8} Cecília

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   As ruas pareciam mais loucas naquele dia, pois os carros e motos não paravam de passar por nós nem por um segundo. Aquilo era até bom, porque assim a gente lucrava mais. E isso seria ótimo, estávamos loucos para conseguir um dinheirinho a mais e tentar fazer a ideia de Guilherme dá certo. Naquele mesmo dia não daria — teríamos que parar um pouco para organizar o dinheiro —, mas estávamos esperançosos que no dia seguinte já poderíamos tentar comprar os doces e salgados que ele tinha sugerido.

Eu agarrei a mão vazia de Guilherme e corri com ele feito uma louca para o outro lado da rua, mesmo com os automóveis ainda em movimento. O bobinho de Guilherme gritou para eu parar, mas não dei ouvidos.
Quando chegamos do outro lado — que eu considerava o melhor lado para abordar os motoristas —, eu comecei a dá umas diquinhas para Guilherme:

— Presta atenção nisso; Quando você abordar um cliente, tenta convencê-lo do porquê é bom ele comprar suas 'bala ou 'salgadin. Além de dizer que 'tá barato, é claro. — ele assentia enquanto eu falava — Fala que seria bom ter alguma coisinha para refrescar a boca durante o trabalho. Às vezes eles não têm tempo de sair pra comprar alguma coisa, então ter isso nos 'bolso seria prático. A mesma coisa é com os 'salgadin. Eles podem querer fazer um lanchinho.

— 'Tô entendendo. O que mais?

— Óbvio que não vai dá pra você falar tudo isso de uma vez só e antes deles 'sair com o carro, então tenta resumir... dá uma improvisada, tá?

— Tá, eu sei. Eu acho que já sei o que fazer. — ele olhou para a rua — Vamos cuidar que o sinal já fechou.

— Mas olha, — acrescentei ligeiro — não bajula demais, é sério. Ninguém gosta disso.

Ele sorriu.

— Não esquenta, eu não sou de bajular ninguém. Vou conseguir vender essa bagaça do meu jeito.

Guilherme inclinou os lábios em um pequeno sorriso lateral e fez menção de seguir até o meio da rua. No entanto, eu puxei um braço dele.

— Tá, mas... não esquece da paciência.

Ele entortou a cabeça.

— Isso já é um pouco mais complicado.

— Eu sei que é, mas seja otimista, respira fundo e chama pelas boas vibrações que aí 'cê consegue ter paciência.

— Entendido... Eu acho.

Os carros e motos pararam ao comando do sinal vermelho. E, como sempre, congestionou! Guilherme seguiu na direção de um carro, eu de outro e assim começamos as vendas. De longe eu estava sempre de olho nele para ver se iria sair do sério e começar a xingar alguém. Mas dessa vez ele estava se saindo bem; mesmo depois que era dispensado, continuava sorrindo.

Era um sorriso forçado, mas era um sorriso. Ao menos estava evitando ficar estressado ou fazer caretas. Na verdade eu via quando respirava fundo e seguia para outro carro. Vez ou outra olhava para mim e sorria e eu estava contente por ele está seguindo os meus conselhos.

Estava tudo indo bem; vendemos por horas e aquele dia estava sendo muito bom para nós. Até que quase no fim da manhã eu ouvi carros buzinando sem parar bem próximo ao semáforo. Eu estava distante, mas assim que olhei pra lá vi que Guilherme estava conversando com uma pessoa que estava dentro de um carro vermelho.

A princípio eu pensei que ele já tinha perdido a paciência de novo e estava criando briga com as pessoas. Porém fiquei surpresa ao perceber que ele estava simplesmente falando com a pessoa do carro e que as buzinas insistentes eram dos carros de trás; eles queriam passar já que o carro vermelho não saía do lugar mesmo com o sinal já aberto. Voltei para a calçada e suspirei, enquanto ainda observava a cena que acontecia perto do semáforo.

Ao Acaso | ConcluídoWhere stories live. Discover now