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*Caleb*
Eu ainda não sabia como, mas nosso jato aterrissou no aeroporto do Galeão e não tivemos problema algum. O piloto taxiou pela pista e desembarcamos de maneira tranquila.
Mierra falava ao telefone o tempo todo. As vezes a observava gesticulando, estressada. Parecia dar ordens e explicar coisas. Acho que o "novo emprego" não estava lhe fazendo bem.
Mais cedo ela me dissera que algumas circunstâncias a obrigaram a se tornar dona do morro do Dendê. E eu estava intrigado querendo saber qual o motivo. E o namorado dela?
Para uma pessoa procurada no país todo, até que Mierra caminhava despreocupada pelo
Saguão do aeroporto. As roupas eram simples,
mas o óculos ainda era de grife — um resquício da antiga Mierra.
Na saída do aeroporto um carro preto — e provavelmente blindado — nos aguardava. As portas foram destravadas e os motores ligados quando Mierra deu duas batidas na porta.
Embarcamos e de novo o cheiro de carro novo invadiu meu nariz. Será que eram todos veículos roubados?
— Coloque esse endereço no GPS! — Mierra mostrava a tela do celular ao motorista.
— Recreio, senhora? — Confirmava o homem de meia idade.
— Exatamente. E vá o mais depressa possível!
Mierra e eu nunca nos demos bem. Os dois em algum grau pareciam querer decidir sobre o que seria melhor para Sam. Claro que havia um jogo de ego. Mas deveria admitir também que as ações dela naquele momento eram louváveis.
Bom, não sabia se poderia atribuir tal adjetivo a uma criminosa, mas seria algo perto disso.
O motorista havia atendido a ordem de Mierra e mantinha uma velocidade alta, correndo pelas pistas da cidade e costurando os carros a frente.
A paisagem aos poucos foi mudando. Primeiro avistei uma faixa de areia e o mar a esquerda e a direita um paredão rochoso imponente surgiu. Aos poucos o carro ia ganhando altitude rumo ao topo da colina onde a suposta mansão do meu irmão se encontrava.
Talvez tia Gertrudes gostasse daquele lugar afastado e aparentemente calmo. Isso, claro, se ela não soubesse sobre o trabalho que Conrado e eu fazíamos para conseguir grana.
Ao chegarmos nos alto, o carro percorreu um
Curto trajeto até adentrarmos uma rua tranquila e arborizada. Havia poucas casas, porém eram mansões enormes, com arquitetura diferenciada que eu não seria capaz de descrever. O motorista se curvava a procura da numeração que o endereço dizia e ao encontrá-la, finalmente parou o carro.
Era o imóvel ao fim da rua, quase perto do penhasco. Um gramado vasto e muito verde contornava a mansão que devia ter dois ou três andares. Conrado sempre teve mania de grandeza e creio que não seria diferente com a casa que escolhera para viver.
— E como vamos entrar? — Perguntei ao notar as paredes altas e os portões de ferro gigantes.
— Como qualquer outra pessoa entraria. — Respondeu Mierra me olhando com sarcasmo.
E então ela desceu e tocou a campainha. A acompanhei sem entender o que ela estava fazendo. Seria pouco provável que nos deixariam entrar.
— Alô — Disse ela ao atenderem o interfone — É da jardinagem.
A desculpa até que era boa.
— Achei que tivesse agendado para as 10 horas. Ainda são oito ! — Advertia a voz rouca de uma senhora.
— Pois é, acho que houve um ruído de informação. Podemos entrar? Porque se formos dispensados creio que haverá disponibilidade apenas para o próximo mês. Sabe como é, há muitos jardins nesse bairro...
A resposta inicial fora apenas de uma respiração pesada e ruidosa. A senhora pelo interfone não estava contente.
E então os portões se abriram.
— Entrem que vou recebê-los na porta! — Disse a mulher.
E então Mierra me olhou como se dissesse "viu como se faz?".
Dei de ombros e entramos no carro.
— Está com sua arma, Caleb?
— Não! Seu capanga levou tudo o que eu tinha quando me revistou. Até os chicletes.
Mierra então abriu um fundo falso no banco da frente e retirou um calibre 38.
— Toma. Talvez precisemos. — Disse me entregando o revólver.
E quando o carro parou e descemos em frente a imensa escadaria que levava a uma porta alta de madeira maciça, o brilho de Mierra sumiu abruptamente. A senhora que nos atendeu apontava em nossa direção com uma espingarda. Tinha um dos olhos fechados enquanto nos alvejava, para melhorar a mira.
Pelo visto ela não havia acreditado na mentira que contamos pelo interfone.
Olhei para Mierra como se dissesse "Viu, como não daria certo?".
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*Samantha*
— E quer saber, Samantha? Talvez eu poupasse sua vida se ainda estivesse gerando meu filho... — Conrado estava sentado em uma cadeira de frente para mim e Rebecca. Ele fumava um cigarro.
Ao lado dele havia dois homens armados com fuzil.
— Eu prefiro morrer a ter qualquer tipo de ligação com você! — Disse expressando todo meu desprezo por aquele homem.
— E se fosse do meu irmão, você gostaria? Se o filho fosse dele, an?
Eu ainda não era capaz de lembrar sobre Caleb. Mas meu rancor por Conrado era imenso que teria filho de qualquer homem que fosse, exceto dele.
— Não sendo um filho seu, eu suportaria qualquer coisa, querido!
Conrado riu.
— Pois saiba que é deprimente... Ter um filho de Caleb. Ele não passa de um covarde. Falhou miseravelmente ao deixar você viva quando deveria tê-la eliminado. Uma vergonha realmente...
Enquanto ele falava eu ainda tentava pensar em algo, alguma coisa que pudesse ser feita. Sentia a cola da fita isolante bem grudada a pele e me esforçava para ver se conseguiria mover apenas um dedo, mas era algo quase que impossível.
Conrado falava e eu já não conseguia mais ouvi-lo. Apenas pensava que iria morrer ali, sem nem memso me recordar sobre quem eu era.
— Já distribuíram as bombas? — Conrado olhou para o lado ao perguntar a um dos homens que permanecia atrás dele com um fuzil.
— Sim senhor. E aqui está o cronômetro. — O rapaz tirou uma espécie de relógio do bolso e entregou a Conrado, que permanecia sentado de frente para mim e Rebecca.
— Muito que bem! — Conrado ergueu-se olhando para o visor de aparelho — Acho que chegou a hora, meninas! — Dizia com satisfação.
Ele apertou um botão e logo em seguida houve início de um "bip" a cada segundo. Conrado provavelmente havia acionado os explosivos e seria questão de tempo até tudo voar pelos ares.
— Me faça apenas uma última gentileza? — A voz de Rebecca era de quem já havia se conformado com o fim.
— Não vejo por que não. Diga! — Conrado coçou a sobrancelha.
— Liberte minha irmã. Apenas isso. Ela não tem nada a ver com essa situação, Conrado. Você já tem a mim. Apenas a deixe em paz...
Ele olhou com uma feição irônica para Rebecca mas depois suspirou, como se fosse conceder.
— Ok, ok... — Ele pegou o telefone e discou números — Raquel? — Segurava o aparelho ao ouvido — Sim, pode soltá-la. Já consegui o que queria. Mas não esqueça de dizer a Sacarlat que se disser qualquer coisa eu a pego de volta e não terei clemência!
Ao desligar o aparelho, ele olhou para nós duas novamente, sorrindo. Ah, como eu desejava acabar com aquele sarcasmo todo. Eu devia estar implorando pela minha vida, porém Conrado era um ser tão repugnante que eu apenas queria xingá-lo!
— Foi excelente revê-las, garotas! Espero que descansem em paz... No in*ferno!!! — Gargalhou — E guardem um lugar para mim, ouviram?
E então ele deixou o cronômetro sobre a mesa com a tela virada para que Rebecca e eu víssemos os nossos último vinte minutos de vida.
Creti*no.