6. A Caçada

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Deveria ser apenas mais uma tarde de sábado na cidade de Campos da Esperança, um pequeno município — com menos de 1.500 habitantes — na região sul do Brasil. Lívia estava adormecida em seus aposentos quando acordou-se com uma dor forte em seu braço esquerdo. Ao abrir os olhos, viu três sujeitos posicionados acima dela e confabulando (Não me mate!).

— Adolfo, o que você está esperando? Mate logo esse monstro! — dizia muito irritado um velho esguio, de cabelos brancos e que deveria ter por volta de uns sessenta anos.

— Eu nã... não consigo! Heitor, eu não consigo! — balbuciou Adolfo, um homem que beirava os cinquenta anos, tinha bigode farto e barriga proeminente. Ele segurava um punhal.

— Você é um covarde! — bradava Heitor, arrancando, logo em seguida, o punhal das mãos do companheiro. — Sabia que não deveríamos ter confiado em alguém como você!

— Parem com isso! Primeiro precisamos acabar com ela! — dizia o mais jovem dos três integrantes do bando, um rapaz barbudo e atlético que deveria ter por volta de trinta anos.

Lívia tinha uma condição rara em que, caso fosse exposta à luz solar, a sua pele sofria queimaduras terríveis. O bando retirou a proteção que ela usava ao dormir e, com isso, a claridade que entrava pelas frestas — entre as tábuas pregadas da janela — queimava o seu braço. Ironicamente, aquele "defeito" acabara de salvar a sua vida, pois Lívia acordou-se a tempo de escapar da investida de Heitor (Me deixem ir!). Pois, antes dele conseguir cravar o punhal em seu peito, ela saltou da cama e saiu correndo para fora do quarto. Heitor ficou tentando retirar o punhal da cama, enquanto que os outros dois ficaram apáticos, apenas olhando a garota escapar.

— Não fiquem aí parados! Peguem-na! — gritava Heitor.

Ao sair no segundo piso — da gigantesca e antiga mansão em que morava —, Lívia aterrorizou-se ao notar que os caçadores haviam arrancado as tábuas das janelas. Pelo visto, eles sabiam de sua condição e tentaram limitar os lugares em que ela podia se esconder; óbvio que sabiam de sua condição, afinal caçavam outros como ela! Então, sem tempo a perder, tentou abrigar-se rapidamente em um dos cômodos mais próximos. E, no momento em que abriu a porta do recinto, Lívia foi coberta pela luz do sol da tarde que banhava todo o lado oeste da mansão; segurou o grito com a forte dor de sua pele sendo queimada, fechou a porta e escondeu-se imediatamente dentro do armário que havia no quarto. Ouvia o TacTacTac das botas dos caçadores batendo no assoalho de madeira, enquanto que controlava os seus impulsos para não emitir nenhum som com a dor lancinante de suas queimaduras recentes.

— Revirem a casa toda! Não podemos deixá-la escapar! — gritava o velho e, aparentemente, líder daquele bando.

Um dos homens entrou sorrateiramente no quarto em que ela estava, Lívia espiou pelas frestas da porta do armário. Era Adolfo, o sujeito bigodudo que não tivera coragem de matá-la instantes atrás. Carregava um grande crucifixo preso por uma corrente ao pescoço e uma pistola calibre 38.

— Apareça! Queremos acabar logo com isso. Por favor, facilite as coisas! — dizia o sujeito.

O homem olhou ao redor do quarto e revisou preguiçosamente o ambiente. Entretanto, antes de sair do cômodo, algo no chão chamou a sua atenção, fazendo-o olhar para trás e, em seguida, na direção do armário. A jovem afastou-se da porta e encolheu-se no fundo do móvel; o caçador aproximou-se lentamente, tapando — com o seu corpo volumoso — a claridade que vinha da janela. Os instantes entre ele segurar o puxador da porta do armário e abri-la pareciam ter levado uma eternidade (Não me mate!). E, finalmente, quando estavam cara a cara, Lívia viu as mãos do homem tremerem (Por favor, não me mate!). Adolfo hesitou mais uma vez; o homem de bigode farto parecia estar enfeitiçado pelos profundos olhos azuis da garota; naquele momento sentiu-se dominado por um sentimento de compaixão. Era a oportunidade que ela precisava para escapar! Lívia saltou sobre o caçador, derrubando-o e empurrando a pistola — que disparou em direção à parede — para longe de seu corpo. Em seguida, ela correu o mais rápido que pode, agora em direção ao térreo, gritando de agonia pelas queimaduras que aumentavam em sua pele.

Medo: Contos de TerrorWhere stories live. Discover now