seu corpo era carregado de curvas, e sua pele, bronzeada. Minha mente se perdeu em sua beleza e então, ela sorriu. Sorriu para mim, levantando o queixo, de maneira despreocupada e atraente.

Não sei por quanto tempo havíamos ficado assim, um olhando para o outro, mas antes que eu pensasse em fazer qualquer coisa, Danilo apareceu em minha frente, tampando minha visão.

Cara!! Quanto tempo! – Ele exclamou, me dando dois tapinhas nas costas.

— Oi, Danilo – Respondi ainda meio aéreo.

— Como 'cê 'tá? Está aproveitando a festa? Quer beber alguma coisa? – Acabei fazendo um meio sorriso ao me lembrar de sua grande mania de jogar várias perguntas de uma só vez.

— Eu 'tô de boa. – Respondi.

— Okay, então. Eu e o Giovanni vamos estar perto do minibar. Depois você chega lá. – Ele disse, e eu assenti.

Assim que Danilo saiu, meus olhos foram à procura da garota dançante, mas ela já não estava mais ali, e parecia não estar em nenhum outro lugar também.

Senti uma decepção tomar conta de minhas feições, mas tentei deixar aquele pensamento de lado. Ainda assim, não consegui evitar de pensar em seus olhos e seu sorriso charmoso. Ela tinha uma beleza no olhar e um sorriso que eu não duvidava fazer qualquer coração perder seu ritmo.

•••

SUMÁRIO

1.Tail: calda em inglês. A expressão é usada no skate para denominar a parte traseira do objeto.

2. Old school: termo usado para alguma coisa à moda antiga, algo que era utilizado há muito tempo e hoje é considerado antiquado e ultrapassado.

Romeu Por Uma Noite ✔Where stories live. Discover now