Minha [Em Atualização]

Saudade

-Desculpe, tinha que ser rápido. -murmurou já de costas mexendo no interior do armário branco de madeira, havia um espelho na porta esquerda, eu me levantei ficando sentada para poder ver meu estado através do espelho.

Meus cabelos estavam úmidos e sem vida, um emaranhado de fios volumosos espalhados, meu rosto estava inchado do lado direito coberto pela bolsa de gelo que eu segurava, meu lábio inferior possui um corte lateral e resquícios do sangue proveniente deste e de minha boca, meus olhos estão manchados pela maquiagem borrada e agora as lágrimas já caem livremente. Meu vestido parecia um trapo agora, meus pés descalços tremem. Choro porque tudo o que eu quero agora é James, sinto o sentimento de saudade sufocar meu peito de forma avassaladora, todas as partes de meu corpo pedem por ele, minha loba ronrona de tristeza.

-Precisa tomar banho, tem algumas roupas mais quentes aqui dentro. -Victor havia dito outra coisa depois disso, mas não quero ouvi-lo.

-Preciso ir embora. -falei retirando a bolsa de meu rosto e encarando o hematoma roxo destacado. -O que esse Hector pretende fazer comigo?

-Hector é o conde, como se fosse o rei para nosso clã, você é para ele a garantia de que James virá até aqui. -sua voz parecia distante. Ele se virou para me olhar. -Esse machucado vai ficar feio por um bom tempo.

-Não me diga. -murmurei desanimada. -James não pode vir, é claramente uma armadilha.

-Por você, ele faz qualquer coisa, com certeza virá pessoalmente. -cruzou os braços olhando virando o rosto para a janela, seus olhos distantes. -Tudo que Hector fez e fará com você é porque sabe da importância que tem para o seu companheiro. 

-Sinto que é pessoal. -coloquei os pés no chão, rendida a vontade de me ver limpa. -Ele virá aqui hoje?

-Não. -garantiu. -Não precisa se preocupar em vê-lo hoje, iremos caçar na cidade, é mais divertido. Mas, claro, o conde precisava dizer algo para alegrar a corte ainda mais. Não posso garantir o mesmo amanhã.

-Já é o suficiente, - consigo andar até o armário e passo o olho por lá para ter uma ideia das minhas opções, agradeço aos deuses por ver roupas ao lado das toalhas. - mesmo que eu saiba que não posso confiar em nada que você diga.

-Eu sinto muito, Saphira, precisa acreditar. -ele tocou minha mão com um olhar arrependido e eu o olhei com raiva, acreditar nele?!

-Quantas vezes eu tenho que dizer pra não encostar em mim?! - puxei a mão dando um passo para trás. -Você literalmente é culpado por eu estar aqui, como eu posso acreditar em você?! Até onde eu vejo, você é tão inimigo quanto Hector. Me deixe sozinha, vá embora!

Victor não disse nada, tocou seus cabelos por um momento, sua boca abriu para dizer alguma coisa, mas nada disse, seu maxilar se enrijeceu e de novo ele expressou aquele olhar de melancolia que não fazia o menor sentido, arqueei a sobrancelha, não é como se ele tivesse alguma defesa contra isso.

Num instante, eu estava sozinha naquele quarto gelado, apesar de tudo já era melhor que a cela. Suspirei pegando uma das toalhas do armário e indo até a porta de madeira, é mesmo um banheiro, quase chorei ao ver que podia regular a temperatura da água do chuveiro. É assim que se percebe o quão na merda nós estamos. Tranquei a porta atrás de mim e comecei a me despir para entrar no box. Retirei o colar que ganhei de minha família no dia do meu aniversário, como sinto falta deles... um soluço escapa de meus lábios quando estou retirando os anéis, um em forma de lobo e o outro o anel de coração vermelho, ambos me foram dados por James. Coloco-os na bancada para poder entrar debaixo do chuveiro. 

Regulei a temperatura da água para que ficasse morna, precisava sentir o calor. Chorei quando o calor começou a escorrer pelo meu corpo, coloquei a cabeça debaixo do chuveiro para molhar meus cabelos, precisava me sentir limpa do toque de Hector. Fecho meus olhos enquanto a água morna cai e abraço meu corpo me sentindo pequena, sentindo toda o estado de vulnerabilidade em que me encontro, quando os abro novamente arfo ao ver os olhos de James me encarando, dura um segundo, mas é o suficiente para fazer a saudade aumentar. Estou enlouquecendo.

Terminei o banho, peguei minhas joias e saí do banheiro enrolada na toalha. Abri o armário e peguei um conjunto vermelho qualquer, a blusa e calça moletom tinha detalhes brancos, além do capuz da blusa, nunca vou entender o que se passa na cabeça desses vampiros, mas acredito que para dormir seja a melhor coisa que vou encontrar por aqui.

Depois que me vesti coloquei o colar e meus anéis em seus lugares, já me sentia mais calma, não acho que conseguiria dormir, sentia minha bochecha latejar e minha barriga roncar de fome. Pelo menos essa roupa vai nos impedir de congelar por hora, é mais quentinha que o vestido, uma pena que ele tenha sido estragado, gostava dele. Tem comida aqui, sinto o cheiro. Onde? Retirei a toalha dos cabelos e a pendurei na porta do armário antes de me virar para a cama, havia uma bandeja com comida e um bilhete ao lado.

Coma, não está envenenado.

-V

V? Quando foi que Victor esteve aqui?! Suspirei, o cheiro está tentador e minha barriga ronca, se estiver envenenado eu descubro mais tarde, preciso acreditar que me querem viva. Sentei na cama e comecei a devorar tudo que tinha no prato, o fato de estar quente me fez gemer de satisfação. Impressionante como mesmo com a possibilidade de ser envenenada você não pensa duas vezes antes de comer. Se eu não comesse, morreria de todo jeito. A medida que mastigo, sinto o desconforto ao lado do rosto, por isso preciso comer devagar para não forçar demais minha parte machucada. Assim que termino, deixo a bandeja sobre a mesa e sigo ao banheiro para escovar os dentes antes de voltar a deitar.

Vai ser uma longa noite... começo a lembrar da primeira noite que passei com James, dormimos em seu quarto, na mesma cama. Eu lembro da sensação de ter seus braços em minha cintura, a sensação de segurança e amor, lembro que tive uma visão naquela noite. São tantas coisas que não consigo compreender, acordei daquilo certa de que estava louca, mas agora sinto que o que estou passando é pior do que a sensação de estar cega naquele dia ou mesmo daquela visão confusa. Agora estou no escuro, porque não consigo sentir James perto, não posso contar com ele para me abraçar e me fazer sentir segura, não posso sentir seus lábios nos meus para me fazer esquecer do mundo ao meu redor e sentir apenas o seu amor, percebo mais ainda o quão fortes são meus sentimentos e a minha necessidade dele. Não sei o que pode acontecer se eu fechar os olhos, tenho medo do que podem fazer comigo, mas tenho mais medo do que pode acontecer com James se ele vier me procurar aqui. Tenho medo que ele venha e mais ainda de que ele não venha, sinto calafrios só de pensar no sorriso sinistro de Hector. Não vou ser capaz de dormir com nenhuma luz apagada, por isso deixo a luz e o abajur acesos, já está tudo escuro lá fora, pelo que pude ver da janela. Fico deitada na cama, meu corpo coberto pelo lençol e meus olhos fechados, lágrimas finas cruzando o caminho entre meus olhos e meus cabelos. Não quero dormir.

Vai ficar tudo bem. Vamos passar por isso juntas. James virá. Hector nunca foi capaz de nos separar por muito tempo.

O que quer dizer com "nunca foi capaz de nos separar por muito tempo?" Tem que começar a me contar mais do que isso, você deveria me contar tudo o que sabe. Eu desconfio que já o conheço, por que você não disse nada? Se estou nas mãos desse psicopata, seria útil saber que já o encontrei, eu não lembro disso.

Não se preocupe com isso, não teremos que lidar com Hector por muito tempo.

Se você não quer me contar, lidar com Hector pode ser exatamente minha forma de conseguir respostas. E ainda tem Victor, não consigo compreendê-lo também. Estou cansada dessas omissões.

Meus pensamentos não duram muito porque não conseguem se desviar de James, principalmente agora, sinto tanto a sua falta. Eu o amo tanto... meus olhos pesam mais ainda, fechados como estão, não demora muito até que eu me entregue ao cansaço e durma sonhando com olhos violeta.