Três Garotas

By GhostGold

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Em uma dia qualquer, ele entra em um ônibus e precisa escolher um lugar para se sentar. Cada assento vago est... More

Capítulo 02
Capítulo 03
Capítulo 04
Capítulo 05
Capítulo 06
Capítulo 07
Capítulo 08
Capítulo 09
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12

Capítulo 01

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By GhostGold

000.

Eram três e cinquenta da tarde. 

Motivado pela calmaria da cidade neste horário e decidido a sair para fazer pequenas compras, ele andou tranquilamente até o ponto de ônibus logo na esquina da rua de sua casa, aguardou poucos minutos e entrou no primeiro veículo que passou. Pagou sua passagem com moedas contadas e analisou o ambiente procurando algum lugar para se sentar. Dentre as duas dúzias de assentos apenas três, estes ao corredor e não às janelas, estavam livres. Curiosamente, todos os três ficavam ao lado de assentos ocupados por três belas (embora em resto totalmente distintas) garotas.

A primeira tinha cabelos tão negros quanto os olhos e que contrastavam com a palidez excessiva de sua pele.

Era, de longe, a mais bonita das três. Encarava distraída a paisagem urbana através das janelas embaçadas da lotação e escutava alguma coisa em seus fones de ouvido. Distante, mal notou a entrada dele.

A segunda falava alegremente ao telefone. Aparentava ser bem jovem e apressada.

Vestia um uniforme escolar e carregava no colo uma grande mochila vermelha que combinava com seus cabelos ruivos. Tinha a pele corada e a voz aguda, ria abertamente enquanto conversava. Notou a chegada dele apenas por algo mais do que um instante, pelo qual o analisou da cabeça aos pés, antes de voltar a conversar.

A terceira estava sentada próxima à porta de saída e lia um livro de capa roxa e aspecto antigo.

Tinha cabelos loiros, olhos verdes e usava roupas de frio, embora o tempo estivesse agradavelmente quente. Foi a que mais prestou atenção nele. Encarou-o curiosa por longos momentos antes de retomar sua leitura. Tinha uma expressão tímida e usava óculos que escondiam sua beleza simples.

Ele encarou as suas três possibilidades de lugar para se sentar. Nervoso, analisou as três garotas. Não se imaginava como capaz de conversar com nenhuma delas e não guardava qualquer tipo de expectativa porque sua timidez o dominava, mas mesmo assim aquela escolha parecia uma grande decisão.

Uma delas é a garota de sua vida.
Ambas as outras, em algum momento, o rejeitarão.

Ao lado de qual ele se sentará?


D-01.

Ironizando mentalmente sua ansiedade em tomar uma decisão tão banal, ele se sentou ao lado da mais próxima das três, aquela de cabelos escuros. 

Agora que estava ao lado dela, conseguia escutar o baixo som vindo dos fones de ouvido. O volume parecia estar bastante alto, mas a música era de uma tristeza serena. Ela o encarou por um pequeno instante quando ele sentou e, ao perceber que ele notara seu olhar, desviou o rosto de volta para a janela.

Minutos se passaram e um silêncio desconfortável imperava no ar. As outras duas garotas abandonaram o ônibus, a ruiva vinte minutos após a chegada dele e a loira quarenta. Esta segunda o fitou com um último olhar triste antes de abandonar o veículo.

A morena permanecia calada e escutando músicas que seguiam todas por melodiosas de tristeza. Ela se ajeitou desconfortável em certo momento, talvez por notar que ele, hipnotizado por sua beleza, volta e meia virava rapidamente para admirá-la.

Ela não tomaria atitude nenhuma. Ele estava ciente de que poderia ser entendido como um assédio se dissesse algo e pretendia respeitar a desconhecida. Triste e frustrado, ele se levantou para abandonar o ônibus em seu ponto que vinha logo mais. Ela olhou para ele mais uma vez neste momento e um esboço mínimo de sorriso passou por seus lábios. Ela se levantou também, para surpresa e alegria dele.

Ele dificilmente via garotas tão bonitas ou ficava tão perto de uma. Apesar do que pensara racionalmente logo antes, uma loucura corajosa e inacreditável parecia querer tomar conta de seu corpo. Sua cabeça passava por mil cenários e situações que poderiam ocorrer se tentasse falar com ela.

Estavam lado a lado na porta de saída.

Ele, aparentemente ansioso, batendo os pés nervosamente no chão.

Ela, agora tirando os fones de ouvido, apertando o botão para descer.

Tomar a iniciativa e interagir com a menina? Segui-la enquanto aguarda esperançoso de que ela diga algo? Ou simplesmente seguir para o mercado ao descer do ônibus, correndo o risco de irem em caminhos opostos?


P-01.

Ironizando mentalmente sua ansiedade em tomar uma decisão tão banal, ele passou pela primeira das garotas e se sentou ao lado da segunda, a ruiva. 

Ela ainda falava ao telefone, rindo aberta e exageradamente. A pessoa com quem falava, fosse quem fosse, parecia também muitíssimo animada e ele podia escutar seus risos e comentários incompreensíveis, mas de entonação bastante entusiasmada. A mochila que ela carregava no colo tintilava com chaveiros diversos que se batiam uns nos outros a cada freada do ônibus. Ela o olhou ligeiramente no momento em que sentou, mas logo após virou novamente o rosto para a janela em um gesto brusco e teatral para continuar sua conversa, aumentando ligeiramente o volume de sua voz.

Ela conversava sobre pequenas fofocas e ria a cada vez que confirmava alguma coisa. Em dado momento, em uma ansiedade juvenil, se encolheu ao perguntar sobre alguma festa que aconteceria logo mais. Repetia constantemente as frases "É sério?" e "Vai ser demais!", entre outras variações pouco originais, cheias de uma surpresa excessivamente fabricada.

Ele se sentia ligeiramente desconfortável com toda aquela extravagância encenada e com a voz aguda da garota, cheia de seus risos constantes. Chegou a considerar pedir para que ela abaixasse um pouco o volume de sua conversa, mas antes de poder formular qualquer frase um pequeno barulho veio do celular, um apito ligeiro e simples. Ela interrompeu uma frase pela metade, afastou o celular do ouvido e xingou nervosamente enquanto apertava inutilmente um botão. O celular agora desligado não reagiu de qualquer forma e só então a garota percebeu que ele ainda estava a observando. Levantou o rosto de forma voraz e encarou-o por alguns segundos. Seus olhos de um castanho indiscreto pareciam tentar desvendar uma figura muito estranha e peculiar.

Ele se afastou ligeiramente num ato de surpresa e receio. A ruiva soltou uma risada veloz e debochada e continuou a encará-lo em uma provocação desconcertante. Com uma voz simplista e natural, ela disse:

— Olá.

Ele não podia mais segurar a língua diante de tamanho atrevimento e mesmo sua timidez não conseguiria impedir sua reação já que ela falara com ele. Com a voz engasgada, ligeiramente baixa e apreensiva, ele perguntou:

— Olá. Desculpe, mas... Você precisa de alguma coisa?

Ela inspirou por um longo momento e soltou o ar com uma gargalhada atrevida. Chacoalhou o celular desligado na mão enquanto respondia, como se ridicularizasse uma pergunta tão estúpida:

— A bateria do meu celular acabou.

Ele permaneceu em silêncio, sem entender a razão do comentário. Ela soltou mais um riso e permaneceu o encarando com uma curiosidade ferina, interessada talvez na sua impotência e em seus modos tão estranhos. Enquanto ele tentava tecer algum comentário de resposta e balbuciava pequenas sílabas sem sentido, ela cortou seu dilema e explicou:

— Você tem um celular pra me emprestar? Vai ser rápido, prometo.

Assimilando a informação e se xingando em pensamentos por sua própria lentidão e estupidez, ele acenou que sim com a cabeça e tirou o celular do bolso da calça. Ela agarrou o aparelho sem rodeios e discou o número em velocidade frenética. Pouco depois já continuava sua conversa como se nada tivesse a interrompido.

Dez minutos depois ela se levantou, pediu para a pessoa com quem falava que esperasse por alguns instantes e perguntou para ele, casualmente:

— Pra onde você está indo? Se não estiver ocupado pode vir comigo, vou pra uma festa mais tarde e posso te levar! Vai ser divertido, você parece legal. Além disso, não quero ter que pedir outro celular.

Ela estava debochando dele? Por que o chamaria tão repentinamente assim para ir a qualquer lugar? Ele já estava deveras nervoso por ela ter usado seu telefone por mais de dez minutos, sendo que tinha prometido ser breve, mas a inconveniência dela e seu jeito displicente de agir o estimulavam de alguma forma.

Ele não tinha realmente nada de muito importante para fazer.

Concordar e ir com ela? Tentar se impor e pedir por mais mais detalhes antes de decidir? Ou apenas tenta inventar alguma desculpa para que ir embora sozinho? 


M-01.

Ironizando mentalmente sua ansiedade em tomar uma decisão tão banal, ele passou pelas duas primeiras garotas e foi se sentar no assento ao lado da porta e ao lado da terceira, a loira. 

Ela levantou ligeiramente os olhos e o encarou por alguns segundos, tomada de algum tipo de interesse profundo e irrefreável. Porém nada disse e, ao perceber que ele a encarava igualmente esperando por uma resposta, abaixou a cabeça num movimento brusco e tímido para continuar a ler seu livro.

Ele achou grande graça naquele comportamento. De tempos em tempos ela parava a leitura, o encarava por longos instantes e, ao notar que fora percebida, voltava suas atenções ao livro. Duas ou três vezes ele pensou que talvez a garota estivesse prestes a tentar falar algo, mas ela sempre virava o rosto e voltava para sua leitura. Alguns minutos se passaram desta forma e a desconhecida aparentava ficar cada vez mais aflita com sua inabilidade de falar. Ligeiramente ansiosa e preocupada, ela encarava a cidade pela janela, como se estivesse travando algum tipo de batalha interna.

Ele, agora acostumado com os trejeitos nervosos e tímidos da garota, concluiu achar seu comportamento bastante carismático. Tentou espiar algum trecho do livro um tanto embolorado e desbotado que ela lia, mas não entendeu o idioma. Parecia ser alemão ou alguma outra língua parecida e era escrito à mão. Surpreso, se perguntou por que alguém andaria com um livro daquele tipo na rua.

Meia hora se passou assim e nada foi dito. Ele esperava em um misto de riso e curiosidade para que a garota finalmente falasse algo, mas ela foi incapaz. Até que, por fim, a loira fechou o livro que carregava, se levantou nervosa e caminhou até a porta do ônibus. Ele sorriu para si mesmo, ligeiramente culpado e triste por ela não ter dito nada.

Ela se preparou para descer. Era a última chance para tentar algo. Parecia tão aflita em tentar falar com ele... Por que ele apenas não perguntava algo para ela?

Ele se levantou também e, em um ato repentino e impensado, andou até a porta e encarou a moça. Ao vê-lo se aproximar, ela passou a encarar o chão para o chão e seus cabelos de tom amarelo esconderam-lhe ligeiramente o rosto. Ao levantar rapidamente o rosto para vê-lo, seus olhos verdes brilharam por um instante através das lentes de seus óculos antes de voltarem a olhar para baixo.

Ele deveria perguntar algo? Aquilo parecia estranho de várias formas. Normalmente era covarde e precisava de algum tipo de incentivo externo para fazer qualquer coisa, mas agora se via na posição oposta, a de precisar decidir sozinho.

Perguntar o nome dela? Não dizer nada, esperando que ela tome coragem para falar ou que se vá? Ou perguntar sobre o livro que ela carrega e se oferecer para acompanhá-la?

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