Fazia duas semanas desde o término com Marília.
É tão estranho pensar nisso agora, me faz ver algo que eu não tinha visto na época: eu gosto tanto de estar com Lia que até meu tempo é contado em relação a ela, quando estamos juntos, quando não estamos.
Fazia duas semanas desde o término, um mês desde que havíamos descoberto que mamãe não estava tomando os remédios, ela foi internada por causa de uma intoxicação e ficou no hospital por uma semana inteira. As coisas estavam insuportáveis, eu estava com raiva de Marília por não ter me contado, com raiva da minha mãe por ter dito para ela não contar. Mas a pior parte foi ter que passar por aquilo sozinho. Eu tinha meus irmãos comigo, mas Beca estavam mal também e André quase não tinha tempo de vir para cá. Eu estava com raiva, mas queria Lia comigo naquele momento. Minha mente era uma bagunça. Acabamos terminando, não com palavras explícitas, mas dizem que atos valem mais que palavras.
Eu estava na faculdade numa aula muito chata de "introdução a engenharia química", é, eu sei, era a matéria base do meu curso e eu não gostava dela, não podia ser um bom sinal. Meu celular tocou, era o psiquiatra da mãe, meu corpo todo estremeceu. Saí da sala em silêncio e atendi a ligação assim que pisei no corredor.
— Pietro? É o Antônio, tudo bem? – Ele falou.
— Oi, Antônio. Aconteceu alguma coisa? – Quem precisa de educação quando se está preocupado?
— Na verdade, sim. Tenho ótimas notícias. – Ele fez uma pausa. Lembro de ter ficado com tanta raiva pelo suspense que quase mandei o cara para aquele lugar.
— Quais?
— Sua mãe aceitou voltar a tomar os remédios. Há quatro dias.
— Isso é ótimo! Por que está me contando só agora?
— Eu queria esperar mais, saber se eles iriam mesmo funcionar, mas sua mãe me convenceu a contar logo. Ela está orgulhosa de si mesma, quer que você também fique.
— É claro que estou orgulhoso! Vou ligar para ela agora. Valeu, Antônio!
— Pietro, espere. A expectativa de melhora é de alguns meses, não se empolgue demais, combinado?
— Pode deixar.
Então mamãe tinha finalmente, realmente aceitado tomar os remédios. Era um sinal de melhora. Mandei uma mensagem para Beca contando as novidades, ela respondeu com "tô dando gritinhos de alegria :')".
— Mãe? Antônio me contou! Eu estou estupidamente feliz! Como está se sentindo hoje?
— Filho. Um pouco melhor que o normal. Espero que esses remédios funcionem mesmo. – Era um dos dias bons em que ela parecia quase sã.
— Eles vão, mãe.
— Como estão as coisas por aí?
— Bem, tá tudo bem.
— E a Marília?
— Não sei.
— Pietro, eu preciso te dizer...
— Eu sei. Não foi culpa dela.
— Que bom que sabe.
— Preciso voltar para aula agora, tá? Fica bem.
— Boa aula, filho.
E foi mesmo uma boa aula. Não a aula em si.
Enquanto o professor explicava algo no qual eu não tinha o menor interesse, tive um insight. Nada daquilo fazia sentido. Eu não gostava do meu curso e não queria continuar nele, então arrumei meu material, me despedi de uns amigos (que não entenderam nada na época) e fui embora. O que eu ia fazer a partir dali? Eu não tinha ideia, mas seria algo que me deixasse de fato satisfeito.
Andei pelo campus prometendo voltar para um curso diferente em agosto. Eu esperava que até lá já tivesse descoberto o que queria da minha vida. Spoiler: eu ainda não tinha, escolhi outro curso, mas desisti dele no fim do ano. Às vezes é difícil se encontrar, mas, eventualmente, acontece. Experiência própria.
Fui até o Diretório Acadêmico da faculdade e desfiz a minha matrícula. Não tinha mais volta. Eu me sentia ótimo. Peguei o metrô até o outro lado da cidade, fui a um museu e depois comi churros na praça, jogado num banco enquanto pensava na vida. Mais tarde, fui até a casa de Beca contar tudo. Ela surtou, disse que eu estava louco e perguntou o que raios eu faria até agosto, não que eu soubesse a resposta.
Quando fui embora, um pouco mais preocupado que antes, resolvi comprar uma garrafa de água. Foi a melhor decisão que tomei naquele dia. E olha que a de deixar meu curso tinha sido ótima.
Acontece que esse lugar onde entrei para comprar água, vendia açaí e Marília estava lá, fazendo um pedido.
— Um açaí de 300ml com morango, por favor. – Ela pediu.
— Ué, desistiu de tentar encontrar açaí com brigadeiro? – Perguntei sem nem pensar sobre o que estava fazendo. Aparentemente, eu estava impulsivo naquele dia. Ainda bem.
— Na verdade, descobri que outras opções também podem ser boas. – Respondeu, com uma sobrancelha inclinada. Aquilo pareceu uma indireta. Estávamos mesmo falando de mistura de açaí? Descobri mais tarde que não.
— Mas talvez nenhum deles seja tão bom quanto o de brigadeiro. – Entrei na brincadeira.
— Quem sabe. – Deu de ombros, pegando o açaí e me dando as costas. Eu a segui.
— Sabe, você nunca me devolveu "Garota no Trem". – Comentei, ela parou e virou para mim com a testa franzida.
— Engraçado, jurava que você tinha dito que eu podia ficar com ele.
— Mudei de ideia.
— Hã. – Não foi uma resposta, foi um barulho. Os olhos de Marília encaravam os meus em dúvida. Ela não sabia onde eu queria chegar.
— Onde você quer chegar, Pietro? – Inqueriu. Eu pensei por segundos suficientes para ela me dar as costas de novo.
— Toma esse açaí comigo. – Me coloquei ao seu lado novamente.
— Não posso, já tenho companhia. – Disse, apontando com a cabeça para duas meses à frente. Quem era aquele? Spoiler: um colega de curso que a chamou para sair.
— Hã. – Minha vez de fazer o barulho estranho. Ela ergueu uma sobrancelha, esperando uma reação melhor. — Eu gosto de você. Eu estava errado por aquilo da Gabriela, não era seu segredo para contar. – Fiz uma pausa. — Nem o da minha mãe.
Lia estava com uma expressão perplexa. Não parecia que ela iria responder, então continuei:
— Me desculpa. Eu nunca quis você longe de mim. Não tem sentido terminar com alguém que você gosta no primeiro sinal de problema. Não é assim que relacionamentos funcionam, temos que tentar consertar as coisas antes de desistir delas. Juntos.
— Pietro, eu... – Olhou para a mesa onde o colega estava, ele deu um leve sorriso, quase como se compreendesse a situação, mas eu não queria ser um babaca.
— Continue seu encontro, ele parece ser um cara legal. Se você não se divertir, se achar que vale a pena tentar de novo comigo, para valer dessa vez, me procure mais tarde, ou amanhã. – Ela pensou por alguns segundos.
— Ok. – Concordou. Eu realmente esperava que aquele encontro fosse péssimo. Sem ofensas ao cara, ele parecia mesmo ser gente boa. Lia deu um leve sorriso e foi até a mesa, se desculpando com o garoto pela demora, ele disse que entendia, não ouvi o resto, por mais que quisesse, seria estranho ficar ali.
Percebi que acabei esquecendo de comprar a água e eu realmente estava com sede. Tudo bem, eu podia encontrar outra lanchonete no caminho. Continuei andando, enquanto pensava onde poderia ter outra, incrível como mesmo passando por lá há três meses, eu ainda não conhecia as coisas direito.
— Pietro! – Uma voz muito conhecida me chamou, não consegui conter um sorriso e me virei para encontrar Marília correndo em minha direção.
— Rápido assim? Eu sabia que açaí com morango não era assim tão bom, só achei que desse para aproveitar um pouco mais.
— Cala a boca. – E se colocou na ponta dos pés, alcançando meus lábios. Seus braços foram para o meu pescoço, enquanto os meus envolveram sua cintura. Eu não a deixaria ir embora tão cedo daquela vez.
*********
AAAAAA, FINALMENTE!
OI!
Espero que todo mundo fique feliz com o epílogo (até aqueles que tinham gostado do final triste). Acho que Marília e Pietro mereciam ficar juntos depois de tudo isso, ou pelo menos tentar de verdade. Não sei por quanto tempo eles vão ficar juntos depois desse final, depende de muita coisa, mas, principalmente, deles mesmo, né? Vocês podem imaginar o que quiserem.
Mais tarde eu escrevo os agradecimentos bonitinho.
AH! Deve ter mais uns dois capítulos com cenas extras, que não fazem necessariamente parte da história. Tipo como foi a conversa com o garoto que estava no encontro com a Lia e uns acontecimentos depois desse final. Aguardem.
Eu vou postar mais histórias em breve, então se vocês gostaram dessa aqui, não me abandonem, ok? E se não gostaram, tentem ler as outras, prometo que elas estarão mais bem estruturadas.
PS: alguém consegue pensar numa música que encaixe nesse capítulo?
Bjbj ♥