Stay With Me - Cartas Esqueci...

By Mai-Santos

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Durante um casamento, Miranda, editora de uma revista em Paris, tem uma discussão com seu namorado e acaba en... More

1 - Azuis frios
2 - Castanhos quentes
3 - Escuro fumegante
4 - Gota transparente
5 - Delírios rubros
6 - Azul avelã
7 - Boca rosada
8 - Sob o céu escuro
9 - Véu branco
10 - Luz vermelha
11 - Branca por fora, rosada por dentro
12 - Cristais brilhantes
13 - Envelope azul
14 - Seda preta
15 - Flor do campo rosa
16 - Botão de rosa
17 - Tons de ouro e rosa
18 - Aura flavescente
19 - Rastros vermelhos
20 - Proeminência avermelhada
21 - Memórias cinzas
22 - Lábio avermelhado
23 - Macia e branquinha
24 - Rosas vermelhas
25 - Noite escura
26 - Nada além da espera escura
27 - Devaneios com vinho tinto
28 - Subconsciente obscuro
29 - Traço rosa intenso
30 - Barriga pálida
31 - Lembranças rubras
32 - Despedida preto no branco
33 - Reflexo avermelhado
34 - Choque entre castanho e azul
35 - Lágrimas no rosto vermelho
36 - Rosas dele e dela
37 - Lábios carmesim
38 - Bandeira branca
39 - Ouro sobre azul
41 - Mamilos cor de coral
42 - Pequeno anjo prateado
43 - A luz da calmaria
44 - Vestido grego branco
45 - Brilhante solitário
46 - Azul da prússia lhe cai bem
47 - Manhã alaranjada

40 - Um azul e outro branco

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By Mai-Santos

𝔸 vida é cheia de surpresas, e não poderia ser diferente. Que prazer teria viver em um mundo onde tudo é esperado?

Quando Miranda, no primeiro minuto do dia primeiro de janeiro de 1995, desejou sob os fogos de Paris que naquele novo ano não se sentisse mais sozinha, ela jamais imaginou que na semana seguinte conheceria a mulher que lhe despertaria o sentimento mais genuíno pela primeira vez.

Ela não imaginou que, ainda naquele primeiro mês do ano, teria seu coração partido, ou que teria algo que jamais esperou ter em sua vida, um fruto de seu romance. Não imaginou que desejaria tantas coisas que nunca desejou. Uma vida em família, acordar todos os dias ao lado da mesma pessoa, compartilhar a felicidade e os problemas com alguém.

Ela tinha orgulho de prever os passos de sua vida, mas não havia previsto nada daquilo.

Do lado de fora do prédio onde Andrea morava, um chofer corretamente fardado desceu do carro e abriu a porta para ela entrar. A jovem sentou-se ao lado de Miranda e lhe sorriu brilhantemente.

Miranda, no entanto, olhou para ela com uma estranha frieza e desviou o olhar para a janela. E assim permaneceram, em completo silêncio durante todo o caminho até o hospital.

O chofer parou no estacionamento subterrâneo e elas caminharam na direção do grupo de elevadores.

"Mira, o que há de errado?" Perguntou Andrea, enquanto esperavam o elevador chegar.

"Não há nada de errado." Respondeu, sem olhar para ela.

"Nós vamos fazer algo importante hoje." Segurou delicadamente os braços de Miranda e a fez voltar-se para ela. "E não quero passar por esse momento sabendo que você está brava comigo. O que acha de resolvermos isso agora?"

"Quem era aquela beijando você na escadaria do seu prédio?" Encarou-a com o rosto neutro.

"A Lilly? É a minha amiga, nós dividimos o apartamento."

"Oh, vocês moram juntas, que interessante."

"Está com ciúme?" perguntou com um tom de surpresa na voz.

"Tenho motivos para estar?"

"Não!" Andrea riu. "Ela é minha melhor amiga, praticamente crescemos juntas."

"Vocês duas nunca tiveram nada além da amizade?"

"Não, não! Somos como irmãs." Disse ela, escandalizada com tal suposição. "Ela só estava me desejando felicidades, quase não nos vimos nos últimos dias e não tivemos oportunidade de conversar melhor sobre todas essas mudanças repentinas em minha vida."

Sem dizer mais nada, Miranda voltou a olhar para a porta do elevador, este abriu logo em seguida e elas o ocuparam imediatamente.

"Miranda, estou falando a verdade." A voz transpareceu sua preocupação.

"Eu acredito em você. Não mentiria para mim, não é?" Olhou-a firmemente e Andrea negou com um gesto. "Não há motivos para nenhuma de nós mentir para a outra."

"É claro que não. Você ainda está brava?"

"Não estou brava, estou tensa e não posso evitar."

"Vai ficar tudo bem." Disse docemente. Passou-lhe o braço por trás das costas e puxou-a para colar no seu corpo.

Miranda encostou a cabeça no ombro dela e suspirou.

°°☉°°

Estavam ambas sentadas diante do médico. Depois de aferir a pressão arterial de Miranda, ele anotou algo no prontuário dela e fitou-a por trás das lentes bifocais.

"Sua pressão está dentro do normal. Eu vi no seu histórico médico que você foi hospitalizada no início da gestação. Você voltou a sentir aqueles sintomas?"

"Não." Respondeu Miranda.

Andrea olhou para ela com o rosto confuso e preocupado. Não sabia que a mulher havia sido hospitalizada.

"Você ainda sente enjoos, teve episódios de desmaios ou sente cansaço extremo?"

"Eu sinto enjoos às vezes, mas apenas com certos odores e alimentos, ou quando estou com fome. Quanto ao cansaço, às vezes ele surge repentinamente mas normalmente passa com alguns minutos de descanso."

"Parece que está tudo dentro do normal. De qualquer forma, é importante investigar. Eu vou solicitar alguns exames laboratoriais, incluindo um de urina para averiguar se você está perdendo proteína."

"E se eu estiver?"

"Há a possibilidade de você ter pré-eclâmpsia. Mas não se preocupe com isso, é somente por precaução. Qualquer que seja o resultado, ainda está no início da gestação, iremos tomar todas as providências para garantir o seu bem-estar e do bebê. Você disse que está na décima oitava semana, quem fez esse cálculo?"

"Minha ginecologista e eu."

O médico terminou de anotar e disse:

"Vamos lá! Está na hora do primeiro ultrassom. Ela vai assistir?" Ele olhou para Andrea.

"Sim. Ela é minha companheira e também é mãe do meu filho." Disse Miranda, com convicção. Andrea olhou para ela com uma exultante surpresa.

"Então pode entrar naquela sala e trocar de roupa. Eu entro em alguns minutos."

Elas se levantaram e encaminharam-se para a porta. Dentro da sala, havia uma cama alta de obstetra com suportes para as pernas.

Miranda virou-se de costas para Andrea e pediu: "Ajude-me a tirar o vestido."

A jovem desceu o fecho do vestido e o tirou pelos pés de Miranda. Pegou a camisola do hospital e ajudou-a a vestir-se. Por fim, tirou-lhe a calcinha para que não se abaixasse e guardou junto ao vestido. Miranda deitou-se então sobre a cama e Andrea cobriu-lhe as pernas com um cobertor. Tudo com muito cuidado e atenção.

"Prontinho, bem embalada e confortável." Disse Andrea.

"Defina confortável."

Andrea riu. Entrelaçou seus dedos nos de Miranda e levou a mão dela aos lábios para um beijo carinhoso, assegurando-a de que não estava sozinha.

"O que você achou do Dr. Phillip?" Perguntou Miranda.

"Ele parece muito sério e pergunta bastante. Passamos mais de meia hora conversando com ele."

"Senti-me em uma entrevista, mas sei que tudo isso é importante. Se ele será o homem que vai fazer o meu parto, eu quero que ele saiba de tudo, até mesmo quantos fios de cabelo eu perco por dia."

Andrea sorriu e afastou os fios grisalhos de Miranda de seu rosto, acariciando o cabelo dela. "Você fica adorável até mesmo com essa camisola rosa de hospital."

"Cala a boca." Miranda revirou os olhos, comprimindo os lábios para esconder um sorriso.

Dentro em pouco, o médico entrou na sala, aproximou-se da cama e começou a examiná-la. Ele olhou um momento para o monitor do ecógrafo e perguntou:

"Quando você foi hospitalizada na França, sua médica tentou auscultar os batimentos cardiofetais?"

"Eu não sei, eu estava medicada. Por quê? Há algo de errado com o coração dele?" Miranda sentiu-se invadida por um medo intenso e apertou forte a mão de Andrea.

"Não é isso, por favor, mantenha a calma." Ele olhou calmamente para elas. "Há pelo menos dois fetos no seu útero, isso quer dizer que você espera gêmeos."

Elas não disseram nada, apenas entreolharam-se com um espanto visível no rosto. A respiração de Miranda começou a ficar tensa e seu rosto tornou-se pálido de repente. Ela voltou a apertar a mão de Andrea e ouviu o médico dizer:

"Eles compartilham a mesma bolsa gestacional e a mesma placenta, significa que são gêmeos idênticos." Ele parou por um momento e voltou a falar. "O tamanho é adequado, aproximadamente o mesmo. Vocês têm interesse em saber o sexo?"

Quando Miranda permaneceu em silêncio com os olhos fitos no monitor, Andrea tomou a frente e respondeu: "Sim. Já é possível saber?"

"Vamos tentar. Eles estão muito tímidos." O médico olhou para Miranda e ergueu a mão para tocar a barriga dela, mas antes disse: "Eu vou tentar algo, você pode sentir um ligeiro desconforto." Começou a massageá-la e no mesmo instante elas puderam ver os bebês se movendo.

"Oh, meu Deus! Estão se mexendo." Andrea exclamou, com a voz trêmula.

"Vamos ver agora. Bem, vocês terão duas meninas saudáveis e muito bem desenvolvidas."

Os olhares delas cruzaram-se novamente, transmitindo a emoção que estavam sentindo. Depois de alguns momentos, o médico continuou:

"Essa é a minha parte favorita..." Assim que ele parou de falar, um som rápido e pulsante preencheu a sala. "Esse é o coração do primeiro feto."

Miranda fechou os olhos e seu rosto recuperou a cor, sua tez alva tornou-se rubra de repente. Andrea não soltou a mão dela por nenhum momento.

"É uma menina forte. Vamos procurar os batimentos da outra." Houve um instante de tensão, mas em alguns minutos voltaram a ouvir o som na mesma intensidade.

Elas respiraram aliviadas e o médico olhou para elas com um leve sorriso tranquilizador.

"Elas estão bem, são muito saudáveis. Entretanto, uma gestação gemelar é mais delicada e vai exigir ainda mais cuidado, além de um acompanhamento mais preciso."

"Elas já podem nos ouvir?" Perguntou Andrea.

"Sim, elas já ouvem sons externos. Em poucas semanas elas vão responder a esses sons e reconhecerão a voz da mãe." Ele olhou então para Miranda e disse: "Mas nesse momento, elas podem ouvir as batidas do seu coração e isso é agradável para elas. Também reconhecem que tem alguém ao lado delas e interagem entre si. Em algumas semanas estarão brincando uma com a outra."

"E elas podem se machucar?" Os olhos úmidos de Andrea brilhavam de genuína preocupação.

"Não. Não se preocupe com isso. Vocês vão perceber que elas mexem mais daqui para frente. Isso é bom, quer dizer que estão recebendo bastante oxigênio. Do contrário, se ficarem quietas por muito tempo, é importante procurar o hospital. Agora, darei um momento para vocês, vou esperar na sala para conversarmos melhor e esclarecer todas as dúvidas."

"Obrigada." Disse Andrea.

Ele puxou o aparelho para mais próximo da cama e deixou a sala. Miranda e Andrea ficaram olhando para a imagem congelada de suas filhas no monitor.

Estavam na mesma posição, lado a lado, com os rostos quase se tocando. Andrea notou que uma delas tinha o braço erguido, como se estivesse tocando a orelha, ou aquele seria o cordão umbilical? Ela não sabia. Não compreendia completamente o que estava vendo.

"Elas são tão perfeitas. Não imaginei que já estivessem assim, com bracinhos e perninhas. Parecem tão tranquilas." A jovem inclinou o rosto para o lado e deixou-se sentar ao lado de Miranda, completamente absorta.

"São gêmeas, Andrea." Disse Miranda, como se a outra não tivesse compreendido aquele fato. "Dois bebês, isso significa o dobro."

"Ei, vai ficar tudo bem." Andrea finalmente olhou para Miranda e viu o desespero em seus olhos azuis.

"E se não estivermos prontas para ter dois filhos? Eu mal havia me acostumado com a ideia de ter um, e agora são dois. Duas crianças sob nossa responsabilidade."

"Nós vamos dar conta."

"Eu não tenho certeza disso."

"Seremos nós duas, juntas, cuidando de dois bebezinhos bem pequenos. Olhe para elas, não deve ser tão difícil." Um sorriso reconfortante dançou em seus lábios.

Miranda suspirou, aquela doçura e ingenuidade da jovem a deixava comovida.

"Oh, Cristo! Que bom que você está aqui." Murmurou ela, com os lábios trêmulos.

"Eu estou aqui." Andrea abriu-lhe os braços e Miranda
se aninhou no mesmo instante entre eles. "Somos uma equipe, vamos fazer funcionar."

"Nós vamos ficar bem. Nós quatro vamos ficar bem." Disse Miranda, e encostou a cabeça no peito da jovem.

"Sim, Mira." Andrea abraçou-a mais fortemente e sentiu os cabelos macios dela em seu queixo. "Se você apertar um pouco os olhos, poderá ver que elas se parecem com você."

Miranda sorriu e levantou os olhos para ela. "Você fala cada bobagem."

°°☉°°

Por mais que Miranda fosse uma mulher reservada e permitisse apenas uma pequena quantidade de pessoas em sua vida íntima, ela era muito conhecida e admirada em seu meio profissional.

Estava naquela estrada há tempo suficiente para cruzar com tantas pessoas que não poderia contar. Ajudou algumas e conquistou o respeito de outras. Tropeçar em certos invejosos era inevitável, mas nunca lhes deu qualquer atenção.

Preferia a conquista limpa e segura, adquirida por seu esforço e seu desejo irrefreável por excelência. Isso deu a ela uma reputação.

Agora que a notícia de sua gravidez estava se espalhando, os vinhos e sapatos que ganhava de presente deram lugar às roupas de bebê e vestidos de grávida. Havia uma sala na revista somente para as coisas que recebia, vindas de todo o país e também da Europa.

Andrea e Emily estavam sentadas no chão dessa sala, separando os presentes que Miranda realmente levaria para casa dos que ficariam na Runway. Alguns iriam para o closet da revista, outros eram simplesmente doados.

"É inacreditável." Disse Andrea, erguendo um macacão marinheiro de bebê. "Como uma coisinha que cabe aqui dentro vira alguém tão grande como nós?"

"Não sei, pergunte para um químico." Disse Emily, sem lhe dar muita atenção.

"Um biólogo." Andrea corrigiu.

"O quê?" Emily olhou rapidamente para ela.

"O correto seria perguntar para um biólogo. Posso te fazer uma pergunta?"

"Não, mas sei que não posso te impedir."

"Se não gosta de trabalhar na Runway, por que continuar aqui?"

"E quem disse que não gosto de trabalhar aqui? Eu amo o meu trabalho, e é uma excelente oportunidade de aprendizado e crescimento."

"Tem uma maneira estranha de demonstrar isso. Parece que está irritada todo o tempo."

"Ficar sorrindo como idiota só irá atrair aproveitadores. Não estou aqui para fazer amigos e quero que fique claro para todos que olhem para minha cara."

"Qual o problema de fazer amigos?"

Emily levantou o olhar e ficou encarando-a por um momento, seriamente. Então começou a dizer:

"Não confio nas pessoas. Não importa há quantos anos você conhece alguém, em algum momento você sempre será decepcionada, e quanto mais tempo levar para isso acontecer, maior é a dor. Prefiro manter o foco no que quero conquistar sem deixar que ninguém atrapalhe."

Andrea não disse nada, ficou apenas olhando para ela com um ar pensativo. A campainha de seu telefone celular tocou e ela levantou para pegá-lo.

"Você ainda está na Runway?" A voz de Miranda soou do outro lado da linha.

"Sim, precisa de algo?"

"Acabei de terminar os ajustes do meu vestido. Irei apenas colocar minhas roupas e descer para a garagem. Pegue minha bolsa e meu casaco na minha sala e encontre-me lá."

"Você já chamou o motorista?"

"Sim! Rápido, Andrea." Respondeu impaciente.

"Tudo bem!" Andrea guardou o celular e começou a pegar as sacolas que elas já haviam separado. "Miranda me quer agora."

"Que sorte a sua!"

"Você sequer imagina." Disse Andrea, sem saber ao certo se a outra estava sendo irônica. "Deveria ir também, está realmente tarde. Eu vou levar essas coisas para ela, esta sala está ficando sem espaço."

"Não tome como algo pessoal o que lhe falei."

"Não se preocupe. É bastante claro para mim quando alguém está se protegendo. É uma pena que ao nos protegermos das coisas ruins, também acabamos por afastar as boas."

Sem esperar por uma resposta, Andrea deixou a sala e correu para o escritório de Miranda.

Quando chegou à garagem, Miranda já estava no carro a aguardando, cheia de impaciência e irritação. Andrea sentou ao lado dela com tantas sacolas, que o casaco e a bolsa de Miranda estavam perdidos no meio delas.

"O que é tudo isso?" Perguntou Miranda, olhando para ela como se fosse louca.

"Coisas que você ganhou nos últimos dias."

"E você precisava trazê-las hoje?"

"Eu trouxe apenas as roupas de bebê, achei que você iria gostar de vê-las tanto quanto eu gostei." Justificou, com os olhos tão brilhantes e um sorriso tão adorável que Miranda decidiu deixar passar.

"Você sabe que precisa mandar isso para lavanderia antes de levar para minha casa, não é?" Perguntou Miranda, e o silêncio constrangido de Andrea fora reposta suficiente para ela. "Encontrou algo interessante?"

"Oh, sim! Veja isso." Ela puxou o primeiro vestido de bebê que encontrou pela frente. Era completamente rosa e cheio de camadas de tule que proporcionavam um efeito bufante. "Não é uma graça?"

"Não. Minhas filhas não irão vestir algo assim, parece um algodão doce." Disse com um ar de desdém.

"Mas é tão lindo." Os ombros de Andrea caíram desalentados.

"É muito inapropriado. Veja esse laço em volta da cintura, isso machuca as costas do bebê. Por que roupas de meninas tem que ser tão desconfortáveis, cheias de botões, flores e adornos? Um recém-nascido é muito delicado para usar algo assim."

"Você tem razão." Concordou, em voz baixa e desanimada. "Deixe-me mostrá-la o meu favorito."

Começou a procurar dentro das sacolas e quando o encontrou, estendeu na frente dela. Tratava-se do macacão azul de marinheiro. Sentiu-se vitoriosa quando Miranda abriu um leve sorriso e assentiu movendo a cabeça.

"Eu gostei desse. Existe uma fotografia em que estou ao lado de minhas irmãs quando éramos crianças e vestíamos algo muito parecido."

"Isso é tão doce. E existem dois, um azul e o outro é branco. Não vejo a hora de poder segurá-las." Disse emocionada. Miranda continuou olhando para ela com seu sorriso ameno. "Você está brava com algo que eu disse?"

"Não, não." Suspirou, recostando a cabeça no banco. "Estou com fome e meu humor não fica muito exemplar quando estou assim."

"Temos algo em comum então." Levantou a mão e acariciou de leve a face de Miranda.

De repente, lembrou-se de onde estava e hesitou por um momento. Olhou para frente, fitando o motorista, e viu que ele não tinha a atenção presa a elas.

"Desculpe." Sussurrou para Miranda.

"Tudo bem." Disse Miranda, com um sorriso. Segurou a mão da jovem e beijou delicadamente na palma. "Ainda teremos que preparar o jantar quando chegarmos em casa." Suspirou cansada.

"Eu posso cuidar disso para você."

"Isso é muito adorável, mas tenho uma ideia melhor, podemos jantar em um restaurante. É mais rápido e não temos que lavar a louça depois."

"Como um encontro romântico?" Miranda assentiu. "Nosso primeiro encontro."

"Já tivemos nosso primeiro encontro, e houve muitos outros depois dele."

"Isso é verdade. Então podemos dizer que é o nosso primeiro encontro desde que estamos realmente juntas."

Miranda continuou olhando para ela com um leve sorriso nos lábios, como se visse na jovem algo essente que somente ela pudesse ver. Seus olhos azuis se fecharam e ela apoiou serenamente a cabeça no ombro de Andrea.

"Tudo bem, criança, como você quiser." Murmurou ela, irrefletidamente.

Andrea conteve por um instante a respiração no momento em que ouviu ser chamada assim.

°°☉°°

O garçom chegou para retirar os pratos do jantar e elas pediram a sobremesa. No momento em que ficaram sozinhas, Miranda levantou e colocou sua cadeira do outro lado da mesa, exatamente ao lado de Andrea.

Voltou a sentar e descansou a mão na coxa da jovem, esfregando suavemente o polegar para frente e para trás. Com um impulso rápido, beijou os lábios de Andrea e olhou para ela com um sorriso.

"Pensei que fosse uma dama muito tímida e discreta." Disse Andrea, cheia de surpresa pela demonstração de carinho. "Pelo menos é o que parecia quando a conheci."

"E eu sou! Mas é um restaurante escuro, não tem muitas pessoas e ninguém está vendo." Defendeu-se, com um ar de divertimento.

"Nesse caso..." Andrea puxou-a pela face e beijou-a intensamente, invadindo com a língua a sua boca.

Miranda afastou-se em busca de ar e sorriu ofegante, dizendo: "Você e seus excessos."

Andrea sorriu como resposta e deu um beijo rápido em seus lábios. Até que Miranda pegou de súbito a mão da jovem e pousou em sua barriga.

"Está sentindo?" Perguntou Miranda.

"Sim, é fascinante." Andrea suspirou, acariciando o local em que a barriga recebia pequenos impulsos.

"Você está realmente feliz com tudo isso? Eu sei que, assim como eu, você não esperava essa grande mudança."

"Estou muito feliz, Mira. Eu disse a você, sinto que tenho um propósito, alguém por quem lutar."

"Fico aliviada, porque por muito tempo tive medo de sua reação. Mas diga-me, você não está nem um pouco assustada? Por favor, Andrea, seja sincera comigo, não quero pensar que estou sendo irracional sozinha."

"É claro que tenho inseguranças, só não disse nada porque não quero deixar você mais nervosa." Andrea tocou suavemente a face dela com a palma da mão, transmitindo toda a segurança através de seu olhar. "Também não quero que pense que estou hesitando, porque não estou, eu garanto!"

"Eu acredito, mas acho que seria melhor compartilhar nossas inseguranças uma com a outra." Disse Miranda, sentindo no rosto a carícia leve de seus dedos.

"Tudo bem. Tem muita coisa acontecendo, eu ainda estou aprendendo a fazer isso."

"Tem razão, eu tive meses para digerir e você só teve alguns dias."

"Não posso imaginar como foi para você quando descobriu."

"Eu me senti completamente perdida e sozinha." Abaixou o olhar e então suspirou. "Não tinha ideia do que fazer. Acho que chorei a noite inteira no primeiro dia. Mas no dia seguinte, aconteceu algo, não sei explicar direito, sei apenas que senti uma vibração dentro de mim, quase imperceptível de tão sútil. Como um sinal de que estavam aqui comigo, e desde então não me senti mais sozinha. Na verdade, senti que nunca mais ficaria sozinha de novo. Parece que elas me entendem de alguma forma."

"Isso é muito lindo." A jovem sorriu com as bochechas rubras.

"Sei que devo parecer uma maluca falando assim."

"Não, de maneira alguma. Vocês têm um vínculo desde sempre, você as nutre e acolhe, é totalmente compreensível que se sinta dessa forma."

"Obrigada."

Nesse momento, o garçom chegou com as sobremesas. Colocou um flan de chocolate na frente de Andrea e uma fatia de cheesecake perto de Miranda.

"Isso é um flan?" Perguntou Miranda. "Que estranho."

"Quer provar?" Andrea levou a colher à boca de Miranda e viu os lábios dela envolverem o doce.

Ela saboreou por alguns segundos e então se deu conta de algo: "Oh, crème caramel."

"É assim que você chama?"

"Eu quero um desse." Disse Miranda, pincelando a língua molhada entre os lábios de tanto desejo pelo doce.

Andrea fez sinal para o garçom e ele se aproximou. Foi então que descobriram que o último flan havia sido servido para Andrea. Ela agradeceu ao garçom e ele voltou a deixá-las a sós.

"Tudo bem, você pode ficar com o meu." Andrea empurrou lentamente na direção dela.

"Está fazendo isso somente porque estou grávida?" Perguntou, com as sobrancelhas arqueadas.

"Sim. É claro."

"O que mais eu ganho por estar grávida?"

"Está querendo usar a gravidez para ter regalias? Que feio."

"Sim, se há algum privilégio em estar grávida eu quero usá-lo." Admitiu, levando uma colher do doce aos lábios com um ar de divertimento malicioso.

Andrea riu e cobriu-a com beijos ávidos no rosto e na boca.

°°☉°°

Já era tarde da noite quando o carro avançava pela movimentada Fifth Avenue e Miranda decidiu de súbito seguir a pé pelo parque.

Elas caminharam distraidamente e de mãos dadas, como se estivessem em um passeio tranquilo.

A noite estava quente, mas um vento fresco soprava por entre a copa das árvores e chacoalhava as folhas primaveris, provocando um agradável som farfalhante.

"Tem certeza que pode caminhar até o apartamento? Ainda podemos chamar o motorista." Disse Andrea, voltando o rosto para ela.

"Todas as manhãs eu caminho até esse parque e volto para casa. Não precisa se preocupar, não estou doente."

"Eu sei disso. Só quero garantir que está bem." Andrea parou e afastou do rosto de Miranda o cabelo que voava insistentemente pelo vento.

Miranda parou e sorriu. "Eu estou bem." Assegurou.

Chegaram a um banco e se sentaram. Era o ponto do parque favorito de Miranda, logo na frente da fonte. Ao fim de algum tempo observando a água cair, recostou-se no banco e começou a falar:

"Gosto desse lugar. Não há muitos lugares bons para pensar em Nova Iorque."

"Você acabou de chegar, não conhece toda a Nova Iorque. Por sorte, eu também não. Digo sorte porque assim podemos fazer isso juntas, descobrir lugares especiais."

Miranda ficou olhando para ela com um sorriso. "Gosto das coisas que você desperta em mim, menina."

A jovem sentiu-se dominado por uma sensação que parecia familiar, mas que realmente não conhecia. Como uma memória de algo que não viveu, mas que sempre quis experimentar.

Viu-se de repente com dezesseis anos de idade. Era apenas uma menina tornando-se mulher e sonhando com um amor romântico igual ao dos filmes. Era comum se imaginar em um passeio pelo parque em um dia quente de verão. Ou assistindo a um grande jogo nas acaloradas arquibancadas de um estádio. Ou talvez em uma aventura na natureza selvagem, como acampar à beira de um lago longe da civilização. Sempre com alguém ao seu lado, alguém que a fizesse sentir-se bem.

Ao passar dos anos e dos relacionamentos, esses desejos se tornaram um sonho distante e irreal, esquecido no fundo de seu subconsciente.

Perguntou-se por que aquelas sensações voltaram depois de tantos anos sem esperança. Talvez porque sentia-se bem com Miranda, e com ela podia voltar a ser uma jovem sonhadora e romântica.

Segurou o rosto de Miranda entre as mãos e começou a beijá-la por toda a face, as maçãs salientes, a testa, a ponta do nariz e os olhos. Por fim, beijou os lábios dela, e neles ela se demorou.

Miranda jogou os braços nos ombros dela e entregou-se de corpo e alma ao conforto de suas carícias. Até que ouviu passos e vozes se aproximando e afastou-se rapidamente.

Um grupo de pessoas passou por elas e Miranda desviou o rosto com um leve rubor crescendo nas maçãs de seu rosto.

Ela olhou para Andrea, e esta tinha uma expressão de confusão e mágoa no rosto.

"Por que fez isso?" Perguntou Andrea.

"Você sabe que não tem nada a ver com você, é algo que está em mim. Eu sou..."

"Uma mulher reservada, eu sei. Achei que tínhamos superado isso." Andrea segurou a mão dela e encostou de leve nos lábios.

"É especial e íntimo demais para ser público. E tem mais uma coisa..."

"O quê?"

"Há algo importante que precisamos conversar. Você não pode continuar trabalhando para mim, precisa se demitir ou eu posso demitir você."

"Por quê?"

"Bem, há uma política no grupo que proíbe relacionamentos como o nosso."

"Por quê se incomodariam com o relacionamento das pessoas? Quem criaria uma política assim?"

"Você está olhando para essa pessoa." Miranda fez uma careta e tocou com o dedo indicador no próprio peito. "Foi há algum tempo, depois de toda a confusão com meu antigo chefe, o grupo queria me bajular para evitar especulações. Convidaram-me para ajudar a reformular o regulamento da empresa, mais precisamente na criação de uma política contra o assédio. Mais vigilância tecnológica, palestras conscientizadoras, um núcleo de apoio para as mulheres e algumas regras novas, como a proibição de qualquer relacionamento entre funcionários de hierarquias diferentes."

"O que isso tem a ver com o assédio?"

"Isso tem tudo a ver. É muito comum que homens utilizem sua posição de poder para ganhar benefícios sobre os funcionários. Trocar favores sexuais por privilégios na empresa ou ameaçar e perseguir uma mulher que não se submeta aos seus prazeres doentios."

"Mas isso não tem nada a ver com o que nós temos. E se dois funcionários quiserem verdadeiramente ficar juntos? Se estiverem apaixonados?"

"Nesse caso, precisam fazer um comunicado formal alegando que estão em um relacionamento consensual."

"Então vamos fazer isso."

"Dessa forma, uma das partes é transferida para outra unidade. Preferencialmente o superior."

"Você seria prejudicada." Murmurou Andrea, pensativamente. "Isso é uma droga."

"É efetivo, a intenção desse regulamento é desencorajar qualquer envolvimento sexual nas dependências da empresa. Se alguém é descoberto infringindo, as consequências podem ser as piores. Mas isso não será um problema, não é? De qualquer forma, não faz sentido você continuar trabalhando para mim agora."

Andrea suspirou e olhou para ela com um brilho honesto no olhar. "Na verdade, eu preciso muito desse trabalho."

"O que está sugerindo?" Perguntou Miranda, começando a ficar apreensiva.

"Eu ainda não recebi minha primeira remuneração e conto muito com ela para pagar minhas despesas. Eu vou me demitir, obviamente, mas preciso encontrar outro emprego antes. Meu aluguel depende disso."

"Isso não é um problema, eu posso ajudar você."

"Eu sou verdadeiramente grata por isso, mas não posso aceitar. Espero que entenda que isso é algo que eu preciso fazer sozinha. Eu usufrui por muito tempo do conforto que meus pais me ofereceram, mas vim para cá em uma tentativa de ser independente, queria provar para mim mesma que posso me virar sozinha. Até então, só tenho falhado."

"Eu entendo. Mais do que você imagina."

"Vou ter duas filhas agora, e tenho essa mulher linda, forte e inteligente que consegue chegar aonde quer. Quero ser suficiente para vocês."

"Você já é." Miranda sorriu com ternura e cingiu os braços em volta do pescoço dela.

"Quero que tenham orgulho de mim. Você, meus pais e minhas filhas." Continuou Andrea, enlaçando com os braços a cintura de Miranda.

"Oh, querida." Suspirou e beijou suavemente os lábios macios da jovem. "Mas não demore, certo? Precisamos de você."

"Tudo bem."

A essa altura, elas estavam apenas sussurrando, compartilhando a respiração morna uma com a outra e mantendo os olhos fechados.

"E teremos que ser muito discretas até que você esteja fora." Disse Miranda. Andrea assentiu e retribuiu o beijo. "Saiba que estou sempre aqui para você. Receber ajuda não faz de você mais fraca ou menos merecedora."

"Você é maravilhosa." Sorriu e voltou a beijá-la mais intensamente.

°°☉°°

Voltaram juntas para casa, caminhando em um confortável silêncio durante quase todo o percurso. Andrea equilibrava-se no meio-fio ao longo da rua enquanto Miranda observava as vitrines da Madison Avenue.

O céu estava escuro e limpo, não havia estrelas aparentes, apenas a lua brilhava minguante no céu.

Passaram na frente de uma floricultura e, mesmo com as portas fechadas, o odor misturado das flores chegaram ao olfato sensível de Miranda e ela espirrou.

Andrea olhou para ela no mesmo instante e sorriu, dizendo: "Que gracinha."

"Gracinha? Tudo que faço agora é uma gracinha?" Miranda revirou os olhos com uma expressão entediada.

"Tudo o que você faz grávida é uma gracinha."

"Você diz isso porque não sente as coisas que eu sinto."

Andrea desceu do meio-fio e segurou a mão dela, entrelaçando seus dedos. Após alguns momentos de silêncio, ela perguntou:

"Está pensando o mesmo que eu?"

"Não." Respondeu Miranda, rapidamente.

"Como você sabe?"

"Eu estou pensando que quero chegar logo em casa para trocar minha calcinha porque aquela gracinha de espirro provocou um pequeno vazamento."

"Tem razão, eu não estava pensando nisso." Andrea começou a rir com profundo divertimento.

"Pare de rir de mim!" Protestou Miranda, soltando bruscamente a mão dela.

"Tudo bem, eu não estou rindo, eu juro!" Ela tornou a pegar a mão de Miranda e beijou-lhe as costas dos dedos tentando comprimir o riso.

"É o que acontece quando você tem que se manter hidratada, acrescente a isso o fato de ter dois bebês pressionando a minha bexiga."

"Podemos acrescentar também aqueles três copos de suco de limão que você tomou no jantar."

"Isso também."

"Não vai perguntar o que eu estava pensando?"

"Não. Se você quiser, você me conta." Disse Miranda, com um encolher de ombros.

"Você é tão sem graça às vezes."

"Tenho certeza que não está comigo pelos meus dotes de comediante."

"Eu estava pensando que agora que teremos duas filhas, poderemos escolher os nomes Jane e June para elas."

Miranda olhou-a de soslaio por um momento, muito séria e indignada.

"Nunca!"

"Por quê? Achei que já havíamos combinado isso."

"Eu nunca concordei com isso. Minhas filhas não terão nomes tão terríveis. Por que você quer condená-las antes mesmo de nascerem? Por quê, Andrea? Por quê?" Encarou-a dramaticamente, até que Andrea começou a rir com um brilho travesso no olhar. "Está brincando comigo, é claro. Sabe que não gosto disso."

"Vamos fazer o seguinte. São duas meninas, eu escolho um nome e você escolhe o outro."

"Não."

"Sim, é o justo."

"Não vou deixar você escolher nenhum nome, suas sugestões são terríveis... Qual o nome da sua mãe?"

"Bárbara."

"Bárbara é um belo nome, é forte e austero. Ela escolheu Andrea para você, um nome igualmente forte e que evoca uma certa presença de feminilidade. Então você tem uma filha e quer chamá-la de June? Parece até a minha mãe, vocês teriam se dado bem." Ela olhou para Andrea e viu um contemplativo sorriso dançando em seus lábios cheios. "Mas é claro que você não está falando sério, só está brincando comigo para me ver chateada."

"Isso não é verdade. Não quero nunca ver você chateada. Eu sei que no fundo você se diverte com as minhas bobagens."

Beijou mais uma vez a mão de Miranda e vislumbrou um sorriso sutil escondido por trás de seus lábios franzidos.

°°°°°°°°

Olá, pessoas ♡
Como tá o coraçãozinho de vocês? O que acharam do capítulo?

Não deixem de comentar seu feedback, eu adoro lê-los.

Tem vaga no nosso grupinho Mirandy, se quiser participar é só comentar aqui que eu mando link.

Beijão e um excelente fim de semana ♡

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