Jude's Pov
Como ela pode fingir que a gente não fez nada?
Ela nem sequer se deu ao trabalho de perguntar se eu também queria fingir, daí agora eu só pareço um idiota tarado.
Tudo bem que eu tenho uma pequena fama, que sinceramente, eu não acho que mereço tanto assim.
Por muitos anos e por muitas pessoas eu fui chamado de Mulherengo...
E rebatendo, não é tão verdade assim.
Na realidade meu primeiro beijo foi só com 14 anos, as meninas me achavam um merdinha idiota, então eu comecei a crescer e ficar mais bonitinho e principalmente virei jogador de futebol.
As garotas tem tara por jogador. E eu só usei isso ao meu favor, não quer dizer que eu sou mulherengo, né?
Mas eu sempre gostei da Kiara, e disso todo mundo sabe.
Eu era fascinado por ela na escola, cada parte dela me fascinava. Seu cabelo longo, as roupas sempre coloridas, o olhar de quem sabe o que tá fazendo sempre. Tudo nela me chamava atenção.
Por um momento eu achei que só estava querendo ela como queria outras meninas, mas quando ela me deu um senhor fora na festa da fogueira eu percebi que eu tava apaixonado por aquela maluca.
Falando nesse fora, esse dia foi louco.
Eu nunca tinha recebido um não de nenhuma garota desde que eu tinha começado a jogar no Birmingham. E a Kiara foi a primeira e última até hoje.
Lembro que era uma noite meio fria, apesar de ser início do verão, mas estávamos em uma vibe praiana, as meninas com short e biquíni e os meninos de bermuda e chinelos.
Algo que não era bem comum pra gente.
Eu sou um pouco mais velho que ela, e na escola o respeito aos veteranos era levado super a sério. Então aproveitando disso eu aproveitava pra me aproximar.
E pra dar um empurrãozinho a mais, meu irmão e amiga, Jobe e Heloísa, sempre me ajudavam tentando chegar nela.
Nesse dia eu lembro de perguntar pra Helo qual era o mood do dia da Kiara, já que ela tinha uma pequena fama de bipolar, não saiu da minha cabeça ela dizendo que a Kiara tava bem até demais.
Ninguém sabia, mas ela tava fingindo que tava bem.
E eu fiquei sabendo da pior forma.
- Oi Kie - Minha voz saiu fraca e logo depois eu pigarreio.
- Ah, oi Jude - Ela diz um pouco distante e distraída.
- Posso sentar aqui? - Pergunto já sentando ao lado de Kiara em um tronco virado pro lago.
Ela só sorri falso pra mim. Cara como que a Heloísa se dizia melhor amiga dessa menina se nem sabia como ela tava se sentindo direito? Fala sério...
- Então, tá curtindo a festa? - Tento quebrar o gelo com uma pergunta e logo em seguida bebo um pouco do álcool em meu copo.
- Tá dando pro gasto, melhor do que ficar em casa - Ela diz, sua voz um pouco embargada na última frase.
- Ah, sim - Percebo que ela não tava afim de conversa, mas eu não sou um cara de desistir - Quer ir pra algum lugar mais... sei lá, longe dessa gente toda?
- Olha Jude, se você tá achando que sou uma dessas marmitinhas que você faz o que quer aqui, você tá achando errado - A voz de Kiara é enfática e me dá um frio na barriga.
Na verdade, um soco no estômago, na cara. Ela só tá me espancando por todo meu corpo.
- Eu não quis dizer isso... - Ela me interrompe.
- Nunca vou gostar de alguém como você - E ali foi o fim.
A garota que eu passei anos da minha vida gostando, tinha acabado comigo.
Depois dali eu a evitava ao máximo, fosse na escola ou até em casa, porque tínhamos o meu irmão de amigo em comum.
E só foi ficando mais difícil pra mim, encarar aqueles olhos que tinham tido na minha cara e em voz alta que nunca iriam gostar de mim.
Eu ainda gostava dela. Muito.
Não sei se pela rejeição eu fiquei com um instinto de fazê-la a qualquer custo gostar de mim, ou me senti desafiado. Seja o que for eu ainda gostava muito dela.
Quando a Helo foi embora as coisas entre nós ficaram pior ainda, o que já tava ruim tinha piorado, o Jobe parou de andar com ela e simplesmente os momentos que eu podia vê-la foram se esvaindo.
Ainda teve o momento que meu irmão percebeu a cagada que fez e entrou em colapso consigo mesmo e seus pensamentos.
Kiara até foi visitar ele uma vez, mas eles ficaram no quarto conversando e na hora de ir embora eu ainda tentei falar com ela.
- Kiara? Quer que eu te leve? Sua casa é longe daqui e tá chovendo - Eu digo alto quase gritando, pois o barulho da chuva inibe minha voz.
- Não precisa Jude - Ela diz, novamente enfática e com objetivo de me deixar mal.
- Porque você continua me tratando assim? Eu nem te fiz nada - Toda a minha revolta dos últimos anos por aquele fora foram soltas nesse momento.
Naquela chuva maldita, os cabelos de Kiara totalmente molhados e as roupas pesadas.
O rímel que usava nos cílios escorrendo pelo rosto, eu queria me aproximar e limpar mas ela provavelmente me bateria.
Não sei se ela está chorando, ou se é a chuva em sua face, mas ela parece triste, distante.
- Escuta aqui - Inesperadamente ela se aproxima de mim e ficamos embaixo do telhado que cobria a pequena varanda - Não preciso que você tenha pena de mim, ou seja lá o que você sente, eu sei o que eu tô passando.
Sua voz estava ficando chorosa e agora eu percebo que eram lágrimas.
- O que você quer dizer com isso? Sabe que pode contar comigo pra contar o que você quiser - Eu me aproximo de seu corpo, apesar de sua roupa estar molhada, sua pele está quente, e talvez ela esteja resfriada.
- Minha melhor amiga foi embora por causa do seu irmão, ele abandonou nossa amizade de anos por popularidade e agora que não tem mais nada está com uma depressão que consegue fazer ele ficar daquele jeito - Ela fala se afastando e na última frase apontando pra casa.
- Eu não preciso e não quero um namorado que tem uma má fama e que eu tenho certeza de que nunca vai entender nada do que eu sinto Jude. Então por favor, me deixa em paz - Kie sai correndo ainda na chuva forte daquele dia.
O máximo que eu pude fazer depois daquilo foi entrar no banho e chorar.
E eu chorei. Feito um bebê precisando de colo.
As palavras dela ressurgiam na minha mente o tempo todo, principalmente a parte que ela diz que eu nunca entenderia nada do que ela sente.
E ela tava certa.
Eu não sou um cara que consola as pessoas, ou que ajuda todo mundo. Sou um homem egoísta demais.
Mas eu só tinha 17 anos.
Todo mundo no clube dizia que eu era super maturo, que eu era o cara de 17 anos mais velho que eles já tinham conhecido.
Mas eu não conseguia nem me declarar direito, não conseguia expressar meus sentimentos verdadeiros pela garota que eu tanto amava de verdade.
Foi meu último ano na Inglaterra antes de ir pro Borússia Dortmund.
Fizeram uma mini festa na escola antes de eu partir, e a Kiara fez questão de faltar nesse dia. Então minha última memória dela foi a noite da chuva.
Quando cheguei em Dortmund a casa parecia vazia demais, não tinham meus pais e meu irmão, nem meus amigos, só eu.
Um velho num corpo de adolescente, mas ainda uma criança que não sabia de nada.
Mas aí eu cresci. Comecei a me dedicar de corpo e alma ao futebol e sinceramente não sei nem se tinha tempo pra pensar na Kiara.
Quando Heloísa Ward voltou pra Inglaterra, agora não como aquela menininha quieta e arteira mas sim uma estudante de medicina, meu coração acelerou.
Não por ela. Eu sabia que se ela voltasse ela falaria com Kiara, e provavelmente assim que eu fosse visitar ela ou meu irmão eu iria vê-la.
E não deu outra.
Na primeira visita eu não vi ela, até porque Jobe e Helo nem estavam juntos direito ainda, e eles são meu canal até ela. Na segunda...
Aquele bendito chá de panela, eles lá precisam de presentes pra casa? Se não fosse por isso...
- Caraca aí, casa foda, gostei - Falo assim que meu irmão abre a porta, ele tá claramente surpreso.
- O que você tá fazendo aqui maluco? - Ele diz me abraçando e pegando o presente.
- Vim pro seu chá né? A Helo me convidou, eu sou literalmente melhor amigo dela sabe! - Falo querendo fazer ele rir mas ele tá com uma cara de atentado que me assusta.
- E você não adivinha quem tá aqui também?
- Quem? Fala logo sabe que eu tenho ansiedade, eu vou infartar - Digo com a mão no coração o fazendo rir.
- A Kie - Ele fala, quase me fazendo infartar de verdade.
- Jude? Cara tu cresceu né? Ta mais gato - Kiara aparece de supetão, me surpreendendo, hoje não tô afim de mais surpresas.
- Oi Kiara, que bom te ver assim, do nada - Minha voz sai nervosa e hesitante.
Ela tava diferente sabe?
A Kiara sempre foi ousada, abusada pra falar a verdade, mas ela tá com outra vibe.
Mais solta, dinâmica, ela não quer ser aquela garota ranzinza de sempre, ela quer parecer pelo menos legal aos olhos de quem pouco vê.
Inesperadamente depois de nossa breve conversa ela me chamou pra cozinha pra ajudar em algumas coisas.
- E aí? Tá tudo bem? - Ela pergunta me deixando curioso com seu interesse repentino.
- Tudo bem sim - Falo e percebo que a conversa iria morrer se eu não falasse mais nada - Porque você tá falando comigo de repente?
- Achei que já era tempo de parar de te tratar mal - Ela fala e eu sinceramente não entendo sua fala.
Ela fazia isso por querer?
- Então a gente vai voltar a conversar como se nada tivesse acontecido?
- Se até Jobe e Helo se reconciliaram, quem somos nós? - Ela fala levando uma bandeja de comida pro quintal da casa.
- Maluca...
E dali pra frente foi só pra frente.
Pela primeira vez ela deixou eu me aproximar e beijar. Foi diferenciado... digamos assim.
Sua boca era de uma maciez absurda, e ela beijava bem demais pra alguém que eu tinha certeza que só tinha beijado umas 5 pessoas na vida.
Minha mão se encontrava em seu pescoço, mas com os dedos acariciando seu cabelo, que era sedoso e hidratado, apesar de estarmos em uma piscina cheia de cloro.
Será que eu tava sonhando?
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