Principal escolha: A ruína ♤...

By AneriLyri

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-Você só tinha uma escolha, Joshua. Apenas arque com as consequências dela. Escolhas e consequências. A melho... More

♤Trailer♤
♤ Cast ♤
♤ Prólogo ♤
♤ Prólogo - parte 2♤
1°|♤| O passado não foi enterrado
2°|♤| A ferida mais dolorosa
3°|♤| Volte para sua Lena
4°|♤| Agora, volte pra sua família
♤ Cast - Parte 2♤
5°|♤| Irmãos May
6°|♤| Eu não te devo desculpas
7°|♤| A sorte? Acaba.
8°|♤| Seria uma boa mãe
9°|♤| Minha metade
10°|♤| Vadias traidoras
11°|♤| Um irmão
12°|♤| Quanto tempo, rainha.
13°|♤| Tudo isso é por Joshua ?
14°|♤| Isso não é um adeus
15°|♤| Testamento conturbado
16°|♤| Oi, amor.
17° - Parte 01|♤| Rei & Rainha.
17° - parte 02|♤| Rei & rainha.
18°|♤| Sobrevivência.
19°|♤| Lealdade, amor.
20°|♤|Possível traidor.
22•|♤| A morte como fuga.
23°|♤| Por te amar.
|♤| Especial de Natal |♤|
24°|♤|Estratégia precede a ruína.
25°|♤|Não diga isso, dói.
26°|♤| Karmas entrelaçados.
27°|♤|Serei seu pior pesadelo.
28°|♤| Apenas rebole, amor.

21°|♤| Traição digna de um rei.

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By AneriLyri

10 de Dezembro, 2019 — 09:12
Nova York - Estados Unidos.

Any Gabrielly.

Trabalhar para alguém é uma submissão consentida, mesmo assim, não quer dizer que seja a melhor opção. Não quer dizer que seja a sua própria vontade, como também não quer dizer que seja uma opção ruim. O fato de depender de muitos elementos, é de influência se tal escolha é algo a ser considerado opção ou não.

Há uma parte de todo ser humano que é instável, que consegue tornar irracional até mesmo o homem mais inteligente do planeta. Dentro dessa parte há a ganância, ignorância, medo, e outros pontos que se tornam sua fraqueza. Sentimentos. Isso é fato: todos possuem fraquezas. Mas há aqueles que conseguem anular as próprias. Outros se tornam prisioneiros de suas próprias falhas, cedem ao único inimigo que podem realmente detê-los: a mente.

É fácil matar alguém que não quer morrer, ouvir alguns gritos que deveriam te fazer mudar de ideia, uma típica desculpa para não matar a esposa, uma súplica para um ganho de tempo, uma história que deveria te comover. Tudo é muito fácil quando você entende que a manipulação pode se tornar a espada que te faz conquistar impérios, ou pode se tornar a espada que decepa a sua própria cabeça e entrega para outro alguém de presente.

Quando se entende que a mente humana é, na verdade, o verdadeiro centro de tudo, você tem dois caminhos a seguir. Há mentes que são mais perversas que outras, há mentes que não possuem falhas, porque foram muito bem acobertadas, e há mentes que são como uma folha em branco.

Você pode fazer o que quiser. Desde escrever uma história, ou simplesmente rasgar.

Há mentes que se tornam folhas em branco simplesmente pela sua ignorância. Em vez da razão, os sentimentos apagam todo resquício de sanidade como uma borracha.

E nesta simples explicação, você conseguiria ver a ponta do iceberg que é a manipulação. A mesma que te faz ponderar sobre o certo e errado. Que te faz tomar uma decisão totalmente contrária do que normalmente você seria favorável a tomar. A mesma que te leva ao topo, ou te joga na própria cova.

Manipulação é uma arte totalmente meticulosa, que quando se esquece do que está fazendo, se torna refém da própria matéria prima. Novamente, a mente.

Eu sempre amei a manipulação. Me tornei adepta dela muito nova, e quando deixei de ser a vítima tinha se tornado melhor ainda. Anos de experiência tinha me feito uma boa manipuladora, ou uma boa vadia mentirosa, como a maioria gostava de "ofender". E não ofendia.

Entretanto, anos de experiência tinham me ensinado a perceber quando há uma manipulação nítida ao redor. O ensinamento simples que se você não é o caçador, está sendo a vítima, mostra que há pessoas que conseguem trabalhar com a mente melhor que outras.

Eu conseguia acabar com vários homens com uma adaga, e conseguiria mexer com a mente deles o bastante para que eles cogitassem que eu não seria capaz disso. Mas eu conhecia alguém que era bom em manipulação ao ponto de fazer o ser humano cogitar se matar sem ter feito absolutamente nada.

Joshua Beauchamp tinha se mostrado um exímio manipulador desde a primeira vez que eu o vi. Isso nunca tinha sido um grande problema entre nós dois. Desde que eu não fosse a manipulada da vez. Ele possuía algo que pouquíssimos pessoas conseguem com exatidão, ter uma personalidade diferente para cada situação; Joshua é falso como um diamante no pescoço de uma prostituta barata, e é por ser exatamente assim, que ele consegue ser o mais valioso entre a maioria.

O tipo de pessoa que aponta uma arma para o seu cérebro e te faz acreditar que não está fazendo isso. Alguém que eu poderia brigar até o fim para ver quem ganharia nesse quesito, mas que mesmo sendo um oponente a altura, eu ainda cederia para meu ego e ele nesse quesito. Joshua possuía um cérebro blindado por puro titânio, e uma lábia tão solta quanto brisa de mar — e eu não gostava de caçar uma briga com ele nesse quesito.

Ele ganharia, e eu daria um jeito de ganhar de outro modo. O talento em trapaças tinha ido para mim. Por isso, a regra que nunca tinha sido dita em voz alta, ainda assim, era muito clara: sem manipulações.

Porque quando houvesse, seria um caminho sem fim até que alguém percebesse que a mentira estava correndo a solta. Então, isso nunca seria um problema, desde que ele não fosse minha vítima e, principalmente, eu não fosse a dele.

Não tinha o porque de ter problemas, certo ?

Meu senso de alerta me dizia outra coisa, principalmente ao ver Bailey May, o mexicano que não aguenta a língua dentro da boca, quieto e sentado no canto do escritório, enquanto batia a sola do sapato no piso em um movimento ansioso. O olhar arisco enquanto acompanhava as poucas pessoas lá em baixo, roendo a unha do dedão. Ele estava nervoso e disperso.

Agora o homem que estava sentado na mesa central, era a própria calmaria, enquanto tentava pingar um colírio nos olhos. Joshua estava com a cadeira virada para o lado de Bailey, estava inclinado e com as pernas relaxadas, enquanto a mão esquerda estava apoiada na coxa, a direita tentava mirar o pequeno recipiente no rumo do olho. A cabeça dele estava inclinada no apoio da cadeira de couro e a boca entreaberta.

  — Que visão erótica, Joshua!— falei alto, quando a porta de vidro do elevador se abriu. Bailey deu um pulo na cadeira, me encarando de olhos arregalados e Josh trincou a mandíbula quando o potinho caiu na sua cara, me encarando com uma expressão de poucos amigos. Homens frouxos.— Sem irritação, querido. Você está velho e precisa ter uma mira decente, talvez seja por isso que optar por acompanhantes pagas seja a melhor opção.— debochei, enquanto andava até o centro da sala.

  — Quando quiser ver minha mira, manda mensagem, Gabrielly.— respondeu debochado, piscando o olho direito.— Para você eu posso abrir uma excessão á cláusula de "não se deitar com coisas ruins".

— Como você dorme, então ?— perguntei com o cenho franzido.

— Que inferno vocês dois!— olhei para Bailey, que nos encarava com a expressão surpresa.— Ele disse que ia te acordar só porque estava entediado, eu não deixava em.— me virei para Joshua, que abriu um sorriso inocente.

— É que por um momento eu pensei que estava morto mesmo, já que Bailey não abre a boca e apenas me encara.— soltei uma risada alta, retirando o casaco e o apoiando no sofá de couro que tinha ali.

— A Santa Muerte não fala muito sobre ressuscitação, leve em consideração, Beauchamp.— baguncei os cabelos de Bailey, que me mandou para puta que pariu em espanhol.— Olha a boca, mexicano de merda.— dei um peteleco em sua testa.— Tem algo para mim ?

— Não, Bailey não é muito dotado.— o mexicano encarou Joshua com desdém e o mostrou dedo médio.— Desculpa, Gaby, ele tem o dedo médio, é maior do que o pau ao menos.— prendi uma risada.

Bailey basicamente ainda estava travado com Joshua, e chegava a ser mais cômico do que preocupante. Já que o mexicano o olhava com assombro e certo receio, não falava muito e parecia ainda não acreditar que Joshua estava vivo. E que por pouco não tinha levado outra surra por estar pegando a irmã do loiro. Bailey Hidalgo May estava com medo, e Joshua se aproveitava há todo momento, aparecendo por trás do latino ou o ameaçando por simples coisas. Eu tinha essa impressão ao menos.

— Para você eu tenho muito mais, Any.— Bailey respondeu, com um sorriso ladino, pegando minha mão e fazendo uma leve carícia. Arqueei as sobrancelhas, lá estava a audácia latina que o levava para o perigo eminente de morte.

Joshua arqueou as sobrancelhas também, abrindo um sorriso encapetado.

Bailey soltou minha mão, perdendo o sorriso de lado e o me encarando de rabo de olho.

— Não se preocupe com essa desgraça loira, Bailey. Ele tem o dom de tirar qualquer um do sério, mas não é imune a uma adaga.— falei simples, caminhando até o bar e encarando as garrafas de bebida. Peguei uma de vodca russa e enchi três shoots.

— Eu não quero.— Bailey respondeu, fazendo uma careta.

— Não é para você, latino.— virei o primeiro, sentindo a garganta queimar, virei o copo para baixo e pequei o segundo, já não queimava tanto assim, fiz o mesmo com terceiro.— Viva aos russos.— passei a mão nos lábios, me virando. Joshua me encarava sério e com as sobrancelhas arqueadas.— O que ?

Não tinha problemas que o álcool não resolvesse, esse era o tipo de manipulação que eu fazia a mim mesma e, no fundo sabendo disso, pouco me importava com as consequências. Que inclusive já estava batendo na porta.

Eu tinha a consciência de quando parar. Me ver realmente bêbada sempre seria raro; ou eu estava muito na merda para me afundar na bebida... ou estaria em alguma festa rodeada de seguranças, onde tinha a certeza que não precisaria preservar minha vida.

— Nada.— deu de ombros, girando o anel de ouro que estava no dedo anelar. Dei de ombros, me sentando na poltrona ao lado de Bailey e ficando de frente para a desgraça loira que estava me encarando com o típico olhar acusador. Eu conhecia bem.

— Joalin vai ao cemitério hoje.— Bailey disse, encarando Joshua com tamanha frieza que eu poderia dizer que estava orgulhosa, mas não tinha treinado ele. Foquei minha atenção em minhas unhas longas e brancas, já imaginando que a tentativa de Bailey de fazer Joshua ceder seria em vão. Ele não receberia nada em troca.

— Que ela leve flores brancas, preciso de paz.— Como eu já imaginava: um sarcasmo que evidenciava o quão foda-se, aparentemente, ele estava para as lamúrias daqueles que ainda não sabiam.

— Sua irmã está se acabando em depressão e você age assim ?— o mexicano franziu o cenho, o olhando com desdém.— Não sei se ficarei surpreso quando acordar e ver que ela se suicidou.— levantei o olhar, encarando de rabo de olho se tinha alguma arma próxima de algum deles.

Eles mesmos eram as próprias armas.

— Minha irmã se acaba por muitos motivos, May. E você melhor que ninguém deve saber que eu me importo ao máximo com ela, ainda assim, não sou a cura para todos os problemas.— Bailey negou levemente com a cabeça.

Qual é ? Ele podia provocar mais, logo mais conseguiria desestabilizar o desgraçado loiro.

— É o que você pensa desde o início, não é ? Que seus problemas são maiores que os do outro, e que a merda das suas escolhas nunca recaem sobre ninguém.— abri um sorriso de lado, levantando o olhar e encarando Joshua com divertimento. Não sabia o motivo de tanta tensão, mas eu amava.

Era muito bom não ser o foco do ódio, para variar.

— Aham, é o que eu penso desde o início. Que vocês são adultos e sabem escolher e sofrer as próprias consequências, eu também penso sobre isso. — Joshua arqueou as sobrancelhas, dando de ombros enquanto falava sarcasticamente.— O que eu acho é que vocês se tornaram uns merdas que não sabem como e quando agir, que procuram alguém para crucificar e se esquecem que na hora de escolher, foram si próprios.— a voz calma e fria exalando à cada palavra.— Ou vai me dizer que há quatro anos atrás, foi eu que peguei minha irmã e sai do país fugindo do diabo ?— perguntou divertidamente.

Bailey soltou uma risada debochada, mas o ódio estava nítido no olhar. Não tinha muito o que ele fazer, Joshua era bem arquitetado para se sobressair de qualquer um ou qualquer situação, eram poucas as vezes que ele não conseguia reverter o jogo. Enquanto alguém não o conhecesse, nem de longe conseguiria chegar até o fim com ele. O ódio do mexicano ao meu lado deixava isso cristalino; ele não conseguiria desestabilizar alguém que não se desestabilizava.

— Posso ter escolhido ir embora, porque tinha sido a única alternativa que ainda me deixaria com a cabeça no corpo, mas não optaria por "morrer" e deixar minha irmã sofrendo por uma mentira. Talvez seja essa a diferença nos merdas que procuram alguém pra crucificar, assim como você.— tentei esconder o brilho de triunfo que passou pela minha expressão, mas com certeza falhei miseravelmente.

Aquele homem não tinha senso de autopreservação, e isso me fazia o adorar em níveis monstruosos. Bailey May falava o que pensava, e isso o tinha levado a quase ser morto, a ser odiado e querido na mesma proporção. Quando se tratava de atingir Joshua Kyle Beauchamp, eu amava e isso fazia eu gostar mais ainda do latino ao meu lado.

Porém, eu sabia que Bailey não era burro. Ele esperar eu chegar para despejar o que já queria dizer há tempos, denunciava isso. Não que ele não desse conta do recado, quando se tratava de Joshua, dificilmente alguém daria conta.

— Não, May. A nossa diferença é que eu tenho peito para aguentar o que falo e o que faço.— piscou o olho direito.— Você não tem, se não, teria me falado isso antes de Gabrielly chegar. Agora, podemos falar sobre negócios, ou você ainda quer tentar me atingir com alguma fala motivacional de como sou péssimo ?— Bailey trincou a mandíbula e Joshua abriu um sorriso de escárnio.

— Eu diria que tenho dó de você quando voltar, mas latinos deixam mentiras para coisas que realmente valem a pena.— Joshua fechou a expressão, encarando Bailey com um olhar totalmente frio.

— Não adianta rebater o garoto, ele tem razão.— intervi, dando de ombros quando os olhos claros me encararam como se fossem navalhas.— Ser odiado tem suas consequências, e elas batem na porta.— murmurei, com um sorriso de escárnio.

— Posso me preocupar com isso daqui um tempo.— respondeu simples, coçando os olhos despreocupadamente. Se levantou, pegando duas pastas em cima da mesa e estendendo até mim. — Presente do mexicano.— piscou o olho direito para Bailey, que o encarou com desdém.

Algo estava acontecendo.

— Como foi ver os Donatellos e se contrabandear para o bando dele ?— perguntei, com um sorriso divertido, vendo a expressão do mexicano se contorcer em frustração.

— Pura desgraça, Any!— esbravejou, gargalhei alto.— Eles conseguem ser os italianos mais desgraçados que já conheci, e olha que eu nem conheço muitos. Tive que receber a merda de oito choques até eles quererem ouvir as merdas que eu tinha para falar!— fiz uma careta, enquanto Joshua prendia o riso.

— Você já recebeu tortura pior do que choque.— Joshua ressaltou. Não deixava de ser uma tortura ruim; parecia que queimava os músculos de dentro para fora.

— Da próxima eu peço para eles darem um no seu cu, então!— rebateu, nervoso.— Eles arracaram três unhas da minha mão e eu tive que mentir para Sabina que tinha entrado em briga de bar.— me encarou com tamanha irritação.— Desde quando eu levo uma surra em um bar ? Eu sou a porra de um pistoleiro! Eu me sinto ofendido!

— Tortura nunca é demais, te faz mais resistente, pense nisso.— abri um sorriso simples, vendo ele me mostrar o dedo médio. Neguei levemente, ainda sorrindo e abri a pasta que tinham me entregado. Nomes e países.— Me explique sobre isso.— pedi, folheando as folhas.

Bailey trocou um olhar com Joshua e respirou fundo. Analisei bem seu rosto, vendo que tinha alguns roxos por ele e estavam levemente tampados com maquiagem. A tortura nem foi tudo isso, dado a personalidade encapetada dos italianos em torturar, ele tinha ganhado uma boa clemência.

— Diego e Daniel desconfiam até os dentes de mim, e me torturaram por horas até eu disser que só passaria informações se propusessem proteção a mim e para Sabina.— assenti.— Eles aceitaram, em troca eu passei o acesso ao banco de informações, como tínhamos combinado. Ainda me odeiam e procuram qualquer brecha para colocarem minha cabeça em uma parede, mas ainda não consigo detalhes sobre a equipe deles é muito menos acesso a mansão em que vivem. Isso é um arquivo que Daniel estava passando para Harvey em uma reunião, eles não conseguiram ver quando peguei algumas folhas. São nomes e países, não sei qual ligação tem, mas me digam que essa bosta tem algum valor, porque não levei oito choques e nem fui afogado a toa.

— Viviane está morta, então não foi atoa.— Kyle respondeu, piscando o olho direito.— Quem da equipe dele está de olho em você ?

— Aquela puta ruiva. Inclusive ela deixou bem claro que sempre quis cortar a cabeça de Any.— o encarei com as sobrancelhas arqueadas.— O que ? Estou fazendo amizades com a minha nova equipe.— respondeu em tom ofensivo, fazendo uma cara de nojo.— Eles estão ganhando dinheiro, sinto falta disso.— suspirou, frustrado.

— Você sente falta de tudo, Bailey, chega a ser patético.— murmurei, lendo mais alguns nomes.

Alguns eram familiares.

— O que tem haver esses nomes ?— Bailey perguntou, curioso como uma criança de oito anos.

— São nomes dos chefes que representam a máfia de cada país. E, em troca de terem poder totalitário no país, respondem diretamente a Diego e sua equipe.— Joshua respondeu.— São poucos nomes nessa lista, ele deve ter um cofre com nome de todos os desgraçados. Mas são informações muito boas, obrigado, garotinho do México.

— Quem tem mais poder nessa lista ?— dei de ombros, enquanto lia.

— Varia de como estão as potências em cada país, um país rico não quer dizer que necessariamente é o mais poderoso da lista. O que importa é em qual área ele é mais potente; armas, drogas, crime organizado ou seja lá o que dê dinheiro para as gangues e mafiosos.— respondi.— Rússia é um inferno com armas, os carregamentos deles são ou eram os melhores, então na época em que comandávamos, era um dos mais poderosos em quesito armas. Não dá pra ter muita noção, não depois de ficar tanto tempo fora.

— Isso não é de muita importância, já que estamos procurando vingança e não reestabelecer império. Mas já dá uma ideia sobre os merdas que estão o apoiando.— continuei.— Só há um problema.— Bailey arqueou as sobrancelhas, em uma pergunta silenciosa.— Há bastante nomes só nessa lista, muitos países juntos em somente um império, o que reduz cada vez mais os locais para uma possível fuga. Em algum momento o circo em Nova York vai fechar, principalmente quando começarem a me caçar com mais afinco.— Joshua assentiu.

— Tenho certeza que me colocarão para caçar um de nós. Eles desconfiam de mim, mesmo me falando que achavam que eu era o mais suscetível a uma traição, vão fazer de tudo para provar a minha lealdade, inclusive com o bônus de que as putas me conhecem e sabem que eu não sou tão insano a ponto de quase morrer por nada.— Joshua soltou uma risada baixa, enquanto girava os anéis de ouro.

— Cuidado com Daniel, ele é o braço direito de Diego e o cérebro mais maquiavélico dos irmãos. E considerando que deva ter algum contato com Sofya e Sina, consegue ser pior ainda.— o canadense alertou.— As informações que você passa, precisa ser contundentes, mas cuidado com quem está mexendo do nosso lado. Krystian, Noah e Sabina são altamente inteligentes, o tipo que sabem ver há milhas de distância quando algo podem ser perigosos a eles. Isso é um problema. Cuidado quando forem fazer algo relacionado a eles, um piso em falso e eles conseguem colocar tudo a baixo.— a voz calma e fria, que continha uma leve ameaça. Sempre tinha sido assim quando ele ordenava algo: havia uma ameaça nas entrelinhas, aquela que você soubesse que se desse errado, iria sofrer.

— Cuidado com Hina e Diarra, não envolva a família delas, caso precise passar informação. Elas conseguem mover infernos e céus caso alguns dos deles corram risco, mas quando a informações delas próprias, não há problemas.— respondi calma. Bailey assentiu, sério.

— E quanto a vocês dois ?— eu e Joshua abrimos um sorriso egocêntrico ao mesmo tempo, e o latino revirou os olhos.

— Estou morto e ela está sendo procurada, nenhum problema com que já não estejamos lidando.— o loiro respondeu.— Mas caso o nosso passado seja muito abordado, nos avise imediatamente. E preciso de mais informações dos membros da equipe e mansão deles, se vire e consiga.— abriu um sorriso debochado.

— Vou vender o meu corpo, talvez eles me passem a planta da mansão deles em troca.— debochou.

— Ou talvez acabem de te enterrar. Um a mais, um a menos, não costuma fazer diferença para eles.— rebati, com um sorriso de lado.— E cuidado por onde anda, aposto que estão te seguindo há todo momento.— alertei.

— Para todos os efeitos, eu estou no carro de Joalin e bebendo uma tequila na maior boate do centro dessa cidade capitalista desgraçada.— fez uma pose de homem simples e passou às mãos nos cabelos, olhando rapidamente as horas no celular.— Preciso ir, falei para Joalin que iria buscar comida, é isso faz duas horas.— o encarei com o cenho franzido.

— Como pode ser tão burro ?— falei com descrença.

— Eu queria matar, você que não deixou.— Joshua respondeu, me acusando e levantando as mãos até os ombros, como se não se importasse. Bailey me encarou com confusão.

— Você está há duas horas sumido e deixou uma Beauchamp esperando, essa raça é a desgraça!— Joshua revirou os olhos, mas não se opôs.— Desconfiam até da própria sombra. Logo mais a Barbie vai saber que você está metido até os dentes em coisa errada.— falei óbvio.

— Já estou indo, patroa.— debochou.

— Me espera no estacionamento, preciso te dar algo para entregar a Joalin.— falei seria. Ele assentiu, passando por mim e soprou um beijo.

— Não ganho beijo, bombadão ?— Joshua perguntou com um sorriso provocador. Bailey entrou no elevador e o encarou com nojo.

— Você ganha bala, seu loiro falsificado!— rebateu, com veneno escorrendo pela voz.

— Esperando ansiosamente o dia que você tiver coragem.— respondeu calmo, com os olhos brilhando em desafio. Bailey negou levemente com a cabeça, enquanto as portas do elevador se fecharam, me deixando a sós com o projeto de capeta.

Joshua levou o olhar claro até mim e me mediu dos pés a cabeça, parando por um tempo a mais nos meus peitos que estavam evidentes pelo decote da blusa azul escura que eu usava. Assobiou baixo, abrindo um sorriso inocente ao ver minha cara de irritação, se apoiando na quina da mesa.

— Qual é o problema, Gaby ?— perguntou, coçando os olhos de novo. Ele tinha levado a mão na porra daquele olho mais vezes do que eu poderia contar. Retirei do meu bolso, um pequeno aparelho e escondi entre as mãos.

Caminhei a passos lentos até ele, parando em sua frente, me inclinei sobre a mesa, passei a mão direita em baixo da mesa e me livrei do que tinha lá, e após isso, passei os braços entre Kyle e me inclinei sobre a mesa. Encarei Joshua de cima a baixo, que estava entre mim e a mesa, os olhos brilhando em divertimento. A própria personificação de calmaria.

— Você está calado demais hoje, tem algo para me contar ?— perguntei em voz baixa, a respiração dele batia na minha bochecha e seu rosto estava há um palmo de distância do meu. Aqueles olhos pareciam me analisar com mais atenção do que deveria, e não hesitavam nem por um mísero segundo. Estável, era uma das habilidades que o fazia implacável em muitos quesitos.

— Deveria ?— perguntou em um sussurro provocativo, respirando fundo entre o vão do meu pescoço e do ombro. Senti todos os meus pelos se eriçarem.

Eu conhecia aquele charme barato, e por mais que fosse tentador, meu foco não era esse. Uma parte irracional, talvez, gostaria de ceder. Mas a parte racional sabia que se eu estava jogando, ele conseguia ser melhor que eu, ou tentaria com todas as forças ser.

— Só você para me dizer.— abri um sorriso de lado, vendo ele fazer o mesmo.

Antes que ele se aproximasse mais, me afastei em um solavanco e apertei sua mandíbula com a mão esquerda. A mão direita dele tatuada e cheia de anéis foi direto para o meu pescoço e eu arqueei as sobrancelhas, quando levantei a mão direita, mostrando o colírio em mãos e abrindo um sorriso de escárnio, seu aperto se afrouxou, com ele cedendo e inclinando a cabeça para trás, ainda meio relutante.

— Medo da morte ?— perguntei, enquanto pingava o colírio no olho direito dele, e logo após no esquerdo. Joshua piscou os olhos levemente, abrindo-os e mostrando a vermelhidão ao redor, me encarando sério.

— Não, sabemos que você não me cegaria.— abriu um sorriso de lado. Assenti, dando de ombros.

— Você está estranho, Joshua.— murmurei, pegando meu casaco em cima do sofá e o vestindo. O encarando com mais atenção ainda; ele estava impecável e a expressão poderosa de sempre, mas havia algo nele que me incomodava.— E isso me incomoda.— caminhei até o elevador, entrando e o encarando; ele permanecia na mesma posição, me encarando com um brilho diferente nos olhos.

— Pode se importar comigo o quanto quiser, Gaby. Tudo bem me amar, ainda.— piscou o olho direito. Mas ainda havia um assombro em sua expressão, algo o estava afetando. Eu o conhecia bem o suficiente para saber que tinha.

— Vai me pagar por ter me acordado.— respondi, abrindo um sorriso encapetado. E desviando do assunto, como a boa vadia que sou.

— Espero que seja com um chupão, nunca iria me opor em ser seu brinquedo sexual.— rebateu divertidamente. Soltei uma risada sincera, enquanto as portas se fecharam, descendo ao estacionamento. Tinha algo de errado e meu subconsciente gritava há cada respirar. A mesma sensação de anos atrás parecia se instalar sobre mim, a diferença dessa vez, era que eu estava dando mais atenção.— Depois te ligo, tenho algo em mente.— assenti.

As portas do elevador se abriram e sai a passos rápidos de dentro, vendo Bailey May escorado no meu carro, enquanto falava ao telefone e parecia totalmente desconcertado. Me aproximei com cuidado, fazendo com que o barulho do salto se chocando no concreto fosse nulo, colocando as mãos dentro do bolso do sobretudo preto que eu usava.

— Não estou morto, Sabina. Pelo amor de Deus!— respirou fundo, parecendo prestes a perder a paciência.— Tá, tá. Já estou saindo do restaurante. Não, Sabina, para sair daqui, eu preciso desligar. Tchau, praga!— apertou o telefone entre as mãos, falando alguns palavrões em espanhol.

— Problemas com a família ?— perguntei, vendo ele dar um pulo assustado. Soltei uma risada baixa, me escorando ao seu lado, no carro.

— Ser gêmeo de alguém tem suas desvantagens.— respondeu simples, respirando fundo.

— Talvez sim.— respondi, com um sorriso pequeno no rosto.

— Sabina é como uma versão minha de saia e com mais inteligência, e isso está começando a me assustar, Any.— engoliu em seco, me encarando de rabo de olho. Fiquei em silêncio o encarando e ele suspirou.— Estou mentindo para minha irmã, a única pessoa que ainda esta viva na minha família. Não é como se nunca tivéssemos segredos, mas isso é...— negou com a cabeça.

— Sente que é traição, não é ?— perguntei calma. Bailey May só tinha se tornado quem era por manipulação; ele tinha cedido, mas isso nunca tinha anulado o fato da família ser um fator decisivo para suas ações. Parte dele ainda tinha atitudes boas, ainda hesitava quando se tratava de consequências para as pessoas que amava. Isso sempre foi um problema.

Bailey amava as pessoas ao seu redor, mesmo que algumas ele escondesse ou negasse até a morte. Isso o tornava suscetível há muito merda. Mas o fazia ser alguém digno, e por mais que eu não gostasse da hipótese, tinha aprendido com Joshua que era necessário. Ele gostava da ideia de ter alguém com valores entre nós, que não perdia a essência nem por uma tortura de horas, que conseguia ter verdade para a família, que independente das merdas que fazia, os honrava. O mexicano que trabalhava que nem um condenado na oficina de carros tinha feito um assassino o admirar, me tinha feito sentir um sentimento que estava escondido há muito tempo.

Me fez sentir remorso. O que me levava a não ligar para minha família ? O que tinha me feito a cortar a garganta do meu pai ? O que tinha me feito a trair pessoas que tinham me dado oportunidades ?

Ele tinha feito, sem querer, eu me auto questionar sobre tudo o que tinha feito ao longo da minha vida. Quais valores realmente me moviam. Ou se um dia eu realmente seria digna de ter uma família, de ter um laço de lealdade e sincero como ele tinha com Sabina.

Se eu não tinha feito a escolha errada ao renunciar.

Após um tempo de reflexão e percebendo o quão desgraçada eu era, cheguei a conclusão que errado era ele de estar ligado a família. Eu estava feliz, e tinha os motivos contundentes com aquilo que acreditava. Não havia uma Any diferente, eu era uma assassina desgraçada que almejava poder e todas suas regalias, por tanto, embora o remorso as vezes desse a cara, eu agia como tal.

Não anulava o fato de eu o compreender, por mais surpreendente que isso fosse. Eu entendia Bailey May e aqueles que tinham sentimentos pela sua família, mais do que eles pensassem que eu entendia. Joshua também compreendia, mas havia uma linha tênue entre mim, ele e a forma como entendíamos as diferentes formas de expressão de sentimentos.

Ele era muito mais expressivo aos seus sentimentos e as mentiras que contavam sobre. Se tinha algo que Joshua não era, era sentimentalista, nem de longe tão bom quanto transparecia ser. Mas há mentiras que são muito bem contadas, e teatros bem feitos ao ponto de se tornar meias verdades.

— Eu nunca trairia Sabina, Any.— a seriedade com que ele falava chegava ser assustadora. Como ele poderia dizer nunca, para algo que acontecia constantemente com as pessoas que nos cercava. Chegava a ser cômico, mas eu não sentia nada em relação a Bailey May e seu complexo de lealdade com família.— Mas imagina quando ela descobrir que estou me contrabandeando para o outro lado ? Será que isso um dia terá um fim ? Porque eu entrei para buscar a proteção, e não sei nem ao menos o que vocês vão fazer depois de sabe se lá o que. Vocês não contam! Eu estou arriscando tudo, mas me preocupa saber que estou arriscando Sabina.

— Você está sofrendo as consequências das suas escolhas, Bailey.— continuei calma, vendo seu olhar fuzilar meu rosto.— Está metido nisso porque há anos atrás não soube acatar uma ordem, preferiu correr para Viviane e estar na palma da mão dela. Não foi eu que te coloquei aqui. Não foi Joshua que te colocou nessa posição. Não foi ninguém, a não ser você mesmo. Agora, se prefere colocar a culpa em mim por estar sendo um informante, fique a vontade, eu não ligo.— dei de ombros. Eu realmente pouco me fodia para os motivos que ele usava, o que me importava era o que conseguia trazer para mim, que o risco a que ele estava se submetendo me trouxesse resultados.

— Acha que ligo para quem eu culpo ou deixo de culpar ?— perguntou em desdém.— Estou preocupado com o fato de minha irmã me odiar, da mulher com quem estou me relacionando me odiar! Não parou para pensar na reação de Joalin ? Ela vai surtar pelo irmão estar vivo, vai surtar por ter as irmãs mortas e vai surtar por aqueles que estão escondendo isso.— seus olhos escuros brilharam em hesitação.— Pela primeira vez em anos, eu percebo que tenho muito a perder, Any. E isso me assusta mais do que deveria, porque o que me fazia o melhor era não temer.— engoliu em seco. Ele estava sendo franco, ao menos.

Bailey desviou o olhar, relaxando a costa sobre a porta do motorista. Ele estava tenso, hesitante e eu sabia bem para onde isso levava; o medo iria consumir ele. Não medo de ser morto, ele não tinha isso. Havia algo que conseguia assustar o pistoleiro do México muito mais, o fato de quem ele o ama, deixar de amá-lo, isso conseguia o assombrar muito mais. Isso era um ponto fraco notável há anos atrás, e Bailey tinha esquecido de trabalhar nisso quando não houve mais situações que isso pudesse ser usado contra ele.

— Antes de trabalhar com Joshua, no início de tudo, sofri um acidente em meio a uma fuga. Quase morri.— relembrei com um sorriso, vendo os olhos castanhos me encarar com total atenção.— Uma das minhas costelas quebrou e podia perfurar os órgãos, e meus pais foram me buscar no hospital.— Bailey tentou esconder o choque, mas não conseguiu. Não o julgava, era a primeira vez que eu falava com todas as palavras que tinha mãe e pai. Que tinha um passado antes de me aliar a Beauchamp.— Eu estava tentando chamar atenção de um certo alguém, era algo grande na época. Estava fugindo de uma mansão, e eu tinha deixado três corpos lá. Duas crianças e uma babá, uma de três anos e outra de doze.— Bailey engoliu em seco e eu continuei, enquanto encarava os anéis que tinha em minha mão.

— No fundo minha mãe sabia que eu sempre fui uma filha ruim, que matava para conseguir dinheiro. Mas meu pai sabia exatamente quem eu matava, a que ponto eu chegaria pelo o que eu achasse certo, de certa forma ele gostava, eu não era tão diferente assim. Nesse dia em questão, eles me levaram embora e eu cheguei em casa, me lembro de ter jantado comida brasileira e também me lembro de ter visto meu pai e minha mãe orando.— soltei uma risada nasalada.— Isso pode te der uma ideia da minha criação, que talvez eu tenha tido uma boa família e princípios que deveria seguir.— o encarei, vendo seu olhar agora parecer mais hesitante ainda.— Não tive, Bailey. Aquele dia eu dormi como uma princesa, sem o mínimo pesar na consciência, porque contanto que não fosse eu, estava tudo bem. Tempos depois, eu matei meu pai.— falei simples, vendo ele arregalar os olhos.

— Você matou seu próprio pai ?!— exclamou assustado. Ele se surpreenderia se eu citasse mais nomes.— Por isso defendeu Krystian, quando ele disse que tinha matado a própria mãe.— a princípio isso tinha me dado muita dor de cabeça. Neguei com a cabeça.

— Não defendi nenhuma merda que vocês tenham feito. Disse que se isso tinha sido uma vontade dele, era um problema unicamente dele. Não importa se são mães, país, irmãs ou irmãos, Bailey. — falei seria.— Se você levanta a arma para um desconhecido e atira sem hesitar, não te faz melhor do que eu que cortei a garganta do cara que me concebeu ao mundo, ou de Wang. Isso só muda o seu alvo, por isso discutia quando Joshua dizia que você era honrado, para mim você só era alguém que hesitava quando sua família está em jogo, em quanto alguns de nós preferia destruir, do que ser o destruído. Ainda é. Mas, há uma diferença entre todos vocês, entre nós.

— Por que está me falando isso ? Você nunca disse nada sobre você ou sobre seu passado. — Bailey parecia uma criança acanhada, e por algum desencargo de consciência, me perguntei se eu seria uma boa irmã mais velha. Se quando meus irmãos tivessem em um beco sem saída, como aparamente o mexicano estava, eu saberia ajudar... e em todas as prováveis situações que eu conseguiria imaginar em poucos segundos, a resposta sempre era não. Nunca teria uma relação como Sabina e Bailey tinham.

— Estou dizendo que um dia eu estava na mesma posição que você. Tinha muito a perder. Não estou falando de Laurel ou do meu relacionamento com Joshua. Estou falando que sei o que se passa na sua mente, porque embora eu tenha entrado muito cedo nesse mundo, demorou até eu ser totalmente a vadia que sou.— falei com franqueza, com uma sinceridade que eu nem sabia que ainda conseguia ter.— Estou contando a história do meu primeiro acidente, porque foi também a primeira vez que matei uma criança. Sempre houve extremos para mim; ganhar ou perder na mesma proporção, e eu perdi muito até entender do que precisava para ganhar. Aquele dia eu ganhei um bom dinheiro, e perdi a parte mais humana que eu ainda conseguia ter; aquele dia eu perdi os poucos escrúpulos que me limitava a certos trabalhos. Se trata disso.

— Não acho que consigo perder elas, Any.— a vulnerabilidade estampada em todo o rosto.

— Então não as perca.— falei firme.— Se sabe que é tão necessário para a sua sobrevivência, lute por isso. Seja leal ao que acredita, Bailey. Eu fui leal ao que acreditava e me fodi muito na vida, mas consegui mais coisas do que uma linhagem toda conseguiria com anos de trabalho árduo. Você tem muito a perder, e se isso for um problema do qual você não saiba lidar, me avise. Eu te disse que tiraria se fosse necessário.— pisquei o olho direito. Bailey assentiu, hesitante, e abriu um sorriso pequeno.

— Obrigado.— murmurou em voz baixa, se desencostando do carro.

— Sempre que precisar, latino.— destranquei a porta, abrindo-a. Antes de entrar, a voz de Bailey me fez parar.

— Any, você confia nele ?— me virei novamente, arqueando as sobrancelhas.— Em Josh...— especificou. Eu já sabia a princípio.

— Não confio.— respondi, me virando para entrar no carro.

— Mas...— me virei novamente, batendo a porta do carro e me encostando nele, cruzando os braços na altura do peito.

— O que está acontecendo, Bailey ?— perguntei. A voz saindo mais fria do que eu planejava. De certa forma, eu sabia que tinha algo a mais, quando se tratava dos gêmeos May, sempre havia. Noah tinha sido guerreiro a aguentar Sabina por anos.

Uma simples frase deles, nunca era uma simples frase.

— Meu pai dizia que a vingança acaba com as pessoas, que não existe lealdade quando se trata desse quesito. A dor pode acabar com as pessoas, mas a vingança transforma o que há de ruim já dentro delas.— me encarou nos olhos.

O analisei por completo. Praticamente a minha altura, já que eu estava de salto, coberto com um casaco marrom escuro e a pele bronzeada ressaltando. Nos pulsos, algumas pulseiras de couro e um dois anéis de prata na mão direita. Os músculos sendo ressaltados, e a expressão dura e delicada ao mesmo tempo; um rosto forte que parece transmitir vulnerabilidade.

— Seu pai era um homem sábio.— dei de ombros. A princípio, eu e Joshua tínhamos jantando junto do senhor e senhora May. Lembro até hoje; Sabina estava apresentando Noah formalmente aos pais, e Joshua estava querendo foder com o amigo.

— Ou talvez ele só tenha me passado ensinamentos de pessoas boas. Mas, se não for, e isso se aplicar a pessoas como nós, me pergunto o que vai acontecer com você e Joshua.— ele parecia sincero, franzi o cenho.— Claramente se odeiam, e depois disso eu imagino que é questão de tempo até você tentar matar ele. Porque é nítido, nas mais sutis provocações, que a vingança te move, e não é só pelas putas das irmãs dele. Não quando, de certa forma, não foram só elas que te destruíram.

— A onde quer chegar ?— perguntei séria.

— Quero chegar que estou com uma Beauchamp, e se tem algo que eles não fazem, é dar ponto sem nó. Não somos burros, sabemos que quando se trata deles, qualquer respirar pode ser uma manipulação e é isso que eu temo quando se trata de vocês dois.— negou levemente.— Porque claramente os dois jogam, muito bem, mas você sabe que ele consegue ser maquiavélico em pequenas partículas. Temo de você estar sendo uma peça do jogo dele e nem estar se dando conta, tudo por causa do maldito ódio. Cuidado, Any, ele claramente é o cara pelo qual fomos leais, mas é exatamente isso que é o problema.

— No fundo você sabe que ele não forjaria uma morte por isso, e isso me leva ao fato dele sempre saber o que fazer. Ele se preparou, e você é o tipo de mulher que destrói tudo e a todos por ódio ou diversão, que é tão detalhista que chega a ser impossível esconder algo, e eu amo isso em você.— abriu um sorriso.— Mas ele é o tipo de pessoa que faz a mesma coisa, mas ele arquiteta tudo de uma maneira impensável, você é a única capaz de o deter. Mas você era capaz de deter o Joshua de quatro anos atrás, não o que está lá em cima e está abrindo mão da própria irmã, porque não o conhece. Você não se preparou.

— Acha que ele está nos traindo ?— perguntei com um sorriso. Era bom conversar com Bailey, porque ele conseguia soltar os detalhes de uma maneira muito sútil e singela.

— Acho que ele tem planos, você tem mais ainda, e nenhum dos dois está pensando naqueles que vão ser prejudicados. Mas, te dou o benefício da dúvida pelo fato de você estar ajudando Joalin, pelo fato de ainda não ter me matado, quando sei que era a sua vontade. Isso é um alerta, Any, que honestamente eu não gostaria de sentir a necessidade em te dar. Mas você sabe que tem algo mais, e se isso não for um problema seu, ok, mas se um dia for...— fez um barulho de negativo com a boca.

— Você realmente só viu os Donatellos ?— questionei, pendendo a cabeça para a direita. Eu estava calma demais; e isso não era bom. Sempre havia um preparo antes de avançar em algo, ou planejar, executar um plano, isso era baseado na calma. Esse era o meu motivo.

Ele só tinha dado mais credibilidade na voz interior que me fazia perder horas de sono.

Bailey hesitou, e pela primeira vez em um curto espaço de tempo, eu pensei na forma como eu o mataria. Ai estava um dos motivos em ser a desgraça da família; eu solucionava o importuno deles, os matando.

— Os Donatellos roubaram as informações. E você sabe que Krystian desconfiaria mais cedo ou mais tarde.— as palavras saíram com um cuidado redobrado e muito sútil. Minha pergunta não era planejada, a possível resposta dele, sim.— Não conversamos quase nada, ele só falou que estávamos correndo risco. Apenas isso.— abri um sorriso calmo. Levei a mão até os bolsos do sobretudo e retirei os dois recipientes de remédio manipulados que estavam lá. Estendi até Bailey.

Estávamos. Mais de um. Detalhes.

— Dê um jeito de entregar para Joalin, sem que ela saiba que você teve contato comigo.— foi a única coisa que falei. Bailey pegou os remédios, mas ainda me encarou sério por alguns segundos, e vendo que eu não falaria mais nada, apenas acenou com a cabeça e se virou, provavelmente indo rumo a seu carro.— Ei, Bailey!— o chamei, após ver que ele estava a uma distância razoável de mim. O mexicano se virou, me encarando. Me desencostei do carro, abrindo a porta do motorista.

— Se alguém souber um mísero detalhe da história que eu te contei, e eu sonhar, você morrerá.— tirei uma poeira do meu ombro.— E se você estiver me escondendo algo e isso influencie a mim, esqueça tudo o que fiz e faço pelas suas garotas, porque como você pode perceber, eu não ligo para laços sanguíneos ou afetivos, não quando afetam algum objetivo meu.— levantei o olhar, a tempo de pegar a expressão que confirmava o que eu já imaginava; o medo que passou como uma fagulha. Ele não estava me contando tudo.

E em uma simples conversa, um pedaço do meu passado rodeado de uma boa manipulação, Bailey May tinha me confirmado muitas coisas. Algo estava acontecendo, e se dependesse dele, eu não saberia. Porque antes de mim, existia Joshua, o cara mais foda em manipulação, que só tinha pecado ao se mostrar frio com Joalin, o ponto fraco da peça de ouro dele.

Bailey tinha razão; eu era detalhista. E a máscara que tampava minha visão começava a cair. E eu parecia prestes a sentir o mesmo gosto de traição de anos atrás. Fazia sentido.

Eu não estava preparada para lidar com um dos maiores demônios do meu passado. Ainda.

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Me joguei despojadamente no sofá branco da enorme sala. A princípio, eu estava em uma suíte de luxo alugada em nomes de terceiro, era em um hotel distante do centro de Nova York. Correr risco já era confirmado simplesmente por estar aqui, mas eu constantemente me mudava para não ter mais perigo. Quartos de hotéis era uma ótima opção, a não ser caso alguém descobrisse quem sou e tentasse me matar.

Tudo normal.

A dor incessante na minha cabeça parecia martelar sobre o quanto eu estava arruinando com ela, e o quanto estava correndo riscos. A que ponto eu chegaria por vingança ? Essa era uma das poucas perguntas que não teria resposta. Talvez de quem se tratasse aquela vingança, por quem, uma espécie de reparo histórico por toda merda que tinha me fodido.

Por minha causa. Tudo tinha sido feito em baixo do nariz e no fundo, quando se é o alvo, você sabe. Depois que tudo acontece e a venda dos seus olhos caem, o ódio se instala em cada local possível de seu corpo e mente, ele te move na maioria das vezes, e se domina ou não... não dá para saber.

Bailey, embora a maioria o taxasse como burro ou algo do tipo, tinha uma razão descomunal sobre o que me movia e qual seria meu fim nisso tudo. Meu fim era uma consequência tão possível quanto a queda dos Donatellos, tudo precisava ser arquitetado, claro, mas eu não era imortal. E não daria conta de aguentar por muito tempo, o circo estava mais do que fechado para mim.

"Você era capaz de derrotar Joshua de quatro anos atrás, não o que está lá em cima."

Isso ecoava em minha mente mais do que eu queria. Tinha mais importância do que deveria. E, mais uma vez, Bailey tinha razão... e ter plena consciência disso machucava meu ego muito mais do que deveria, também.

Joshua tinha um poder indescritível na mente, isso era uma qualidade extremamente boa para si próprio, mas isso resultava em muitas vidas e planos fodidos. Ele tinha os próprios objetivos, e eu o conhecia bem demais para saber que não importava o que, ou quem, desde que se tornasse um empecilho, ele acabava com a pessoa ou a manipulava.

Quem ele tinha se tornado não era a questão, não para mim. Ele não tinha mudado, não dava para mudar alguém como nós, mas um tempo preso, preso em sua própria mente com a solidão e silêncio, é capaz de você elevar certos pontos, intensificar certos lados. Joshua tinha uma espécie de ligação comigo, e isso não fazia com que eu estivesse fora da lista dele.

Porque ele nunca esteve fora da minha nos últimos quatro anos. E, assim como ele, estive tempo demais com a solidão e ódio sendo minhas únicas companhias. Trinquei a mandíbula, retirando o celular do bolso do sobretudo e desbloqueando, entrando na lista telefônica.

Graças a Krystian Wang e seu software de busca de informações, não havia um número que eu não tivesse acesso. Isso era bom. Cliquei no número que eu queria e coloquei o celular em viva voz.

Enquanto chamava, me levantei, indo até o pequeno bar embutido na parede ao lado da televisão e peguei uma garrafa de whisky. Enchi um copo, levando até a boca e tomando o primeiro gole.

— Alô.— a voz firme e delicada de Joalin Beauchamp se fez presente. Me virei para o rumo do celular, que estava apoiado no braço do sofá, continuei a onde estava.

— Como vai, Joalin ?— perguntei, calma. Ouvindo um arquejo de surpresa do outro lado da ligação, abri um sorriso de lado.

— Bom, não é a minha intenção trocar de cartão...— ouvi o barulho de passos pela ligação.— Mas fico feliz por lembrarem de mim e me oferecem uma nova conta, pode falar.— soltei uma risada. Ligeira igual ao irmão.

— Qual dos dois está do seu lado ?— perguntei.— Sabina ?— negou com um barulho.— Bailey ?— o mesmo barulho, franzi o cenho.— Não me diga que o chinês que xinga os produtos da Chanel e compra assim que sai uma coleção nova, está na sua casa.— debochei, porque era a única pessoa que estava próxima de Joalin o suficiente. Ela soltou uma risada divertida, confirmando o que eu já imagina. Ouvi ela resmungar algo e depois uma porta bater.

— Fico feliz que tenha me ligado.— sussurrou.— E obrigado pelos remédios, não precisava ter deixado na porta, podia ter entrado. Você é sempre bem vinda a onde eu estiver, Any.— havia algo naquela frase que me fazia sentir uma vadia de mão cheia, Joalin era a a única que pensava realmente assim, os outros tinham suas descordâncias quanto a isso.

— Não posso, sinto muito, você sabe porque não posso.— falei em voz baixa, tomando mais um gole de whisky.— Espero que fique bem, Joalin. Que as coisas comecem a caminhar para você... que — hesitei por um segundo.— seja feliz.

— Por que tem que ser assim ?— perguntou em um sussurro baixo e misturado a raiva e mágoa.— Você também merece ser feliz, mesmo sendo... o que é.— arqueei as sobrancelhas, soltando uma risada.

— Você poderia ter me ofendido, garota.— murmurei em divertimento.

— Nunca fui melhor do que você para te ofender. Eu tenho consciência disso.— nesse ponto ela se enganava mais do que qualquer um. Mas eu lembro bem que discussão resultou neste pensamento de Joalin.

Drogas sempre foi uma das áreas mais rentáveis de criminosos, e Joalin conseguia ser a especialista mais competente que conhecia para o cargo. Mas, diferente dos irmãos, ela tinha uma mente dificilmente corrompida, Joalin julgava muito o que Joshua fazia, quando na verdade e indiretamente fazia as mesmas coisas. Ele levantava uma arma e atirava, matava pessoas, e Joalin não era diferente, suas drogas tinham levado muitos a overdoses fatais.

O sendo de justiça dela era um problema, já que ela abominava o fato de recrutarmos pessoas boas. Talvez ela se arrependesse... o que nunca tinha demonstrado ou falado, e no fundo, eu não gostava nenhum pouco do fato dela se opor a cada merda que era feita, nos julgando por ser ruim, quando ela também era.  Joalin tinha uma simpatia absurda e sempre dava esmolas aos mais pobres, mas isso não a fazia uma santa e muito menos alguém boa o suficiente para julgar.

Eu não falava nada sobre o quanto a opinião cheia de princípios dela me irritava, afinal, família sempre foi um assunto delicado para ser discutido entre mim e Joshua. Nesse ponto, tínhamos visões diferentes. Mas, antes eu tivesse dado um jeito em Joalin...

Joshua sempre foi calmo demais por fora, mas eu conhecia o caos de sua mente perversa e afiada demais, não havia ninguém que estava isento dele. Joalin não tinha sido diferente, independente do amor de irmãos que possuíam.

Ela tinha o xingando por ter bombardeado uma casa de alguém que nos devia, o homem tinha assumido a dívida de drogas do filho, logo, levou as consequências por ele também. Joshua a encarou com um divertimento cruel, e um sorriso de lado, antes de falar algo que tinha chocado a maioria, exceto a mim. Ele tinha se tornado isso.

"Quem matou eles foi você, Joalin, porque a área de drogas é sua. Então, ao invés de me julgar por estourar uma bomba, comece a pensar que você está nessa merda e o dinheiro que cai na sua conta vem das drogas que faz. E seu cargo não tem como bônus só dinheiro, ou acha que as crianças do subúrbio que usam a sua droga sobrevivem ? Se quer ser boa samaritana, volte para casa e seja, aqui você vai assumir as suas merdas."

Houve um longo processo até todos entenderem que a amizade e laços sanguíneos que Joshua tinha era um caso a parte, ele ainda era o chefe, logo agia como tal quando necessário. E, nesses momentos, eu ficava feliz por não ter ninguém, e por todos saberem que eu não era, nem de longe, alguém que hesitaria.

Mesmo eu também me opondo à Joalin e sua forma de pensar sobre o que fazíamos, ela ainda conseguia ser melhor em vários quesitos. Não tinha como se opor a isso também, e no fundo, ele sabia disso.

— Você sempre pode tentar me ofender, Joalin. Eu vou ficar surpresa e depois feliz caso você consiga.— soltei uma risada leve, junto da sua.— Como estão as coisas ? Todos estão bem ?— perguntei sutilmente e mansa.

Viva a arte da manipulação.

— Sim e você ?— Joalin era excelente para manipular elementos químicos e formar drogas, nem sempre para omitir fatos. Mentira ela era boa, até demais. Mas para omitir fatos ? Não, principalmente quando ela tinha consciência de quem e do que era capaz a pessoa com quem ela estava lidando. Inteligente demais, como um Beauchamp.

— Senti hesitação na sua voz.— falei despretensiosamente.— Algo que eu deva saber ?— porque se Bailey May não soltava algo a mim, ele se abriria com outro alguém. Mesmo que sutilmente.

— O noivo de Sabina está na cidade. É um bosta.— despejou rapidamente. Arqueei as sobrancelhas.

— Um bosta em que sentido ?— perguntei. Se ela queria conversar, tudo bem, eu poderia fazer aquilo. Nem todos entendiam Joalin e seus sentimentos conflituosos, eu era uma dessas pessoas, mas fingir era uma arte que eu sempre fui mestre.

— Acho que ele já foi um traficante de bosta, e tem um ego tão elevado quanto o Empire State. Ofende há todos quando as coisas fogem do controle dele, se acha sarcástico mas é apenas um merdinha.— bufou irritada.— Não sei como Sabina se envolveu com alguém assim.

Ou talvez não sabe como Sabina não se envolveu com você.

Calei minha boca, eu já era filha da puta demais e evidenciar isso no momento não era o mais aconselhável.

— Sabina tem um gosto peculiar para homens.— falei, enchendo outro copo de whisky.— Veja bem, ela se envolveu com uma cabra.— revirei os olhos, e abri um sorriso de lado. Joalin gargalhou.

— Você provavelmente não iria gostar do atual, vai por mim.— se ele fosse o que Joshua falava, é, realmente não gostaria.— Noah foi a pessoa mais próximo do certo...— encarei o celular com os olhos semi-fechados. Qual é, não era possível que ela ainda não tivesse tentado pegar Sabina.

Até eu tinha tentado... mas tive êxito.

— Quem sabe um dia eu o encontre na rua.— murmurei.— Mas Sabina e Noah seguiram caminhos diferentes, Joalin, é normal eles estarem em outro relacionamento... nem tudo é para sempre.— dei de ombros, abrindo o zíper da bota direita.

— Pelo menos a Zoe é extremante simpática. Uma boa pessoa.— parei na metade do zíper, franzindo o cenho para o chão. Soltei, me levantando lentamente e pendendo a cabeça para o lado direito.

— Desde quando conhece a namorada de Noah ?— perguntei. Ah, eu amava os detalhes e a minha aptidão para me atentar a eles.

Silêncio.

— Conheci na boate, quando houve aquela festa que você apareceu... acompanhei ele até a mansão, por causa do pé.— soltei uma risada nasalada. Poderia ser, mas Bailey tinha deixado muito em aberto.

— Então é isso ?— perguntei, soltando o cinto da saia que eu usava.— Passa quatro anos e você acha que se tornou fácil mentir para mim ? Qual é, Joalin, lidei com você e seu irmão durante anos. É mais fácil dizer que não quer me contar, do que tentar me trapacear. Te auxilio em algumas coisas porque gosto de você, não porque quero que me passe informações.— minha voz tinha uma pitada de sarcasmo. Me irritava, mas não seria evidenciando isso que eu conseguiria descobrir o que tinha acontecido. O que estava acontecendo.

— As coisas estão complicadas, Any...— abaixou o tom de voz. Abri um sorriso encapetado, era tão fácil.— Há dois dias Krystian nos reuniu para avisar que houve um roubo de dados... nossas informações foram roubadas e tudo indica que seja os Donatellos. As coisas estão indo muito rápidas, por um caminho não muito legal.— ponto para o México, então.

— Quais foram roubados ?— perguntei com falso interesse, terminando de tirar a bota do pé direito e partindo para o zíper da outra.

— Ele não disse muito, mas aparamente foi roubado o arquivo de dados sobre cada um. Nem todos. Mas as minhas informações, Bailey, Sabina, Krystian e Noah, foram roubadas.— trinquei a mandíbula, retirando a bota e caminhando até o celular.

— Vocês tem que tomar cuidado, Joalin. Eles vão fazer de tudo para conseguir me capturar, e as pessoas que são mais suscetíveis a saber algo sobre mim ou por onde ando são vocês.— alertei. Isso era verdade, mas eu também já previa... Bailey poderia nos dar as melhores informações, mas como consequência aceleraria o processo de caça. Eu era a pedra no sapato deles, e assim como qualquer dono do tipo da máfia, eles sabiam que eu precisava ser eliminada o quanto antes.

— Você tem que tomar cuidado, Any.— sussurrou, parecendo apavorada. Franzi o cenho, desde quando Joalin tinha medo sobre mim e onde me metia ?— Alguns de nós tem muito a perder, e já se passou muitos anos, nem todos tem a mesma consideração...— me atentei a cada detalhe do que aquela frase realmente significa. Joalin possuía uma inteligência avassaladora, e assim como o irmão, sabia não pisar em falso.

— Do que está falando ?— perguntei.— Se você não me contar a verdade, Joalin, sinto muito, mas serei a próxima a ir pro caixão.— falei séria. Sim, uma vadia completa, que usava manipulação mental com uma garota que tinha pensamentos suicidas e estava prestes a sucumbir a uma perda. Deveria me importar ? Talvez, mas eu não entrava em um jogo sem o objetivo de vencer.

Custe o que custar. E isso se aplicava a pessoas que eu tinha um pequeno e frágil fio de afeição. Não era pessoal, não com ela, mas os caminhos que me levariam a verdade não me importava.

A máfia era assim; ninguém era confiável o bastante, a mesma pessoa que te estendia a mão para ajudar, assim como eu fazia com Joalin, te afundaria sem mais nem menos. E se você se importasse com isso, muito provavelmente seria a próxima decoração de um mafioso ganancioso.

— Any...— soltou um suspiro trêmulo. Revirei os olhos, eu realmente não estava no melhor momento para aguentar choro.— Não me coloque em uma posição que pode custar muito a mim.— trinquei a mandíbula, apertando o copo de whisky que estava na minha mão esquerda.

— Sua cabeça é seu guia, Joalin.— respondi simples.— Espero que os remédios te ajudem a sair dessa.— os mesmos que eu tinha te dado com objetivos divergentes. Não queria que Joalin afundasse nas drogas, longe disso. Mas a fidelidade que ganharia com isso, a gratidão que a faria refém, era de grande serventia.— Adeus.— levei o dedo indicador até o "desligar", mas sua voz me parou antes de meu dedo tocar o touch do celular.

— Espera.— hesitou, tentei não abrir um sorriso, mas falhei miseravelmente.— Eu conheci Zoe nessa reunião, ela o acompanhou. Noah a ama, Any, e isso é tão visível que chega a ser cômico perceber que ele seguiu em frente.— arregalei os olhos levemente surpresa, isso era novo, Noah carregar o brinquedinho junto dele.— Ela é simpática e tem um brilho natural, é alguém que merece ser feliz, eles merecem ser felizes. Sabina com Pepe, mesmo sendo um babaca, também está sendo feliz. E eu percebi, ao conversar com Zoe, que eles merecem a oportunidade de serem realmente o que merecem ser; um casal completo. Vir até Nova York arruinou Noah, porque é cristalino como água, que há uma fidelidade surreal dele com aquilo que viveu com você e Josh.— engoli em seco.

A onde esta praga loira queria chegar era uma boa questão, não me opus, e isso fez ela respirar profundamente e seguir.

— Krystian então... ele parece feliz, verdadeiramente feliz. Com a boate, com tudo que é relacionado a ela. Ele tem um brilho diferente, não o do egocentrismo ou da inteligência, de certa forma, ele se sente em casa.— soltou uma risada baixa.— Bailey, eu não sei se é minha mente me pregando peças, mas também parece feliz. As coisas progrediram para alguns de nós, e não é justo termos que largar tudo por um erro. Mas os meios não justificam os finais...— a interrompi.

— A onde quer chegar com isso ?— perguntei entredentes.

— Se as coisas piorarem para eles, e os Donatellos realmente invadirem, já que Krys acha que esse é um dos próximos passos, cada um já tem um plano de saída. Ou até mesmo antes deles chegarem a tomar o primeiro passo.— passei a mão sobre os cabelos, respirando fundo.— Bailey e Sabina talvez voltem para o México, todos estamos hesitantes com o que talvez vá acontecer... se eles queriam informações, é para saber a onde atacar.— assenti, porque aquilo era uma afirmação verdadeira.— Noah e Krystian... eles cogitaram denunciar você caso aconteça algo diretamente com eles. O que fui totalmente contra.— soltei uma risada.— Você talvez seja pega e está rindo, inferno ?— falou contrariada.

— Me denunciar não é um problema, Joalin, eu já estou sendo caçada. Eles não tem nenhuma informação sobre mim, logo, só fariam isso como válvula de escape pra fugirem ou se safarem.— respondi. Era uma boa tática e mesmo que se a finalidade fosse outra, me trair, não tinha problema algum. Eu não podia me ofender com algo que claramente faria sem hesitar, era só ter alguma coisa ou alguém que realmente valesse a pena.— Você se preocupou atoa.

— Merda. E eu ainda soltei que Noah tinha encontrado Sabina, Zoe saiu de lá arrasada e Noah praguejou até a geração dos meus netos.— então o ex casal tinha se encontrado ? Merda.

Sabina e Noah juntos sempre foi solução rápida para qualquer problema. Eu e Joshua éramos um problema no momento, e dado a situação em que os dois terminaram, algum motivo de força maior tinha que ter surgido para suprir a mágoa.

— Você machucou o coração da pobrezinha.— debochei, ouvindo Joalin soltar uma risada sem graça. A consciência dela ainda pesava, a minha já não tinha muito escrúpulo.

— Eu tenho tendência a estragar as coisas, acontece... — respirei fundo.— Acho que eles terminaram ou algo do tipo. Krystian esteve fora para resolver com os fornecedores da boate e disse que o Noah o procurou, deixando recado com uma das garçonetes. Acha que eu deveria falar com ela ?— arqueei as sobrancelhas.

— Acho que você não precisa de mais problemas para si. E tenho certeza que se Noah e Sabina se encontraram, é porque houve motivos e eles aguentam as próprias consequências.— dei de ombros.— O que não é fruto dos seus atos, não é culpa sua, Joalin. Entenda essa porra de uma vez por todas, todos vocês são adultos, então por assim dizer, deveriam agir como tal.

— Você iria gostar dela.— neguei levemente com a cabeça.

A minha opinião sobre Zoe não tinha como quesito afeição nenhuma a suas qualidades e modo de levar a vida. Para mim, ela era como um objeto de valor sentimental a Noah, e isso para alguém que tinha um alvo na costa, nunca seria bom. Zoe poderia ser a própria rainha da Inglaterra, ainda assim ela não teria valor algum para mim, e isso já era um problema dela dependendo da circunstância.

— É. Talvez.— respondi, não evidenciando que já conhecia a peça de ouro daquela cabra maldita.— Preciso ir, Joalin. Fique bem.— ela suspirou pela ligação.

— Se cuide, Any. Por favor.

— Sempre, loira.— soltei uma risada baixa, desligando a ligação.

As informações não batiam. E eu estava com a morte próxima demais para ignorar isso e as informações soltas que chegavam até a mim; Bailey desconfiava de Joshua, todos eles tinham se encontrado e o mexicano sabia disso, antes disso Sabina e Noah já tinham se encontrado. E como complemento, eu não sabia o que estava rolando ao redor do mundo, quem exatamente estava empenhado a trabalhar para Diego.

Joshua tinha os planos dele e isso parecia cada vez mais lento. Ele escondia muito coisa; e por mais que isso me desse tempo para imaginar mil cenas de como ele morreria, onde todas continham como assassino, eu. Isso trazia mais desconfianças ainda.

Lidar com o diabo era um problema e tanto, porque não há ninguém pior que ele.

Se eu estivesse lidando com alguém que odeio por pura necessidade, manipularia e arquitetaria um plano para me sobressair e acabar com as pontas soltas. Eu faria isso.

Joshua sempre foi igual a mim.

Peguei as chaves do carro, caminhando até a porta; eu não gostaria do que faria, mas eu já não era mais a rainha há muito tempo. Independente de hierarquia e título, eu ainda sabia ter sangue frio o bastante para jogar.

Traições sempre foram algo considerado desonroso pela sociedade, independente de você ser alguém ruim ou não; casos e casos. Para mim, a traição doía no ego, como ácido em um corte feito por adaga, ardia, queimava, corroía por dentro... porque a traição nunca vem de quem você menos espera, ou de um desconhecido. Havia coisas que eu não esquecia, principalmente do que eu me arrependia. E também do que eu aprendia.

Quando eu tinha quinze anos, roubei uma casa. E lembro de ter me pensando que merda estava fazendo, do por que me rebaixava a algo tão simples como roubar um bem material que não daria nem mil dólares. Conforme envelheci. Assaltei mais lugares do que pude imaginar e, embora conseguisse ganhar muito mais com itens luxuosos ou entrasse em uma mansão de alta segurança simplesmente para matar alguém, se tinha algo que não esquecia, era como invadir uma residência.

Não importava a segurança, não mais. Na Ásia, a tecnologia sempre foi tão avançada que eles quase nunca invadem uma residência, com explosões e tudo; chama muito atenção. Aprendi como me disfarçar, isso incluía uma faxineira, prostituta, jardineira ou algo do tipo. Nunca desconfiarão de quem está debaixo do próprio teto, de quem passa e te comprimento com um sorriso feliz e genuíno.

É tão fácil se misturar, que a maioria das pessoas julgam ser um dom. Principalmente quando se tem uma personalidade forte, e características físicas marcantes.

Não cheguei ao topo porque abri as pernas para um mafioso e depois o matei, não que isso seja uma tática ruim, seria fácil e sem prestígio, mas nem todo mundo se importa com prestígio. Eu me importava com meu ego; por isso me tornei a melhor em tudo que me propunha a fazer, mesmo que fosse designado para ser uma vadia assassina. Charme sempre foi tão letal quanto veneno de cobras.

O gerente que estava me apresentando um apartamento para alugar e que elogiava meus peitos sutilmente, que o diria. Agora, ele estaria no décimo quinto sono, enquanto eu já tinha entrado em outro apartamento e aproveitava o conforto da poltrona de couro. Ele ainda acordaria, isso já era um presente por ser simpático e não ter me feito muitas perguntas.

A princípio, para uma cobertura em um dos melhores prédios de NYC, a fechadura era bem fraca. Não que alguém fosse arrombar uma residência em um prédio de alta segurança sem armas ou algo do tipo; exceto eu, que tinha um belo corpo e uma manipulação tão divina quanto minha pulseira de rubis. Teria que dar um aviso a minha querida amiga sobre isso...

A maçaneta da porta girou. Puxei a pistola e desengatilhei, mirando. Abri um sorriso de lado.

A porta se abriu e assim que a vadia me encarou e se deu conta de que meu olhar não era a única coisa apontada para ela, arregalou os olhos e perdeu toda a cor da boca. Deixando a porta aberta e a bolsa cair no chão.

— Entra e fecha a porta.— falei, sem hesitar por um segundo com a arma.— Se continuar, vou furar seu cérebro. Então, de qualquer modo saio ganhando, principalmente se você optar pela morte.— pisquei o olho direito.

— Como você entrou aqui ?— perguntou, enquanto fechava a porta com o pé e mantinha as mãos erguidas. A garganta tremendo levemente, e os olhos que lutavam para não demonstrar tanto, se evidenciavam pelo medo.

— Como eu não atirei no seu cérebro quando tive uma oportunidade ?— perguntei, sarcástica. Me levantei, ainda com a arma mirando bem no meio do seu cérebro.— Entenda, há perguntas que as respostas não são muito agradáveis, logo, não faz diferença.— dei de ombros.— Senta.— apontei para o sofá de cor avermelhada.

— Any, que merda está fazendo ?— a voz trêmula enquanto se aproximando a passos lentos da onde estava o sofá. Ficando à uma distância de sete passos de mim.

— Eu que pergunto. Pensou que demoraria quanto tempo para eu descobrir ?— seus olhos se arregalaram e a mandíbula se tensionou, abri um sorriso encapetado.— Assinou sua sentença de morte quando entrou dentro da minha casa e se achou no direito de me trair.— falei entredentes. Ela soltou uma risada de nervoso. E, se eu realmente fosse insana ao ponto de admirar alguém além de mim, admiraria a petulância da vagabunda, porque a tentativa dela tinha sido bem rápida.

A loira pisou no meu pé com força, batendo na minha mão direita que segurava a arma, fazendo com que ela voasse longe. Senti o soco na cara, me fazendo ir para trás, enquanto ela corria até a bolsa. Provavelmente uma arma. Mas para o desprazer dela, eu nunca apanhei de graça.

Puxei seu cabelo, fazendo com que ela viesse para trás. Dei uma ajoelhada na sua coluna, fazendo com que ela curvasse, pisei com o salto agulha no seu pé, e se o sangue que escorria do meu nariz não me incomodasse tanto, eu sorriria pelos gritos de dor. Mas, a desgraça tinha um treinamento bom, eu tinha de admitir. Sua mão apertou minha perna esquerda e em um desvio de atenção, vi a adaga que estava em minha bota parar na sua mão e ir com toda velocidade para a minha barriga.

Soltei seu cabelo, me desviando da adaga e dando um passo para trás. A loira se virou e pude ver uma determinação diferente em seus olhos, não era sobre morrer, eu conseguia ver aquela determinação em pouquíssimas pessoas ao longo da minha vida, o traço que me fazia a considerar algo próximo de amiga. E não pude analisar muito, porque ela já estava em cima de mim com a adaga.

— Acha que é fácil me matar, vadia ?— disse entredentes, enquanto avançava para cima de mim. Limpei o sangue da nariz, desviando do primeiro avanço da adaga.

Puxei a segunda adaga que estava na bota esquerda e levantei, impedindo da faca que a filha da puta segurava partir minha cara no meio. Seu rosto estava próximo do meu e eu apenas arqueei as sobrancelhas.

— Seu problema é achar que pode ser melhor do que eu, puta.— debochei. Chutando sua barriga com força. O corpo da mulher bateu com tudo em um abajur. O ódio cegava as pessoas, e por mais que ela soubesse como matar alguém, não conseguiria enquanto não raciocinasse.

— Acho que elas provaram bem, te destruindo.— debochou, se levantando e me dando uma rasteira. Cai com tudo no chão, ainda segurando a adaga, a dor irradiando por toda coluna. Senti o peso da filha da puta em cima de mim e a adaga em sua mão.— Morrendo pelas minhas mãos ? Quem diria. — soltei uma risada alta. Eu poderia morrer, mas não pelas mãos dela.

Finquei a adaga na sua coxa esquerda que estava em meu quadril. A loira gritou, pendendo para o lado, mas a mão que estava com a adaga permanecia firme e desceu com uma velocidade impressionante em direção ao meu peito. Retirei a adaga da coxa em um solavanco, ouvindo seu grito de dor, e cortei o braço direito, fazendo com que a adaga que ela segurava caísse em um momento de descuido. Aproveitei que seu peso estava desproporcional e a joguei para o lado, rodeando as suas costas e puxando seu pescoço para meu peito. Contornei o braço sobre seu pescoço, enquanto uma segurava seu rosto. Sua mão fazia força para eu ceder, mas ela não conseguiria.

Não se pode superar o insuperável, Savannah.— murmurei no seu ouvido.— E eu vou quebrar seu pescoço em cinco segundos se não estiver disposta a me dar informações pela sua vida de merda.— a irritação em minha voz era perceptível. A sala, que antes tinha uma decoração incrivelmente bonita e detalhista, estava toda quebrada e havia respingos de sangue por toda parte.

Puxei com o pé a arma que Savannah tinha me feito perder e a coloquei na minha bota novamente. Ainda pressionando o pescoço da vadia. Gastar balas para que, quando em um movimentos simples, eu giraria e o pescoço dela estaria quebrado.

— Quebrando pescoços, Any ? Sempre ouvi as histórias na Ásia, então é verdade.— soltou irritada. Trinquei a mandíbula, sentindo pela primeira vez o ódio realmente tomar conta.

Forcei o aperto e Savannah começou a se remexer, procurando ar desesperadamente.

— Você pode ter o pescoço quebrado, mas seus irmãos... Será que os médicos legistas conseguirão explicar um corpo de uma criança mutilado ? — perguntei, soltando uma risada ao ver ela se remexer, tentando se desfazer do aperto.— Você vai morrer, Savannah, mas pode escolher se vai ser hoje ou não, e se seus irmãos não serão um efeito colateral. Eu vou te soltar e você vai cooperar, estamos entendidas ?— assentiu desesperadamente. Me levantei rapidamente, chutando a costa da loira, fazendo com que ela deitasse no chão e soltasse um gemido. Mirei a arma novamente.

— Levanta.— e em movimentos lentos, a australiana se levantou, segurando o corte na perna que jorrava sangue, a calça jeans já estava com uma mancha de sangue enorme. Savannah se apoiou na poltrona que eu estava, sentando ao não conseguir suportar o peso da perna. Sorri presunçosamente, o estrago na coxa dela não era nada, mas o olhar de ódio por ter sido pega já me satisfazia de certa forma.

— Sempre foi questão de tempo, não é ?— perguntou retoricamente, me encarando com os olhos azuis banhando em lágrimas e ódio. Que Savannah era uma das mulheres mais bonitas, isso não tinha dúvidas, mas havia algo na pose angelical que sempre me parecia familiar demais, que me transmitia uma sensação de algum lugar.— Você sabe de tudo desde que quebrou o contrato. Eu deveria imaginar.— arqueei as sobrancelhas, soltando uma risada.

Mal sabia ela.

— Pensei que saberia, foder com Sina e Sofya não tem privilégios ?— perguntei sarcasticamente.— Eu não te julgo por isso, sabia ? Realmente Beauchamp's sabem como foder alguém e, claro, estou falando dos dois jeitos. Mas, trair, Savannah ? O que se passou na merda da sua cabeça ao entrar em uma equipe do alto escalão e cogitar que ficaria tudo por isso mesmo ? — dei de ombros, limpando o canto dos lábios. Meu batom tinha borrado.

— Talvez, o mesmo motivo que te fez hesitar em atirar no meio da cabeça de Josh.— falou secamente e, aparentemente e para minha surpresa, sincera.— Escolhas erradas nem sempre podem ser revertidas, Any.— eu poderia ficar surpresa ou totalmente desconfiada com isso, mas Savannah tinha sido sincera em alguns momentos da vida e isso eu sabia com exatidão, conseguia ver quando a verdade saia de sua boca. Ou talvez, parte de mim ainda a imaginava como uma filha da puta tonta.

De todas elas, a que eu menos esperava algo desse tipo era ela, por incrível que parecesse. Savannah para mim, tinha sido algo muito próximo de uma amiga, e independente de não ter a parte de segredos ou confissões, a minha consideração por ela era como a consideração que eu tinha por Noah, ou algo muito próximo disso. Que ela tinha se tornado uma vadia, não julgava, mas que tinha feito tudo enquanto eu nutria um sentimento bom por ela, isso me fazia ficar mais puta que o normal. Isso era chocante; o fato de eu nunca ter imaginado que Savannah me trairia.

Digna de ter amizades ? Eu sabia que não, nunca conseguiria tal proeza. Sempre tive esse pensamento, e por mais que fosse extremamente próxima de Sabina ou de outras, havia algo em minha relação com Savannah que eu não tinha com mais ninguém. A traição dela doeria, se eu me importasse realmente com isso.

No fundo, eu pouparia todos os meus problemas se soubesse me colocar no meu devido lugar; estar sozinha.

— Você teve mais de uma oportunidade de me contar a verdade. Não tente cobrir que é uma traídora desgraçada, não tem graça, Savannah.— murmurei, fazendo uma careta de desdém.

— Quer falar sobre isso ?— perguntou em tom de voz elevada.— Qual é, Any, só atire no meu cérebro e poupe-me da sua tortura mental. Isso não tem graça.— apertou a perna, enquanto a mão ficava totalmente vermelha de sangue.

— Especialista em disfarces, a melhor da máfia, tão boa que vivia no anonimato. Eu deveria saber que você era uma puta maldita.— neguei levemente com a cabeça, ainda com o sorriso no rosto.— Ainda penso sobre tudo que você permitiu saberem de você, se é real ou apenas mais um disfarce para foder todos nós, junto com as putas loiras.

Minha amizade com você nunca foi uma mentira.— me encarou com uma seriedade descomunal.

— Não sei qual é a sua definição para amizade, mas acredito que seja diferente da minha, então.— me sentei no sofá, ainda com a arma mirada. Era só atirar.— Vamos poupar o sentimentalismo, Clarke, preciso de informações e você quer que eu poupe sua vida, certo ? Podemos fazer um acordo.— abri um sorriso presunçoso. Ela soltou uma risada sem humor, me encarando com desdém e soltando um gemido de dor ao movimentar a perna.

— O que me garante que não vai estourar minha cabeça ?— perguntou.

— A minha palavra. Nem todo mundo é uma desgraça como você, já está na hora de aprender isso, poxa.— fiz um biquinho, e ela revirou os olhos, mas hesitou. — Quero tudo que sabe, Savannah, a verdade das informações que tem. De agora, das próximas e das de antes, se acha que sua vida vale a pena, só seja sincera comigo.

— O que quer saber ?— a voz baixa e controlada. Savannah Clarke sabia como se fazer muito bem, e o problema disso era saber quando ela estava sendo real, ou quando estava sendo algum personagem que ela mesmo criava na própria cabeça. Não havia ninguém tão bom quanto Savannah para entrar e sair; chegava a ser um dom, e isso sempre foi relevante para mim e Joshua.

Não podíamos entrar em muitos lugares, porque só sairíamos se fizéssemos uma carnificina. Savannah não, poderia entrar como uma empregada e sair como uma mulher de negócios, quando alguém realmente se desse conta, ela já não estava mais lá. Ninguém a conhecia, e isso era um feito e tanto para alguém que trabalha no topo, um talento impressionante.

— O que está rolando na máfia ao redor do mundo ?— perguntei. E seus olhos me analisaram por completo, como se captasse cada detalhe sobre mim. Era divertido ser analisada por muitos, e pouquíssimos realmente saber algo real sobre mim.

— A máfia está caminhando muito bem, evoluindo como uma corrente de água. Mas todos estão compartilhando e dividindo suas forças entre trabalhar e caçar a sua cabeça, principalmente os que são extremamente aliados de Diego, aqueles que precisam de algum favor dele, então... São os que mais se empenham. Há aqueles que ainda possuem um certo carinho, por assim dizer, a você e Josh, e tentam não se meter no meio da caçada, mas a ordem do topo é clara: Um valor por Any Gabrielly viva e outro valor pela cabeça dela, não importa a forma que tragam, mas a preferência é te pegar viva.— mordeu os lábios com força, enquanto apertava ainda mais o forte da perna.

— Como estão os negócios deles ?— meneei a cabeça para a direita, vendo alguns porta retratos com fotos de uma linda família.

— Tão forte quanto titânio. Não há o que dizer, Any; eles sabem comandar como ninguém, e isso cresce há cada momento. E, pra sua infelicidade, eles conseguiram um aliado incrivelmente forte, graças a Dave.— a encarei, vendo um resquício de sorriso surgir em seu rosto. Ela queria que eu perguntasse ? Ok.

— Qual ?— Savannah soltou uma risada sem humor, me encarando com mágoa. Aquele tipo de olhar tinha sido dirigido para mim mais vezes do que eu poderia contar.

China.— trinquei a mandíbula, apertando a arma com mais força.— É o país mais populoso do mundo, e por mais que tenha os índices de criminalidade baixa, você sabe que possuem uma mão de obra barata para fabricação, uma potência incrível para organizações criminosas e assassinos. Vocês nunca conseguiram se aliar a eles, nem sequer prestavam para pisar lá e tentar conversar uma conversa diplomata.— debochou.— Não passou um ano direito, os Donatellos assumiram e já conseguiram a aliança, Dave é muito respeitado ainda, principalmente por saberem que a perca de poder repentina dele foi um golpe, ou contra-golpe.— soltei uma risada.— A China foi de foder, Any, tudo se tornou mais impactante com eles como uns do domínio mundial.

— Desde quando Dave perdeu tudo por golpe ?— perguntei, sarcástica.— Ele apenas provou do próprio veneno dele. Se você sabe do que falam, deve saber também que ele queria enviar a mim e Joshua para debaixo da terra.

— O que falam é que era a primeira vez de vocês dois juntos na América novamente, e Dave não sabiam que se conheciam até então, vocês sempre trabalharam individualmente para o topo. Dave tinha algo grande, e precisava causar um impacto que só os dois melhores e mais famosos assassinos de elite conseguiriam. O trabalho foi apresentado e vocês planejaram por três meses, e em vez de Dave ficar mais rico e poderoso, perdeu a filha e o império. Eu sei muito dessa história, você se surpreenderia.— arqueou as sobrancelhas.— Qualquer um que procure mais, sabe que Josh Beauchamp e Any Gabrielly tem uma origem bem ruim, e nem de longe estavam matando apenas para o topo. No fundo, as pessoas desconfiam, apenas não tem coragem de procurar sobre onde vocês se tornaram o que são.— soltei uma risada alta.

— Pelo visto você teve a audácia de procurar, não é ?— a encarei friamente, ainda com um sorriso no rosto.

— Acha que se eu realmente soubesse de quem se tratava, teria topado me envolver nessa merda ?— disse entredentes e eu dei de ombros.

— Você tem um talento descomunal, mas é burra, Savannah. Não me impressionaria se si envolvesse mesmo já sabendo.— desdenhei.

— Escute a si própria, Any. Você é uma assassina de elite com o ego extremamente inflado, acha mesmo que eu arriscaria uma amizade se soubesse desde o início ?— perguntou incrédula.— Eu fui sua amiga, Any, quer você queira ou não, quer me ache uma vadia ou não. E não teve um só dia em que consegui dormir sem a porra do remorso me corroendo! Porque eu gostava do que tinha com você, e quanto realmente me dei conta de com quem estava lidando, não te larguei, permaneci da forma como pude!— exaltou a voz.

— Você nunca foi minha amiga, Savannah.— falei em voz baixa, com a voz tão cortante quanto a adaga que tinha perfurado seu braço e perna. No fundo, algo me dizia que eu tinha me empenhado em ser algo próximo disso a ela.— Nem se quer foi leal como afirmou a mim e a Joshua que seria. Você acompanhou tudo e sabia de tudo.— ela negou levemente, os olhos brilhando em lágrimas, e algo me dizia que não era dor física.

— Eu nunca compactuaria com a morte da sua filha.— falou em um sussurro, soluçando enquanto tentava secar as lágrimas. Apenas a encarei, e a lembrança dos dias seguidos da morte de Laurel, passaram como um trágico filme em minha mente.

Um dia após eu sair da hospital, o silêncio na mansão era como a confirmação do que eu mais temia: tinha realmente acontecido, minha filha estava morta. Joshua esteve comigo em todo o processo de hospital até o funeral, mas nenhuma palavra se quer tinha saído de sua boca, e muito menos da minha. Eu não saberia dizer se palavras de apoio teriam um efeito sobre mim naquele momento, afinal, nunca as ouvi. Estar sozinha na minha própria mente já estava sendo um martírio mais pesado do que conseguia suportar e, por fora, tudo havia perdido o sentido. Se é que algum dia realmente teve.

Eles tinham nos deixado vê-la. Faltava pouco, dias, para ela nascer saudável... e viva. Ela tinha cabelos escuros e pele clara, o médico disse que os olhos provavelmente seriam claros. O nariz era parecido com o meu, mas ela me lembrava uma foto de Joshua quando era um bebê. A bebê que tinha chegado aos meus braços era linda, e seria muito mais se não estivesse morta.

Não sei dizer até hoje quanto tempo durou a cerimônia fúnebre, se alguém me lançou algum olhar sentimental, se o barulho de choro era de Ursula por não ser avó, ou era apenas meu subconsciente me fazendo lembrar do som do meu próprio choro. Consigo lembrar que o sobretudo não me fazia sentir o frio, mas eu estava completamente congelada por dentro, sentindo uma dor inexplicável se instalar, e nem mesmo as piores das torturas tinham me preparado para isso. A sensação de encarar a morte não me assustava, mas ver que minha filha tinha encarado isso antes de eu a sequer conhecer fisicamente, isso me assombrava até hoje.

E provavelmente assombraria até o último suspiro que eu desse.

Joshua tinha seus próprios demônios para cuidar, talvez procurando uma maneira para que aquilo não acabasse com ele. Não sabia dizer, isso estava longe do meu alcance. O apoio inexistente dele talvez tenha me feito falta, ou talvez eu só fosse alguém destruída demais para querer arrastar mais alguém para meu poço. Enquanto eu vegetava em uma cama, junto de bebida, cigarro e meu próprio silêncio, Joshua estava no escritório com seus próprios pensamentos. Cada um sofria o luto da forma como preferia; mas, havia poucos momentos em que tive a vontade súbita e natural de querer ter alguém perto de mim, esse momento foi um deles... e não tive ninguém, a não ser eu mesma.

Os problemas com a bebida começaram aí. Desde cedo eu bebia desenfreadamente, e após uma temporada muito proveitosa na Rússia, aprendi a realmente beber; ser forte para bebida. Eu era a primeira a entrar e, quase sempre, a última a sair, de uma roda de bebida. Com o tempo, não era mais só porque eu gostava, começou a se tornar necessidade.

Para dormir, principalmente. Antes de um assalto, acompanhando um jantar, conversando sobre alguma coisa. Beber não tinha se tornado um vício, mas uma necessidade para aguentar tanta merda. O álcool não fazia tanto efeito, já que eu nunca bebia o suficiente para ficar bêbada — o que era extremamente difícil. Então, o cigarro também aumentou de quantidade, era um ato compulsivo e ansioso; se não tem um copo na mão ou cigarro, eu provavelmente estarei girando algum dos meus anéis.

Não precisava ser um gênio para perceber que eu tinha definhado após a morte de Laurel. Mas precisava ter coragem para me dizer a verdade sobre isso — e nem mesmo Joshua teve, não quando ele também se afundava da forma dele.

— Você compactuou com a morte dela, quando não me disse a porra do plano de Sina e Sofya.— murmurei friamente, engolindo em seco.— A única coisa que eu realmente queria, era ela.— Savannah soluçou, enquanto meu rosto ainda permanecia passivo.— Como teve coragem de fazer todo aquele teatro, mesmo sabendo que minha filha estar morta tinha parcela de culpa sua ?— perguntei, uma calmaria estranha se apossando da minha voz. Aquilo doía em Savannah, ao menos parecia. Não tinha vindo até aqui para isso, mas a desgraçada em minha frente responderia tudo.

— Eu juro por Deus que não sabia.— tentou limpar as lágrimas que caia desenfreadamente. Soltei uma risada alta.

— Se Deus existisse ele talvez iria te matar por jurar em vão.— respondi sarcasticamente, Savannah negou, o peito se movendo freneticamente enquanto buscava ar em meio às lágrimas.

— Qual é a porra do seu problema ? Acha que eu faria o que fiz se soubesse que elas mandaram matar Laurel ?— gritou.— Você estava sozinha e jogada as traças, porque ninguém tinha coragem de sequer olhar nos seus olhos e perceber que você estava definhando. Josh nem sequer a conseguia encarar por dias! Porque te ver era como ver a própria filha. E mais ninguém ofereceu um apoio enquanto você estava na merda, mas posso te afirmar que para Josh ofereceram, porque ninguém achava que você era digna disso. Já parou para pensar ? Todo mundo fantasia você como uma assassina vadia, e mesmo você sendo, ninguém foi sentar do seu lado para ficar, mesmo que em silêncio, com você!— ela não tinha mentido.

Então por que ficou ?— perguntei, pela primeira vez, desde que tudo aconteceu. E a cara de surpresa de Savannah, me fez cogitar quem tinha sido mais traída em toda a situação.

Eu lembrava.

Mais do que gostaria.

Já havia se passado cinco dias, e eu já conseguia falar com exatidão quantos riscos tinha no quadrado de mármore. Conseguia ver, através das portas de vidro da sacada, que alguns conversavam na piscina, entravam e saíam da mansão, alguns sorriam as vezes e logo depois fechavam... como se rir naquele momento fosse errado ou impossível, para mim era. Não havia um dia que eu não tivesse chorado, as vezes os motivos mudavam; ódio, irá, solidão, angústia e tristeza.

Joshua tentou entrar uma vez no quarto e me entregar um prato de comida. Eu não consegui olhar no rosto dele por mais de dois segundos, antes de desviar o olhar e cair em lágrimas. Tudo nele me lembrava ela.

No sexto dia, todos tinham saído para uma simulação do próximo assalto, isso incluía Beauchamp, e eu estava sentada no chão, enquanto encarava a paisagem lá fora. Mas, me surpreendi ao ver a porta do quarto abrir e por ela, Savannah Clarke passar com um pedaço de torta de morango. Ela se sentou ao meu lado e colocou o prato entre nós duas, enquanto segurava um garfo e me estendia outro. A encarei sem expressão, ou talvez com uma fagulha de confusão.

"Se quiser silêncio, eu fico. Se quiser conversar, eu conversarei. Enquanto isso comeremos uma torta, e você pode me matar ou mandar para tortura, mas sozinha não ficará."

Eu não fiquei sozinha nos próximos dias. Até que precisei me reerguer e catar os poucos cacos que tinha sobrado de mim, isso me fazia ter um carinho a mais pela australiana — ela que estava lá quando precisei de ajuda para colar. E ninguém nunca soube; e por confiar muito a Savannah, conseguia sentir o gosto amargo da traição dela.

— Porque ninguém merece ficar sozinho.— sussurrou, mais para si do que para mim.— E porque eu não me dei conta de tudo que elas tinham feito, até ouvir da própria boca de Sina, dois dias depois que fomos até você falar sobre o funeral de Josh. E se não quiser acreditar, eu vou entender melhor do que ninguém, mas essa é a minha verdade.

— Então, me chamou de vadia e fez minha caveira para os outros por puro divertimento, Savannah ?— perguntei com divertimento, tentando afundar a mágoa em algum lugar do meu subconsciente.

— Você não é o tipo de pessoa que precise de alguém para fazer a caveira, faz por si própria.— respondeu, afiada demais.— Escute, que eu fui uma vadia que ajudou Sina e Sofya a explanarem informações e conseguir de outros mafiosos, eu fui, mas vai me dizer que hesitou ao ir embora e deixar todos para trás ? Qual é, Any, talvez eu seja a única naquela merda que realmente saiba a verdade sobre você. E eu sei, de todas as verdades e mentiras, e se tem uma mentira ,é a que eles acreditam, que você não queria os deixar para trás.

— Ficou magoada por eu ter te deixado, Savannah ?— perguntei, fazendo um biquinho.— Desculpas se não pego putas traidoras para cuidar.— abri um sorriso sarcástico. Nem todas as mentiras poderiam ser descobertas, e por mais que Savannah estivesse totalmente certa, eu não poderia me preocupar com o que os outros optavam por acreditar, por se iludir.

A australiana negou levemente com a cabeça, parecendo totalmente magoada. Entender lados nunca foi um ponto forte da minha personalidade, estava pouco me fodendo para empatia ou compreensão — agora o que eu sentia em relação ao gesto de Savannah, era outros quinhentos. Os erros dela nunca anulariam os acertos, e vice-versa.

— Quer a verdade mesmo ?— perguntou, relaxando aos poucos na poltrona, o sangramento parecia estar ficando pior. Mas ela não morreria, e nem tampouco perderia a consciência, eu tinha pleno conhecimento a onde acertar.— Do início ? Eu te contarei. E depois, te darei todas as informações da máfia para você seguir com seus planos.— ela levou meu silêncio como uma possível confirmação, pois desviou o olhar e começou, parecendo cansada.

— Eu estava de volta à Austrália para o aniversário da minha mãe. Antes estava no Itália, conseguindo informações para Demi Donatello. Conhece ?— perguntou, abrindo um sorriso de lado ao ver eu arquear as sobrancelhas.— Nunca tinha trabalhado para os Donatellos, eles estarem no topo era sinônimo de merda para mim, porque meu trabalho sempre foi no anonimato, isso me fez uma especialista. Mas, o dinheiro que ela queria por míseras informações, foi tentador e eu fui.— abaixei o braço, o apoiando ao meu lado, ainda mirando no peito da vadia. Ela estremeceu, mas prosseguiu.— Ela queria fichas completas sobre Any Gabrielly e Joshua Beauchamp; foi a primeira vez que ouvi o nome de vocês dois. E pelo modo como ela me descreveu, percebi que havia algo errado. Ela era uma vadia inteligente, mas filhinha de papai, e não demorou muito para eu compreender que ela era apenas uma intermediária do pai. Dave sempre fez tudo às escondidas, certo ?— soltou uma risada.

— Eu não sabia absolutamente nada sobre vocês, porque me atentar a quem são os melhores assassinos não era necessário. Mas, Demi sabia que um rosto bonito e desconhecido como o meu, poderia ir a lugares inimagináveis. Ela sabia mais sobre Josh do que sobre você, e ela nunca me disse qual era a finalidade. Neste mesmo período, começou a ocorrer os acertos de contas mais sangrentos do império Donatello, e eu supus que era vocês. Mas não se pode descobrir sobre alguém, sem ao menos saber como é o rosto da pessoa...— trinquei a mandíbula.

Você estava na festa de aniversário dos Donatellos.— conclui. A mesma festa que marcou o meu reencontro com Joshua depois de um ano e meio afastados. Ele continuava desgraçado, isso não mudava, independente da época.

— Honestamente, eu percebi que estava na merda assim que pousei o olhar em vocês dois. Demi estava ao meu lado e os olhava com olhos de águias, e ela nem mesmo precisou dizer quem eram vocês, pelo modo como todos olhavam eu supus que os dois que bebiam despojadamente, ignorando tudo e a todos, que fossem tatuado em cada canto de pele, fossem os filhos da puta que ela afirmou.— abriu um sorriso pequeno.— As únicas informações eram: não se conhecem, são considerados os melhores assassinos, e estão sendo cogitados para trabalhar em conjunto. E eu me lembro de pensar o porque de tudo isso, já que vocês trabalhavam, separadamente, mas trabalhavam para Dave. Ele devia saber com quais cobras peçonhentas estava se metendo, então por que a dúvida ? Mas sabe o que é engraçado, Any ?— me encarou.

— Não faço a mínima ideia, Clarke.

— Que desconhecidos não se olham com ódio a primeira vista, e não possuem uma tensão sexual tão palpável quanto uma coluna de concreto. E se isso se aplica a desconhecidos, imagine assassinos, que são esquivas por natureza. Ninguém naquela festa realmente estava confortável um com o outro; ombros tencionados, expressões divertidas mas com uma pitada de nervosismos, e sempre com o ego fluindo por cada poro. Mas vocês...— soltou uma risada baixa.— Eu vi o olhar dele quando te viu passar por aquela porta, era um misto de conhecimento e surpresa, e não havia nada no rosto dele que me parecesse com curiosidade ou raiva... longe disso. E quando se sentou ao lado dele, totalmente relaxada, mas com um olhar que brilhava, e percebi de longe as provocações sutis e os sorrisos afiados, eu percebi. Nenhum assassino age assim um com o outro, muito menos se eles estivessem disputando o pódio de quem é o melhor. Vocês já se conheciam, tão bem que chegava a ser tenebroso a troca de olhares, mas escondiam isso de uma maneira tão sucinta, que eu entendi o porque de Dave querer saber de vocês; porque ninguém conhece um ao outro, a não ser vocês mesmo.

Engoli em seco.

— Então, fiquei quieta e comecei a procurar. Nenhum registro, mas tantos boatos, e eu comecei a me preocupar, porque Dave me tinha nas palmas da mão. Joshua Kyle Beauchamp, tinha pais e irmãs, um aluno problemático, alguém com uma índole ruim desde que se entendia por gente, problemas com drogas na adolescência e tantas mortes no currículo que nem ao menos conseguem contar. Não havia ninguém que não o temesse, que não elogiasse a inteligência, mas as pessoas sempre me diziam do cuidado que ele possui com tudo que faz; a forma como parece ser um melhor amigo e depois corta sua garganta, que chora como um ator bem pago, como manipula com um sorriso e nem ao menos percebe. Mas, analisei os últimos trabalhos que ele tinha feito, e Dave me disse que Joshua sumia ao ponto de nem mesmo ele, o chefe da máfia, o achar. Ele também me afirmou sobre como qualquer alvo que tinha, se enviasse Joshua, receberia a solução do problema em pouco tempo.— me encarou.

Eu deveria parar a conversa ali, perguntar o que realmente precisava saber. Mas, por algum motivo não parei. Savannah era a primeira pessoa, em anos, que sabia mais da minha relação com Joshua do que nós mesmos.

— Procurar algo sobre você, foi como procurar agulha em um palheiro. Any Gabrielly, não sabia se tinha família, onde tinha estudado, nem mesmo em qual país tinha nascido, a única coisa que tinha conhecimento era de que tinha se tornado uma assassina de elite e possuía descendência latina. Mas, ao te analisar segundo comentários, tracei a forma como você agia; sempre muito egocêntrica, pouquíssimas pessoas conseguiam se aproximar de você, sanguinária, sem se importar com ninguém e muito menos com teatros, e um fascínio por lâminas. Ouvi histórias incríveis a respeito de você e o talento que possui com adagas, espadas ou qualquer coisa que possa cortar.— mordi a língua, tentando conter a porra da minha voz de sair e questionar.— Dave não desconfiava de você, sabia ? Ele dizia que você trazia verdade consigo. Que você era o que apresentava e pronto, que ele esperaria que você o matasse quando julgasse necessário, mas trair não. Ele achava que você não se importava com poder.

— Dave sempre soube que se eu cheguei a onde cheguei, foi porque eu almejava poder. Não tente me fazer de tola. Antes de você sequer analisar comportamentos alheios, eu já matava para mafiosos.— retruquei. Savannah, respirou fundo e continuou, me encarando com aquele maldito olhar; que parecia me conhecer bem demais. E eu odiava em níveis catastróficos isso.

— Então, eu contei a Demi que desconfiava que vocês já se conheciam, e ela me disse que desde que Dave tinha colocado vocês dois dentro de uma sala, tinha dado errado. Pareciam não bater em nenhuma ideia, e todos achavam que eu era louca. Mas eu aprendi que dentro das nossas próprias mentes somos solitários, então devemos ouvir a única voz que está dentro dela. Então, pesquisei sobre os acertos de contas que vocês tinham feito nos últimos anos, tentando encontrar alguma brecha que ligassem a merda de vocês.— apertei a arma com mais força, mas pela primeira vez não vi hesitação nenhuma por parte de Savannah.— Era estranho o fato de que no último um ano e meio, vocês estivessem em lados opostos, nunca perto o suficiente para se encontrar. Mas antes disso ? Um caso na capital do Japão, outro numa cidade próxima... As vezes perto demais. E lá estava o que eu precisava; eu só precisava entender o porquê.

— Geralmente assassinos resolvem problemas perto um do outro, Savannah.— debochei, com um sorriso presunçoso e o olhar, com toda certeza, brilhando em ódio.

— E eu pensei nisso. Mas quando vi você e Joshua brigarem no meio da mansão dos Donatellos, por algum motivo banal. Eu voltei atrás, principalmente quando você enfiou uma adaga no ombro dele... você não erra, Any. E Joshua nunca aceitaria receber uma adaga no ombro de ninguém.— aquele dia, a princípio, tínhamos brigado em algum ponto do plano de Dave, e antes que ele ou os filhos dele pudessem ter interrompido, saímos na porrada na sala de estar. Eu estava com o nariz sangrando e ele com uma adaga no ombro.— Qual ligação assassinos daquele nível podem ter ?— abriu um sorriso de lado.— Então eu pesquisei sobre assassinos. E fui parar na Rússia, porque Dave me disse que lá havia assassinos de muitos anos que servia a ele, que poderiam ter ideia sobre o treinamento de vocês. Porque alguém como vocês, precisavam ter uma ligação e eu deduzi que poderia ser o treinamento.

Então o desgraçado era fissurado em descobrir minha história. Deveria estar surpresa, mas a essa altura, dificilmente ficaria. Não quando a vadia que tinha trabalha para mim, além de me trair, me conhecia há muito mais tempo.

— Russos não são muito adeptos a falar, mas quando uma mulher faz de tudo o que eles querem, você consegue pelo menos um pouco. Então veio a primeira informação, você tinha entrado adolescente e matado o primeiro cara com quem tinha trabalhado, e já era muito conhecida na máfia. Mas, não estava dando muito as caras nos últimos anos. E Josh tinha largado a família há um tempo, e nem sequer pisava em casa, uns diziam porque ele não se importava, outros falavam sobre ele ter muitos inimigos. Mas, com muito esforço e favores sexuais, eu consegui um início.— trinquei a mandíbula.— Alguém me disse sobre o Japão não ter muitos assassinos próprios, mas sempre há chineses perambulando por lá, e que uma gangue que fabricava cocaína tiveram problemas sérios com quatro assassinos, e pelo o que eu disse superficialmente, eles apenas assentiram para as semelhanças. E então fui ao Japão, eu só precisava saber quando vocês tinham se conhecido e se planejavam algo; eu iria ganhar muito dinheiro e proteção.

— Não acho que iria adiantar.— murmurei, secamente. E, para minha total certeza de arrependimento, Savannah assentiu sem hesitar, com a voz cheia de uma mágoa.

— No Japão, por ódio do destino a mim, eu estava em um bar e conheci Akira Saito.— todos meus membros se retesaram em uma tensão que eu não sentia há anos. Meu coração acelerou mais do que deveria, e minha mão, pela primeira vez desde que eu tinha chegado ali, pareceu hesitar. Savannah assentiu, com um sorriso singelo e... gentil, como se entendesse.— Sabe o que me chamou mais atenção nele ? O olhar. Alto e muito forte, vestido tão simples e coberto, e o olho puxado me parecia tão doce. Não parecia em nada com o homem que gerenciava o armamento de Tokyo, mas me falaram isso, e eu acreditei quando vi o reflexo dele ser mais rápido que um raio e pegar um copo que estava para cair. Muito simples, mas tudo nele me lembrava alguém, uma espécie de lembrança viva.

— Pensei que ele estava morto.— foi a única frase que pronunciei, em voz baixa. Um pensamento aleatório.

— Não sei hoje. Mas há anos atrás, estava vivo.— respondeu simples.— Ele conversou comigo gentilmente, usei o título de Dave para dizer que ele queria fazer um pedido muito valioso de armas. Ele arqueou as sobrancelhas e passou às mãos sobre o cabelo liso e enorme, e eu jurei a mim mesma que ele podia ser a própria personificação da morte, mas eu não sairia dali sem alguma nova informação. Sabe o que ele fez ?— eu poderia supor com exatidão sobre o que Akira fez ou deixou de fazer.

— Deve ter dado risada da sua cara.— murmurei, impaciente.— Dave nunca mandaria uma vadia com rosto bonito para o Japão, principalmente para resolver pedidos de armamento. É boa no que faz, Savannah, agora sei o porquê; errou até aprender.— cuspi as palavras com mais veneno do que achei que sairiam.

Aquela puta sabia tanto, e isso me fazia a odiar muito mais do que ter me traído. Todos esses anos, eu estava com uma fonte ambulante de informações sobre mim mesma.

— Você está certa; foi exatamente o que ele fez.— Savannah abriu um sorriso fraco.— E depois ele me perguntou realmente o motivo que tinha me levado até ali, se não fosse um bom motivo, eu morreria em poucos segundos. Mas, eu não perguntei, apenas soltei dois nomes: Josh e Any. Não precisou de sobrenome, de características físicas ou da personalidade. E toda a doçura que eu via no olhar dele se foi, e não sei dizer o que foi mais forte em sua expressão, a surpresa ou o receio. Não medo, receio.— meu coração se apertou, o inferno da angústia parecia querer dar o ar da graça.

— Eu vou acabar com sua raça, Clarke.— sibilei com tanto ódio, que consegui ver o mais puro e genuíno medo em suas ações.

— Precisa das informações que tenho, então vai ouvir até o fim. Até o maldito segundo que tentei correr da avalanche de problema que vocês dois são, e mesmo assim não consegui!— respondeu, com raiva também.

— Vai para puta que te pariu!— me irritei, levantando e apoiando a arma, ponta para atirar. Savannah me encarou com medo e fúria, falando com tanta certeza a próxima fase, que senti uma tontura repentina me bater.

— Assassinos de tanto talento, você se surpreenderia do que são capazes, treinados para salvar uma vida e acabar com ela sem sequer ter uma arma na mão. Não há nada para defini-los, a não ser destruição, por onde passam há morte, há alguém destruído, se é necessário, fazem, se não é mas julgam ser, fazem. É isso que são; gigantes sem freio, cuja a única coisa que se sabe é que irão destruir, não se sabe se é sua casa, sua vida, a de um amigo, ou a deles mesmo.— engoli em seco.— Ele me disse isso de uma maneira tão simples, que precisei de minutos para entender, não sabia se sentia receio pelo o que tinha falado ou animação, uma alma viva que sabia da existência de vocês. E ele te conhecia bem demais, não é ? A propriedade com que ele citava era descomunal, me fazia ter mais certeza do que a própria morte.— murmurou sarcástica.

— Assassinos são pessoas ruins, sinto se ele te disse uma descrição genérica e você caiu.— respondi ríspida. Tudo o que ele tinha falado... estava longe de ser uma descrição genérica. Então, era isso que ele pensava depois de tudo.

— Quando eu ia perguntar de novo, ele fez um sinal de silêncio. Lembro até hoje: "fantasmas não podem ser chamados, se não, eles veem até nós". A palavra chave saiu da minha boca, treinamento, e ele soltou uma risada amaldiçoada que arrepiou até meu último fio de cabelo. Quanto menos souber dos dois, melhor, isso te poupará sofrimento e morte. De onde eles vêm, não se sai, mas eles conseguiram tal proeza. E não é como se eu realmente os conhecesse.— mordi o canto inferior dos lábios.— Eu precisava saber da onde vocês tinham saído, precisava daquele dinheiro, de um início decente. Então, a mulher dele, uma japonesa incrivelmente alegre, chegou ao lado dele, estava grávida.— arregalei os olhos, sentindo a garganta fechar.— E ela disse: Gabrielle quer tomar suco de limão, vamos, antes que sua filha nasça com cara de limão. A vida é uma merda, não é, Any ?

Hesitei, abaixando a arma, ainda a deixando ao meu lado. Savannah não esboçava nada, a não ser... compreensão e alívio.

Gabrielle, então.

— Guardo as palavras dele há tantos anos, que foi um martírio mais pesado do que a mentira de Sina e Sofya. Eu arregalei os olhos, Gabrielle não é um nome comum na Ásia, e ele apenas me encarou com um olhar frio igual ao seu, coincidências demais. O recado foi claro: "Sim, é em homenagem. Não sei da onde você os conhece, mas fuja enquanto pode, eles são demônios e a carga que carregam por terem feito certas coisas, só trará caos. Você nunca os matara, porque somente eles podem fazer isso. E, porque se você fizer isso, principalmente com aquela mulher, quem vai acabar com você, sou eu."E eu, burra demais, dei uma risada alta. Eu tinha o chefe da máfia mundial, quem aquele cara pensava que é ?!

Burra. Que bom que ela tinha chegado a conclusão certa.

— A resposta foi uma adaga fincada entre os meus dedos, um centímetro a mais teria decepado, mas ele não errava, nunca errou, não é, Any ? E eu lembrei na hora de você; a mesma aptidão, com os olhos fixos nos meus, como se fosse guiado por uma ordem divina... ou maligna.— me encarou, soltando uma risada baixa e sem humor.— A frase dele perpétua até hoje; Porque sou um especialista em lâminas da Liga, e se você não quiser mexer com o mestre, não vai querer mexer com quem o superou.— trinquei a mandíbula.

Eu nunca teria o superado.

— Foi assim que Dave descobriu então... mesmo assim você contou.— assimilei. A princípio, Joshua e eu pensávamos que alguém tinha conseguido seguir o nosso rastro e Dave tinha impedido.

— Precisava do dinheiro. E ele me deu, simplesmente por ter dito um nome; e depois eu estava livre, Any.— murmurou em voz baixa, como se lembrasse de tudo.— Quando voltei para casa, na capital da Austrália, minha mãe disse que alguém tinha enviado uma caixa com dezessete corvos decapitados.— engoli em seco. O gosto do ódio se misturando com o do remorso em um passe de mágica.— E uma adaga de ouro com um rubi encrustada na ponta. E um recado " Você morrerá, nem que isso demore anos", e eu fugi durante anos, até que as coisas se acalmaram e eu não precisei mais.— soltei uma risada alta.

— Você recebeu o caralho de um rubi, e acha que não está jurada de morte ?— perguntei sarcástica.— Entenda, Savannah, se há um objetivo a ser cumprido, ele será cumprido.— e mais uma vez, eu estava falando a verdade nua e crua. Ensinamentos são passados de pessoa para pessoa, e são perpetuados quando são necessários.

Esse era extremante necessário.

Não receba a porra de algum item com um rubi. Porque, se você recebeu, eles te acharam e irão atrás, e aí tudo passa a ser questão de tempo.

Eu tinha recebido um colar rodeado de rubis. Brincos, anéis, adagas e todas as merdas que um rubi pudesse ser colocado.

— Nunca mais tive contato com os Donatellos e só fazia serviços pequenos para continuar mantendo riqueza. Mas, eu não contava que iria me apaixonar, Any.— falou rapidamente e eu endureci a postura, a encarando com tanta descrença.

— Como pode ser uma puta burra do caralho ?— exclamei.— Se apaixonar por aquela desgraça ? Qual é, Savannah!

— Sina, apareceu como um anjo em minha vida, me mostrando um mundo onde eu realmente poderia ser feliz e me preocupar com o preconceito, mas não com assassinos na minha cola! Eu nunca tive tempo para processar a onde estava me metendo, porque quando percebi já estava querendo prosseguir uma vida ao lado dela. E você não é ninguém para me julgar, não quando Joshua te fez uma cadela manipulada.— ela tinha tocado em uma ferida ?

Puxei a adaga da minha bota, jogando contra a poltrona. Savannah gritou quando a adaga parou exatamente a onde estava a mão dela, que se não fosse um bom reflexo, estaria decepada.

— Cuidado com o que fala. Você até pode saber da onde eu vim, mas não sabe como realmente é, e nunca me viu como realmente posso ser.— Rebato, entredentes. Savannah ofegou, tentando controlar a respiração, arregalando os olhos azuis.

— A verdade é que quando Sina me propôs uma oportunidade, ela nunca disse tudo. Me disse que o irmão estava para trai-la, e seria por pouco tempo que eu coletaria informações de vocês e das outras máfias para ela. Eu estava cega e apaixonada, Any, faria tudo por ela.— engoliu em seco e eu neguei levemente.

Amor cegava as pessoas, a faziam tolas.

— Por isso que quando nos conheceu, entrou em choque. Já sabia a onde estava se metendo.— abri um sorriso sarcástico.

— Quando ela me apresentou a Josh e a você, foi como um prévia do inferno. Anos depois e ainda continuavam com a mesma expressão de poder, inabaláveis. E você ainda me chamava mais atenção que Joshua, porque vocês dois são os piores, mas em áreas diferentes. Tentei pular fora depois de um ano trabalhando para vocês, mas aí começou a ficar pior para mim, Any. Se você se sente traída, me mate, e depois mate as putas, porque elas também me traíram.— murmurou enraivecida.

— Você chupava Sina e sentava na cara de Sofya, me poupe do papo de "Não gozei e agora quero represálias", isso não cola comigo, Savannah!— respondi em desdém. Mesmo sabendo que a chance da mulher a minha frente estar mentindo ser nula.

Savannah não mentia, ocultava. E, por mais que a linha entre os dois fosse muito tênue, havia diferenças. Não que isso fosse ser levado em conta; eu tinha perdido muito do mesmo jeito.

— Eu namorava Sina! E Sofya me embebedou e eu...— perdeu a fala, batendo com força na poltrona.— Eu transei com ela. — falou com arrependimento e eu abri um sorriso, começando a entender o jogo das putas. Manipuladoras de primeira categoria, precisava admitir. Então Shivani não tinha sido a única.

— E deixa eu adivinhar, por favor, agora estou até me divertindo.— murmurei, porque eu adorava foder com os outros.— Ela ameaçou contar para Sina, e você viveu com o medo de terminar com a namorada porque transou com a irmã, isso se tornou um problema que você não soube sair, e continuou cedendo a vontade das duas, quando na verdade elas tinham combinado até isso. Realmente, aqueles loiros Beauchamps são os próprios secretários do capeta.

— Depois da ruína, Josh foi preso e eu pensei que as coisas fluiriam, poderia ser feliz depois de viver anos com medo da morte. Não foi o que aconteceu. Sina se mostrou confusa pelo o que tinha feito... e eu, bom, precisei me afastar, eu também estava com sentimentos confusos relacionado a outra pessoa. Ela me procurava quando queria, e eu nutria um amor doentio de esperança que fosse dar certo. E ao mesmo tempo, sentia que a estava traindo.— os olhos da australiana ganharam um brilho de lágrimas e um sorriso distante.— Perdi minha mãe, e ela foi a única que esteve ao meu lado, não conseguia me afastar de Sina nem quando quisesse, Any. Porque no fundo, eu amo o personagem que foi até mim na Austrália e me fez companhia durante anos. — arqueei as sobrancelhas, com tamanha dor que ela colocava em cada palavra.

— Se você me odeia por amar Sina, tudo bem, eu também me odeio por isso. Mas não posso fazer nada, não quando luto todos os dias para não ceder a saudade.

— Está sem falar com elas há quanto tempo ?— questionei, séria.

— Dois dias depois do enterro, eu estava irada e a questionei sobre tudo. Ela me disse que tinha planejado tudo, que Dave tinha passado o meu contato... eu sempre fui parte do plano de todos eles.— negou com a cabeça, os cabelos loiros caindo em cascata.— Fui usada.  E isso, mesmo que a amando ao extremo, me fez sentir raiva o suficiente para me livrar de uma humilhação. Então fui embora, sem forças para tomar alguma atitude, mas li a carta de Josh e então retornei a casa de Sina para avisar que ele logo iria caçar ela. — engoliu em seco.— Não há o que dizer, Any. Essa é minha história, fui a peça de tabuleiro de um jogo grande demais, e acabei me envolvendo com pessoas piores ainda. As consequências, estou sofrendo agora.— me encarou e eu encarei de volta. Ficamos assim por alguns segundos, enquanto ela ainda pressionava o corte.

Ela não iria morrer, eu sabia a onde tinha acertado perfeitamente. O suficiente para imobilizar e sangrar, mas não para morrer, perder movimentos ou a consciência por falta de sangue.

— Não entendo como lutou contra toda sua inteligência, Savannah.— murmurei rouca e ela começou a limpar as lágrimas.— Contra o instinto de autopreservação que sei que possui. Você deveria ter saído fora quando soube que estaria lidando comigo e com ele, isso nunca daria certo.— falei, enquanto girava o anel anelar que estava na minha mão esquerda.— Há um talento especial em você, sobre entrar e sair em qualquer lugar, ser quem quer seja. Conseguiu trair há todos, mas conseguiu me fazer sentir o gosto amargo da traição mais intensamente.— seu olhar triste e arrasado se arregalou.— Porque ninguém nunca fez o que você fez por mim, e eu te considerei, Savannah. O tipo de pessoa que se precisasse de um favor, eu concederia, e acredite, eu não concedo favores a qualquer um.

— Any, eu...— fiz um sinal de silêncio. Ela calou a boca e eu continuei com a mesma expressão; inabalável. Quando na verdade eu tinha muita coisa a processar, sentimentos demais para digerir e planos para elaborar.

— Então, Savannah. Me diga, tudo não passou de um plano também ? O fato de me consolar em um momento de vulnerabilidade ?— pendi a cabeça para a direita. Aquele simples ato significava muito, porque eram em simples coisas que me faziam prosseguir diariamente.

Diga que sim, será mais fácil te matar se sim.

— Não.— e nem uma abertura pra qualquer hesitação.

— Acreditar em você, Savannah, é como esperar que uma serpente venenosa possa dormir ao seu lado. Talvez ela durma, mas se ela se sentir ameaçada, ela irá picar.— fiz uma analogia simples. E se Savannah realmente fosse inteligente e soubesse do que eu era capaz, poderia se livrar do que estava por vim.

— Só me diga o que quer saber e vamos acabar com isso.— suplicou. Então ela sabia como ia acabar ? Interessante.

— Como destruí-los ?— Savannah entendeu a minha pergunta. Que eu sabia como matar ou destruir um império, com certeza eu sabia. Mas, ter informações sobre um império é essencial para saber a onde atacá-lo.

Impossível. E não importa de que caralhos você saiu, sozinha não vai a lugar nenhum.— respondeu simples.— Eles tem a máfia debaixo dos sapatos de couro italiano dele, e mesmo alguns não gostando, ainda responde a eles, não vai ter um lugar no mundo que será seguro a você.

— Eu só quero matar eles.— murmurei despretensiosamente, com um sorriso de lado.

— Não acho que seja impossível matar eles, Any, acho impossível você só os matar e no final conseguir ficar viva.— franzi o cenho.

— Seja mais específica.

— Anos atrás, se alguém matasse você, Joshua estaria no lugar, e vice-versa. Se ainda tentassem e conseguissem matar os dois, ainda teria uma equipe para aniquilar e as pessoas que eram temente a vocês. Não se trata de só matar e sair, se você fizer isso, morrerá, porque toda e qualquer pessoa te encontrará.— exclamou, falando rapidamente.— Neste caso, há quatro pessoas no topo, há a equipe delas, há pessoas temente a eles, e tem o bônus de Dave estar vivo e ter um ponto extra contra você. Eles já possuem um plano para cada um deles caso caiam, não há um lugar no mundo que te oferecerá arrego, você sequer vai conseguir sair há tempo. Não há sequer uma forma de tudo isso ser baseado na vingança, porque você não pode matar quem está comandando uma hierarquia, a menos que...— perdeu a fala, parecendo se dar conta de tudo. É, Savannah, eu também começava a cair em si.

Parei. A encarando seriamente. Então... trinquei a mandíbula.

— A menos que ocupe o lugar deles e eles assinem um contrato, passando o poder para mim. E depois, eu retome as rédeas da máfia mundial e sofra a represália por parte daqueles que ainda são temente a eles.— completei, soltando uma risada baixa. Eu deveria ter imaginado.

Quando um mafioso que possuía o poder de um país ou império, é morto por outro, em troca da reivindicação de poder e comando, tudo é passado para aquele que conseguiu tal feito; dinheiro, dívidas, status, inimigos e poder. Tinha sido assim comigo e Joshua, poderíamos ter começado do início, arranjando a direção de algum país, para irmos crescendo aos poucos, mas demos o golpe no topo — porque acreditávamos que merecíamos.

Um representante do Senegal, por exemplo, poderia não ser leal à gestão dos Donatellos. Mas, na hierarquia, ainda teria de respeitá-los e respeitar as regras que eram impostas; sejam de consumo, importação e exportação, barreira de entrada e saída para certas pessoas. Era complexo; mas só conseguia isso quem queria e fazia por onde.

Ter audácia para matar um chefe é para poucos, e nem todos fazem para conseguir o império. No início da minha carreira, matei um dos representantes do México porque ele era um filho da puta, mas o fato dele comandar parte da gangue do antigo México, não me atraia, então fiquei em dívida com outro babaca que entrou no lugar.

Audácia movia mentes inexperientes, e por isso a maioria acabava a sete palmos abaixo da terra. Fugir da represália que tinha o feito de matar um chefe, era uma desgraça — uma sensação que eu não gostava de lembrar.

— Quem quiser fazer esse feito irá precisar ter pessoas de peso no time, não é só sobre quantidade. Seguranças o suficiente para proteger, e alguma aliança, independente do país, forte ou não, precisa retornar ao jogo para conseguir atingi-los.— Savannah parecia estar absorta em suas próprias ideias. Ela também planejava aquilo.— Entenda, você conseguindo estar em uma equipe de peso ou ter o comando de algum país com poder de armas, tráfico de drogas ou humano, o que quer que seja, fará você responder ao império deles. Sendo inimiga ou não. E aí, você precisa planejar uma outra parte que meu Q.I não disponibiza, sinto muito.

— Porque estando de volta ao jogo, os Donatellos precisam pensar em quem colocará e qual represálias irão sofrer.— conclui e Savannah assentiu com um sorriso minúsculo.

— Você é inteligente 'pra caralho.— mas não o suficiente.

— Mas, de quem precisa ? Você deve saber sobre a equipe deles, me diga, o que acha que falta ?— perguntei, fingindo tirar uma pluma da minha bota.

— No meu modo de pensar, eles estão preparados para qualquer, repito, qualquer plano. Uma mente inteligente de uma medida excepcional, alguém muito bom em matar e despistar, alguém insano o bastante para conseguir informações, elementos que podem ser descartados, e alguém que consiga ser o equilíbrio disso tudo. Esses são lacunas que você precisa preencher, se quiser ter êxito em montar um plano. Para conseguir realizá-lo, vai precisar dos melhores entre os melhores.— mordi a língua, tentando conter a calma.

— Qual país está forte o bastante para se aliar, mas fraco o suficiente para o chefe ser derrubado ?

— Grécia está com o tráfico humano em alta, pode se dizer que as melhores mulheres estão saindo de lá, vindo de todos os cantos do mundo. Antônio Megalos é um traficante potente e conseguiu todo o comando do país. Difícil de matar, mas não se for uma mulher bonita e com traços latinos.— gemeu de dor, ao tentar movimentar a perna.

— Você seria uma aliada e tanto há anos atrás.— debochei.— Quero te perguntar mais alguma coisa...— eu estava torcendo para estar errada. Não aguentava mais tanta merda sobre mim.

— Siga em frente.

— Lembra de Viviane ? A melhor organizadora de rachas.— Savannah assentiu.

— Como se esquecer daquela puta loira ? Eu amava as festas, mas sempre tive vontade de degolar a cabeça dela.— soltei uma risada leve, sem querer.

— Por onde ela anda ?

— Diego assinou um contrato para ela sair da máfia.— franzi o cenho.— Sim! Também fiquei confusa, mas ela conheceu alguém, não sei te dizer ao certo o nome, se apaixonou e casou. Teve filhos até, e largou desse mundo. Sumiu completamente, dizem que ela só paga favores que devia, e quando o último acabar, estará mais que livre para viver com a família. Bom, é isso que sabe.

Engoli em seco.

— É bom saber, isso talvez incremente algum plano.— dei de ombros, com uma calmaria que poderia assustar qualquer um. O sangue frio tinha sido um requisito desde sempre, e com a constância, se tornou crucial e normal. Ninguém conseguia compreender o que se passava comigo, se eu estava em um bom ou mal dia, se estava um caos ou em paz. Só permanecia a incógnita, um elemento surpresa para qualquer ação que eu tomaria.

— Não seja suicida ao ponto de tentar fazer isso sozinha. Por favor.— arqueei as sobrancelhas, evidenciando a surpresa.

— Por que se importa ?— perguntei.

— Acho que observei você tempo demais para saber que é muito mais do que transparece ser. Não estou falando só sobre seu lado ruim, que sei que ainda não apareceu totalmente, mas também sobre seu lado bom.— permaneci inexpressiva.— O fato de nunca falar sobre o que te irritava em Joalin, porque sabia que ela poderia sentir demais. Nunca pedir para Shivani ir em assaltos com crianças, depois de tudo, porque sabia que ela não aguentava. Comprar sempre o chocolate que Krystian gosta, para que ele não reclamasse tanto. E o modo como olhava para Josh, para o quarto de Laurel, para a equipe. Foram rara as vezes que vi a verdadeira Any, era sempre quando você esquecia de se esconder.

— Não escondo o que sou, Savannah.— retruquei. Mas as palavras dela pareciam ter um efeito do qual eu desconhecia, ou não me lembrava há um tempo.

— Mente para si mesma. E sabe que esconde o seu pior e bom lado, o que era e ainda é, é apenas um meio termo, Any.— respirei fundo.—  O que te faz ser quem é, parece te assustar; você não desaba por um momento, você não se permite sentir nada, porque está sozinha e quando esteve com alguém, não adiantou, porque Joshua sempre foi um personagem bom demais para ser desfeito. Está é a diferença de vocês; Por isso todos estavam do lado dele, porque sempre fantasiavam o que viam. Você é verdadeira, Any, por mais que se oculta muito. Mas, Josh ? Ele é tão ruim quanto você e ainda assim consegue ser a melhor pessoa para se ter ao lado. Isso me incomodava; o fato de te julgarem por estar demonstrando sua verdadeira face, quando na verdade, o loiro não ficava para trás.

— A onde quer chegar com isso, porra ?— perguntei, em voz baixa. Sentindo mais do que deveria, de novo. Tudo parecia estar me afogando em um mar salgado de verdades.

— Ser uma assassina de elite. Isso não anula o fato de você realmente ser, mas ninguém nunca te olhou como deveria, além da matança. A não ser ele, e por isso vocês eram perfeitos. — fechei a mão em punho, captando cada detalhe do rosto angelical e perfeito de Savannah, que parecia vulnerável e verdadeiro demais.— Eu acredito em redenção, Any, e talvez você só não acredite, porque acha que não é digna.— e essa frase, a maldita frase, parecia ter perfurado meu coração quando um bisturi.

— Você não sabe do que está falando.— soltei uma risada, totalmente descrente.

E, o destino realmente não estava ao favor de Savannah. Me virei, ao ouvir o barulho da tranca, levantei a arma, mas abaixei rapidamente ao ver duas crianças passar por ela. O pânico tomou conta de Savannah, e em um movimento rápido, ela puxou uma manta do sofá, cobrindo a perna e a mão manchada de sangue. Bem na hora.

A menina com certeza era mais velha, pelo modo como fazia caretas para o irmão mais velho. Belas crianças, eu tinha que admitir. Os cabelos loiros contrastavam tão bem com os olhos claros, extremamente parecidos com Savannah. Em versão pequena e mais birrentos que a irmã mais velha. Enquanto os irmãos brigavam na porta, sem se dar conta de que eu estava lá.

Encarei Savannah, abrindo lentamente um sorriso de lado. A australiana arregalou os olhos, negando levemente e perdendo a cor dos lábios aos poucos.

— Belos irmãos, Savannah. Por que não os apresenta ?— o menino foi o primeiro a me encarar, abrindo um sorriso bobo e me encarando com um brilho nos olhos. A menina, pareceu meio hesitante, mas puxou o irmão é caminho até onde estávamos.

— Como você é linda!— o garotinho comentou, soltei uma risada. A praga era linda, não tinha o que me opor a isso.

— Você também é. Qual é o seu nome ?— perguntei, arqueando as sobrancelhas.

— Não responda!— Savannah gritou. A irmã dela foi esperta, porque na mesma hora puxou o irmão para perto de si e se afastou.

— O que está acontecendo ?— perguntou a garota, assustada. Savannah fez um sinal de silêncio com a mão e sussurrou "não se mexa".

— Não posso saber o nome da sua família ?— perguntei.— Você soube a da minha.

— Eu já te disse tudo.— suplicou.— Por favor, Any...— abri um sorriso de lado, encarei as crianças que estavam assustadas.

Eu poderia ter formado uma família assim.

— Por quem ?— perguntei em voz baixa, e Savannah franziu o cenho, com o rosto molhado em lágrimas.

— Quem o que ?

Por quem estava apaixonada ?— a encarei, e de todas as perguntas, aquela realmente fez Savannah se surpreender.— Por quem criou sentimentos ao ponto de achar que estava traindo Sina.— ela negou com a cabeça, mordendo os lábios com força.

Assenti, realmente entendendo. E, naquele momento, eu pude sentir uma tristeza que não sentia há tempos. Não a dor dilacerante que  tentava me dominar, mas a tristeza de não saber de como poderia ter sido.

A explicação de tanto ódio direcionado a mim, a forma como tinha falado de Joshua desde que cheguei. O porque de ter estado ao meu lado.

Savannah tinha se apaixonado por mim.

— Eu sinto muito, Savannah.— A frase mais sincera que soltei desde que tinha pisado os pés ali.

— Acredite, eu sinto mais. Você, mesmo com toda suas imperfeições, ainda seria melhor do que eu, e não é como se houvesse probabilidade disso acontecer.— aquilo me desnorteou mais do que deveria e parecia tirar um peso de Savannah.

Me levantei, engolindo em seco e encarando as crianças. Caminhei até a porta, vendo a garota apertar mais ainda o irmão, enquanto eu passava ao lado. Savannah tentava se levantar, mas não conseguia. Virei, encarando a australiana, que estava no piso abaixo, sentada na poltrona.

As crianças ainda estava na pequena escada entre a porta de entrada e os sofás da sala. E me encaravam. O garotinho tinha olhos tão puros e bonitos, e parecia não estar assustado, me encarava com afeição.

— Diga a Sina e a Sofya, que eu vou mover o inferno contra elas. E que podem fugir o quando quiserem, antes delas sequer cogitarem a possibilidade de comandar, eu estava matando; porque cada um é bom em sua área.— abri um sorriso encapetado, totalmente automática. Porque agora, como em poucas vezes da minha vida, eu agiria no automático.

— Não falo mais com elas.— respirei fundo. Captando cada detalhe do rosto de Savannah Clarke.

— Mas vai.

— Por que ?— franziu o cenho.

— Você só errou em uma coisa. Porque eu não sou digna de redenção, Savannah.— puxei a arma da bota. E antes que a mulher que tinha se apaixonado por mim pudesse cogitar ou entender o que eu faria, mirei.

— Não!— aquele grito de súplica poderia me atormentar, se eu ao menos ligasse.

Mirei na cabeça da garota, atirando, fazendo com que ela caísse para trás, ainda de olhos abertos e totalmente imóvel. Puxei o garoto para o meu lado, fazendo com que ele gritasse de susto e chamasse Savannah. Todos os sons de choro foram abafados. Rodeei minhas duas mãos em torno do pescoço e girei com tudo, jogando o peso do meu corpo para a esquerda, junto com o garoto, ouvindo o barulho de osso se partindo e a cabeça pequena do garoto se torcer em um movimento horrendo. Soltei, com o corpo pequeno — e com o pescoço quebrado — caindo aos meus pés. Não encarei os corpos, meus olhos ainda estavam em Savannah.

Os olhos dela estavam arregalados e olhavam os irmãos, agora mortos, caídos no chão. Ela não se movia. Totalmente em choque.

Savannah viveria com a dor, assim como eu.

Ela viveria, simplesmente por ter feito o que ninguém tinha feito. E, mesmo tentando a esconder a todo custo o que me fazia vulnerável, eu sabia, no fundo... eu tinha amado Savannah naquele momento em que sentou ao meu lado.

Mas o destino sempre foi uma desgraça para mim. E se eu assumisse que tinha sentido amor naquele simples ato, precisaria estar disposta a assumir a mim mesma os meus sentimentos.

Não tinha amado só Savannah. E nem de longe o meu sentimento mais forte tinha sido por ela — isso começava a me assustar.

— Estamos quites, Savannah. Te vejo em breve.— pisquei o olho direito, chutando levemente o corpo do garotinho a minha frente.— Ben poderia ter sido um homem incrível, se você não tivesse atravessado o meu caminho.— abri um sorriso de lado. E sem ouvir nada, me virei e abri a porta do apartamento.

Eu precisava beber.

|♤|

Parei o carro no semáforo, enquanto abria a garrafa de tequila e levava até a boca. Engoli três goles de uma vez, apoiando a garrafa no apoio só para mudar a marcha do carro. Considerando que eu já tinha bebido mais cedo, e estava no final dessa garrafa, eu podia deduzir que meus pensamentos já tinham um teor alcoólico mais alto do que deveria. Eu só queria ficar bêbada, e me esquecer de onde sai e para onde fui — e do que tinha escutado.

Não podia ser. Encarei a pulseira de rubi, que rodeava meu pulso direito. Dezesseis rubis, fora os do colar e brincos que eu tinha recebido há anos. Uma das joias mais bonitas que eu tinha, a mesma que dizia que minha cabeça era o sonho de consumo.

Que eu estava jurada de morte bem antes de sequer cogitar a ideia de ser uma rainha.

Meu celular começou a vibrar de maneira contínua no banco do passageiro, franzi o cenho. Me inclinei, pegando o aparelho e vendo a mensagem "vozes detectada", demorou alguns segundos a mais para meu cérebro conseguir processar o que caralho era aquilo; Mais cedo, antes de todo um inferno cair sobre meus ombros, eu tinha colocado uma pequena escuta em baixo do escritório de Joshua. Ela estava desativada, até minha conversa com Bailey, a confirmação de Joalin e as malditas confissões de Savannah, agora não estava mais. Se houvesse sinal de voz no ambiente, meu celular ou notebook vibrava, e eu poderia escutar o que diabos acontecia.

O destino talvez quisesse me ajudar. Então, ativei o som, apoiando o celular no banco e continuando a dirigir. Eu estava próxima a boate de Joshua, mas queria apenas uma coisa; paz. Então continuei seguindo reto, a caminho do meu hotel.

Havia uma leve batida de música eletrônica no fundo, mas estava abafada. A essas horas a boate já funcionava. Mas havia mais vozes que o convencional naquele escritório, e não precisou de muito para eu compreender isso.

— Tem certeza do que fez ?— não conhecia, mas era voz masculina. Nem fina e muito grave. Me interessei na hora.

— Não acho que ela vá realmente falar, a mulher é uma tonta.— arqueei as sobrancelhas. Voz de mulher e chegava a me repugnar, de tão nojenta que era. Que diabos de mulher era.

— Vá por mim, vai dar tudo certo. Eu sei exatamente a onde jogar.— e a voz calma e divertida de Joshua preencheu meu carro. Todo meu sentido se aflorou com isso, trinquei a mandíbula, encostando o carro no meio fio e o desligando.

— Claro que sabe, filho da puta.— uma voz masculina diferente, acompanhada de uma risada.

— Inclusive, ele já está te procurando. Andou por caminhos diferentes do convencional, está tentando ter contato com Krystian a todo custo.— uma voz feminina calma e delicada ressaltou. Isso me cheirava a armação há milhas de distância.

Fazia tanto sentido.

— Ele não me decepciona, eu sabia.— soltei uma risada incrédula. A única pessoa que não o decepcionava...

— Ainda acho que você vai arrumar problemas com isso.— algum homem respondeu.

— Não posso me dar o luxo de não ter o melhor ao meu lado. E a garota é inocente demais, está aterrorizada, ainda não contou da gravidez para ele...— e tudo a minha volta se preencheu em silêncio, como se o tempo passasse de maneira vagarosa, se colidindo com a intensidade e pressa dos meus pensamentos.

— E quanto a assassina ?

— Acredite, ela possui um gênio do cão, partir do momento que cair em si e perceber que está presa a mim. Isso vai ficar um caos.— soltou uma risada.— Será como tentar aprisionar minha morte eminente.

— Como ela não percebeu tudo ?— alguém perguntou.— Ela literalmente está presa a você, se não te ajudar, todos morrem, inclusive ela. Para a melhor, ela caiu fácil.

— Porque Any é como um leão cego, altamente mortal e poderoso, mas está sem rumo por não conseguir ver. Muito tempo sendo o topo faz as pessoas esquecerem dos pontos que precisam de atenção.— respondeu sútil.— Ela não caiu fácil, porque ela nunca esperou isso. Ninguém com aquela personalidade e inteligência se sucumbe sem querer, Ravelyn.

É claro, a quem eu queria enganar ?

Os avisos de Bailey, a forma como ele estava mais cedo, as brechas de Joalin e tudo o que Savannah me contou. Desde cedo eu estava jogando contra mim mesma; porque a vingança realmente me cegava.

Mais uma vez traída. Pela mesma pessoa.

Eu tinha depositado uma mínima porcentagem de confiança naquele desgraçado. Ele iria pagar.

Liguei o carro, saindo há uma velocidade que, se Joshua tivesse sorte, poderia me matar. Já estava próxima da boate, talvez sete minutos, e os carros e luzes passavam como vulto, em meio a escuridão iluminada de Nova York. Não estava frio, porque eu estava queimando de ódio; porque em um maldito dia tinha sido despejado tudo sobre mim, como uma avalanche desgraçada de problemas. A rua da boate estava extremamente lotada, parei o carro uma quarteirão antes, e abri a porta do carro com tudo.

Não peguei casaco algum, apenas segurei a pistola na mão direita, andando pela rua movimentada como se não houvesse ninguém para me impedir — e naquele momento não teria. Percebi os olhares sobre mim, enquanto eu caminhava pela rua; não sabia dizer se pela arma ou pelo modo como estava vestida. Minhas botas de salto alto, batiam na altura do joelho, meu vestido estava a um palmo da bunda e era frente única, também na cor preta. Meus braços estavam expostos, deixando todo e qualquer desenho a mostra para quem quer que quisesse ver. Meu cabelo estava liso e divido ao meio, as joias de ouro e rubi rodeavam cada canto do meu corpo, e meus lábios vermelho sangue complementavam.

Havia tantas pessoas. E elas sabiam que um lugar como aquele, teria pessoas como a mim. Alguns homens sussurravam ou gritavam enquanto eu passava, mas eu estava foda-se para uns merdas que o pau nem conseguia subir mais. Eu estava na base do ódio, e nem tentava esconder isso.

Os seguranças da porta, assim que me viram, arregalaram os olhos levemente, mas não me impediram de passar pela entrada. Assim que entrei na boate, uma onda de calor humano me atingiu, aquilo estava lotada para caralho. E a música eletrônica esganiçou sobre meus ouvidos; eu poderia admirar a pegação, a dança, bebidas ou a orgia que rolava no canto mais escondido. Mas passei como um furacão pela multidão — inclusive, alguém apalpou minha bunda —, eu só queria chegar no caralho daquele elevador.

Eu estava em uma velocidade diferente de pensamento, um segundo parecia demorar dez vezes mais, e ainda assim conseguia sentir tudo se esvair.

— Ei, gatinha.— um idiota parou a minha frente, levando a mão para minha cintura. Revirei os olhos, pegando seu pulso e torcendo, levando-o até a costa dele. O grito de dor poderia me incomodar, mas a música cobria. Chutei sua perna com o salto, vendo ele cair no chão. Frouxo.

Os seguranças começavam a andar para meu rumo, mas apertei o botão do elevador, esperando abrir. Quando a porta abriu, tinha um segurança dentro dele, abri um sorriso simples, vendo seus olhos percorrer por todo meu corpo.

— A senhora não pode subir.— soltei uma gargalhada.

— Você não tem noção do que eu posso fazer.— murmurei, entrando no elevador e apertando o botão do último andar. Onde era o escritório. O segurança tentou me puxar, desviei do seu braço, passando por baixo dele.  Destravei a arma, levando até o meio da sua cara e atirando. O corpo caiu entre o vão das paredes, sujando tudo.

O sangue sujou todo o elevador espelhado, uma pena. Sujou minha bota de couro também, que filho da puta, era edição especial.

Sóbria eu já era um problema, e sabia disso com total capacidade. Bêbada, eu já era mais insana, mais sincera e jogos era a última coisa que minha mente gostaria de racionar — por isso eu não podia beber muito, o estrago sempre vinha. Mas, hoje, por mais que eu tivesse bebido um pouco a mais, eu tentava conter todo o ódio que estava me consumindo. A voz manipuladora que sussurrava para mim "traída mais uma vez", a que me fazia perder o sono desde a última vez que eu o tinha visto, "mais uma vez peça do jogo dele". Tudo fazia tanto sentido agora.

A mulher era Zoe. Porque ele queria Noah, não no plano de vingança, no plano de retomada do poder. E eu era a cega, que independente do talento, tinha pulado para o fundo do próprio poço.

Repassei em minha mente, milhares de situações que tinha aberto brechas para me prender a Joshua. Algum maldito contrato.

"Uma mente inteligente de uma medida excepcional, alguém extremamente bom em matar e despistar e que seja leal ao império, alguém insano o bastante para conseguir informações, elementos que podem ser descartados, e alguém que consiga ser o equilíbrio disso tudo."

Ele queria uma assassina de elite, não era ? Iria realizar mais um sonho de Joshua.

A porta do elevador se abriu, diretamente no escritório. E todos os olhares se voltaram para mim, inclusive as armas, abri um sorriso egocêntrico, nem me dando ao trabalho de levantar a minha também. Só havia um que não tinha levantado a arma, e ele me encarava com a mandíbula trincada. Havia três homens, fora Joshua, e três mulheres — inclusive, uma delas estava no colo dele.

Engoli todo o ódio que me corroía e fechei a expressão, franzindo o cenho. Irritada por não saber de algo ? Claro. Eu gostava de teatros, principalmente quando me tornava atriz principal.

— Reuniões particulares agora, Joshua ? Pensei que seu lazer fosse orgias.— debochei, travando a porta do elevador e me escorando no batente. E todas as armas seguiam cada movimento meu. Apenas um dos homens abriu um sorriso contido, me encarando de cima a baixo divertidamente; muito gostoso, por sinal.— Não sabia que tinha ficado sociável e feito novos amigos.— encarei a puta que estava no seu colo e retribuía um olhar de nojo em minha direção.

Joshua estava sentado no centro da sala, e a mulher que estava em seu colo era morena e possuía olhos azuis tão intensos quanto o mar. Bonita para caralho, mas eu era mais. Havia outras duas mulheres; uma era loira e estava atrás de um computador, a outra era negra e possuía um cabelo platinado. Agora os homens, incrivelmente bonitos; um era ruivo e tinha os cabelos cacheados, estava com um moletom branco e com as pernas deitadas no sofá, outro tinha traços europeus e era branco como a neve, e me encarava curiosamente com os olhos verdes. E o que estava tentando esconder o sorriso, tinha os olhos levemente puxados, um cabelo liso e preto, e a pele bronzeada. Todos fortes e com uma beleza que me faziam querer transar com eles.

— É sempre bom ver sua beleza, quer se juntar aos meus novos amigos ?— perguntou, abrindo um sorriso de lado.

— Não sabia que procurava amizades na escória humana, Beauchamp. Devo dizer que regrediu.— alfinetei, começando a ver a raiva cintilar no olho daqueles merdas. Inclusive da putinha.

— Talvez seja lá a onde ele te conheceu.— e para a minha surpresa, além de puta, era audaciosa. Percebi Joshua pressionar a cintura dela, e arqueei as sobrancelhas, o sorriso do desgraçado apareceu.

— Pessoas como eu, amor, são encontradas apenas se quiserem.— desdenhei, girando a arma na minha mão direita.— E talvez você devesse calar a boca, em poucos segundos sua voz já estourou meu tímpano direito.— o homem de cabelo preto engasgou em uma risada, abaixando a arma. Ele foi o primeiro a abaixar, e abriu um sorriso enorme, enquanto me encarava.

— Eu suspeitei que era você desde o início.— murmurou, divertidamente. A maioria franziu o cenho e se entreolhou.

— Abaixem as armas.— Joshua mandou é como cachorros castrados, todos obedeceram.— Conheçam o diabo: Any Gabrielly.— o moreno e o ruivo sorriram, a loira do computador também. O cara branco como a neve e a negra de cabelo platinado, me encarraram com curiosidade, mas a puta... eu amava ver a carranca que causava nas pessoas. Além disso, todos possuíam uma faísca de divertimento; eu era o motivo da piada.

Belos amigos, Joshua...— respirei fundo, caminhando lentamente e passando o dedo indicador sobre a cômoda.

— O que faz aqui, Any ?— a pergunta séria. Soltei uma risada, o encarando diretamente. Esperto demais para saber que tinha algo errado. Dei de ombros, encarando o homem que tinha sorrido para mim.

— Qual o seu nome ?— perguntei, me escorando na parede, e cruzando as mãos em frente ao meu colo, com a arma em uma delas.

— Kyle Hanagami.— piscou o olho direito e eu abri um sorriso.

— Belo nome.— elogiei, desviando o olhar para o ruivo; aquele homem tinha cara de ser insano igual a Bailey.— E você ?

— Hugo Blikosv.— russo então... geralmente os melhores atiradores saiam de lá.

— Russo ?— ele assentiu. Soltei uma risada baixa.— Sabe de uma curiosidade da Rússia ? De lá saem os melhores atiradores, são incríveis. Do tipo que erram um verbo simples em inglês, mas nunca erra com uma arma de longo alcance. — pisquei. Ele fechou o sorriso gradativamente. Me virei novamente para Joshua, que me encarava seriamente.

— Você está assustando o garoto.— murmurou debochado. Mas ele estava irritado; a mandíbula trincada, os olhos que não hesitavam nem por um milésimo de segundo.

Aparentemente, me trair sempre esteve nos planos. Me contar ? Talvez daqui um tempo.

— Não acho que homens como ele se assustam com mulheres como eu. Agora talvez sua amiga sim, já que ela não retira o olhar de mim nem por um segundo.— a encarei, divertidamente.— Se quiser, amor, é só pedir... não há nenhuma garrafa de vodca que me faça negar.— o silêncio preencheu.

— Então eu tenho que te dar vodca ?— Joshua perguntou. Então ele estava defendendo a vadia ?

— Não, baby. Você precisa me dar a verdade.— abri um sorriso encapetado e percebi que todos ficaram tensos. Joshua afastou a mulher delicadamente, levantando da cadeira e caminhou até o centro da sala, ainda me encarando. Todo de preto, com as mangas arregaçadas; a postura gritando luxúria e um poder que somente ele tinha. Os olhos me analisaram com cautela.

— Acho que meus amig...— o interrompi. Que o teatro fosse parar na puta que pariu.

Amigos ou equipe ?— perguntei séria. A voz tão fria quanto meus olhos; Joshua sabia muito sobre mim, inclusive a forma como resolvia todos os meus imprevistos.

— Do que está falando ?— perguntou, com um sorriso de lado.

— Me acha idiota ou burra ?— perguntei, calma. A vadia soltou uma risada e eu a encarei. — Me diga, Beauchamp. Qual a merda do seu problema ? Quem você acha que é, me conte, porque o homem que eu conheci, sabe com quem mexer.— voltei minha atenção a ele. Eu tinha acordado e dormido com aqueles olhos durante anos, conseguia ver tudo o que ninguém via, e tudo o que me traz

— Seja específica, Any.— a voz rouca e totalmente fria, a mesma que era dirigida quando o assunto era negócios. Então sempre foi isso.

— Nunca foi sobre vingança, não é ?— perguntei, soltando uma risada descrente.— Fiquei me perguntando durante anos sobre o que realmente faria quando te visse, e todas as respostas sempre acabavam em morte. Eu sabia disso. Mas você também sabia, não é ?— ele ficou em silêncio e percebi que engoliu levemente em seco.

— Te prometi vingança. E estou fazendo isso, mas você deve saber que não dá para acontecer sem uma equipe.— deu de ombros. Um blefe bom.

— Uma mente tão brilhante quanto a sua, mas uma personalidade tão podre quanto aqueles merdas.— soltei uma risada.— Tudo está planejado desde o início, não é ?— silêncio. Porque não havia mais para onde fugir, tudo se esclarecia de uma maneira surpreendente em minha mente.

— E eu caí como uma idiota.— murmurei entredentes.

— Não foi bem assim, Any.— arqueei as sobrancelhas.— Seja lá o que está teorizando, não fantasie tanto.— debochou. Trinquei a mandíbula, sentindo meus doentes doerem devido a força.— Está errada, ou louca.

— Você.— apontei para o único cara que eu tinha dividido muito mais que poder e dinheiro.— É sobre poder nessa merda, não é ?— me aproximei a passos lentos.— Nunca planejou vingança, planejou a porra da retomada do poder. Morreu, não por causa dos Donatellos, para voltar ao poder e a liga não saber que você está vivo. Porque corríamos perigo.— as palavras saiam sem freio, conforme tudo fazia sentido na minha cabeça.

Joshua trincou a mandíbula e não desviou o olhar nem por um segundo. A inteligência não era uma característica só dele, afinal.

— As cartas foram para manter eles em Nova York, porque os Donatellos iriam bolar planos e você conseguiriam colocar infiltrados na segurança. Nunca se despediu, apenas os manipulou. E eu iria embora, se não tivesse sido a escolhida para responder por Joalin.—abri um sorriso descrente.— Planejou a minha volta, porque precisa de uma assassina de elite para conseguir destruir o topo; e quem melhor que eu ? A lenda da Ásia, que derrotou Donatello, que matou a própria a família.— senti meus olhos arderem.

— Any.— falou sério.— Não é porque faz sentido, que é verdade.

— Me fez suspeitar que sua morte era uma vingança não só para você, mas para a equipe toda. Comigo voltando, além de ter uma mulher sedenta por vingança, ninguém iria se preocupar com a morte do homem mais poderoso... porque iriam ter que lidar com uma assassina de elite sagaz por verdade. Sua morte teve pontas soltas justamente por isso, para me instigar. E eu iria ser o foco, enquanto você consolidasse tudo. — neguei levemente.— Me fez voltar para esse inferno para te servir, porque não há como eu sair mais. Não há como desistir. — engoli em seco, sentindo a irritação nos meus olhos aumentarem mais.

— Como assim ?— ouvi uma voz feminina sussurrar.

Porque eu entrando uma vez, só saio se for morta.— respondi, ainda encarando Joshua.— Não há nenhum lugar que irá me aceitar na máfia, em nenhuma equipe, porque todos querem minha cabeça nesse exato momento. E assim, só terá um lugar que ninguém me caçará... — fechei a mão esquerda em punho.— No império de Joshua Beauchamp, sendo a assassina de elite dele. Não tenho escolha, porque você as tirou de mim no momento que me fez quebrar a porra do contrato.— minha voz estava rouca, e eu não sabia se estava afundando em minha própria mágoa ou dor.

— Você planejou a volta de todos. De cada mísera lacuna para a merda do seu império.— senti a primeira lágrima descer, e os olhos azuis me encaravam com uma atenção descomunal.— Viviane nunca revogaria os favores, porque se aposentou. Ela só voltou, porque você revogou o favor que ela te devia. Sabia que eu não deixaria os gêmeos morrerem, sabia que ele estaria naquela casa, sabia que Astrid tinha a porra de informações!— gritei.— Me manipulou desde que eu pisei os pés em Nova York.

— Saiam.— foi a única coisa que Joshua falou. E eu... soltei uma risada alta.

— Deixe eles ficarem. Deixe todo mundo ver o valor da sua mente brilhante, e o quanto você é um desgraçado manipulador!— gritei, e ninguém se moveu, parecendo em um dilema entre ir e ficar.— Próximo tópico, ou próximo irmão ? — abri um sorriso perverso, com as lágrimas ainda caindo.— Não me diga que arrastou Noah para a merda deste jogo.— silêncio.

— Não arrastei Noah.— deu de ombros, calmamente.

— Não. Arrastou a mulher e o filho dele.— rebati. Joshua arregalou os olhos levemente, mas ainda não perdendo a pose de rei que sempre possuiu.— Tudo por poder. Pelo maldito poder.— respirei fundo, passando a mão levemente pelo rosto.— Por que me arrastar para essa merda ?

— Porque não há nenhuma assassina como você.— aquilo doeu mais do que deveria. Não havia nenhuma tentativa de fingimento, ou sequer palavras doces para amortecer.

Eu tinha sido traída mais uma vez.

E dessa vez.... Engoli em seco.

— As informações.— senti meu coração se acelerar.— Você as tem.— e aquilo tinha sido uma afirmação.— Astrid nunca teve informação sobre mim, ou sobre você. Conseguiu todas e me fez acreditar, por míseros segundos, que talvez você fosse a pessoa que eu conheci um dia.

— Eu sinto muito, Any.— a voz fria como gelo, onde não havia resquício algum de sentimento.— Preciso de você na minha equipe e você quer viver, esperava que as coisas dessem certo para te contar tudo. Mas, se não desse, sempre soube que sua reação seria me matar... se fizer isso, eles saberão exatamente onde você está. Se fizer qualquer coisa errada, você já sabe...— piscou o olho direito.— Entrou em um jogo que não pode sair, amor.

Não se tratava de ser da equipe dele. Se tratava que agora eu era presa a Joshua Beauchamp, um dos brinquedos dele. Agora eu teria que trabalhar para ele.

O gosto da traição era igual há de anos trás, mas agora parecia doer mais. Ele me entregaria para as únicas pessoas que eu fugia.

— Não assinei contrato nenhum, desgraçado.— não que a lei fosse de grande relevância na máfia, mas papéis assinados era provas de que talvez, você tenha concordado com algum termo.

— Mas sua assinatura está no contrato de emprego. Assassina de elite, para mim.— arqueei as sobrancelhas.— Você queria ajudar Joalin, assinou os papéis. Sinto muito, Any.— e eu não sabia como agir, porque nem em milhares de teorias ou possíveis cenas que eu viveria, aquela estaria.

— Taylor irá te explicar como deve agir agora. E eu sinto por você ter descoberto assim, Any, mas eu já presumia que você iria assimilar tudo. Sua inteligência sempre foi um ponto alto e extremamente atraente. Antes de te chamar para o primeiro trabalho, irei mostrar as provas.— debochou, abrindo um sorriso egocêntrico.— Vai trabalhar para mim, amor. Você mesma se auto colocou uma coleira.

Fúria ou rancor poderia me inundar agora. Mas, minha mente sempre tinha sido minha inimiga e amiga na mesma proporção, tinha sido minha única companheira.

Astrid tinha dito sobre eu não saber ser maleável. Não saber sentir.

Bailey tinha me alertado, porque ele já sabia do plano de Joshua.

Noah iria voltar para esse pandemônio, a nossa antiga casa. E teria uma família em meio ao poder que o melhor amigo faria.

E eu, enquanto não arrumasse uma alternativa, seria o cão de guarda desse filho da puta.

— Você...— me aproximei mais ainda, ficando a três dedos de distância. Nossos narizes quase se tocando, mas os olhares se chocando como álcool e fogo.— Vai se arrepender por cada merda, e irá amaldiçoar o dia que me manipulou. Se quer uma assassina, Joshua, vai ter. Espero que lembre os tempos de liga, amor, porque você é um bastardo que se acha o melhor... não é.— cuspi na sua cara e me afastei.

Joshua me encarou com raiva e passou a mão direita sobre o rosto.

— Não pense em ir atrás da minha família ou de alguém, Any. Porque eu sei que você irá tentar. Se não, antes de morrer, te faço assistir um deles decepando a cabeça do seu irmão mais novo.— fiquei séria, porque eu sabia que ele faria isso.

Se havia alguém que cumpria com aquilo que prometia, Joshua era esse alguém.

— Decepe a cabeça do garoto então, aproveite e coloque do lado da cova de Laurel. Vou tirar um dia para contar como o pai dela é um traidor de merda, me lembrei, ela também está morta.— levantei a arma, mirando na parede de fotos, descarreguei o revólver, em várias fotos. Todos me encararam assustados, exceto ele. Porque ele sabia o demônio que estava prendendo.

— Diga a sua equipe de merda sobre as pessoas que eles estão lidando, Joshua. Porque você pode até ter conseguido me prender, mas te garanto que eu treinei todos eles para não cederem.— pisquei o olho direito. Me virei, andando automaticamente até o elevador.

— Daqui dois dias, quero que esteja aqui. Irá começar a trabalhar em prol do meu império, amor.— olhei por cima do ombro.

— A sua manipulação vai voltar contra você. A única coisa que me deixa feliz, é saber que o laço que nos unia foi morta. Matei por você um dia, Joshua, uma pena que as circunstâncias tenha mudado.— foi a última coisa que eu disse antes de entrar no elevador espelhado e ainda com o corpo morto do segurança.

Me encarei no espelho; maquiagem borrada, os olhos brilhando em ódio e mágoa. O corpo tremendo, o coração mais agitado do que nunca. De novo eu estava presa.

Eu nunca tinha escolhido vingança ao aceitar trabalhar com Joshua.

Tinha escolhido minha própria ruína, mais uma vez.

_____________________

Eu sempre disse que eles eram iguais, e também afirmei em vários pensamentos e diálogos o quão errado é fantasiar algum deles. Josh nunca foi uma pessoa altruísta, mas sempre foi um manipulador de primeira categoria... e sempre esteve muito claro, e arquitetado também. Espero que vocês estejam chocados, porque eu queria que fosse essa sensação.

Não esqueçam de comentar muito e deixar a estrelinha, em ? Isso me motiva muito.

Esse capítulo encerra a primeira fase de A ruína. E com ele, muitas pontas se fecharam e outras se abriram.

Não foi somente Any que foi manipulado, em ? Vi muita gente confiando no loiro e julgando a Any, que ela estava muito esquiva. Quando na verdade, mesmo tentando se esquivar, caiu na armadilha. Nos próximos capítulos será explicado como funcionará essa aliança obrigada de Any com o império de Joshua, e em como isso a afetará mentalmente.

O que será que motiva Josh ? Ele se arrepende ? Prender Any... ameaçar a entregá-la, mesmo sabendo de todo o passado.

Any matando os irmãos mais novos de Savannah sem remorso algum; como sempre foi mencionado, uma bomba em potencial.

Nesse capítulo, houve toda a reviravolta sobre a relação das duas e os motivos que levaram Savannah a ser uma vadia. Amor não correspondido cegou muitos deles, com ela não foi diferente. E ela sabe muito sobre Any, e mesmo assim, esteve em momentos cruciais para a assassina de elite.

Citamos novas pessoas. A nova equipe de Joshua, e em como ele nunca perde a pose de patrão, mesmo que isso afete a própria família.

Espero não ter decepcionado no capítulo, em ? Estou MUITO ansiosa para iniciar a segunda fase, porque realmente nela a desgraceira acontece. E eu amo escrever sobre os conflitos mentais que cada um possui.

Obrigados pelos 100K. Não pelos números, mas por confiarem no meu trabalho e darem visibilidade para ele; os números são apenas isso, mas os comentários e carinho que recebo... são o verdadeiro "gás" que me motiva a estar aqui. Obrigada, de todo coração.

Deixem as teorias, amo ler.

Me sigam no Twitter, sempre estou por lá e solto MUITO spoiler por lá.

Amo vocês e até breve, com a segunda fase.

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