Capítulo XIX

1.5K 168 37
                                    

  P.O.V. Miranda

  "Precisamos conversar."

  Tudo caminhava em perfeita ordem em meu dia de trabalho, especialmente depois de haver mostrado ao cozinheiro que não era prudente cruzar o caminho de Miranda Priestly e sua família. Meu humor em Runway estava ótimo, eu podia ver o quanto Emily estava confusa com esse fato e isso me divertia. Até mesmo a incompetência alheia não me enervava a níveis extremos, eu estava mesmo tranquila e não via a hora de contar sobre meus atos sórdidos à minha família. Até que, às 16 horas e 57 minutos, recebi uma mensagem de Andrea dizendo puro e simplesmente: Precisamos conversar. Sem carinhas ou letras duplicadas, o que indicava a falta de entusiasmo e seriedade da mensagem. 

  Era clichê, mas quem ficaria tranquilo ao receber uma mensagem como essa? E eu, o mais desconfiado dos seres que habitam a Terra, estava há exatas duas horas relendo, imaginando, supondo, indagando, qual seria o teor misteriosamente escondido atrás daquelas duas palavras. Tudo estava bem pela manhã, sua voz estava amorosa, nada séria quando me ligou na hora do almoço. Se fosse algo com as gêmeas, ela me ligaria e não enviaria uma mensagem perturbadora como aquela. "O que poderia ter acontecido?" Me questionava incessantemente até que algo me ocorreu.

  - Nathaniel. - Eureca, eu poderia dizer. Era mais que um fato, era óbvio que o cozinheiro procuraria Andrea para chorar sua miséria. Era óbvio que ele a manipularia para aborrecer-se com minhas ações. E era mais que óbvio que eu deveria ter previsto isso. 

  Aquela constatação arruinou todo meu dia, pois eu estava dividida em dois sentimentos: raiva pela possibilidade concreta de Nathaniel agir de forma tão baixa e a aflição de encarar o que Andrea tinha para me dizer. Talvez, essa aflição estivesse mais para medo. Eu sabia que ela não estava cem por cento segura em nossa relação e um dos fatores que a deixavam assim, era justamente o meu jeito de resolver certas coisas. 

  - Eu devia ter pensado melhor no que ela acharia disso... - Suspiro derrotada, ponderando que talvez eu tenha agido de forma precipitada. No entanto, a cena da noite anterior invade minha mente e, além de Andrea, a imagem das minhas próprias filhas passando por aquela situação que havia sido completamente causada por aquele garoto, me faz mudar de ideia. Não tinha nada de precipitado em minhas ações. 

  - Miranda, você precisa ser mais racional. - Meu corpo ganha uma postura mais segura. Partindo do princípio de que Andrea estava realmente aborrecida por isso, minha posição era clara, ela não tinha o direito. Eu fiz o que fiz, sem arrependimentos, unicamente porque Nathaniel armou todo aquele circo em frente à minha casa, expondo a mim e as minhas filhas. Se ela não gostou do fato do antigo namoradinho ter o que merecia, ela poderia voltar para ele. 

  Dou uma nova checada no relógio, já passavam das 19:30, em breve eu estaria atrasada para o jantar. Andrea não havia enviado nenhuma outra mensagem depois daquela, isso, em minha opinião, confirmava que estava chateada. Eu também não respondi, estava ocupada demais fingindo que trabalhava, quando na verdade, queimava meus neurônios na tentativa de antecipar como seria a tal conversa. 

  Muitos cenários foram criados em minha cabeça. Primeiro, imaginei a mansão sem nenhuma iluminação, tirando o abajur aceso na antessala do térreo. Com passos cuidadosos, me aproximaria da luz e seria surpreendida com uma Andrea sentada com uma expressão facial sinistra, pronta para defender a moral de seu ex namoradinho. Discutiríamos em tom baixo, pois as gêmeas já estariam na cama. Obviamente nossos argumentos seriam discordantes, o que resultaria em um término. Ela sairia de casa furiosa e eu não iria atrás dela.

  Depois, minha imaginação me guiou para outro cenário. A mansão, desta vez, estaria bastante iluminada, a mesa estaria posta, Andrea e as gêmeas estariam apenas me esperando para jantar. Durante a refeição, tudo pareceria bem, o que tornaria toda a situação um milhão de vezes mais torturante, pois atrás de cada sorriso, eu saberia que ela guardava sua fúria até o momento mais adequado para liberá-la. O resultado também era o término, sua partida exasperada e nenhum sinal de rendição em meus olhos.

  O terceiro e último cenário foi uma mistura dos dois primeiros. A casa estava acesa e ela me aguardava na antessala. Dessa vez, ela não esperaria para falar, não teria nenhum suspense. Ela me questionaria sobre minha atitude em relação a Nathaniel e eu diria o quanto ela estava sendo impertinente, pois o que fiz foi pouco em comparação à toda exposição desnecessária e danosa que ele nos provocou, inclusive a si própria. Mais uma vez, ela não concordaria, eu diria algumas palavras as quais, provavelmente, me arrependeria, ela partiria e eu deixaria. Três diferentes hipóteses, um único desfecho: o fim. 

  - Assim, basta que eu o evite. - Com um objetivo claro, finalmente solicitei que a assistente júnior chamasse o motorista, recolhi minhas coisas, busquei eu mesma o livro no departamento de arte, desci pelo elevador até o saguão do prédio e avisto Roy de prontidão e a porta da Mercedes aberta a minha espera. 

  - Boa noite, Miranda. - O motorista disse de forma polida e eu apenas o ignorei e entrei no carro. Assim que ele fez o mesmo, desviei o olhar para o céu estrelado, a noite nunca fora tão interessante quanto naquele momento.

  - Para a mansão. - Foi o que eu disse antes dele dar a partida em direção ao motivo de todo aquele nervosismo e ansiedade.

Guerra é GuerraWhere stories live. Discover now