Os Mártires do Coliseu - A. J...

By JaianeSantos517

7K 210 22

A história da famosa arena de Roma, onde milhares de cristãos primitivos encontraram um fim cruel e sangrento... More

..
introdução
A Origem e a História Primitiva do Coliseu
Os Entretenimentos e Espetáculos do Coliseu
Os Cristãos
O Primeiro Mártir do Coliseu
Inácio
O General Romano
O Jovem Bispo
O jovem Sardo
Alexander, Bispo e Mártir
Os Senadores
A Jovem Martina
O Pequeno Marino
Os Reis Persas
Os Duzentos e Sessenta Soldados
Os Atos de Priscila
Crisanto e Daria

Os Atos de Estêvão

74 0 0
By JaianeSantos517

᯽ 1 ᯽︎

     Os  eventos  que  estamos  para  relatar  tiveram  lugar  no  ano  259  da  era cristã.  Os  imperadores  Valeriano  e  Galieno  haviam  usurpado  o  trono,  e  sob  o  seu governo  tirânico,  uma  terrível  perseguição  abateu-se  sobre  a  Igreja.  Dificilmente houve,  em  qualquer  outro  reinado  dos  duzentos  e  cinquenta  anos  que  se passaram  sobre  a  Igreja,  intervenções  tão  visíveis  da  providência  divina  para  a exaltação  de  seus  mártires  e  para  a  humilhação  de  seus  inimigos,  como  as  desse período.  Os  trovões  do  céu  rolaram  sobre  a  cabeça  dos  perseguidores,  a  terra tremeu-lhe  sob  os  pés,  e  os  seus  ídolos  derreteram-se  como  chumbo  na  fornalha da  oração  dos  mártires.   Contudo,   rios  de  sangue  jorraram,  e  os  anjos, diariamente,  transportaram  para  a  residência  de  paz  e  alegria  as  almas  preciosas dos  triunfantes  de  Cristo.
     Nunca  houve  na  história  do  Império  um  tempo  em  que  as  pessoas  foram tão   visitadas  pelas  calamidades  como  nos  reinados  de  Gallus  e  Valeriano. Inundações,  incêndios  e  terremotos  dizimaram  províncias  inteiras,  e  destruíram campos  cultivados  e  belas  cidades.  A  fome  e  a  pestilência  uniram-se  na  guerra  do extermínio,  e  os  lamentos  do  luto  eram  ouvidos  em  toda  parte.  Como  era  de  se esperar,   os  cristãos  foram  responsabilizados  por  todas  as  calamidades  do Império.  O  Diabo  falou  através  dos  oráculos  do  Capitólio,  e  atiçou  os  ânimos contra  a  "detestada  religião",  que  nessa  época  espalhara-se  a  toda  parte.  A perseguição  chegou  trazida  por  circunstâncias  peculiares.
     Durante  os  três  primeiros  anos  de  seu  reinado,  Valeriano  foi  indulgente  e pacífico.  Ele  era  de  certo  modo,  afeiçoado  aos  cristãos.  Em  público,  ou  em particular,  mostrava-lhes  respeito  e  favor,  e  a  Igreja  florescia  por  todos  os  lados. "Antes  da  perseguição",  relata  Eusébio,  o  grande  historiador  da  Igreja  Primitiva, "Valeriano  foi  gentil  e  bondoso  para  com  os  servos  de  Deus.  Nenhum  dos  regentes anteriores    nem  mesmo  aquele  que  era  publicamente  reconhecido  como  cristão (Filipe,  ano  244)    mostrou  tal  favor  para  conosco  como  este  príncipe  no  começo de  seu  reinado.  A  sua  casa  vivia  cheia  de  cristãos,  e  mais  parecia  uma  igreja  de Cristo  que  um  palácio  do  imperador  romano"  (Livro  VII,  cap.  X).
     Entre  os  cortesãos  havia  um  homem  chamado  Macriano,  de  origem insignificante,  mas  que  tinha  alguma  pretensão  de  aprender.  Sendo  bastante hábil  com  a  feitiçaria  e  as  mágicas,  insinuou-se  no  favor  do  soberano.  A  avareza, a  ambição  e  a  crueldade  tomaram  posse  de  sua  alma.  Ele  visava  o  poder supremo,  e  desejava  satisfazer  as  vis  inclinações  de  seu  espírito  derramando  o sangue  dos  cristãos,  a  quem  odiava  sem  causa.  É  de  pensar  que  os  demônios,  a quem  é  permitido  influenciar  os  homens  através  das  artes  negras,  houvessem convencido  Macriano  de  que  nunca  realizaria  suas  esperanças  ambiciosas, enquanto  Valeriano  fosse  amigo  dos  cristãos.
     Macriano   determinara   perverter   a   nobre   e   generosa   disposição   do imperador.  A  história  apresenta  a  terrível  narrativa  de  seus  sucessos.  Ele começou  por  contar  ao  imperador  as  maravilhas  da  magia;  como  ele  poderia desvendar  o  futuro,  guiar  o  presente  no  caminho  da  prosperidade,  e  ser  o  talismã da  riqueza,  do  poder  e  da  glória.  O  irrefletido  Valeriano  caiu  como  mosca  no  mel envenenado.  Sob  os  conselhos  de  seu  preceptor  impiedoso,  passou  a  crer  que  as lições  de  sabedoria  estavam  escritas  nas  entranhas  de  bebês  recém-nascidos,  e que  os  terríveis  segredos  do  futuro  desconhecido  podiam  ser  decifrados  no sangue  fluído  do  coração.  A  sua  primeira  vítima  foi  um  recém-nascido.  Em  seu fanatismo  cego,  curvou-se  sobre  as  vísceras  mal-cheirosas  para  rastrear  nas fibras   escarlates   a   linguagem   da   profecia   e   do   conhecimento.   Os   olhos preconceituosos  enxergam  tudo  de  uma  só  cor;  de  igual  modo,  quando  a  paixão predomina  na  alma,  todos  os  pensamentos  são  moldados  à  sua  forma,  e  as nobres  faculdades  do  intelecto  e  da  vontade  emprestam  seu  serviço  à  sua gratificação.  Assim,  Valeriano  achou  ter  visto  na  horrenda  prática  da  magia  as fontes  desvendadas  do  conhecimento  e  do  poder.  Não  é  de  admirar  que,  sob  a orientação  do  impiedoso  Macriano,  ele  descobrisse  que  os  deuses  (os  demônios) estavam  descontentes  com  o  cristianismo;  e  como  um  abismo  chama  outro,  ele caiu  nas  profundezas  da  crueldade,  da  intolerância  e  do  fanatismo.  No  final  de 251  d.C.  Valeriano  era  um  dos  mais  cruéis  e  desapiedados  perseguidores  da Igreja.
     Durante  os  dias  de  paz  que  precederam  a  perseguição,  Deus  revelara  a Cipriano,  bispo  de  Cartago,  que  tempos  difíceis  estavam  chegando.  O  erudito bispo  escreveu  a  várias  igrejas,  preparando-as  para  a  tormenta.  Em  sua  sublime exortação  ao  martírio,  em  sua  carta  aos  tibaritanos,  ele  declarou:  "Instruído  pela luz  que  o  Senhor  nos  concedeu,  devemos  prevenir  vossas  almas  pela  solicitude  de nossa  admoestação.  Vós  deveis  saber,  e  ter  como  certo,  que  dias  de  terríveis provações  estão  para  chegar    o  tempo  do  anticristo  se  aproxima.  Devemos  estar preparados  para  a  batalha,  e  não  pensar  em  nada,  a  não  ser  na  coroa  de  glória  e na  inefável  recompensa  que  seguirá  à  brava  confissão  de  fé.  As  provações  que  se avizinham   não  são  como  as  do  passado;  combates  mais  severos  e  mais sanguinolentos  nos  aguardam.  Portanto  os  soldados  de  Cristo  devem  prepara-se com  fé  inabalável  e  virtude  imaculada,  lembrando  que  são  participantes  do sangue  de  Cristo,  e  que  podem  derramar  seu  sangue  por  Ele"  (Cipriano,  Epis.  56, ad  Thibaritano,  de  Exhortat.  Mart.).
     Quando,  no  ano  seguinte,  as  nuvens  da  tempestade  profetizada  por Cipriano  romperam  sobre  o  mundo  em  todos  os  horrores  de  uma  perseguição sangrenta,  o  próprio  Eusébio  foi  uma  de  suas  vítimas  mais  notáveis.  Ele  nos conta,  noutra  parte  de  sua  obra,  que  quando  a  perseguição  irrompeu,  a  turba enfurecida  gritava  no  anfiteatro  de  Cartago,  pedindo  que  ele  fosse  jogado  aos leões.  Como  os  edifícios  mais  altos  são  os  mais  expostos  aos  raios,  os  bispos  e pais  da  Igreja  foram  as  primeiras  vítimas  da  perseguição.  Em  Roma,  Estevão  foi martirizado  enquanto  celebrava  um  culto  nas  catacumbas.  É  dos  Atos  de  Estêvão que   citaremos   alguns   dos   episódios   relacionados   ao   Coliseu   durante   a perseguição.
     Conquanto  Deus  houvesse  permitido  a  perseguição  para  provar  a  sua Igreja,  preparou  também  terrível  retribuição  para  a  injustiça  dos  seus  inimigos. Todos  os  perseguidores  tiveram  um  fim  precoce  e  miserável.  Talvez  nenhum desses  tiranos  que  derramaram  o  sangue  dos  cristãos  tenha  sido  tão  humilhado  e amaldiçoado  como  Valeriano.  "Estes  escolhem  os  seus  próprios  caminhos",  diz  o Senhor,   através   do  profeta  Isaias,   "e  a  sua  alma  toma  prazer  nas  suas abominações.  Também  eu  quererei  as  suas  ilusões"  (Is  66.3,4).  O  Império  inteiro tomou  parte  na  maldição  que  se  abateu  sobre  o  impiedoso  Valeriano;  os  males acumulados   das   pragas,   das   fomes,   dos   terremotos   e   das   guerras   civis desabaram  como  uma  tempestade  sobre  o  mundo,  dizimando  a  raça  humana  e espalhando  a  toda  parte  o  terror  e  a  confusão.
     Os  bárbaros  que  viviam  nas  fronteiras  das  províncias  investiram  de  todos os   lados   sobre  diferentes   partes   do   país,   como  que  seguindo  um  plano preconcebido,  pilhando  e  saqueando  tudo  à  sua  frente.  Valeriano  foi  forçado  a voltar  a  atenção  a  um  inimigo  mais  formidável  que  os  inofensivos  cristãos.  Ele organizou  as  tropas  para  a  guerra,  enviou  seu  filho  Galieno  contra  os  alemães,  e o  seu  melhor  e  mais  corajoso  capitão  a  outra  parte  do  Império,  enquanto  ele próprio  liderou  o  exército  contra  os  persas,  que  eram  nesse  tempo,  como  em muitos  anos  passados,  os  mais  formidáveis  inimigos  do  Império.  Sapor,  o  rei  dos persas,  derrotou  e  destruiu  o  exército  romano,  e  levou  preso  o  imperador.  A  hora da  retaliação  chegara  para  o  cruel  Valeriano.  Ele  foi  arrastado  diante  do  persa arrogante,  em  cadeias,  e  ainda  vestido  com  o  seu  magnífico  manto  de  púrpura  e ouro.
     Depois  de  ser  insultado  da  maneira  mais  bárbara  e  miserável,  foi  forçado  a caminhar  diante  da  carruagem  do  rei  persa,  e  assim  percorrer  todas  as  cidades do  reino,  para  ser  insultado  e  maltratado  pelo  povo.  O  mais  vil  escravo  não poderia  ter  sido  tratado  com  mais  desprezo.  Toda  vez  que  Sapor  desejasse  entrar na  carruagem,  ou  montar  seu  cavalo,  Valeriano  era  obrigado  a  dobrar-se  com  a face  para  o  chão,  e  servir  de  escabelo.  Após  vários  anos  passados  em  humilhante servilismo,  fome,  insulto  e  dores  incessantes,  um  destino  ainda  pior o  aguardava. Quando  se  lhe  desvaneceu  a  força  natural,  determinaram  a  antecipação  de  sua morte  pelo  último  e  mais  cruel  ato  de  desforra.  Ele  foi  esfolado  vivo,  e  a  sua  pele, enchida  com  palha,  foi  pendurada  num  dos  templos  como  um  monumento  ao triunfo  e  à  vingança  dos  persas.  Assim  devem  perecer  os  que  se  levantam  contra Deus!

᯽︎ 2 ᯽︎

     Enquanto  Valeriano  prosseguia  com  os  estudos  impuros  e  medonhos  da magia,   os  cristãos,  cônscios  da  mudança  que  se  lhe  operaria  no  caráter, preparavam-se  para  a  tempestade  iminente.  As  catacumbas  foram  reabertas,  e provisões  foram  transportadas  para  aquelas  lúgubres  residências  dos  mortos.  O tabernáculo   e  o  altar  foram  despojados  de  seus  ornamentos,  e  os  cultos passaram  novamente  a  ser  celebrados  junto  aos  túmulos  dos  mártires,  nas escuras  passagens  subterrâneas.  Os  catecúmenos  eram  batizados,  e  os  fieis  eram exortados  e  fortificados  pela  frequente  comunhão  e  oração  incessante.
     Valeriano   demonstrou,   de   diversas   maneiras,   a   alteração   de   seus sentimentos  para  com  os  cristãos.  E  enquanto  ele  premeditava  o  massacre  dos seguidores  de  Cristo,  um  ato  heróico  de  zelo  e  coragem  de  uma  das  criadas  do palácio  atiçou  o  fogo  de  seu  coração  pervertido,  e  desembainhou  a  espada  para  a matança  de  milhares.
     Certo  dia,  uma  pobre  mulher  estava  chorando  loucamente  junto  aos portões  do  palácio  real.  Uma  cristã,  serva  do  palácio,  viu-a,  e  compreendeu  que  o seu  bebê  fora-lhe  tirado  pelo  imperador,  que  naquele  momento  o  estava  cortando em  pedaços.  A  cristã  foi  aos  aposentos  do  soberano  e  encontrou-o,  juntamente com  o  impiedoso  Macriano,  debruçado  sobre  o  corpo  sem  vida  de  uma  bela criança.  Suas  mãos  estavam  manchadas  de  sangue;  eles  mais  pareciam  fúrias que  homens.  Sentindo  subir-lhe  a  santa  indignação  diante  do  quadro  pavoroso,  a destemida  serva  de  Deus  reprovou  o  imperador  por  sua  impiedade,  ameaçou-o com  os  julgamentos  do  Deus  eterno,  e  fê-lo  tremer  com  as  terríveis  retribuições que  pendem  sobre  os  assassinos  e  opressores  dos  pobres.  Entretanto,  o  espírito do  mal  já  se  apossara  do  miserável  Valeriano.  As  palavras  de  reprovação irritaram-lhe  severamente  a  alma  arrogante;  ardendo  de  raiva,  ele  ordenou  que  os lictores  removessem  e  torturassem  a  cristã  que  ousara  repreendê-lo.  Com  o mesmo  fôlego  com  que  sentenciou  a  sua  primeira  mártir,  ordenou  que  placas  de bronze  fossem  penduradas  nas  paredes  do  Capitólio  e  nas  colunas  do  Fórum, anunciando  os  decretos  da  perseguição  e  da  matança.
     Estevão  reuniu  à  sua  volta  o  trêmulo  rebanho,  e  animou-o  para  o  martírio; com  santas  admoestações  e  a  leitura  dos  escritos  sagrados,  inspirou-lhes  uma piedosa  confiança.  Entre  outras  coisas  que  citamos  de  Barônio  (ano  259),  os  Atos do  suplício  deste  santo  homem  contam  que  ele  dirigiu-se  aos  fieis  nestes  termos:
     "Meus  filhinhos  amados,  ouçam  a  mim,  um  pecador.  Enquanto  há  tempo, frutifiquemos   em  boas  obras,  e  não  apenas  para  com  o  próximo,  mas  a  nós também.  Em  primeiro  lugar,  admoesto-vos  a  tomardes  a  vossa  cruz  e  a  seguirdes ao  nosso  Senhor  Jesus  Cristo,  que  condescendeu  em  dizer-nos:  'Quem  achar  a sua  vida  perdê-la-á;  e  quem  perder  a  sua  vida  por  amor  de  mim  achá-la-á'.  Por esta  razão,  suplico-vos  que  sejais  mais  solícitos,  não  apenas  pela  vossa  salvação, mas  pela  do  próximo  também;  se  algum  de  vós  tem  amigos  ou  parentes  ainda  no paganismo,  apressai-vos  a  trazê-los  a  Cristo,  para  que  sejam  salvos  e  batizados".
     Entre  os  cristãos  que  ouviam  estas  advertências  do  líder  estava  Hipólito, um  homem  santo,  que  fora  um  rico  cidadão  romano,  mas  dera  tudo  o  que possuía  aos  pobres,  e  agora  levava  uma  vida  solitária,  nas  catacumbas  da  Via Ápia.  Quando  Estêvão  parou  de  falar,  Hipólito  lançou-se  de  joelhos,  e  expôs:
     — Bom pai,  tenho  meu  sobrinho  e  minha  sobrinha,  ambos  gentios,  a  quem eu  mesmo  eduquei;  a  mãe  deles,  uma  gentia,  chama-se  Paulina;  o  pai,  que  os envia  a  mim  de  tempos  em  tempos,  chama-se  Adrias.
     Estêvão  aconselhou-o  a  deter  as  crianças  na  próxima  vez  que  lhe  fossem enviadas,  a  fim  de  que  os  pais  também  viessem  visitá-lo.  Dois  dias  depois,  as crianças  vieram  a  Hipólito,  trazendo  alguns  bolos.  Ele  reteve  os  sobrinhos,  e mandou  avisar  Estêvão,  que  os  veio  conhecer  e  abraçar.  Solícitos  para  com  os filhos,  os  pais  das  crianças  logo  vieram  buscá-las.  Estevão  falou-lhes  então  dos terrores  do  julgamento  futuro,  exortando-os  seriamente  a  abandonar  os  ídolos, como  fizera  Hipólito.  Adrias,  o  pai,  disse  que  temia  ser  espoliado  de  suas propriedades  e  posto  à  morte  –  a  sorte  reservada  a  todos  os  que  se  professavam cristãos.  Paulina,  irmã  de  Hipólito,  alegou  o  mesmo,  e  repreendeu-o  por  instigar tal  coisa;  ela  odiava  a  religião  cristã.  A  família  partiu,  deixando  sem  sucesso aqueles  que  os  exortara,  mas  não  sem  esperança.
     Estevão  chamou  Eusébio,  o  douto  sacerdote,  bem  como  o  diácono  Marcelo, e  enviou-os  a  Adrias  e  Paulina,  convidando-os  novamente  a  vir  às  catacumbas, onde  Hipólito  vivia.  Quando  eles  chegaram,  Eusébio  lhes  disse:
     —  Cristo  vos  espera,  a  fim  de  introduzir-vos  no  reino  dos  céus.
     E  quando  Paulina  começou  a  insistir  na  glória  deste  mundo  e  na  sina miserável  dos  cristãos,  ele  descreveu-lhes  as  glórias  inefáveis  do  céu,  que  eles não  podiam  alcançar  a  não  ser  pela  fé  e  o  batismo.  Paulina  recusou  decidir-se  até o  dia  seguinte.  Na  mesma  noite,  um  pai  e  uma  mãe  cristãos  vieram  com  o  filho paralítico  até  Eusébio,  para  que  ele  o  batizasse.  Eusébio  orou  pelo  menino  e batizou-o.  O  menino  foi  imediatamente  curado  da  paralisia;  sua  língua,  que  era presa,  soltou-se,  e  ele  glorificava  a  Deus.  Então  Eusébio  realizou  a  santa  ceia,  e todos  participaram  do  corpo  e  do  sangue  de  Cristo.  Quando  contaram  isto  ao bispo  Estêvão,  ele  veio  reunir-se  a  eles,  e  todos  regozijaram-se  em  Deus.
     Na  manhã  seguinte,  Adrias  e  Paulina  retornaram,  e  ao  ouvir  sobre  a  cura do  menino,  encheram-se  de  admiração;  prostrando-se  contritos,  pediram  para  ser batizados.  Hipólito  rendeu  graças  a  Deus,  e  bradou:  —  Pai,  não  adia  o  seu batismo.
     A  resposta  de  Estêvão  foi:  —  Deixemos  então  que  a  solenidade  seja completada;  faze-lhes  as  perguntas  prescritas,  para  que  se  constate  se  eles realmente  crêem  e  não  têm  mais  nenhum  tremor  no  coração.
     Após  as  interrogações,  ele  recomendou-lhes  que  jejuassem,  e  havendo-os instruído,  batizou-os;  deu  ao  menino  o  nome  de  Neone,  e  à  menina,  o  de  Maria. Estêvão  partiu,  e  os  novos  convertidos  ficaram  morando  com  Hipólito,  Eusébio  e Marcelo   nas  catacumbas.  As  propriedades  que  possuíam  na  cidade  foram distribuídas  aos  pobres.
     Tão  logo  essas  notícias  chegaram  aos  ouvidos  do  imperador,  ele  ordenou que  procurassem  os  convertidos,  prometendo  que  metade  da  propriedade  deles seria  dada  em  recompensa  a  quem  os  encontrasse.  Foi  então  que  Máximo,  um escrevente  de  uma  das  repartições  do  governo,  recorreu  a  um  estratagema  para os  achar.  Fingiu  ser  um  cristão  que  recolhia  donativos,  e  dirigindo-se  a  um  local chamado  Area  Carbonaria,  no  monte  Coeliano,  lá  esteve  esmolando  até  que  viu Adrias  passar,  e  dirigiu-se  a  ele  a  fim  de  obter  uma  prova  de  que  era  mesmo cristão:
     —  Pelo  amor  de  Cristo,  em  quem  eu  creio,  eu  te  suplico,  tem  piedade  de minha  miséria. 
     Apiedando-se  dele,  Adrias  convidou-o  a  acompanhá-lo.  Mas quando  iam  entrando  em  casa, Máximo  foi  pego  por  um  demônio,  e  gritou:  —  Homem  de  Deus!  Sou  um informante.  Vejo  sobre  mim  um  fogo  imenso.  Oh,  ora  por  mim.  Estou  sendo torturado  pelas  chamas!
     Os  crentes  intercederam  por  ele  com  lágrimas,  e  ele,  prostrando-se  ao  chão, foi  curado.  Quando  o  levantaram,  ele  exclamou:  —  Pereçam  os  adoradores  dos ídolos.  Quero  ser  batizado!
     Levaram-no  a  Estêvão,  que  o  instruiu  antes  de  o  batizar.  Sendo  agora  um cristão,  Máximo  pediu  para  ficar  alguns  dias  com  o  bispo  Estêvão.
     Quando  Máximo  não  retornou,  procuraram  por  ele,  e  alguns  de  seus colegas   escreventes  foram  enviados  à  sua  casa  pelo  mesmo  departamento. Encontraram-no   prostrado   em   oração.   Lançando   mão   dele,   levaram-no   a Valeriano,  que  lhe  indagou:
     —  Ficaste  tão  cego  pelo  suborno,  a  ponto  de  enganar-me?
     —  É  verdade  —  replicou  Máximo.  —  Até  então  eu  fui  cego,  mas  agora, havendo  sido  iluminado,  eu  vejo.
     —  Por  qual  luz?  —  indagou  o  imperador. 
     —  A  luz  da  fé  no  Senhor  Jesus  Cristo  —  confirmou  Máximo.
     Enfurecido,  Valeriano  ordenou  que  ele  fosse  lançado  de  uma  das  pontes  do Tibre.  Seu  corpo  foi  depois  sepultado  por  Eusébio  nas  catacumbas,  na  Via  Ápia¹.
     Depois  disso,  Valeriano  enviou  um  grupo  de  setenta  soldados,  com  ordens de  aplicar  toda  diligência,  até  encontrarem  Eusébio  e  os  demais.  Quando  o  bispo, juntamente  com  Adrias,  Paulina,  as  crianças,  e  o  venerável  Hipólito  foram descobertos,  conduziram-nos  algemados  ao  Fórum  de  Trajano.  O  diácono  Marcelo queixara-se   da   crueldade   do   imperador   contra   os   amigos  sinceros,   e   foi denunciado  por  Secundino  Togato.  Por  causa  disto,  ele  também  foi  apanhado.
     Eusébio,  o  sacerdote,  foi  o  primeiro  a  ser  interrogado  pelo  juiz:  —  És  tu  o perturbador  da  cidade?  Mas,  antes,  qual  é  o  teu  nome?
     —  Chamam-me  Eusébio,  e  sou  sacerdote.
     Então  o  juiz  ordenou  que  ele  se  sentasse  a  um  lado,  e  que  Adrias  fosse trazido.  Indagado  primeiramente  quanto  ao  seu  nome,  e  depois  sobre  como conseguira  a  riqueza  e  a  influência  com  que  seduzia  as  pessoas,  respondeu:
     —  Em  nome  de  Jesus  Cristo,  herdei-as  do  esforço  de  meus  pais.
     —  Então  faze  uso  de  tua  herança,  e  não  a  desperdices  subvertendo  os outros  —  admoestou  o  juiz.
     — Eu realmente  a  emprego,  e  sem  fraude,  para  o  meu  próprio  bem  e  o  bem de  meus  filhos.
     —  Tens  filhos  e  esposa?
     —  Eles  estão  aqui  comigo,  algemados.
     —  Que  sejam  introduzidos  —  ordenou  o  juiz.
     Paulina  e  os  filhos,  Neone  e  Maria,  foram  trazidos  à  sua  presença,  seguidos pelo  diácono  Marcelo  e  por  Hipólito.
     —  É  esta  a  tua  esposa?  E  são  estes  os  teus  filhos?  —  indagou  o  juiz.  
     —  São  eles  —  confirmou  Adrias.
     —  E  quem  são  estes  outros  dois?
     — Aquele  é  o  diácono  Marcelo,  e  este  é  meu  irmão  Hipólito,  um  fiel  servo  de Cristo. 
     Voltando-se  para  eles,  o  juiz  exigiu:  —  Declarai  com  vossa  própria  boca por  qual  nome  sois  chamados.
     Marcelo  respondeu:  —  Chamam-me  Marcelo,  o  diácono.
     —  E  tu?  —  dirigiu-se  ele  a  Hipólito.  —  Qual  é  o  teu  nome?
     —  Hipólito,  servo  dos  servos  de  Cristo.
     O  juiz  ordenou  que  Paulina  e  as  crianças  fossem  postas  à  parte,  e  falou  a Adrias:  —  Dizei-me  onde  estão  os  teus  tesouros,  e  que  tu  e  os  demais  que  contigo vieram  ofereçam  sacrifícios  aos  deuses,  salvando  vossas  vidas;  de  outro  modo, logo  a  perdereis.
     —Já  lançamos  fora  os  ídolos  vãos  —  interveio  Hipólito  —,  e  encontramos  o Senhor  do  céu  e  da  terra,  Cristo,  o  filho  de  Deus,  em  quem  cremos.
     O  juiz  ordenou  então  que  todos  fossem  levados  à  prisão  pública,  e  que  não fossem  separados.  Foram  todos  conduzidos  à  Marmetina.  Após  três  dias,  o prefeito,  assistido  por  Probo,  reuniu  a  corte  no  Templo  da  Terra,  onde  ordenara que  instrumentos  de  tortura  de  todos  os  tipos  estivessem  de  prontidão.  Adrias  foi trazido   primeiro,   e   interrogado   sobre  as  suas  propriedades.  Quando  nada satisfatório  lhe  foi  extraído,  o  altar  diante  de  Minerva  foi  aceso,  e  eles  receberam ordens  de  oferecer  incenso.  Todos  rejeitaram  com  horror  a  proposta,  rindo  do  juiz por  lhes  pedir  tal  coisa.  Foram  então  despidos,  estendidos  nus  sobre  o  cavalete,  e surrados  com  varas.  Paulina,  açoitada  severamente,  rendeu  a  alma  a  Deus. Vendo  isto,  o  juiz  mandou  que  Eusébio  e  Marcelo  fossem  decapitados.  A  sentença foi  executada  na  Petra  Scelerata,  próximo  ao  Coliseu,  em  13  de  novembro.  Seus corpos  foram  deixados  aos  cães;  o  de  Paulina  foi  arremessado  no  pavimento.  Um outro  Hipólito,  um  diácono,  recolheu  os  três,  e  sepultou-os  nas  catacumbas  da Via  Ápia,  onde  eles  tantas  vezes  haviam  se  reunido.
     Depois  disso,  Secundino  levou  Adrias,  as  duas  crianças,  e  Hipólito  à  sua própria  casa,  tentando  por  todos  os  meios  descobrir  onde  estava  o  dinheiro  deles. Mas  suas  respostas  eram  as  mesmas:
     —  O  que  possuíamos,  gastamos  com  os  pobres;  nosso  tesouro  é  a  nossa alma,  que  não  podemos  de  maneira  alguma  perder.  Cumpre  a  tua  missão.
     Secundino,  então,  mandou  torturar  as  crianças,  a  quem  o  pai  encorajara: —  Sede  firmes  meus  filhos.
     Enquanto  recebiam  os  golpes,  a  única  coisa  que  as  crianças  diziam  era:  — Ajuda-nos,  Cristo!
     Depois  foi  a  vez  de  Adrias  e  Hipólito  serem  supliciados,  tendo  as  laterais  do corpo  queimadas  com  tochas.  E  quando  haviam  sido  torturados  de  diversas maneiras,  sem  de  modo  algum  serem  induzidos  a  sacrificar,  Secundino  ordenou:
     —  Rápido!  Levantai  do  chão  as  crianças  Neone  e  Maria,  trazei-as  à  Petra Scelerata,  e  matai-as  diante  dos  olhos  do  pai.
     Feito  isto,  seus  corpos  foram  atirados  num  lugar  público,  ao  lado  do anfiteatro.  A  noite,  cristãos  fiéis  levaram-nos  dali,  e  os  sepultaram  na  mesma catacumba  que  a  sua  mãe,  na  Via  Apia.
     Quando,  passados  oito  dias,  Secundino  relatou  tudo  ao  imperador,  ele mandou  que  seu  trono  fosse  preparado  no  circo.  Flamínio,  Hipólito  e  Adrias, foram  conduzidos  acorrentados,  com  um  arauto  gritando  à  frente:  —  Estes  são  os culpados  miseráveis,  os  canalhas  que  subverteram  a  cidade!
     Quando  chegaram  ao  tribunal,  o  juiz  pôs-se  novamente  a  questioná-los acerca  do  dinheiro,  propondo:  —  Entregai  o  dinheiro  que  usais  para  induzir  o povo  ao  erro.
     —  Nós  pregamos  a  Cristo  —  replicou  Adrias  —,  que  condescendeu  em livrar-nos  do  erro,  não  para  a  destruição  dos  homens,  mas  para  que  tenhamos vida.
     Quando  Secundino  viu  que  suas  palavras  de  nada  valiam,  mandou  que lhes  batessem  na  boca  com  varas  pesadas,  enquanto  o  pregoeiro  proclamava:  — Sacrificai  aos  deuses,  queimando-lhes  incenso!
     O  trípode,  um  objeto  de  três  pés,  já  estava  aceso  para  este  propósito. Hipólito,  escorrendo  sangue,  gritou:  —  Executa  teu  ofício,  infeliz,  e  não para!
     Então  Secundino  mandou  que  os  executores  parassem  de  bater,  e  insistiu: —Ao  menos  agora,  tendes  dó  de  vós  mesmos;  vede  que  tenho  pena  de  vossa loucura.
     Os   cristãos   responderam:   —   Estamos   prontos   a   suportar   qualquer tormenta  para  não  fazer  o  que  tu  e  o  imperador  desejais.
     Secundino  relatou  isto  ao  imperador  Valeriano,  que  ordenou  a  destruição imediata  de  ambos,  na  presença  do  povo. Desta  vez,  Secundino  mandou  que  fossem  levados  à  ponte  de  Antônio,  e espancados  até  a  morte.  Depois  de  sofrer  por  um  longo  tempo,  eles  entregaram  a Deus  o  espírito;  seus  corpos  foram  deixados  no  mesmo  lugar,  próximo  à  ilha Licaônia.  Hipólito,  o  diácono  da  igreja  de  Roma,  removeu  os  corpos,  durante  a noite,  para  a  mesma  cripta  na  Via  Ápia  (5  de  dezembro),  onde  os  outros  fiéis haviam  sido  postos.  (Veja  Barônio,  ano  259,  n°  8  e  seguintes.)
     Nos  Atos  que  estamos  citando,  descobrimos  que,  tão  logo  as  catacumbas receberam  os  restos  mortais  dos  mártires,  tornaram-se  também  o  lar  voluntário dos  vivos.  Enquanto  a  paz  reinava  no  Império,  e  os  sacrifícios  impuros  eram oferecidos  em  pequenos  templos  no  centro  da  cidade,  alguns  cristãos  fervorosos retiravam-se  para  as  catacumbas  a  fim  de  orar  sossegados.  Este  era  o  caso  de Hipólito,  o  irmão  de  Paulina,  cuja  morte  acabamos  de  descrever.  Há,  nos  mesmos Atos,  a  comovente  história  de  uma  mulher  grega  e  de  sua  filha,  que  passaram alguns  anos  numa  das  criptas  da  Via  Ápia,  permanecendo  em  oração  até  bem depois  de  a  espada  da  perseguição  haver  voltado  para  a  bainha.  Elas  eram parentes  de  Adrias  e  Paulina,  e  eram  igualmente  cristãs.  Ao  chegarem  a  Roma, souberam  que  seus  familiares  haviam  sido  martirizados  por  amor  a  Cristo.  Em grande  alegria,  foram  à  capela  das  catacumbas  (hoje  chamada  Capela  de  São Sebastião),  onde  os  mártires  haviam  sido  enterrados,  e  lá  passaram  treze  anos em  vigília  e  oração,  até  que  aprouve  a  Deus  chamá-las  para  o  céu.  Foram  ambas sepultadas  na  mesma  cripta.

᯽︎  3 ᯽︎

     Quase  um  ano  se  passara,  desde  que  tiveram  lugar  as  cenas  acima descritas.  A  perseguição  ainda  assolava,  mas  já  ia  perdendo  a  virulência  de  sua irrupção.   O  Diabo,  que  se  apossara  do  coração  de  Valeriano,  incitava-o  a crueldades  ainda  maiores,  e  a  um  ódio  mais  profundo  e  intenso  pelos  cristãos. Consequentemente,  ele  emitiu  um  decreto  mais  maldoso  que  o  primeiro,  e prometeu  como  recompensa  aos  informantes  todas  as  propriedades  dos  cristãos por eles  traídos.  Enviou  ordens  secretas  aos  governadores  das  províncias, esclarecendo  que,  apesar  de  publicamente  ordenar  a  morte  apenas  dos  cristãos principais,  na  verdade  desejava  o  total  extermínio  da  religião.
     Assim,  no  ano  seguinte,  a  perseguição  tornou-se  mais  feroz  que  nunca. Devemos  agora  retornar  à  segunda  parte  dos   Atos   que  estamos  citando,  e continuar  a  história  de  carnificina  e  horror  passada  no  Coliseu  dezessete  séculos atrás.
     Quando  o  edito  foi  publicado,  Estêvão,  o  líder,  convocou  o  clero,  e encorajou-os:  —  Irmãos  e  companheiros  de  armas,  já  ouvistes  falar  do  diabólico mandato:  se  um  gentio  entregar  um  cristão,  receberá  como  recompensa  todos  os seus  bens.  Portanto,  irmãos,  rejeitai  com  desprezo  os  deuses  deste  mundo,  para que  possais  receber  o  reino  celestial;  não  temei  os  príncipes  da  terra,  mas  orai  ao Deus  do  céu  e  a  Jesus   Cristo,  seu  Filho,  que  nos  podem  resgatar  das  mãos  dos inimigos  e  da  malícia  de  Satanás,  associando-nos  à  sua  graça.
     O  presbítero  Bônus  ajuntou:  —  Não  apenas  estamos  preparados  para renunciar  aos  bens  terrenos,  mas  também  para  verter  o  nosso  sangue  pelo  nome do  Senhor  Jesus  Cristo.
     Quando  Bônus  acabou  de  falar,  todo  os  cristãos  achegaram-se  a  Estêvão,  e pediu-lhe  ermissão   para   trazer   seus   vizinhos   gentios   que  desejavam  ser batizados.  Ele  determinou  que  no  dia  seguinte  reunissem-se  todos  na  cripta  de Nepotiana.
     No  raiar  do  dia  seguinte,  cento  e  oito  catecúmenos  de  ambos  os  sexos estavam   reunidos.   Estêvão   batizou-os,   e   dirigiu   o   culto   de   que   todos participaram.  Enquanto  o  bispo  ocupou  este  posto  nas  catacumbas,  cuidando das  questões  da  Igreja,  ensinando,  exortando,  presidindo  concílios,  e  celebrando cultos  nas  criptas  dos  mártires,  multidões  de  gentios  acorriam  a  ele  para  serem instruídos  e  batizados.
     Simprônio,   o   servo   de  um  desses  novos  convertidos,  foi  apanhado, interrogado,  e  forçado  de  todas  as  formas  a  revelar  como  ele  dispusera  do dinheiro  de  seu  rico  senhor.  Entre  outras  coisas,  quando  a  imagem  de  Marte  foi posta  diante  dele  com  o  tripé,  para  que  sacrificasse,  ele  declarou:  —  Possa  o Senhor  Jesus  Cristo,  Filho  do  Deus  vivo,  destruir-te!
     E  imediatamente  o  ídolo  fundiu-se.  Admirado,  Olimpo,  o  oficial  encarregado de  sua  execução,  mandou  que  ele  fosse  levado  a  sua  própria  casa,  ameaçando esgotar  sobre  ele,  naquela  noite,  toda  espécie  de  tormento.
     Chegando  ao  lar,  Olimpo  contou  a  sua  esposa,  Exupéria,  como  o  ídolo derretera  diante  do  nome  de  Cristo.
     —  Então  —  ponderou  ela  —,  se  a  virtude  deste  nome  é  tão  grande  como disseste,  é  melhor  que  abandonemos  os  deuses  que  não  podem  defender  nem  a nós  nem  eles  mesmos,  e  procuremos  este  Jesus  que  deu  a  vista  à  filha  de Nemésio.
     Olimpo,   então,   mandou   que   Tertuliano,   seu   servente,   tratasse honradamente  a  Simprônio,  e  tentasse  descobrir  onde  estava  o  tesouro  de Nemésio,  seu  amo.  Naquela  mesma  noite,  porém,  ele  e  Exupéria,  juntamente  com o  filho,  vieram  até  Simprônio  e  caíram  de  joelhos,  professando:
     —  Reconhecemos  o  poder  de  Cristo.  Queremos  ser  batizados  por  ti!
     —  Se  tu,  tua  esposa  e  teu  filho  estais  realmente  arrependidos  —  falou Simprônio  a  Olimpo  —,  podemos  cuidar  do  batismo.
     —  Terás  a  prova  agora  mesmo  —  prometeu  Olimpo  —,  de  que  de  todo  o meu  coração  eu  creio  no  Senhor  Jesus  a  quem  pregas,  —assim  falando,  abriu  um aposento  onde  ele  conservava  ídolos  de  ouro,  prata  e  mármore,  e  garantiu  a Simprônio  que  estava  pronto  a  fazer  com  eles  o  que  ele  achasse  por  bem.
     —  Então  destrói  cada  um  deles  com  tuas  próprias  mãos  —  propôs Simprônio.  —  Derrete  o  ouro  e  a  prata,  e  distribua-os  aos  pobres,  e  então  saberei que  crês  de  todo  o  coração.
     Quando  Olimpo  fez  o  que  foi  mandado,  ouviu-se  uma  voz  que  lhe  disse:  — Deixa  meu  Espírito  habitar  em  ti.
     Ao  ouvir  isto,  ele  e  sua  esposa  começaram  a  fortalecer-se  mais  e  mais, fervendo  com  o  desejo  de  ser  batizados.  Simprônio  comunicou  estas  coisas  a Nemésio,  então  em  liberdade,  e  ele  foi  imediatamente  relatá-las  ao  bispo  Estêvão. O  bispo  agradeceu  a  Deus,  e  à  noite,  dirigiu-se  à  casa  de  Olimpo,  que  caiu  de joelhos  com  a  esposa  e  o  filho,  apontando  os  fragmentos  dos  ídolos,  como  uma prova  de  sua  sinceridade.  Vendo  isto,  Estêvão  pôs-se  a  doutriná-los  nas  coisas espirituais.  Depois  batizou  o  casal  juntamente  com  os  seus  serviçais  que  creram, e  com  o  seu  filho,  a  quem  deu  o  nome  de  Teodolo.
     Três   dias   depois,   a   notícia   chegou   a   Valeriano   e   a   Galieno,   que imediatamente  ordenaram  a  morte  de  Nemésio  e  de  sua  filha,  Lucila,  a  quem  a vista  fora  restaurada.  Ambos  foram  assassinados  no  templo  de  Marte,  enquanto Simprônio,  Olimpo,  Exupéria  e  Teodolo  foram  queimados  até  a  morte,  próximo  ao anfiteatro.  Eles  expiraram  entoando  louvores  a  Cristo,  que  lhes  concedera  o privilégio  de  ser  contado  entre  os  mártires.  Seus  restos  mortais  foram  recolhidos pelo  clero,  e  acompanhados  até  a  tumba  por  Estêvão,  com  os  hinos  habituais.
     Alguns  dias  depois,  decretos  especiais  foram  emitidos  para  a  apreensão  e  punição de  Estêvão  e  da  igreja  romana.  Doze  deles  foram  apanhados  imediatamente,  e levados  à  morte  sem  nenhum  interrogatório.  Entre  eles  estava  o  amado  sacerdote Bônus,  ou  o  Bom,  que  fizera  aquela  gloriosa  declaração  nas  catacumbas,  quando a  igreja  fora  convocado  por  Estêvão.  Seus  corpos  foram  recolhidos  por  Tertuliano, um  liberto  de  Olimpo,  e  depositados  próximo  àqueles  dois  outros  mártires,  numa cripta  perto  da  Via  Latina.  Ouvindo  isto,  Estêvão  mandou  chamar  Tertuliano,  e havendo-o  instruído  a  respeito  do  reino  do  céu  e  da  vida  eterna,  batizou-o,  e recomendou-o  a  um  pastor,  que  o  encarregou  especialmente  de  procurar  os corpos  dos  mártires.  Dois  dias  depois,  Tertuliano  foi  apanhado  e  levado  perante Valeriano,  por  quem  foi  interrogado  como  sendo  propriedade  de  Olimpo;  havendo respondido  e  suportado  toda  espécie  de  tortura  com  uma  constância  heróica,  foi finalmente  decapitado  no  segundo  marco  miliário  da  Via  Latina.  Seus  restos foram  recolhidos  por  Estêvão  e  depositados  na  mesma  cripta  que  os  demais.
     No  dia  seguinte,  vários  soldados  foram  enviados  a  prender  Estêvão  e  os cristãos  que  com  ele  estivesse.  Quando  o  levaram  à  presença  de  Valeriano,  o imperador  indagou:
     —  És  tu  que  estás  te  empenhando  para  destruir  a  república,  e  por  tua persuasão  induzir  o  povo  a  abandonar  a  adoração  aos  deuses?
     —  Eu  não  arruino  a  república  —  afirmou  Estêvão  —,  mas  de  fato,  admoesto e  exorto  o  povo  a  renunciar  aos  demônios  a  quem  eles  adoram  nos  ídolos,  e  a reverenciar  somente  ao  Deus  verdadeiro,  e  a  Jesus  Cristo,  a  quem  Ele  enviou.
     Valeriano  ordenou,  então,  que  ele  fosse  conduzido  ao  templo  de  Marte, onde  a  sua  sentença  seria  lida  nas  tabuinhas.
     Sendo  levado  para  fora  da  cidade,  na  Via  Ápia,  e  chegando  ao  templo  de Marte,  Estêvão  levantou  os  olhos  ao  céu  e  orou: —  Senhor  Deus  e  Pai,  que destruíste  Babel,  a  torre  da  confusão,  destrói  este  lugar  onde  o  Diabo  engana  o povo  com  superstições.
     Começou  a  trovejar.  Um  raio  atingiu  o  templo,  derrubando  uma  parte  dele. Os  soldados  correram,   deixando   Estêvão  sozinho.  Ele  dirigiu-se   então   ao cemitério  de  Lucina,  com  os  pastores  e  diáconos  que  o  auxiliavam,  e  ali  encorajou os  cristãos  para  o  martírio.  Depois,  adorou  ao  Deus  Onipotente.  Os  soldados  que haviam  saído  em  seu  encalço  encontraram-no  celebrando  o  culto.  Sem  se atemorizar,  Estêvão  prosseguiu  ministrando  até  os  soldados  lhe  cortarem  a cabeça,  no  momento  em  que  ele  se  sentava  na  cadeira  pontificial,  diante  do  altar. Era  o  dia  4  de  agosto.  Foi  grande  a  lamentação  dos  cristãos,  ao  serem  privados  de seu  generoso  pastor.  Eles  o  depositaram  numa  cripta,  juntamente  com  a  cadeira ensopada  por  seu  sangue,  num  local  chamado  cemitério  de  Calisto.  (Veja Barônio,  ano  260.)
     Os  restos  mortais  de  Hipóloto,  Adrias,  Paulina,  e  das  crianças  Neone  e Maria,  acham-se  preservados  sob  o  altar  da  bela  igreja  de  Santa  Ágata,  em Suburra.  Ela  é  agora  a  capela  acadêmica  dos  estudantes  irlandeses  em  Roma,  a quem  foi  concedida,  juntamente  com  a  ampla  faculdade  anexa,  por  Gregório  XVI, "de  abençoada  memória".  Os  discípulos  de  Patrício  aprendem  que  o  espírito  de mártir  ainda  é  necessário  em  seu  país.  A  Irlanda  também  teve  os  seus  mártires,  e o  túmulo  das  vítimas  das  primeiras  perseguições  à  Igreja  deve,  forçosamente trazer  à  memória  do  levita  exilado  a  história  de  seu  país  sofredor.  A  sua  fé  vê  o lado  brilhante  da  nuvem  que  passou  sobre  a  Irlanda  nos  tempos  penais;  seus pais  estão  com  os  heróis  de  Roma,  na  brilhante  galáxia  dos  mártires  do  céu;  seu país  é  contado  entre  as  nações  favorecidas  por  Deus.





























————————«•»————————

¹ -   A  pequena  capela  onde  Máximo  foi  sepultado  ainda  é  vista  nas  catacumbas  de  São Sebastião,  na  Via  Ápia.  Como  estas  catacumbas  são  abertas  ao  público  estrangeiro,  não  há  nada tão  conhecido  na  Cidade  Eterna.  A  pedra  com  a  inscrição  "Locus  Maximi"  ainda  se  acha  preservada no  mesmo  ponto.  Era  nesta  sombria  capela  subterrânea  que  Filipe  Néri  costumava  passar  noites inteiras em oração.

Continue Reading

You'll Also Like

370K 5.5K 192
Todos sabem que hoje em dia é muito difícil encontrar individualidades para as nossas ocs de Boku no Hero por isso a partir de hoje vou vos apresenta...
382K 24.2K 165
Oiê gente sou nova aqui, espero que gostem das minhas histórias. imagines da minha autoria.🦋~
19.5K 864 46
Daniela Fernandes é uma jogadora portuguesa que depois de um namoro tóxico decide se mudar para Barcelona. Pablo Gavi jogador da seleção espanhola e...
11.1K 327 12
alguns imagines com a billie eilish, para você se imaginar com a cantora ATENÇÃO PARA OS ALERTAS CONTEM VIOLÊNCIA VIOLÊNCIA SEXUAL CONTEÚDO SENSÍV...