Secrets

By sweetcabello21

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"Como podemos nós pretender que os outros guardem os nossos segredos se nós próprios os não conseguirmos... More

Prólogo
Capítulo I
Capítulo II
Capítulo III
Capítulo IV
Capítulo V
Capítulo VI
Capítulo VII
Capítulo VIII
Capítulo IX
Capítulo X
Capítulo XI
Capítulo XII
Capítulo XIII
Capítulo XIV
Capítulo XV
Capítulo XVI
Capítulo XVII
Capítulo XVIII
Capítulo XIX
Capítulo XX
Capítulo XXI
Capítulo XXII
Capítulo XXIII
Capítulo XXIV
Capítulo XXV
Capítulo XXVI
Capítulo XXVII
Capítulo XXVIII
Capítulo XXIX
Capítulo XXX
Capítulo XXXI
Capítulo XXXII
Capítulo XXXIII
Capítulo XXXIV
Capítulo XXXVI
Capítulo XXXVII
Capítulo XXXVIII
Capítulo XXXIX
Capítulo XL
Capítulo XLI
Capítulo XLII
Capítulo XLIII
Capítulo XLIV
Capítulo XLV
Capítulo XLVI
Capítulo XLVII
Capítulo XLVIII
EPÍLOGO

Capítulo XXXV

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By sweetcabello21

3/4

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Camila POV

Aeroporto. Lugar de encontro, de desencontro, de choros, de chegadas e partidas. Espaço para reencontros, onde a distância aumenta ou diminui. A alma vadia pelos cantos e as histórias estão impregnadas no ar. Cada concreto traz uma bagagem perdida, uma história de amor, amizade, companheirismo. Cada história uma peculiaridade, um mundo de mistérios. Um mundo dentro de nosso mundo. O tempo não acaba. O tempo não chega. Em cada corredor o relógio move-se de forma desregular, seguindo apenas a história que cada um possui. Cada piso carrega fragmentos de vidas e ao mesmo tempo recorda cada lágrima absorvida. A partida é suave. A chegada é turbulenta. As bagagens invisíveis são mais pesadas, pois carregam momentos e identidades. Os medos são revelados, a saudade finda, a angústia aumenta. Entre rostos quebra-cabeças são montados, peças são encaixadas. Vultos, anjos e demônios. São bagagens, nomes, vidas, sonhos e aspirações. São tantas histórias reunidas.

Aeroporto. Passagens, choros, sorrisos, filas, abraços, embarques, desapego, documentos nas mãos, passageiros, letras e números, alegria, tristeza, saudade, normas, despacho de bagagens, lembranças, cada um carrega uma bagagem em sim. Com suas lendas e mitos aeroportos ainda me trazem medo, a angústia da perca, as lembranças do abandono, a solidão da partida, as lágrimas derramadas, os momentos sufocantes, minhas escolhas, a turva lembrança de cada passo dado e ao mesmo tempo à distância nos separando, funguei e tentei afastar as lembranças corrosivas de minha mente.

Ao longe em meio à multidão de vultos e rostos desconhecidos, reconheci quem eu esperava. Sorri ao ver que mesmo com o tempo ainda continuavam tão elas, imutáveis em sua essência. Vero carregava Anne em seu colo, que parecia dormir vencida pelo cansaço. Suas mãos entrelaçadas com a de Lucy, que carregava a inseparável boneca de pano de um único olho de sua filha, ela buscava um rosto familiar no meio àquele caos de histórias e vidas. Ela sorriu ao visualizar meu rosto, percebi Vero resmungar baixinho antes de seguirem a minha direção.

- Meu Deus! – Vero exclamou. – Sexo lésbico tem te feito bem. – riu maliciosamente. – Olha esses olhinhos brilhando e essa bochecha corada. – riu da minha cara, Lucy estapeou meu braço. Vero gemeu. – Por que eu apanho? – resmungou. – Essa vaca passa um ano sem contar sobre a volta da que não foi e na cara de pau liga, atrapalha nossa viagem à Paris e eu apanho por dizer a verdade. – virou o rosto, fingindo-se de ofendida. Lucy negou com a cabeça e sorriu ao me encarar novamente, me puxando para um abraço apertado logo em seguida.

- Ignora... – sussurrou. – O tempo passa, mas ela continua a mesma garota irritante e provocadora por quem me apaixonei. – beijou meu rosto. – Não acredito que ela voltou. – Lucy segurou meu rosto, seus dedos acariciando minha face. – Eu ainda não acredito que meu casal favorito está de volta à ativa, isso soa como uma série e estamos na segunda temporada ou algo do tipo... – pôs-se a tagarelar, sua voz trazendo certa nostalgia.

- Série? – questionei divertida. – Isso tudo é como uma verdadeira novela mexicana. – confessei. Vero puxou Lucy para longe de mim e logo me abraçou, um abraço sem jeito porque Anne ainda estava em seus braços. A pequena parecia absorta ao mundo ao seu redor. O cansaço da viagem lhe conferindo um bom sono.

- Estou pensando seriamente em parar de dar comida a essa menina. – puxou o corpo dela para cima, que escorregava. – E você – olhou para mim desafiadoramente. – quero toda a verdade, cada vírgula sombria que você ocultou na sua ligação reveladora. – beijou meu rosto.

- Veronica. – Lucy repreendeu. – Deixe de ser invasiva. – Vero deu de ombros ignorando a repreensão da mulher.

- Estou louca para ver aquela vadia novamente. – sorriu. Um sorriso diabólico e infantil, que apenas Veronica Iglesias conseguia reproduzir. – Algo me diz que vai ser um encontro muito interessante. Onde ela se encontra? – Lucy puxou o carrinho com as bagagens.

- Saiu para levar o David ao shopping.

- Que meigo... Mãe e filho. – Lucy prendeu seu cabelo. – Deve ser uma verdadeira bobona perto dele. – concluiu. – Como foi que todo esse mundo de segredos foi revelado. – refez o coque em seu cabelo. – Confesso que estou com certa curiosidade... – Vero abafou um riso.

- Chegando a minha casa eu conto cada detalhe sombrio. – imitei a voz de Vero. - Aqui não é bem, na verdade... – olhei ao redor. – Não gosto muito de aeroportos, pois tenho péssimas lembranças. – fiz careta. – Mas sobre David e Lauren, ela definitivamente não consegue nem colocá-lo de castigo... – neguei com a cabeça. – E morre de ciúmes dele. – sorri discretamente. – Então não se surpreenda se ela se arder ao ver David e Anne interagindo. – Lucy arregalou os olhos e Vero gargalhou, mas tampou a boca assim que a garotinha remexeu em seus braços.

- Ela vai acordar com um humor do cão, então diminua seus escândalos. – Lucy repreendeu. Vero baixou a cabeça, ela podia ser o que for, mas bastava apenas a sua mulher aumentar o tom de voz, que ela sabia que tinha que parar.

[...]

Em casa Vero acomodou Anne no sofá enquanto eu preparava um café quente na cozinha. Lucy acomodou as bagagens maneiras no quarto de hóspede, que aguardava por elas, as mais pesadas ficariam para Veronica.

- Meu bebê está aquecidinho e ronronando na sala... – Vero entrou na cozinha. Lucy estava sentada, apenas a esperávamos para eu começar o relato. – Passou a viagem quase toda tagarelando, pensei que a bateria fosse eterna. – fingiu limpar o suor da testa. – Ela está na fase do por que e isso é tão fofo e constrangedor. – suspirei ao lembrar-me dos momentos vergonhosos que as perguntas de David me fizeram passar. – Tudo é um grande por que!

- Sei como é isso! – abri o armário e peguei três xícaras.

- Como você lida com esse momento? – Lucy levantou e foi ao armário pegar o pote de biscoito.

- Nos primeiros por quês eu respondia pacientemente, mas não importava a resposta sempre aparecia outro por que até que eu ficava sem argumento. – servi-nos de café. – Depois aprendi a contornar as respostas ou desviar sua atenção. – Lucy pegou um prato e colocou na mesa. – Comida o distrai rapidamente, então tenho isso ao meu favor. – vanglorie-me. Coloquei alguns biscoitos no prato. Vero levantou e pegou adoçante, elas eram uma parte da família e conhecia cada pequeno detalhe da casa.

- Pronto. Comida e bebida na mesa então comece sua história. – colocou algumas gotas de adoçante. – Garota eu te ligo sempre que posso e você nunca se lembrou de mencionar algo como... – mordiscou o biscoito. – Eu terminei com o Seth ou... Sabe aquela branquela gostosa e amiga de vocês? Eu voltei pra ela... Mas não as respostas eram as mesmas. Sempre falando como se ainda estivesse com Seth, "Está viajando", "Está trabalhando", "Está bem...", sempre coisas vagas e a última, que não foi resposta ensaiada, disse que ele mudou o visual... – revirou os olhos. – Custava um relato menos vago da sua vida?

- Queria que eu relatasse todo meu drama pessoal por telefone? – me defendi. Bebi um pouco de café. – Na verdade foi tudo tão confuso. Lembro que eu só conversei com meus pais sobre a Lauren está na cidade dois meses depois que ela descobriu ser a mãe do David. Ela já estava morando com a Taylor e decidida a entrar na vida do filho e infernizar a minha.

- Minha amiga desestruturou o seu mundo de faz de conta. – concordei com o comentário de Lucy.

- Como ela descobriu? – Vero questionou visivelmente curiosa.

- A história é tão longa que vou contar ao longo dos dias que estiverem aqui porque ela deve está para chegar e eu não quero estar aqui nesse momento de vocês. – peguei um biscoito. – Certo dia a Normani ficou de pegá-lo na escola e esqueceu, ele independente como sempre saiu sem ninguém ver e graças a Deus chegou a salvo na casa da Tay, Lauren estava lá e de malas prontas para ir a Miami. Foi nosso primeiro reencontro, trocamos algumas farpas e insultos. Naquele momento eu a tratei como se não me afetasse, mas meu coração e cabeça entraram em choque, em uma pequena batalha que a cabeça ganhou. Ela foi pra Miami e juntou algumas peças soltas e voltou... – bebi um pouco mais. – Quando nos enfrentamos novamente ela já sabia a resposta, mas mesmo assim fez a minha temida pergunta, se David era filho dela. Depois nós éramos gritos e grosserias, eu era. Trocamos ameaças, insultos, às vezes eu queria matá-la, mas nunca soube se na época era porque sua presença me irritava ou abalava o que eu julgava ser uma estrutura bem montada. – olhei para xícara e depois para as mulheres a minha frente. - Meu relacionamento com o Seth, que para mim era feito de aço, no fim foi construindo em cima de areia movediça. Seth decidiu ser engolido e levou consigo tudo o que tínhamos para que Lauren e eu nos acertássemos. E hoje vejo o quanto fui tola ao tentar renegar esse sentimento, ao tentar silenciar meu coração. – sorri boba. Vero e Lucy me olhavam de forma concentrada, acompanhando cada vírgula do meu relato. – Porque eu amo Lauren, eu não amo sua beleza, na verdade suas risadas provocam o rebuliço em meu estômago. Eu não amo seus olhos, não me entendam mal – tentei procurar as melhores palavras. -, quer dizer eles são lindos, mas eu amo o que eles transmitem... O universo de sentimentos particular dela. Eu não amo sua boca, me delicio com as palavras que ela profere. Não há como negar o óbvio. Lauren é minha liberdade ao mesmo tempo em que é minha prisão. Ela me irrita, me provoca, me desloca e faz com que eu me reinvente... – suspirei sem mais palavras ou com palavras demais para ser exposta. Algumas palavras devem ser guardadas para ser contempladas na solidão das lembranças, na nostalgia dos momentos porque quando Lauren não está presente são essas palavras que me acalentam, me ninam e agitam minhas memórias.

- Aaaaaaawwn – completaram ambas. Elas se entreolharam de forma apaixonada e senti uma pequena vontade de vomitar. Vero deitou a cabeça no ombro da mulher.

- Agora que o Seth não é mais figura presente, eu posso dizer o quanto o achava um palerma, quer dizer com todo respeito, ele é um ótimo homem e sempre cuidou de vocês, então já ganha pontos por isso, mas Camila você é lésbica demais para ser feliz com um homem. – confidenciou. Rolei os olhos, segurando o riso para não mostrar que ela tinha um pouco de razão. – Nunca opinei um dedo em suas escolhas, mas ele... – colocou a língua pra fora e fez careta. – sem comentários.

- Deixe de ser venenosa. – Lucy ralhou sem aumentar o tom. – Vá olhar nossa pequena travessa... – Lucy esperou Vero sair para prosseguir o assunto. – Você acha que ela nos odeia?

- Ódio é uma palavra forte, mas ela guarda um poço de mágoas... Até eu fiquei visivelmente surpresa quando soube que vocês, as três mosqueteiras, não mantinhas mais contato.

- Não foi planejado, mas... – respirou fortemente. – Não há desculpas, sei que erramos feio, mas tudo foi tão impactante que acredito que foi nosso mecanismo de defesa para tudo o que estava acontecendo.

- Ela vai querer nos matar. – Vero completou entrando na cozinha. - Anne ainda dorme. – informou. – Estou com medo da energia que ela vai ter após acordar... Mas sobre Lauren... Conhecendo-a como conheço, na palma da mão, não vai ser uma batalha fácil. – beijou a cabeça de Lucy. – Sei que temos uma puta culpa nisso tudo, mas essa conversa está mais para confronto do que para um diálogo civilizado. – colocou os braços nos ombros da mulher. – Eu gosto de conquistar as coisas mais difíceis. – piscou, Lucy gargalhou, pois o comentário referia-se também a ela.

- Vamos para sala antes que Anne acorde e não nos encontre. – Lucy chamou. – Quero aproveitar os momentos com minha filha antes que Lauren nos mate.

Lauren POV

Quando criança, nós somos atormentados pelos monstros que se encontram debaixo da cama, ou os que se escondem dentro do guarda-roupa. Dormir com a luz apagada é tão pavoroso. O escuro nos remete à solidão da nossa vida, é o momento em que estamos mais vulneráveis para sermos atacados, é quando o nosso subconsciente se aproveita para criar através do nosso imaginário os nossos piores pesadelos, o bicho-papão aparece sorrateiramente para puxar nosso pé.

Crescer é um processo árduo e doloroso, mas isso não torna a vida mais fácil. Os monstros não desaparecem, eles apenas evoluem, o bicho-papão torna-se as contas, os amores perdidos, o fracasso na carreira, na vida escolar. A luz apagada continua a nos trazer medo, mas somos obrigados como adultos a nos fingirmos de forte quando o que mais queremos é o colo de nossa mãe. Mas não existe um monstro pior do que o seu passado porque não importa onde você esteja ele volta quando você menos imagina para trazer à tona todos aqueles medos que você julgava ter superado.

E lá estava meu bicho-papão na minha frente, dividido em dois, um sorriso angelical e um diabólico. E eu senti-me de volta aos dias de fogo, a solidão mascarada por uma pseudo-felicidade, eu senti estar de volta em Londres aos momentos de desespero em que eu ligava para as minhas amigas em busca de consolo e elas sempre diziam estarem ocupadas ou que no momento não podiam falar. Lá estavam Veronica e Lucy, perto da escada olhando pra mim.

Eu queria voltar a ser criança e ter apenas medo do monstro que se escondia debaixo da minha cama. Talvez naquela época meu bicho-papão fosse mais fácil se enfrentar, agora olhando para aqueles pares de olhos eu não tinha forças para enfrentar meu passado, que eu julgava superado.

- O que vocês fazem aqui? - fui rude.

- Viemos visitar uma amiga. - Veronica respondeu. Seu sorriso nunca inabalável.

- Eu não convidei vocês. - retruquei.

- Na verdade, quando eu disse "uma amiga", não me referi a você. - tampou a boca para esconder seu sorriso. - Eu me referi a Camila, mas você pode ser incluída nessa lista, pois precisamos mesmo conversar. - armei todas as minhas defesas. Vi Lucy cotovelar a barriga da outra. Veronica gemeu de dor.

- Estou brincando! - respondeu depois de apanhar de Lucy. - Estamos aqui para conversar com você.

- Cadê a Camila? - ignorei sua resposta.

- Camila não se encontra. - Lucy respondeu. Sua voz sempre tranquila e paciente, diferente da de Veronica. - Ela saiu para nos dar um pouco de liberdade. - prosseguiu

- Eu não quero conversar com vocês, nós não temos nada a conversar. - fui firme.

Segurei-me no corrimão da escada, estava com medo de cair, com medo de ser sugada pelos meus monstros. Veronica continuou me olhando, talvez procurasse as palavras certas ou talvez mais uma piadinha para jogar.

- Tanto tempo se passou Jauregui e você ainda continua com a mesma arrogância. É... – expirou. - Certos hábitos nunca mudam.

O tempo parecia não passar. O relógio havia decidido desacelerar a passagem dos segundos, um tique-taque irritante soava em minha cabeça. Um martelar dos medos, dúvidas, raivas e frustrações acompanhavam o ritmo descompassado do passar do tempo que mesmo parecendo não andar prosseguia normal. Uma distância não significativa nos separava.

Três corpos, uma casa, uma história e muitas lacunas a se preencher. Na minha frente estavam elas, que cresceram comigo e deveriam ser minhas melhores amigas. Para mim, a representação daqueles corpos trazia o medo do abandono e do esquecimento. Pois, fui facilmente trocada pelos empecilhos do dia-a-dia. "Não posso", "Tenho reunião", "Estou cansada", "Minha cabeça está doendo". Desculpas e mais desculpas eram desenterradas da minha mente. As lembranças de cada fala quando eu ligava atormentada pelos meus medos. Eu tinha feito à escolha certa? Eu deveria voltar? Eu precisava de um conselho, de palavras amigas, mas delas apenas desculpas. O que separava mais não era à distância, era a falta de interesse por parte delas, de manter o nosso relacionamento. Um relacionamento que, quando crianças, juramos nunca ter fim, e foi tão facilmente substituído pela correria do dia-a-dia.

- Eu não quero repetir de novo. - aumentei o tom de voz. - Por favor, retirem-se da minha casa.

- A casa é sua? - Veronica riu novamente. - Até mais cedo minhas fontes diziam que a casa era da Camila. Você está bem avançadinha! – ela debochou, o sorriso pretensioso sempre presente.

- Você entendeu o que eu quis dizer. - urrei. O descontrole fazia minha voz aumentar, mas ao mesmo tempo meu subconsciente gritava, alertava-me que uma criança dormia no recinto. - Por favor, não temos mais nada o que conversar. Tudo que devíamos ter conversado já foi explicado nas lacunas não preenchidas no silêncio de ambas. Eu liguei pra vocês, mas vocês não me retornavam. Vocês não tinham tempo... Não digam que temos assuntos pendentes, nossos assuntos foram resolvidos nas reticências da falta de fala de vocês, nos suspiros derrotados e na apatia por manter uma conversa comigo, nas desculpas esfarrapadas. Retirem-se daqui. – ordenei. Sentia minha cabeça latejar.

Lucy deu dois passos para frente, seu olhar ao mesmo tempo transmitia medo e saudade, minha pequena encontrava-se tão diferente e ao mesmo tempo tão igual.

- Por favor, Lauren, ignora as brincadeiras infantis da Veronica. - Vero fez careta. - Temos que conversar. Há coisas que devem ser explicadas...

- Não há nada a ser explicado. - interrompi seu discurso. - Vocês sabiam dessa merda, de toda essa verdade, mas decidiram ocultar de mim. Eu pensei que vocês eram minhas amigas, mas vocês escolheram o silêncio, vocês optaram por defendê-la. Vocês tinham que me apoiar. Ligar-me, ir atrás de mim ou ter feito alguma merda para que eu soubesse dessa porra toda.

O sorriso divertido de Veronica foi substituído por uma carranca. Percebi ela respirar fundo, estava prestes a explodir. Ela sempre foi a que teve pavio curto. Éramos parecidas nisso.

- Não jogue a bomba de suas escolhas pra mim ou para nós. Você foi embora, você fez sua escolha sem ao menos lembrar que tinha amiga, que tinha a quem recorrer nesses momentos. Era pra isso que a gente existia. Éramos um triângulo, toda vez que alguém precisasse, as outras estariam dispostas. Você acovardou-se, você fugiu. – apontou o dedo em minha direção. - Você não ligou pra nós, não venha dizer que somos culpadas.

- Vocês tinham o dever, a obrigação como amiga de me ligar, de me procurar e dizer a verdade.

- Não tínhamos dever nenhum a partir do momento em que você decidiu nos tirar da sua vida como quem tira um pedaço de chiclete do sapato. Você foi embora, você não ligou. Eu ligava para o seu celular e dava desligado, ligava pra Camila e ela não me atendia... – respirou fundo e prosseguiu. - Eu vim aqui e não tinha ninguém, eu tentei procurar vocês, supus que vocês estivessem em Miami. Fui atrás da Taylor e ela sempre me evitava, até que ela disse que você foi embora, não explicou mais nada e ainda se surpreendeu por eu não saber da história. – seus olhos sempre fixos nos meus. - Dois - frisou a palavra dois. - meses depois de ter ido embora você lembrou-se de mim, você lembrou-se de nós. Uma ligação curta Lauren, uma ligação de 5 minutos. – mostrou-me os cinco dedos da mão direita. - Ainda hoje me lembro de suas palavras. "Terminei com a Camila, me mudei pra Londres e estou feliz aqui. Por favor, nunca mais toque no nome dela. Estou indo trabalhar, depois falo com você...", eu nem cheguei a processar a frase e você já havia desligado. Essas poucas palavras misturadas com respirações descompassadas e falta lúcida de uma estrutura vocabular, indicaram-me que você estava meio alterada. Você nos abandonou. Você acha que eu senti o quê? Minha irmã, porque nós crescemos juntas e você é como uma irmã pra mim. Minha irmã simplesmente partiu sem me avisar... Você ouviu aquela babaca, aquele projeto de loira, você ouviu a Alexa e foi embora, você simplesmente esqueceu-se da gente. Você acha que eu não senti? Você acha que não tive vontade de viajar pra Londres e te estapear? – ela negou com a cabeça, meus olhos ardiam pelas lágrimas que eu não permitia derramar. - Ah como eu quis matar você, esganar você por ter me trocado tão facilmente por garotas, ou pela Alexa que nunca na verdade quis sua felicidade. Ela é uma encubada que é apaixonada por você. - arregalei os olhos. - Você nunca percebeu? Basta notar o quanto essa escrota fez e faz de tudo para que não fique com a Camila porque quer você somente pra ela... – vendo minha cara ela continuou. - Não me diga que você foi tão ingênua a ponto de nunca notar o quanto a Alexa é loucamente apaixonada por você, tudo que ela faz é apenas para te ter como propriedade como se você pertencesse a ela. - tentei abrir a boca e contra argumentar, mas Veronica não deixou, prosseguiu seu discurso - Eu encontrei um dia com a Camila, com a barriga saliente, perguntei o que tinha acontecido. Ela disse simplesmente que vocês terminaram e que não queria tocar mais no assunto. Mas Laur mesmo ela comendo feito três... Aquela barriga não era uma barriga comum. Ela tentou me negar de todas as formas, tentei pressionar a Taylor e todos que estivessem a nossa volta, e não desisti até descobrir a verdade. Ela disse que estava grávida, e que era de um amigo dela, mas todos nós sabemos que a Camila é lésbica o suficiente para nunca encostar perto de um homem, como ela ficaria grávida? Aquela história dela ter seguido em frente e engravidado de um amigo não desceu... Passei uma semana atrás dela até que descobri de tanto a pressionar, ela disse a verdade. Ela me contou o que aconteceu, eu quis te matar por ter desistido tão fácil, por ter acreditado numa fatídica coincidência ou falta de sorte do destino. – falava tudo apressadamente. - Parecia mesmo uma piada de mau gosto, como se vocês não tivessem predestinadas a ficarem juntas. Você foi embora, por culpa de um acidente, isso prova que um segundo das nossas vidas é suficiente para mudar todo o nosso caminho. Imagine se naquele segundo a Camila não tivesse derramado vinho, tente imaginar o que seriam hoje... Não, não imagine, não tente, é frustrante tentar viver de passado. Mas não me julgue como culpada. Nessa história não há santos e demônios, inocentes ou culpados, existe apenas ações e reações, atos e consequências. Você fugiu, ela ocultou essa verdade. – a voz dela ecoava em minha mente e junto com ela os meus medos eram gritados pelos demônios que eu criava em minha cabeça. - Eu nunca fui amiga da Camila, eu era sua amiga – apontou novamente para mim. - Incontáveis as vezes que eu te liguei e você estava bêbada e desligou na minha cara, ou alguém atendia. Cansei de mandar você voltar, de tentar fazer com que você me escutasse e você, nos seus momentos de embriaguez, me mandava parar de tocar no nome dela, me mandava seguir minha vida, que você estava feliz seguindo a sua. Eu fiz o que você pediu. Você impôs uma ação, cada um reagiu como pôde, o instinto da Camila foi defender-se, o meu foi ignorar. Se você foi covarde o suficiente para não olhar pra trás, cabia a eu tampar os olhos e esquecer que você existia. Decidi seguir minha vida em um lugar que não me lembrasse de você, o vazio que você provocou em nossas almas era enorme. Eu pedi minha transferência pra Porto Rico, eu já estava com quem eu tinha que estar, então nós estávamos dispostas a seguir nossas vidas, e você não estava feliz seguindo a sua? Pegando mulheres e mulheres, saindo, trabalhando, ganhando, divertindo-se. A liberdade utópica de todo solteiro, dinheiro, festa, farra, sabe-se lá que coisas lícitas e ilícitas você se envolveu. Não nos julgue... – inspirou profundamente. - Estávamos perto de nossa mudança, quando a notícia que o filho da Camila havia nascido. Eu não queria o ver, eu não tinha necessidade de afundar mais nesse mundo de mentiras e intrigas, não cabia a mim ou a nós, nos sujar nessa lama imunda de segredos, mas a Lucy pediu, ela disse que tínhamos a obrigação de vê-lo. – eu era bombardeada por informações. - Assim que a Camila voltou pra casa fomos visitá-la. Lauren... – lágrimas rolavam pelo rosto delas. - Eu coloquei meus olhos naquele ser minúsculo, branco, de cabelos castanhos escuro, o meu subconsciente me jogou para uma lembrança de quando nós tínhamos dez anos e ambas planejávamos nossos casamentos com nossos verdadeiros príncipes encantados, você me fez prometer que não importasse o que acontecesse conosco no futuro, se seu filho precisasse, eu moveria mundos e fundos para ajudar. E lá estava ele, aquele pequeno ser, assim como você prometeu cuidar dos meus filhos, eu não podia simplesmente me afastar da vida do meu sobrinho, porque você mesmo sendo uma vadia ainda é como uma irmã... David é nosso sobrinho. - referiu-se a ela e Lucy. - Lá estávamos nós, Lucy e eu, abobalhadas por aquela criança, que quase não resmungava, apenas chorava calmamente, tão sereno, todos seus traços foram esculpidos cuidadosamente nele. – Vero riu em meio às lágrimas. – O irônico é que mesmo se Camila seguisse em frente sempre te carregaria com ela em forma de um garoto apaixonante... – secou algumas lágrimas com as costas da mão. - Eu não queria ter mentido, na verdade eu não queria que essa merda tivesse existido, mas não existe um botão que volte para o passado, então, não me culpe por toda a sua merda, por toda essa merda. Eu tenho culpa, você tem culpa, Camila tem culpa, Lucy tem culpa, seus irmãos têm culpa, os únicos inocentes são aqueles que não sabem a verdade, cada um teve um direito de escolha e por mais que minha escolha tenha sido inclinada à resposta errada, em nenhum momento Camila apontou uma arma na minha cabeça. Eu escolhi movida pela mágoa, pela raiva, pela tristeza, eu escolhi isso, mas não jogue na minha cara como se eu fosse à única culpada. Assim como eu não tenho o direito de te culpar por nada... - o discurso de Veronica morreu, Lucy olhou pra mim. Eu não sabia o que dizer, eu não queria mais ouvir.

- Eu não quero ouvir vocês! - gritei.

- Lauren, você não tem querer. – Lucy insistiu, tentei tampar meus ouvidos e ignorar suas palavras, mas sua voz ressoava em minha cabeça. - Estamos aqui porque temos que colocar o ponto final no lugar dessa reticência. Só podemos virar uma página quando a anterior for escrita, enquanto essa página continuar incompleta, nós não conseguiremos seguir em frente, sempre faltará essa lacuna. Não queremos recuperar o tempo perdido, não há como voltar aos dias e anos que se passaram. Os momentos que não foram compartilhados, não há como voltar. Mas estamos aqui porque nós amamos você, porque assim como você se deu uma nova chance para perdoar seus erros e perdoar os outros que também erraram, nós também estamos aqui, tanto para perdoar o seu, como para tentar nos redimir pelo nosso. – ela abriu os braços. - De cara limpa para pedir desculpa por nossas falhas, por nossas escolhas. Não há como julgar o que teria acontecido e nem justificar o injustificável, mas nós queremos apenas corrigir as falhas para que nós possamos seguir em frente, juntas ou em caminhos separados, mas você tem que manter a mente aberta. Nós somos humanos e suscetíveis a erros e falhas. Sim, nós falhamos e admitimos isso, e não a culpamos também, por mais que a Veronica a tenha culpado. Porque é contraditório dizer que você é a única culpada se nós como amigas escolhemos o caminho mais fácil, a negação... Talvez naquela época vocês não estivessem prontas para esse relacionamento, mas conversando com a Camila hoje, eu vejo o quanto vocês amadureceram, todos amadurecemos. O destino trabalha de uma forma cômica, e talvez fosse essa forma que ele encontrou para que evoluíssemos o nosso espírito, nos tornando... – pausou. - Não há palavras, não há definições do que nos tornamos. A evolução é sentida, ela não é definida, não é escrita. Palavras não pontuam o que somos agora e nem qualifica o que éramos antes. Por favor, baixe a guarda, e tente nos escutar.

Todo aquele confronto estava me desgastando. Ignorei qualquer argumento ou tentativa delas para manter àquela conversa. Corri para o banheiro, sentia que toda a comida queria voltar, meu estômago revirava. Desejei poder me esconder debaixo das cobertas até que minha mãe aparecesse e ligasse a luz, me tranquilizando e mostrando que os monstros não existem. Sentia-me pequena e indefesa. Atirei-me ao chão do banheiro, segurei meu cabelo e vomitei, vomitei a comida e junto quis vomitar os medos, aquele encontro e todas minhas escolhas.

Encontrar Veronica e Lucy era como se as falhas e buracos do meu passado aparecessem para me enfrentar, era como descobrir que não importasse quantos passos eu desse, nunca sairia do lugar. De novo estava enfrentando meus demônios e batalhando contra a raiva e a angústia das escolhas de Camila. Como Vero havia colocado, não havia santos e demônios, mas sentia como se no fim do dia ao me olhar no espelho descobriria minha verdadeira face.

O vômito surgia em jorros, amargando minha boca, com a mão que não segurava o cabelo limpei o suor da testa. Levantei-me ao sentir que todo aquele enjoo diminuía. Dei descarga e procurei ver meu reflexo. O reflexo que apareceu no espelho talvez demonstrasse meu eu interior no momento. Cabelo desgrenhado, a pele mais pálida que o comum, olhos inchados e vermelhos. Definitivamente estava um lixo.

- Amor, abre essa porta. – batidas ecoaram após a frase de Camila. Continuei concentrada em escovar os dentes. – Lauren? – chamou novamente. Mesmo meu corpo pedindo apenas ser ninado por ela, não estava em condições de uma nova briga. Abri a torneira e lavei meu rosto na busca por recompor a minha máscara de mulher forte quando me sentia tão frágil. – Lauren. – repetiu. – Eu quero te ver. Abre essa porta e vamos conversar. – choramingou, senti-me partida ao ouvir sua súplica, mas continuei com a escovação sem tirar os olhos do espelho. Uma luta comigo mesmo era travada e no fim parecia que eu perderia. – Amor... – bateu suavemente na porta. – Deixe-me cuidar de você. – sussurrou. – Eu não vou sair daqui até você abrir a porta. Prometemos enfrentar o mundo juntas, lembra? – questionou. Escorreguei meu corpo e colidi com o chão, a cabeça encostada na porta do banheiro, sabia que Camila estava do outro lado na mesma posição.

[...]

Permaneci chorando em silêncio e ouvindo os pedidos de Camila para que eu abrisse a porta. Levantei-me quando não havia lágrimas para derramar e nenhum momento para relembrar ou refazer. Tudo era passado e eu não podia me afogar em cenas ou histórias que não voltariam.

- Você quer conversar? – Camila pulou do chão quando abri a porta. Ignorei-a. Caminhei até o closet. – Amor... – chamou-me. – Olha para mim... Você não vai embora? – perguntou assustada. Peguei meu pijama e troquei de roupa sem dirigir-lhe uma palavra, ouvia vagamente o que ela dizia, mas suas palavras pareciam pertencer a outro idioma. – Lauren. – segurou meu braço. – Você não pode me deixar sozinha... Conversa comigo. – suplicou.

- Eu não quero conversar... – sussurrei sem encará-la. – Eu não quero gritar, eu preciso dormir e pensar... – afastei-me e continuei a andar.

- Você não vai dormir comigo?

- Vou dormir com o David... – saí sem dizer mais nada.

David dormia tranquilamente. Deite-me ao seu lado procurando fazer o mínimo de barulho, meus olhos atentos para qualquer movimento dele. Ele parecia tão forte e determinado, sem medos de monstros debaixo da cama.

Contemplar seu sono trouxe uma paz, sentia que me recompunha a cada respirar do meu filho. Seus cabelos desgrenhando-se por seu rosto. Contive-me inúmeras vezes a vontade de entupi-lo de beijos.

Eu não queria pensar no pequeno confronto, toda minha atenção estava direcionada a ele. Em admirar e babar em cada traço e ao mesmo tempo uma angústia nascia em mim pelos momentos perdidos, pelas primeiras descobertas que não pude presenciar.

David remexeu-se bruscamente na cama. Entrei em modo de alerta. Sua cabeça virou-se de um lado para o outro, no rosto uma expressão de medo. Comecei a acariciar seu cabelo e sussurrar uma canção de ninar, queria afastar o que o atormentava. David remexeu-se novamente.

- Mama? – choramingou sem abrir os olhos.

- Estou aqui meu amor... – puxei seu corpo para meus braços e ele me abraçou, sua cabeça se encolhendo em meu peito. – Mama está aqui... – sussurrei. – Nada vai acontecer... – David remexeu-se novamente.Ele devia estar em algum sonho ruim, mas não estava totalmente acordado. – Calma... É apenas um sonho ruim. – balancei lentamente seu corpo, ninando-o.Sua respiração um pouco pesada foi se acalmando aos poucos. – Dorme meu amor...Mama não vai deixar que nenhum sonho ruim atormente seu sono. – beijei seus cabelos, meu corpo balançando lentamente, minha mão esquerda afagando suas costas. - Não sairei daqui. Nada te fará mal... Eu estarei sempre com você. Mama te ama... 

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Desculpe, ficou sem sentido, eu postei o capítulo, mas deu erro aqui e agora arrumei. 



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