33- O Humano

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(2010 palavras)

No fundo do mar há um outro mundo, escuro, frio e sombrio. A alta densidade de água não permite que os raios solares atingissem o fundo, eles acabam por perder sua força no meio do caminho. Mas mesmo a extensa escuridão do mar não é capaz de impedir a vivência de seres dentro de si, por mais que se acredita ser inabitável, a verdade é que existem mais seres vivos debaixo d'água do que acima dela.

De tantos tamanhos, aparências e jeitos, tantos seres diferentes vivendo juntos no mesmo mundo sombrio, cada um a sua forma. Mas a atenção desse conto será voltada para um pequeno polvo que galantemente vaga pelas profundezas, se escondendo dentre as fendas de todo possível predador, enquanto ligeiramente tenta procurar uma presa para se alimentar.

Mas esse polvo, em particular, não aguentava mais aquele mundo sombrio em que vivia, para aquele animal era tudo tão insignificante e vazio, vivia para sobreviver e vagueava pela imensidão sem nenhum propósito, contudo era incapaz de mudar sua rotina ou de mudar sua vida. Pois vivia de seus instintos e não de seus sonhos, pois agia da forma como sempre fora programado a agir.

Quando sentia ameaçado, atacava ou fugia, quando sentia necessidade buscava prazer e se alimentar, os instintos primordiais dominavam suas ações e seu controle, mas dentro de si, o polvo possuía um inconsciente sentimental, havia um vazio dentro de si pois vivia tanto em um ciclo infinito e repetitivo que era como se estivesse morto por dentro.

O polvo se perguntava certas coisas, mas como não era racional suas perguntas não eram pensadas, elas apenas estavam lá, mesmo que ele em si não percebesse isso. Uma parte dele que ele nunca viu ou percebeu existir, mas que estava lá. Era interessante, mesmo acostumado a viver em meio aquela depressiva escuridão, ele se sentia cego por não enxergar as coisas dentro dentro de si mesmo.

O animal queria algo, mas não sabia o que, apenas queria. Enquanto seu corpo e seus instintos viviam e repetiam da mesma ação, seu inconsciente buscava algo que o salvasse daquela rotina, mesmo que ele não soubesse o que. Certo dia, vagueando pelas profundezas do mar, ele avistou algo que nunca, em toda sua curta vida, havia presenciado, uma nova criatura chegara no oceano, uma que não se assemelhava a nenhuma outra das milhares que ele havia visto.

Era gigante, tinha apenas quatro tentáculos, por mais que parecesse ter um corpo mais duro que aqueles que normalmente via. Enquanto seus companheiros marinhos pareciam fugir e se afastar do visitante desconhecido, pela primeira vez o polvo fora contra seus instintos e se aproximou daquele ser que não parecia querer lhe matar ou machucar, os dois andaram em harmonia criando um pequeno e momentâneo laço.

A criatura estendia um de seus tentáculos com cinco mini-tentáculos na ponta e o polvo se enrolava nela, sentindo sua textura e seu corpo, admirado com aquilo que via, a criatura possuía algo em sua cabeça que ele não havia visto antes: luz.

Luz saía de sua cabeça, o polvo apenas observava mais admirado ainda, ficaram longos minutos brincando e interagindo juntos, a nova criatura parecia encantada com o pequeno animal em suas mãos, nenhum dos dois sabiam ler as emoções um do outro, mas ambos estavam se divertindo naquele momento. Até que chegou um momento em que a criatura parecia querer se despedir, mas o polvo finalmente tinha algo livre do ciclo, não poderia aceitar perde-lo e usou todas as suas forças para se grudar na criatura, ou ele a faria ficar ou ela a levaria com ele. Mas de toda forma o animal se recusava a deixa-la ir.

Após um bom tempo de brigas, a criatura finalmente cedeu e decidiu o levar junto. Agora o mundo do polvo mudaria de forma avassaladora, eles então começaram a subir, o polvo nem sabia que isso era uma escolha.

Oh como aquela criatura era sábia, pensava tão fora da caixa que chegava a fazer o polvo lhe admirar, enquanto subiam o mundo transitava de preto para azul, pois agora chegavam as camadas mais claras do oceano, o animal encarava tudo estupefato, e agora com a luz podia ver um pouco melhor certos detalhes, e observando cautelosamente o polvo começara a discernir que boa parte da estrutura da criatura não era natural.

As Vinte VirtudesWhere stories live. Discover now